Compartilhar

Déficit estatural e fatores associados em crianças de 6 a 24 meses atendidas em unidades de saúde do sudoeste da Bahia

Déficit estatural e fatores associados em crianças de 6 a 24 meses atendidas em unidades de saúde do sudoeste da Bahia

Autores:

Elma Izze da Silva Magalhães,
Daniela Santana Maia,
Carla Fabrícia Araújo Bonfim,
Michele Pereira Netto,
Joel Alves Lamounier,
Daniela da Silva Rocha

ARTIGO ORIGINAL

Cadernos Saúde Coletiva

versão impressa ISSN 1414-462Xversão On-line ISSN 2358-291X

Cad. saúde colet. vol.24 no.1 Rio de Janeiro jan./mar. 2016 Epub 12-Abr-2016

http://dx.doi.org/10.1590/1414-462X201600010037

Abstract

Objective

To assess the prevalence and factors associated with stunting among 6 to 24-month old children.

Methodology

This was a cross-sectional study including 360 children attended in all health units in the urban area of Vitória da Conquista - BA. A questionnaire was used to collect information and we evaluated anthropometric measures of weight and height. Nutritional status was evaluated according to the cutoff points for anthropometric indexes recommended by the World Health Organization. The association among the studied factors and stunting was assessed by Poisson regression with robust variance.

Results

The prevalence of stunting in the assessed children was 13.6%. The factors associated with the outcome were: father’s unemployment (PR: 2.46; 95% CI: 1.34 to 4.49) and low birth weight (OR: 2.29; 95% CI: 1.27 to 4.13).

Conclusion

The results show a significant prevalence of stunting among children under two years old, emphasizing the importance of nutritional monitoring and the influence of obstetric and socioeconomic factors.

Keywords:  nutritional status; infant; stature by age; socioeconomic factors; birth weight

INTRODUÇÃO

A avaliação do crescimento infantil é a medida que melhor define a saúde e o estado nutricional da criança, além de ser um excelente indicador de desigualdade nas populações1. Os dois primeiros anos de vida são caracterizados por uma fase de crescimento acelerado e por importantes aquisições no processo de desenvolvimento, representando, assim, um período de grande vulnerabilidade aos agravos sociais, econômicos e ambientais2.

O retardo de crescimento linear ou déficit estatural é uma medida de desnutrição a longo prazo, a qual geralmente está associada a uma combinação de consumo alimentar inadequado e infecções de repetição que estão intimamente relacionados com o padrão de vida da população, incluindo o acesso a alimentação, moradia e assistência à saúde3-5.

O déficit estatural aumenta o risco de doenças infecciosas e mortalidade precoce, bem como pode acarretar comprometimento do desenvolvimento psicomotor, atraso na capacidade intelectual, menor capacidade produtiva na idade adulta, além de ser considerado determinante do baixo peso ao nascer entre as futuras gestantes5,6.

Em virtude de sua magnitude e das consequências irreversíveis para o desenvolvimento e sobrevivência das crianças5,7, o déficit estatural ainda é considerado um dos mais importantes problemas de saúde pública a serem enfrentados pelos países em desenvolvimento2,7.

Diante disso, o objetivo deste estudo foi avaliar os fatores associados ao déficit de estatura em crianças de 6 a 24 meses atendidas em todas as unidades de saúde da zona urbana do município de Vitória da Conquista, Bahia.

METODOLOGIA

Trata-se de um estudo transversal desenvolvido a partir de dados de uma pesquisa mais ampla, denominada Caracterização da saúde materno-infantil do município de Vitória da Conquista, BA, realizada em todas as 21 unidades de saúde da zona urbana de Vitória da Conquista. Essa pesquisa teve como objetivo avaliar a prevalência de anemia e desvios nutricionais entre gestantes e crianças menores de 2 anos atendidas nas unidades de saúde.

