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Cross-cultural adaptation of the primary health care satisfaction questionnaire

Cross-cultural adaptation of the primary health care satisfaction questionnaire

Autores:

Elisabete Pimenta Araujo Paz,
Pedro Miguel Santos Dinis Parreira,
Alexandrina de Jesus Serra,
LoboRosilene Rocha Palasson,
Sheila Nascimento Pereira de Farias

ARTIGO ORIGINAL

Acta Paulista de Enfermagem

On-line version ISSN 1982-0194

Acta paul. enferm. vol.27 no.5 São Paulo Sept./Oct. 2014

http://dx.doi.org/10.1590/1982-0194201400070

Introdução

A atenção primária é o primeiro nível de oferta de cuidados para um bom desempenho dos sistemas de saúde, e o que oferece atenção voltada às pessoas e seus problemas mais comuns. Evidências demonstram melhores indicadores de saúde e de satisfação dos usuários, além de menores custos com saúde em países cujos sistemas de saúde são orientados pela atenção primária.(1,2)

A satisfação de usuários é considerada, um dos principais objetivos dos serviços de saúde, ocupando um lugar progressivamente mais relevante na avaliação e garantia da qualidade dos serviços de saúde para que se possa oferecer no sistema de saúde, os cuidados necessários, acessíveis e adequados às expectativas da população que diretamente utiliza o serviço público de saúde.(2-4)

A satisfação com o serviço de saúde é influenciada por vários fatores como a cultura local, o conhecimento do funcionamento do serviço, as atitudes dos profissionais diante das demandas apresentadas pelos usuários, a confiança no profissional de saúde, as experiências passadas na utilização do serviço, atendimento de suas necessidades, êxito do tratamento, dentre outros. Dada a subjetividade e multidimensionalidade que envolve a satisfação, este é um conceito de difícil operacionalização, em função de expectativas e demandas atendidas pelos serviços que passam pelos aspectos técnicos e interpessoais do cuidado. Quanto mais satisfeito o usuário está com o serviço de saúde, mais ele pode estar receptivo às orientações profissionais para a melhoria de sua saúde e escolher aquele serviço como sua referência de tratamento.(4,5)

Os instrumentos utilizados na avaliação da satisfação com serviço de saúde muitas vezes são insuficientes para dimensionar aquilo que realmente querem mensurar, principalmente se o objeto de medida apresenta características subjetivas, e que o consenso neste campo ainda é difícil,(6,7) devendo ser sempre consideradas as especificidades do serviço e da clientela avaliados, principalmente se utilizados instrumentos oriundos de outros países e realidades sociais, o que requer adequação a outra realidade sociocultural. A validação cultural e linguística dos instrumentos permite assegurar a validade e fiabilidade dos instrumentos adaptados, avaliando-se o que se pretende conhecer em um outro contexto, cultura e época, e permite a comparação de resultados com outras populações.(8,9)

Este estudo objetivou realizar a validação transcultural para o Brasil da versão portuguesa do Questionário sobre as dimensões de qualidade e a satisfação de pacientes com os cuidados primários de saúde elaborado por Raposo, Alves e Duarte.(10)

Métodos

Estudo metodológico de adaptação cultural e avaliação das propriedades psicométricas da versão portuguesa do Questionário sobre as dimensões de qualidade e a satisfação de pacientes com os cuidados primários de saúde elaborado por Raposo, Alves e Duarte.(10) A versão original apresenta 33 itens organizados em cinco dimensões: instalações do centro de saúde, atendimento administrativo, serviço de enfermagem, atendimento médico e atendimento no geral, enunciados sobre a forma de uma escala tipo Likert de concordância com 7 pontos, que varia entre 1-discordo totalmente; 2-discordo bastante; 3-discordo pouco; 4-nem concordo, nem discordo; 5-concordo um pouco; 6-concordo bastante; até ao 7-concordo totalmente.

O estudo foi realizado em uma Clínica da Família, na área de planejamento 3.1, município do Rio de Janeiro, sudeste do Brasil, situada em uma região que recentemente sofreu um processo de pacificação, com presença constante da polícia militar para erradicação dos conflitos sociais que comumente ocorriam.

