versão impressa ISSN 1679-4508versão On-line ISSN 2317-6385
Einstein (São Paulo) vol.15 no.2 São Paulo abr./jun. 2017
http://dx.doi.org/10.1590/s1679-45082017rc3927
Diversas anomalias genitais congênitas acometem o sexo masculino. Dentre elas, a criptorquidia é a mais comum.1 Outras patologias, apesar de raras, são o escroto ectópico e o pênis ectópico, sendo este último mais relatado em casos de transposição peno-escrotal.2 Relatamos aqui uma abordagem cirúrgica inédita para um caso de extrema raridade, devido à associação entre pênis ectópico, escroto ectópico e criptorquidia bilateral.
Paciente do sexo masculino, 10 anos, com pênis e escroto ectópicos (Figura 1), na região perineal, sem transposição peno-escrotal e com criptorquidia bilateral. Em associação, apresentava deformidade esquelética do tipo diáfise púbica com anquilose dos joelhos, e nenhuma associação com anomalias do trato urinário. Anteriormente, a criança fora submetida a uma orquidopexia esquerda, sem sucesso, devido à localização ectópica do escroto, sendo o testículo, então, posicionado na base do pênis. Iniciou-se a cirurgia com incisão inguinal à direita, objetivando a mobilização do testículo direito, que, entretanto, só foi possível até a posição anatômica do escroto, no púbis, e não à ectópica, na região perineal. Prosseguiu-se com a correção cirúrgica do pênis e escroto ectópicos, iniciada por uma incisão em Y invertido e complementada inferiormente para separar o pênis do escroto (Figura 2). Em seguida, o pênis foi mobilizado do períneo até sua posição anatômica, no púbis, onde foi fixado. Da pele escrotal perineal, foi mobilizado um retalho para configuração da bolsa testicular, adjacente e inferiormente ao pênis, com formação da rafe mediana e de duas hemibolsas testiculares. Prosseguiu-se com a orquidopexia, iniciada pelo posicionamento do testículo direito na hemibolsa testicular direita (Figura 3) e continuada pela abordagem do testículo esquerdo até sua disposição na hemibolsa esquerda. Ao final, realizou-se uma postectomia.
Figura 3 Posicionamento do testículo direito na hemibolsa testicular direita formada a partir da pele escrotal perineal
No pós-operatório imediato (Figura 4A), pôde-se observar a disposição do pênis e do escroto em suas posições anatômicas, com os testículos acomodados em suas respectivas hemibolsas. A pele perineal apresentou-se livre de tensão, devido à retirada não excessiva de pele escroto-perineal. Após 8 meses de cirurgia (Figura 4B), observou-se boa cicatrização, permanência da pele perineal livre de tensão, e manutenção de todas as estruturas em suas posições tópicas, com preservação de suas funcionalidades e ausência de complicações.
O pênis ectópico é uma anomalia que geralmente ocorre associada à transposição peno-escrotal. Isoladamente, representa menos de 20 casos na literatura.3 Já o escroto ectópico é a mais rara anomalia escrotal.4 No paciente deste caso, pênis e escroto ectópicos representavam uma associação ainda não descrita na literatura, com a manutenção da posição relativa entre tais estruturas, apesar da ectopia, não caracterizando uma transposição peno-escrotal.5 A anomalia deste paciente provavelmente é decorrente da malformação óssea ao nível da diáfise púbica. A raridade da associação e a ausência de relatos justificam a realização tardia da correção cirúrgica da ectopia, essencial para o tratamento da criptorquidia do caso, como demonstrado pela tentativa malsucedida de orquidopexia antes da correção das posições ectópicas. Além de permitir a orquidopexia, o procedimento cirúrgico promoveu ganho na autoimagem do paciente.