O município de Vitória da Conquista, localizado na região sudoeste da Bahia, é o terceiro maior do estado, tendo sua economia voltada principalmente para o setor de serviços8. Segundo dados do Censo Demográfico 20109, o município possuía 306.866 habitantes, sendo 9,3% desses na faixa etária de 0 a 5 anos.

Para o cálculo do tamanho amostral utilizou-se o programa Statcalc do software Epi-info 6.0410. Esse foi realizado considerando-se o número total de crianças menores de 2 anos atendidas nas unidades de saúde da zona urbana de Vitória da Conquista em 2010 (n = 6.764), uma prevalência estimada em 40,6%11, uma vez que considerou a maior prevalência dentre as variáveis dependentes do estudo principal (anemia ferropriva), com precisão de 5% e intervalo de confiança de 95%, totalizando amostra mínima de 350 crianças.

O projeto de pesquisa foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Estadual do Sudoeste da Bahia – UESB (protocolo n. 048/2010). A coleta de dados ocorreu no período de maio de 2010 a janeiro de 2011, durante as consultas de Crescimento e Desenvolvimento (CD) realizadas nas unidades de saúde. Os pais ou responsáveis pelas crianças foram convidados a participar da pesquisa de forma aleatória, sendo esclarecidos os seus objetivos e solicitada a assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, caso concordassem em participar do estudo. Como critério de inclusão, a criança deveria ter idade entre 6 e 24 meses e ausência de doenças crônicas que pudessem interferir em seu crescimento linear. Foram excluídas as crianças acompanhadas por responsáveis que não estavam capacitados a responder ao instrumento de coleta.

As informações foram coletadas por meio da aplicação de um questionário padronizado, incluindo questões referentes à identificação da criança e da mãe, dados demográficos e socioeconômicos da família, dados obstétricos, práticas de aleitamento materno e assistência à saúde.

A avaliação antropométrica foi realizada segundo as técnicas estabelecidas pelo Sistema de Vigilância Alimentar e Nutricional – SISVAN e preconizadas pelo Ministério da Saúde12. O peso foi verificado em balança digital eletrônica portátil Marte® (capacidade de 200 kg e sensibilidade de 50 g), com prato tipo bandeja (em plástico ABS) acoplado para a disposição da criança. O comprimento foi aferido em antropômetro portátil Alturexata® (0,35 a 2,13 m e precisão de 1 mm).

O estado nutricional das crianças foi avaliado de acordo com os valores em escores-z dos índices antropométricos estatura/idade, peso/idade e peso/estatura preconizados pela Organização Mundial de Saúde13, com o auxílio do software WHO Anthro Plus14. Foram classificadas com déficit estatural (baixa estatura para idade e muito baixa estatura para idade), baixo peso para idade e magreza, as crianças com valores de escore-z < –2 para os índices estatura/idade, peso/idade e peso/estatura13.

O índice estatura/idade representa o crescimento linear da criança, sendo o que melhor indica o efeito cumulativo de situações adversas na infância. Além disso, é considerado o indicador mais sensível para medir a qualidade de vida de uma população e está presente na Caderneta de Saúde da Criança12.

A associação entre as variáveis estudadas e o déficit estatural foi verificada por meio de regressão de Poisson com variâncias robustas. Inicialmente realizou-se análise bivariada para avaliar possíveis associações entre as variáveis demográficas, socioeconômicas, obstétricas, de práticas de aleitamento materno e assistência à saúde (variáveis independentes) e o déficit estatural (variável dependente). As variáveis que apresentaram p-valor inferior a 0,20 na análise bivariada foram incluídas na análise multivariada, sendo a probabilidade inferior a 5% (p < 0,05) considerada nível de significância estatística para a seleção no modelo de regressão múltipla.