Adaptação cultural e linguística

Inicialmente solicitou-se e obteve-se autorização expressa dos autores do questionário para realização do processo de validação e posterior utilização junto à população brasileira. Para efetuarmos o processo de adaptação cultural e linguística (Cross cultural adaptation) foram seguidos as diretrizes propostas por estudos internacionais(9,11) e nacionais(12) que incluem 5 etapas: tradução, primeira versão de consenso, retro tradução, comitê de especialistas e pré-teste.

Fase I e Fase II

Foram efetuadas nesta primeira etapa duas traduções independentes (T1 e T2 do instrumento da língua original (língua fonte) para português do Brasil, realizada por uma das enfermeiras pesquisadoras e um médico, ambos com atuação na área de Atenção Primária, onde foram verificadas possíveis dificuldades de compreensão de palavras que pudessem ser adaptadas semanticamente ao nosso contexto. Também foi solicitado aos tradutores que avaliassem a dificuldade de cada item da escala, e para tanto foi elaborada uma pontuação variou de zero (muito difícil) a 10 (muito fácil). Palavras ambíguas ou com significado pouco claro foram assinaladas no questionário apresentando-se propostas de melhoria para versão brasileira, por não serem de uso corrente no Brasil.

A partir das traduções independentes, uma retro tradução foi realizada por uma socióloga com fluência na língua portuguesa de Portugal que levou em consideração o questionário original, os itens que mantinham equivalência semântica das questões (mesmo significado), equivalência conceitual (mesmos conceitos nas duas culturas) e apresentação simples e direta das questões. Pequenas modificações foram efetuadas, mantendo-se os objetivos do estudo, e incorporadas às sugestões dos tradutores que resultou na versão de consenso.

Fase III e IV

A versão original em português, a versão de consenso da tradução para o português do Brasil e a retro tradução para o português de Portugal, foram comparadas por um painel de peritos (comitê de especialistas) constituído por uma epidemiologista brasileira, uma pesquisadora de enfermagem brasileira que atua com a estratégia saúde da família, um professor de enfermagem português doutor com atuação na área de gestão de serviços, e uma professora portuguesa de enfermagem, pesquisadora na área de qualidade de serviços de saúde com experiência na utilização do questionário original. Foram analisadas todas as questões da versão de consenso, visando avaliar em que medida o conteúdo de cada item refletia o sentido e conteúdo da versão original. As decisões tomadas seguiram as propostas de Guillemin,(11) visando à equivalência entre a versão original e a versão brasileira tendo em conta quatro áreas: equivalência semântica, equivalência idiomática, equivalência experiencial e equivalência conceitual.

As palavras ou expressões com significações diferentes foram retiradas ou ajustadas de modo a refletir na versão traduzida o mesmo conteúdo da versão original concorrendo para a validade do instrumento. Foram eliminadas inconsistências grosseiras e/ou erros conceituais da tradução e seguido o acordo por consenso que resultou em uma versão com índice de concordância de 100%. Seguiu-se a avaliação das discrepâncias, homogeneizando-se a redação baseada no consenso. Como exemplo temos as frases originais “Por norma o tempo de espera para ser tratado é curto” modificada para “Os enfermeiros/médicos respeitam o horário de atendimento”; “Os gabinetes de atendimento têm espaço suficiente” modificada para “Os consultórios para atendimento têm espaço suficiente”.

Fase V e VI

A versão de consenso foi aplicada a vinte usuários de uma clínica da família que não integrou o estudo, constituindo-se na fase final do processo de adaptação cultural. Na fase de pré-teste não foram assinaladas dificuldades de compreensão e de interpretação das questões, portanto os pesquisadores não consideraram necessário o re-teste, passando imediatamente a aplicação da versão de consenso.

Etapa de Campo

Aplicou-se o questionário por meio de entrevista a 398 usuários que atendiam aos critérios de inclusão e procuraram a Clínica da Família com demandas de saúde. As entrevistas ocorreram nos turnos da manhã e tarde, de segunda a sexta-feira no período de 05/08 a 28/11 de 2013, antes do atendimento médico ou do enfermeiro, ou durante a espera para a realização de algum procedimento na clínica. As entrevistas tiveram duração média de 15 minutos e foram realizadas por bolsistas treinados para este procedimento.