Para a seleção do modelo final foi utilizada a estratégia passo a passo, com a inclusão de todas as variáveis selecionadas durante a análise bivariada em ordem decrescente de significância estatística. As variáveis que apresentaram p > 0,05 foram retiradas uma a uma do modelo e consideradas definitivamente excluídas se o decréscimo na explicação do desfecho não era estatisticamente significativo. Para analisar esse parâmetro, o modelo foi avaliado a cada retirada, com auxílio dos testes estatísticos de Wald e razão de verossimilhança parcial baseada na estatística –2[ln(Lr) – ln(Lc)], que compara a verossimilhança do modelo reduzido – Lr com a verossimilhança do modelo completo – Lc. A avaliação da qualidade do modelo final foi feita pela aplicação do teste da bondade (goodness of fit test).

RESULTADOS

Foram avaliadas 360 crianças, dentre as quais 50,3% eram do sexo feminino; 54,7% estavam na faixa etária entre 12 e 24 meses, com média de idade de 13,9 ± 5,1 meses. Em relação à escolaridade dos pais, 30,4% das mães e 24,1% dos pais tinham até 8 anos de estudo. A maioria das famílias (60,5%) possuía rendimento mensal igual ou inferior a um salário-mínimo vigente na época do estudo, sendo a mediana de renda igual a 510 reais (Tabela 1).

Tabela 1 Distribuição das crianças atendidas nas unidades de saúde da zona urbana de Vitória da Conquista, BA, segundo características demográficas e socioeconômicas (2011) 

Variável n % Média (desvio-padrão)/
Mediana (IIQ) ᵼ
Sexo da criança
Masculino 179 50
Feminino 181 50
Idade da criança 13,9 (5,1)
6 a 12 meses 163 45
13 a 24 meses 197 55
Raça/cor da criança
Branca 184 52
Não branca 173 49
Escolaridade materna
Sem instrução 124 35
Até 8 anos de estudo 108 30
9 a 11 anos de estudo 105 30
> 11 anos de estudo 19 5,3
Trabalho materno
Sim 102 29
Não 255 71
Número de irmãos 2,1 (1,5)
Até 2 irmãos 294 73
≥ 3 irmãos 96 27
Número de irmãos menores de 5 anos 1,2 (0,5)
Até 1 irmão 278 77
≥ 2 irmãos 82 23
Escolaridade paterna
Sem instrução 138 43
Até 8 anos de estudo 78 24
9 a 11 anos de estudo 85 26
> 11 anos de estudo 23 7,1
Trabalho paterno
Sim 320 91
Não 30 8,6
Renda familiar 510,0 (365,0)
≤ 1 salário-mínimo 208 61
> 1 salário-mínimo 136 40

IIQ: Intervalo interquartílico; Mediana da renda em reais

Quanto às características obstétricas, a maioria das crianças (59,1%) nasceu de parto cesárea, 7,3% prematuras e 10,4% com baixo peso ao nascer. No tocante à prática de aleitamento materno, mais de 90% das mães relataram que estavam amamentando a criança e, dentre aquelas crianças que não estavam recebendo leite materno, a mediana de tempo de aleitamento materno foi de 270 dias. O acompanhamento frequente das crianças nas unidades de saúde foi referido por 93% das mães (Tabela 2).

Tabela 2 Distribuição das crianças atendidas nas unidades de saúde da zona urbana de Vitória da Conquista, BA, segundo características obstétricas, práticas de aleitamento materno e assistência à saúde (2011) 

Variável n % Média (desvio-padrão)/
Mediana (IIQ) ᵼ
Número de consultas pré-natal 6,7 (2,2)
< 6 consultas 72 22,4
≥ 6 consultas 249 77,6
Duração da gestação
< 37 semanas 26 7,3
≥ 37 semanas 332 92,7
Tipo de parto
Normal 147 40,9
Cesáreo 212 59,1
Peso ao nascer 3153,0 (552,2)
< 2.500 g 37 10,4
≥ 2.500 g 320 89,6
Aleitamento materno 270 (240)
Sim 332 92,5
Não 27 7,5
Aleitamento materno exclusivo 180 (90)
Sim 302 84,8
Não 54 15,2
Plano de saúde
Sim 29 8,1
Não 330 91,9
Acompanhamento na unidade de saúde
Sim 334 93
Não 25 7

IIQ: Intervalo interquartílico; Mediana de tempo de aleitamento materno e tempo de aleitamento materno exclusivo em dias

Na avaliação do estado nutricional, 4,5% das crianças avaliadas apresentaram baixo peso para idade e 5,6%, magreza. A prevalência do déficit estatural foi de 13,6%, dos quais 73,5% apresentavam baixa estatura para idade e 26,5%, muito baixa estatura para idade.

Após análise bivariada, as variáveis incluídas para análise multivariada foram: sexo, idade da criança, número de irmãos menores de 5 anos, trabalho paterno (Tabela 3), duração da gestação, peso ao nascer, plano de saúde e acompanhamento na unidade de saúde (Tabela 4).

Tabela 3 Razão de prevalência (RP) bruta do déficit estatural e seus intervalos de confiança de 95% (IC 95%), segundo variáveis demográficas e socioeconômicas das crianças atendidas nas unidades de saúde de Vitória da Conquista, BA (2011) 

Variável Déficit estatural (%) RP (bruta) IC
95%
p
Sexo da criança
Feminino 11,05 1
Masculino 16,2 1,47 (0,86-2,49) 0,16
Idade da criança
13 a 24 meses 11,17 1
6 a 12 meses 16,56 1,48 (0,88-2,50) 0,14
Raça/cor da criança
Branca 15,22 1
Não branca 11,56 0,76 (0,44-1,30) 0,32
Escolaridade materna
≥ 8 anos de estudo 13,84 1
< 8 anos de estudo 13,64 0,99 (0,57-1,69) 0,96
Trabalho materno
Não 11,76 1
Sim 14,51 1,23 (0,67-2,27) 0,5
Número de irmãos
Até 2 irmãos 12,88 1
≥ 3 irmãos 15,63 1,21 (0,69-2,13) 0,5
Número de irmãos menores de 5 anos
Até 1 irmão 11,87 1
≥ 2 irmãos 19,51 1,64 (0,95-2,83) 0,07
Escolaridade paterna
≥ 8 anos de estudo 14,62 1
< 8 anos de estudo 14,38 0,98 (0,58-1,67) 0,95
Trabalho paterno
Sim 12,19 1
Não 30 2,46 (1,32-4,58) 0,01
Renda familiar
> 1 salário-mínimo 14,71 1
≤ 1 salário-mínimo 12,98 0,88 (0,52-1,51) 0,65

Tabela 4 Razão de prevalência (RP) bruta do déficit estatural e seus intervalos de confiança de 95% (IC 95%), segundo variáveis obstétricas, de práticas de aleitamento materno e assistência à saúde das crianças atendidas nas unidades de saúde de Vitória da Conquista, BA (2011) 

Variável Déficit estatural (%) RP (bruta) IC
95%
p
Número de consultas pré-natal
≥ 6 consultas 14,46 1
< 6 consultas 15,28 1,06 (0,57-1,97) 0,86
Duração da gestação
≥ 37 semanas 12,95 1
< 37 semanas 23,08 1,78 (0,84-3,80) 0,13
Tipo de parto
Normal 16,32 1
Cesáreo 11,79 0,72 (0,43-1,21) 0,22
Peso ao nascer
≥ 2.500 g 12,19 1
< 2.500 g 27,03 2,22 (1,21-4,07) 0,01
Aleitamento materno
Sim 14,16 1
Não 7,41 0,52 (0,13-2,04) 0,35
Aleitamento materno exclusivo
Sim 13,25 1
Não 16,67 1,26 (0,65-2,44) 0,5
Plano de saúde
Sim 3,45 1
Não 14,55 4,22 (0,60-29,54) 0,15
Acompanhamento na unidade de saúde
Sim 12,57 1
Não 24 1,91 (0,90-4,06) 0,09

Os fatores que se associaram ao déficit estatural, após ajuste do modelo de regressão múltipla, foram: trabalho paterno e peso ao nascer. O desfecho foi mais prevalente entre aquelas crianças cujos pais não trabalhavam quando comparadas àquelas cujos pais trabalhavam; bem como se observou maior prevalência do déficit estatural entre as crianças que nasceram com baixo peso em relação àquelas nascidas com peso normal (Tabela 5).