No início da coleta de dados apresentavam-se brevemente os objetivos do estudo, procedimentos da entrevista, explicação da garantia de confidencialidade e anonimato dos participantes. Seguia-se a leitura e assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, documento obrigatório em pesquisas com seres humanos, com informações detalhadas das etapas, métodos da pesquisa, possíveis riscos à pessoa e as condutas para evitá-los. A compreensão de todo o seu teor com a assinatura consentida, garante a autonomia dos participantes pela observância dos princípios éticos da pesquisa.

Os dados foram organizados em um banco de dados e as análises estatísticas geradas no programa Statistical Package for the Social Sciences versão 20.0, incluíram análises descritivas e de tendência. Para análise da consistência interna, ou seja, o grau em que todos os itens medem um mesmo constructo da escala foi utilizado o alpha de Cronbach.

O desenvolvimento deste estudo atendeu as normas nacionais e internacionais de ética em pesquisa envolvendo seres humanos.

Resultados

Caracterização dos respondentes

A amostra constituiu-se por 74,1% de respondentes do gênero feminino e 25,9% do gênero masculino. A média de idades foi de 41 anos com desvio padrão de 15,72 anos variando entre 18 e 84 anos. Quanto à cor da pele/raça autorreferida, 48,6% são de cor parda, 28% cor preta, 21,2% cor branca e 1,5% indígena. 9,3% vivem sós. Entre os entrevistados 36,7% dos usuários apresentam o segundo ciclo do ensino básico (5ª a 9ª série), 24,6% o primeiro ciclo do ensino básico (1ª a 4ª série). Da amostra entrevistada, 55,8% não informou possuir ocupação formal.

Em termos de rendimento mensal em salários mínimos 38,4% recebem entre 1 e 2 salários, 32,4% não possuíam renda e 11,8% informaram ter algum tipo de auxílio financeiro do governo. Já quanto à frequência com que costumam ir à unidade de Saúde 35,5% informou frequência de 2 vezes a 6 vezes ao ano, 25,6% de 1 vez por mês e 12,7% semanalmente, sendo que 59,7% informou como motivo do comparecimento a consulta de rotina.

Em relação à satisfação com a localização da unidade 93,7% estão satisfeitos ou muito satisfeitos, no entanto 5,3% dos usuários sentem dificuldades em chegar à unidade de saúde, 72,9% demoram até 15 minutos para chegar a mesma e 94,2% não possuem gastos neste deslocamento.

Apenas 17,1% os usuários conseguem marcar consulta no mesmo dia, 29,2% demoram entre 2 a 4 semanas para conseguir consulta médica e 28,4% entre 1 a 2 meses. No que diz respeito à demora na sala de espera para consultar-se com o médico 58,8% são atendidos na primeira hora e 15,2% esperam mais de 2 horas por esta consulta.

Quanto ao tempo de demora em conseguir uma consulta com o enfermeiro 35,9% dos usuários a conseguem no mesmo dia. Apesar de 74,9% ter a consulta com o enfermeiro dentro de 30 dias, 25,1% informou esperar entre 1 mês e 6 meses. 42,4% informou esperar até 30 minutos na sala de espera para consultar com o enfermeiro.

Na análise da escala de satisfação dos usuários iniciamos pela avaliação dos itens da escala segundo a dispersão das respostas, verificando-se que os usuários posicionaram a sua avaliação em todos os níveis de concordância da escala, o que denota um adequado poder discriminativo dos itens (Tabela 1). Estes apresentam valores genericamente bem acima do ponto médio da escala denotando satisfação global dos usuários.

Tabela 1 Mínimo, máximo, média e desvio padrão dos itens do questionário Satisfação do usuário com os cuidados primários de saúde n=398 

Item Variáveis da Escala de Satisfação Mínimo Máximo Média Desvio padrão
1 Instalações tem boa aparência 1 7 6,25 1,06
2 Instalações tem temperatura agradável 1 7 6,06 1,31
3 Instalações são confortáveis 1 7 6,13 1,12
4 Instalações apresentam-se limpas 1 7 6,30 1,02
5 Banheiros apresentam boas condições de higiene 1 7 5,99 1,23
6 Consultórios para atendimento têm espaço suficiente 1 7 6,21 1,16
7 A clínica tem instalações adequadas a pessoas com deficiência 1 7 5,63 1,59
8 Os serviços encontram-se bem sinalizados 1 7 5,99 1,37
9 Horário funcionamento é adequado as suas necessidades 1 7 5,70 1,66
10 Nesta clínica há informação sobre cuidados de saúde 1 7 5,72 1,67
11 Os Agentes Comunitários são atenciosos 1 7 6,05 1,39
12 Os Agentes Comunitários interessam-se pelos seus problemas e pela sua resolução 1 7 5,85 1,52
13 Os Agentes Comunitários explicam claramente o que o Senhor deve fazer 1 7 5,94 1,51
14 Normalmente se espera pouco pelo atendimento 1 7 5,11 1,80
15 Os enfermeiros são atenciosos 1 7 6,11 1,24
16 Os enfermeiros interessam-se pelos seus problemas e pela sua resolução 1 7 5,94 1,35
17 Os enfermeiros fazem tudo o que podem para resolver o seu problema 1 7 5,87 1,49
18 Os enfermeiros explicam-lhe claramente o tratamento que terá de fazer 1 7 5,97 1,43
19 Os enfermeiros são competentes nos tratamentos que lhe fazem 1 7 6,01 1,42
20 Normalmente o enfermeiro está disponível para lhe tratar 1 7 5,60 1,62
21 Os enfermeiros respeitam o horário de atendimento 1 7 5,20 1,73
22 Normalmente se espera pouco para ser atendido 1 7 4,61 1,87
23 Os médicos são atenciosos 1 7 6,40 1,15
24 Os médicos interessam-se pelos seus problemas e pela sua resolução 1 7 6,36 1,15
25 Os médicos explicam-lhe claramente os tratamentos que terá de fazer 1 7 6,41 1,12
26 Os médicos fazem tudo o que podem para resolver o seu problema 1 7 6,26 1,26
27 Os médicos são competentes nos tratamentos que lhe fazem 1 7 6,29 1,27
28 Os médicos respeitam o horário de atendimento 1 7 5,48 1,79
29 Normalmente se espera pouco para ser atendido 1 7 4,76 1,88
30 De modo geral o Sr (a) se sente satisfeito com os serviços desta unidade de saúde 1 7 5,70 1,55
31 Esta unidade de saúde corresponde as suas necessidades 1 7 5,70 1,52
32 Esta unidade de saúde está de acordo com suas expectativas 1 7 5,38 1,68
33 Esta unidade de saúde está muito próxima de uma unidade de saúde perfeita 1 7 4,85 1,85

As questões que apresentaram os valores médios mais baixos são relativas ao tempo médio de espera para o atendimento tanto pelos médicos como pelos enfermeiros. Assinala-se também um valor médio de 4,85 na questão “Esta unidade de saúde está muito próxima de uma unidade de saúde perfeita” denotando que apesar dos usuários se sentirem satisfeitos, reconhecem que a unidade não atende a todas as suas expectativas.

Validade de constructo

A validade de constructo de um conceito como a satisfação em constante mudança e evolução, para além da sua subjetividade, apesar de complexa, revela-se decisiva para que possa ser considerada uma medida de credibilidade. A dimensionalidade do instrumento foi avaliada pela análise fatorial em componentes principais (ACP) seguindo-se a avaliação da consistência interna pelo método da determinação do alfa de Cronbach e as correlações dos itens com os fatores. Estipulou-se para ACP, na interpretação do fator, carga fatorial mínima de ±0,30. O número de fatores com autovalor (eigenvalue) superior a um e o Cattell’s Scree test determinaram o número de fatores a extrair.

Obtivemos seis fatores na análise fatorial em componentes principais. A matriz gerada evidenciou um índice de Kaiser Meyer-Olkin (KMO) de 0,919 com significância para o teste de esfericidade de Bartlett (BTS) (c2=11171,324, p=0,000), sendo indicador da adequação da amostra e da matriz de correlações à fatorização. A análise revelou seis fatores com eingenvalue superior a 1, que explicam 70,82 % da variância, respectivamente 20,31% para o primeiro fator, 12,72% para o segundo fator, 12,57% para o terceiro fator, 10,58% para o quarto fator, 9,43% para o quinto fator e 5,20% para o sexto fator. Algumas pequenas alterações relativas à escala original foram assinaladas, não desvirtuando nenhum dos fatores.