Tabela 5 Razão de prevalência (RP) e intervalo de confiança de 95% (IC 95%) ajustados por regressão de Poisson para o déficit estatural em crianças atendidas nas unidades de saúde da zona urbana de Vitória da Conquista, Bahia, Brasil (2011) 

Variável RP (ajustada) IC 95% p
Trabalho paterno
Sim 1
Não 2,46 (1,34-4,49) 0,004
Peso ao nascer
≥ 2.500 g 1
< 2.500 g 2,29 (1,27-4,13) 0,006

DISCUSSÃO

A prevalência de déficit estatural verificada no presente estudo (13,6%) foi próxima à observada em outras pesquisas realizadas no país2,15,16. Por outro lado, foi superior à verificada na Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF) 2008-200917, na qual a prevalência na região Nordeste foi de 5,9%, próxima à média nacional (6,0%).

O crescimento linear na infância e adolescência depende, fundamentalmente, da interação entre o potencial genético e a influência de vários fatores ambientais. No entanto, nessa interação, os fatores ambientais assumem importância primordial na infância, especialmente nos países em desenvolvimento, nos quais as diferenças genéticas parecem ser menos importantes do que as diferenças ambientais18.

Dentre os fatores que se associaram ao déficit de estatura no presente estudo, o baixo peso ao nascer tem sido apontado como fator de risco para esse distúrbio nutricional por diversos outros autores2,19-24.

O peso ao nascer atua como forte preditor do crescimento pós-natal, especialmente considerando o fato de que o déficit linear pode iniciar-se ainda no útero2, sendo que, nos países em desenvolvimento, o retardo de crescimento intrauterino é a principal causa do baixo peso ao nascer25.

Segundo Romani e Lira26, a condição de nascimento com peso inferior a 2.500 gramas, em geral, contribui para o déficit de crescimento e desenvolvimento pós-natal, tornando as crianças mais vulneráveis à ocorrência de infecções frequentes e prolongadas, as quais deixam sequelas importantes e, em muitos casos, levam ao óbito.

Em relação aos fatores socioeconômicos, nesse estudo, ao contrário dos resultados verificados em outros trabalhos2,22,24,27, a variável renda familiar não apresentou associação significativa com o déficit estatural. O fato da renda não ter aparecido como variável associada ao desfecho estudado provavelmente ocorreu devido à homogeneidade de renda nessa população, que concentra pessoas de baixa renda, sendo a maioria com renda igual ou inferior a um salário-mínimo. Por outro lado, a falta de trabalho paterno mostrou-se significativamente associada à baixa estatura nas crianças avaliadas, o que pode ser explicado, em parte, pelo fato de que esse desemprego pode interferir diretamente na renda (caso seja a única forma de garanti-la) e, consequentemente, na disponibilidade e qualidade dos alimentos ofertados no domicílio, dos quais depende um adequado estado nutricional.

Ressalta-se que uma alimentação adequada é essencial para o crescimento e desenvolvimento infantil, especialmente nos primeiros 2 anos de vida28, época que abrange o desmame, a introdução dos alimentos complementares e a consolidação de uma alimentação variada, associada a um crescimento acelerado29. O déficit estatural é mais frequente nesse período, considerando a elevada demanda por nutrientes e a existência de limitações na qualidade e quantidade dos alimentos disponibilizados30,31.