Em relação à caracterização dos fatores originais com os deste estudo (Tabela 2), os mesmos foram organizados em F1- Atendimento do enfermeiro; F2- Atendimento Médico; F3-Instalações da Unidade de Saúde; F4-Satisfação Global; F5-Atendimento Administrativo; F6-Atendimento Médico: horário tempo de espera. A média e o desvio padrão para cada um dos fatores foi respectivamente: F1- 1,26 e 5,69; F2- 6,35 e 1,06; F3- 6,04 e 086; F4- 1,37 e 5,48; F5-5,73 e 1,34; F6-1,70 e 5,12.

Tabela 2 Satisfação do usuário: Percentagem de variância explicada, saturações fatoriais, comunalidades (h2) e consistências internas por fator 

Item Variáveis da Escala do nível de Satisfação Fatores, % variância explicada e comunalidades
F1 F2 F3 F4 F5 F6 h2
20,31% 12,72% 12,57% 10,58% 9,43% 5,20%  
17 Os enfermeiros fazem tudo o que podem para resolver o seu problema 0,908           0,911
18 Os enfermeiros explicam-lhe claramente o tratamento que terá de fazer 0,900           0,896
19 Os enfermeiros são competentes nos tratamentos que lhe fazem 0,899           0,905
16 Os enfermeiros interessam-se pelos seus problemas e pela sua resolução 0,891           0,861
15 Os enfermeiros são atenciosos 0,885           0,860
20 Normalmente o enfermeiro está disponível para lhe tratar 0,883           0,858
21 Os enfermeiros respeitam o horário de atendimento 0,847           0,846
22 Normalmente se espera pouco para ser atendido 0,798           0,768
24 Os médicos interessam-se pelos seus problemas e pela sua resolução   0,857         0,858
25 Os médicos explicam-lhe claramente os tratamentos que terá de fazer   0,807         0,786
23 Os médicos são atenciosos   0,799         0,775
26 Os médicos fazem tudo o que podem para resolver o seu problema   0,798         0,801
27 Os médicos são competentes nos tratamentos que lhe fazem   0,774         0,753
3 Instalações são confortáveis     0,718       0,591
4 Instalações apresentam-se limpas     0,690       0,536
1 Instalações tem boa aparência     0,658       0,490
2 Instalações tem temperatura agradável     0,641       0,446
5 Banheiros apresentam boas condições de higiene     0,618       0,489
6 Consultórios para atendimento têm espaço suficiente     0,582       0,491
7 A clínica tem instalações adequadas a pessoas com deficiência     0,578 0,317     0,470
8 Os serviços encontram-se bem sinalizados     0,488       0,367
9 Horário funcionamento é adequado as suas necessidades   0,306 0,451 0,307     0,411
31 Esta unidade de saúde corresponde as suas necessidades       0,814     0,823
32 Esta unidade de saúde está de acordo com suas expectativas       0,782     0,824
30 De modo geral o Sr (a) se sente satisfeito com os serviços desta unidade de saúde       0,773     0,797
33 Esta unidade de saúde está muito próxima de uma unidade de saúde perfeita       0,734     0,717
10 Nesta clínica há informação sobre cuidados de saúde     0,315 0,333     0,335
12 Os Agentes Comunitários interessam-se pelos seus problemas e pela sua resolução         0,879   0,802
11 Os Agentes Comunitários são atenciosos         0,862   0,871
13 Os Agentes Comunitários explicam claramente o que o Sr deve fazer         0,815   0,802
14 Normalmente se espera pouco pelo atendimento       0,390 0,604   0,593
29 Normalmente se espera pouco para ser atendido           0,809 0,821
28 Os médicos respeitam o horário de atendimento   0,349       0,753 0,815
Alpha de Cronbach 0,94* 0,94* 0,84* 0,91* 0,88* 0,84*  
0,96* 0,94* 0,93* 0,94* 0,93*    

F1- Atendimento do enfermeiro ; F2- Atendimento Médico; F3- Instalações da Unidade de Saúde; F4- Satisfação Global; F5-Atendimento Administrativo; F6-Atendimento Médico (Horário e tempo de espera);