Os resultados encontrados neste estudo mostram que os déficits nutricionais ainda persistem na população estudada, predominando o déficit estatural na região sudoeste da Bahia. Nesse contexto, o monitoramento nutricional torna-se essencial, principalmente porque o estado nutricional exerce influência decisiva sobre os riscos de morbi-mortalidade infantil32.

O Ministério da Saúde33 recomenda que até a criança completar 2 anos seja realizado um acompanhamento cuidadoso do seu crescimento e desenvolvimento pela equipe de saúde, com um olhar biopsicossocial não só para a criança mas também para o contexto de saúde e de vida de sua mãe e da família, inclusive com as articulações intersetoriais no território, necessárias para o projeto terapêutico de cada criança/família.

Considerando a associação do déficit estatural com o baixo peso ao nascer, é necessário priorizar uma agenda única de nutrição, no enfoque do curso da vida, o que operacionalmente se traduz numa apropriada assistência ao pré-natal, ao parto e à saúde dessas crianças, quebrando um ciclo vicioso que se inicia ainda no período intrauterino e se perpetua ao longo da vida5,22.

No tocante aos aspectos socioeconômicos, considerando que a distribuição da saúde e doença na sociedade está associada à posição social que define as condições de vida e trabalho dos indivíduos e grupos34, os resultados do estudo despertam a reflexão sobre a preocupação de organismos internacionais em retomar a discussão da mensuração das desigualdades sociais e econômicas nos países subdesenvolvidos e de suas repercussões sobre a saúde e nutrição na infância35.

De acordo com Monteiro et al.36, a melhoria no poder aquisitivo das famílias contribuiu consideravelmente para a redução da desnutrição em crianças menores de 5 anos, na última década. Dessa forma, é importante destacar a necessidade de intervenções que busquem diminuir a pobreza, de forma a garantir o adequado acesso aos alimentos em termos de quantidade e qualidade, essenciais para o crescimento e desenvolvimento satisfatórios, bem como para a prevenção de outros agravos que interferem no estado nutricional da criança.

Como limitação do estudo, destaca-se a não investigação da variável inclusão da família em programas de transferência de renda, tais como o Programa Bolsa Família, os quais, através da melhoria do poder aquisitivo das famílias e do acesso a uma alimentação adequada, poderiam influenciar a saúde e nutrição infantil, reduzindo a prevalência dos déficits nutricionais. Assim, são necessários mais estudos, que avaliem outros fatores que poderiam contribuir para o déficit nutricional nessa população, para que medidas efetivas sejam implantadas com objetivo de reverter esse panorama nutricional no sudoeste da Bahia.

CONCLUSÃO

No presente trabalho observou-se uma prevalência relevante de baixa estatura na população estudada, sendo observada associação significativa do desfecho com fatores obstétricos e socioeconômicos.

Os achados deste estudo reforçam a importância do monitoramento do estado nutricional nos primeiros dois anos de vida, por se tratar de um período crítico de grande vulnerabilidade e de aquisições importantes no crescimento e desenvolvimento infantil, especialmente nas crianças que nascem com baixo peso e em famílas de baixa condição socioeconômica.