*Valores obtidos pela presente pesquisa;

**Valores obtidos por Raposo, Alves e Duarte (2009)

O fator “Atendimento Médico”, da escala original, foi dividido em dois fatores: ao primeiro denominamos de “F2- Atendimento Médico”, que agrupa aspectos como o interesse pelos problemas e sua resolução, a explicação dos tratamentos a realizar, a atenção e a competência do profissional para resolver os problemas apresentados pelo usuário na consulta. O segundo fator denominado “F6-Atendimento Médico: Horário e tempo de espera”, refere-se a aspectos relativos ao tempo de espera e ao cumprimento do horário por parte dos médicos. Assinala-se também ligeira ambiguidade fatorial com valores muito próximos de 0,30 na questão “Nesta clínica há informação sobre cuidados de saúde”. Esta apresenta, no entanto, maior saturação no F4 - “Satisfação Global” do que no factor F3- “Instalações da Unidade de Saúde” agrupando-se a questões relativas às expectativas e à satisfação do usuário.

Confiabilidade

A confiança relativamente à permanência dos resultados fornecidos em várias aplicações de uma determinada escala ou teste, à qual está sempre associado um erro que é necessário reduzir, designa-se de fidedignidade ou confiabilidade. Para o efeito, segue-se o método da consistência interna, obtido através da correlação média entre todos os itens e o valor final do teste ou do fator em questão tendo em conta os itens que o compõem. O alfa de Cronbach é o teste mais utilizado quando os itens se apresentam de forma não dicotômica sendo uma boa estimativa da fidelidade na maioria das situações.

Como linha de referência considera-se o valor de 0,80, embora se possa aceitar valores superiores ou iguais a 0,60, quando o número de itens é baixo. Os resultados mostraram que todos os fatores apresentam valores de consistência interna superiores a 0,88, demonstrando que o instrumento possui confiabilidade, tal como o instrumento original.

Verifica-se também valores médios superiores ao ponto médio da escala, realçando-se um maior nível de satisfação no Fator 2 “Atendimento Médico” e um menor nível de satisfação no Fator 6- “Atendimento Médico Horário e tempo espera” relativo ao horário e tempo de espera para atendimento médico.

Estudo correlacional

A validade dos itens foi avaliada pela correlação de Pearson item/fatores, com e sem sobreposição do item, as correlações bicaudais r de Pearson entre fatores e a análise de componentes principais estão apresentados na tabela 3.

Tabela 3 Correlações entre os itens e os fatores com e sem sobreposição 

Item Sem sobreposição do item F1 F2 F3 F4 F5 F6
p15 0,785 0,824 0,625 0,588 0,452 0,284 0,428
p16 0,823 0,859 0,635 0,563 0,514 0,330 0,434
p17 0,865 0,896 0,670 0,558 0,530 0,351 0,399
p18 0,840 0,875 0,675 0,543 0,509 0,365 0,406
p19 0,861 0,891 0,679 0,566 0,596 0,439 0,423
p20 0,815 0,860 0,572 0,551 0,586 0,366 0,468
p21 0,765 0,825 0,527 0,490 0,563 0,351 0,642
p22 0,660 0,747 0,460 0,480 0,552 0,387 0,622
p23 0,859 0,653 0,903 0,477 0,492 0,371 0,459
p24 0,890 0,622 0,925 0,464 0,494 0,340 0,471
p25 0,830 0,595 0,880 0,429 0,507 0,338 0,502
p26 0,846 0,623 0,897 0,424 0,549 0,396 0,478
p27 0,818 0,635 0,878 0,459 0,509 0,435 0,466
p1 0,528 0,374 0,308 0,612 0,292 0,263 0,226
p2 0,533 0,388 0,304 0,637 0,299 0,236 0,266
p3 0,631 0,415 0,289 0,705 0,388 0,230 0,300
p4 0,616 0,389 0,290 0,686 0,377 0,323 0,267
p5 0,625 0,448 0,340 0,709 0,386 0,362 0,320
p6 0,591 0,485 0,446 0,676 0,408 0,347 0,299
p7 0,626 0,483 0,324 0,733 0,440 0,343 0,305
p8 0,521 0,494 0,327 0,633 0,408 0,354 0,280
p9 0,523 0,468 0,435 0,656 0,475 0,327 0,340
P10 0,498 0,443 0,345 0,442 0,642 0,396 0,320
P30 0,792 0,604 0,519 0,494 0,857 0,557 0,447
P31 0,818 0,547 0,530 0,473 0,875 0,505 0,486
P32 0,855 0,578 0,535 0,527 0,905 0,506 0,582
P33 0,773 0,464 0,434 0,429 0,856 0,469 0,535
P11 0,776 0,313 0,298 0,360 0,433 0,852 0,185
P12 0,849 0,325 0,331 0,442 0,506 0,906 0,280
P13 0,817 0,444 0,472 0,411 0,515 0,885 0,317
P14 0,679 0,390 0,385 0,399 0,561 0,810 0,392
P28 0,834 0,547 0,524 0,382 0,518 0,297 0,925
P29 0,841 0,540 0,465 0,415 0,559 0,370 0,932