REFERÊNCIAS

1 Onis M, Frongillo EA, Blössner M. Is malnutrition declining? An analysis of changes in levels of child malnutrition since 1980. Bull World Health Organ. 2000;78(10):1222-33. PMid:11100617.
2 Oliveira VA, Assis AMO, Pinheiro SMC, Barreto ML. Determinantes dos ponderal e de crescimento linear de crianças menores de dois anos. déficitsRev Saude Publica. 2006;40(5):874-82. . PMid:17301910.
3 Engle PL, Bentley M, Pelto G. The role of care in nutrition programmes: current research and a research agenda. Proc Nutr Soc. 2000;59(1):25-35. . PMid:10828171.
4 Sigulem DM, Devincenzi MU, Lessa AC. Diagnóstico do estado nutricional da criança e do adolescente. J Pediatr. 2000;76(8):275-84. .
5 Coutinho JG, Gentil PC, Toral N. A desnutrição e obesidade no Brasil: o enfrentamento com base na agenda única da nutrição. Cad Saude Publica. 2008;24(Supl 2):S332-40. . PMid:18670713.
6 Lima ALL, Silva ACF, Konno SC, Conde WL, Benicio MHDA, Monteiro CA. Causas do declínio acelerado da desnutrição infantil no Nordeste do Brasil (1986-1996-2006). Rev Saude Publica. 2010;44(1):17-27. . PMid:20140325.
7 Monte CMG. Desnutrição: um desafio secular à nutrição infantil. J Pediatr. 2000; 76(8):285-97. .
8 Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE. Bahia, Vitória da Conquista: infográficos: dados gerais do município [Internet]. Brasília: IBGE; 2010 [citado em 2012 dez 28]. Disponível em:
9 Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE. Indicadores sociais municipais: uma análise dos resultados do universo do Censo Demográfico 2010 [Internet]. Brasília: IBGE; 2010 [citado em 2012 dez 28]. Disponível em:
10 Dean AG, Dean JA, Coulombier D, Brendel KA, Smith DC, Burton AH, et al. Epi Info Version 6.04b: a word processing, database, and statistics program for public health on IBM-compatible microcomputers. Atlanta: Centers for Disease Control and Prevention; 1996.
11 Oliveira MAA, Osório MM, Raposo MCF. Concentração de hemoglobina e anemia em crianças no Estado de Pernambuco, Brasil: fatores sócio-econômicos e de consumo alimentar associados. Cad Saude Publica. 2006;22(10):2169-78. . PMid:16951889.
12 Brasil. Ministério da Saúde. Sistema de Vigilância alimentar e nutricional: orientações para coleta e análise de dados antropométricos em serviços de saúde: norma técnica do sistema de Vigilância Alimentar e Nutricional (SISVAN). Brasília; 2011.
13 World Health Organization – WHO. WHO Child Growth Standards: Length/height-for-age, weight-for-age, weight-for-length, weight-for-height and body mass index-for-age: methods and development. Geneva: WHO; 2006. (Non serial publication).
14 World Health Organization – WHO. WHO AnthroPlus for personal computers manual: software for assessing growth of the world’s children and adolescents [Internet]. Geneva: WHO; 2009 [citado em 2012 dez 28]. Disponível em: http:/www.who.int/growthref/tools/em
15 Garcia MT, Granado FS, Cardoso MA. Alimentação complementar e estado nutricional de crianças menores de dois anos atendidas no Programa Saúde da Família em Acrelândia, Acre, Amazônia Ocidental Brasileira. Cad Saude Publica. 2011;27(2):305-16. PMid:21359467.
16 Araújo JS, Barbosa JS, Santos Filha EO, Silva DG. Fatores associados ao déficit estatural e ao sobrepeso em crianças usuárias de unidades básicas de saúde em Aracaju - SE. Nutrire: Rev Soc Bras Alim Nutr. 2012;37(2):147-62. .
17 Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE. Pesquisa de orçamentos familiares 2008-2009: antropometria e estado nutricional de crianças, adolescentes e adultos no Brasil. Brasília: IBGE; 2010.
18 Santos CDL, Clemente APG, Martins PA, Sawaya AL. Influência do de estatura nos desvios nutricionais em adolescentes e pré-adolescentes. déficitRevNutr. 2009;22(2):187-94.
19 Gigante DP, Victora CG, Araújo CLP, Barros FC. Tendências no perfil nutricional das crianças nascidas em 1993 em Pelotas, Rio Grande do Sul, Brasil: análises longitudinais. Cad Saude Publica. 2003;19(Supl 1):S141-7. . PMid:12886444.
20 Vitolo MR, Gama CM, Bortolini GA, Campagnolo PDB, Drachler ML. Estado nutricional, criança, fatores de risco, antropometria, excesso de peso e insuficiência de crescimento. J Pediatr. 2008;84(3):251-7. .
21 Orlonski S, Dellagrana RA, Rech CR, Araújo EDS. Estado nutricional e fatores associados ao de estatura em crianças atendidas por uma unidade de ensino básico de tempo integral. déficitRev Bras Crescimento Desenvolvimento Hum. 2009;19(1):54-62.
22 Menezes RCE, Lira PIC, Leal VS, Oliveira JS, Santana SCS, Sequeira LAS, et al. Determinantes do estatural em menores de cinco anos no Estado de Pernambuco. déficitRev Saude Publica. 2011;45(6):1079-87. . PMid:22124738.
23 Rissin A, Figueiroa JN, Benicio MHD, Batista Filho M. Retardo estatural em menores de cinco anos: um estudo “baseline”. Cien Saude Colet. 2011;16(10):4067-76. . PMid:22031136.
24 Pedraza DF, Menezes TN. Fatores de risco do déficit de estatura em crianças pré-escolares: estudo caso-controle. Cien Saude Colet. 2014;19(5):1495-502. . PMid:24897214.
25 Kramer MS. Determinants of low birth weight: methodological assessment and meta-analysis. Bull World Health Organ. 1987;65(5):663-737. PMid:3322602.
26 Romani SAM, Lira PIC. Fatores determinantes do crescimento infantil. Rev Bras Saude Mater Infant. 2004;4(1):15-23. .
27 Leal VS, Lira PIC, Menezes RCE, Oliveira JS, Sequeira LAS, Andrade SLLS, et al. Fatores associados ao declínio do estatural em crianças e adolescentes em Pernambuco. déficitRev Saude Publica. 2012;46(2):234-41. . PMid:22331183.
28 Aggarwal A, Verma S, Faridi MMA, Dayachand. Complementary feeding reasons for inappropriateness in timing, quantity and consistency. Indian J Pediatr. 2008;75(1):49-53. . PMid:18245935.
29 Brasil. Ministério da Saúde. Guia alimentar para crianças menores de 2 anos. Brasília; 2005. 152 p.
30 Shrimpton R, Victora CG, de Onis M, Lima RC, Blossner M, Clugston G. Worldwide timing of growth faltering: implications for nutritional interventions. Pediatrics. 2001;107(5):E75.3
31 Dewey KG, Adu-Afarwuah S. Systematic review of the efficacy and effectiveness of complementary feeding interventions in developing countries. Matern Child Nutr. 2008;4(Supl 1):24-85. . PMid:18289157.
32 Monteiro CA, Benicio MHDA, Iunes R, Gouveia NC, Taddei JAAC, Cardoso MAA. ENDEF e PNSN: para onde caminha o crescimento físico da criança brasileira? Cad Saude Publica. 1993;9(Supl 1):85-95. . PMid:15448823.
33 Brasil. Ministério da Saúde. Saúde da criança: crescimento e desenvolvimento. Brasília; 2012. 272 p. (Cadernos de Atenção Básica, no. 33).
34 Comissão Nacional sobre Determinantes Sociais da Saúde – CNDSS. As causas sociais das iniquidades em saúde no Brasil: relatório final da Comissão Nacional sobre Determinantes Sociais da Saúde. Rio de Janeiro: CNDSS; 2008.
35 Gakidou EE, Murray CJL, Frenk J. Defining and measuring health inequality: an approach based on the distribution of health expectancy. Bull World Health Organ. 2000;78(1):42-54. PMid:10686732.
36 Monteiro CA, Benicio MH, Konno SC, Silva AC, Lima AL, Conde WL. Causas do declínio da desnutrição infantil no Brasil, 1996-2007. Rev Saude Publica. 2009;43(1):35-43. . PMid:19169574.