*Valores obtidos pela presente pesquisa;

**Valores obtidos por Raposo, Alves e Duarte (2009)

Todos os itens apresentam valores correlacionais sem sobreposição mais elevados com a dimensão a que teoricamente pertencem do que com outras dimensões, sugerindo uma interdependência entre fatores, evidenciando que a escala é representativa dos fatores relativos à satisfação dos usuários e tem familiaridade suficiente para constituírem distintas dimensões (validade convergente discriminante). As correlações são mais fortes com o fator/dimensão a que teoricamente pertencem do que com outro, sendo abonatório da homogeneidade de conteúdo dos itens dentro de cada um. Destaca-se que globalmente apresentam valores superiores a 0,70, à exceção dos itens 1,2,6,8,9 e 10 (0,528; 0,533; 0,591; 0,521 e 0,523, respectivamente).

Discussão

Neste estudo descreveram-se as cinco fases do processo de adaptação transcultural e contributos para validação para o português brasileiro do Questionário sobre as dimensões de qualidade e a satisfação de pacientes com os cuidados primários de saúde. Produziu-se um instrumento equivalente à versão portuguesa para uso no Brasil, garantindo sua equivalência idiomática e semântica. A avaliação das propriedades psicométricas do instrumento pelo estudo da validade de construto mostrou que as questões abordadas no instrumento medem aquilo que se pretende medir. A consistência interna determinada pelo alfa de Cronbach, superior a 0,84 em todas as dimensões denotou elevada fiabilidade do instrumento, como encontrado em outros estudos que utilizaram a psicometria para mensuração de fenômenos subjetivos que envolvem comportamentos e avaliação de serviços.(13-18)

Para os enfermeiros utilizar um instrumento que avalie a satisfação com seu trabalho individualmente e da equipe, contribuirá com o conhecimento do impacto de suas atividades, com adequação de ações e aumento de sua visibilidade social no contexto da assistência primária, adotando-se estratégias de melhoria contínua da qualidade e comunicação para a efetividade do cuidado.

Globalmente, da análise da correlação de cada item com os fatores, verificou-se que cada item se correlaciona mais fortemente com o fator a que pertence do que com outros fatores, sendo sinal de validade.(14,15) Os resultados, apesar de apresentarem valores médios elevados em todas as dimensões, evidenciam na dimensão Atendimento do Médico em termos de horário e tempo de espera, valores médios mais baixos, o que contribui para uma avaliação negativa do serviço de saúde.

A opção pela entrevista na clínica para facilitar a participação dos usuários, principalmente pela baixa escolaridade da população que utiliza o serviço de saúde, com possibilidade de haver dificuldade na leitura das questões, pode ter levado a um viés decorrente da participação única de usuários presentes na unidade de saúde, influenciando o padrão de respostas dos participantes, sendo uma limitação na avaliação dos resultados.

Conclusão

O instrumento Satisfação dos Usuários com os Cuidados Primários de Saúde nas etapas do processo de adaptação cultural na sua versão traduzida para o Brasil mostrou-se psicometricamente adequado, equilibrado e eficaz para uso em unidades primárias como as de saúde da família, apresentando-se equivalente à versão original de Portugal.

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