versão impressa ISSN 1413-8123versão On-line ISSN 1678-4561
Ciênc. saúde coletiva vol.23 no.2 Rio de Janeiro fev. 2018
http://dx.doi.org/10.1590/1413-81232018232.13892015
Nas últimas quatro décadas, alguns pesquisadores têm voltado sua atenção para o estudo dos fatores psicossociais do trabalho. Assim, propostas teóricas e metodológicas foram desenvolvidas com a intenção de subsidiar modelos investigativos1,2.
Dentre os modelos teóricos que avaliam o estresse no trabalho, destacam-se o Modelo Demanda-Controle (MDC)2 e o Effort-Reward Imbalance (ERI) ou Desequilíbrio Esforço-Recompensa3.
Karasek propôs um modelo cuja ênfase está na forma de organização do trabalho e que envolve duas dimensões, sendo elas a demanda e o controle. Demanda é considerada como sendo as exigências do trabalho de natureza psicológica, de tempo, de velocidade, de produtividade e conflitos por cobranças contraditórias. Já o controle se refere ao poder do trabalhador sobre o trabalho, caracterizado pela possibilidade de ter autonomia, tomar decisões e desenvolver habilidades cognitivas2,4–6.
Em 1988, Johnson e Hall incluíram no modelo outra dimensão, o apoio social, que se refere à interação entre colegas e chefias na cooperação para a realização do trabalho, podendo contribuir para a diminuição do desgaste sobre o trabalhador e dos riscos à saúde7.
Atualmente existem dois diferentes instrumentos em versão brasileira que são utilizados no país para a utilização do Modelo Demanda-Controle. São eles: o Job Content Questionnaire (JCQ) e a escala reduzida denominada Escala Sueca de Demanda-Controle-Apoio Social (DCS), desenvolvida por Theorell em 19882,4,5,8,9.
O estresse no trabalho é o resultado da junção de alta demanda psicológica, baixo controle do processo de trabalho e baixo apoio social por parte dos colegas e chefia no ambiente de trabalho2,10–12.
No setor terciário da economia, responsável pelos serviços, encontramos os trabalhadores das universidades que, por atuarem no setor público, muitas vezes são desvalorizados, sendo considerados pela população como ineficientes, desinteressados e vistos como privilegiados por terem emprego estável13,14. Entretanto, estes trabalhadores também podem estar submetidos a condições laborais de precarização, com níveis de demanda e de controle sobre o trabalho que podem levar ao estresse psicossocial no trabalho, ao sofrimento e ao adoecimento14,15.
Desta forma, ao considerar que as condições de trabalho e de vida interferem no processo saúde/doença e na saúde do trabalhador, o presente estudo teve por objetivo: analisar a demanda psicológica e o controle do trabalho dos Técnicos Administrativos em Educação (TAEs) de uma universidade pública do estado de Minas Gerais.
Pesquisa transversal de seleção completa composta por população de Técnicos Administrativos em Educação (TAEs) de uma universidade pública, de Minas Gerais, que integra uma investigação mais ampla, denominada Trabalhadores Técnicos Administrativos em Educação: Condições de Trabalho e de Vida.
Foram considerados elegíveis: TAEs efetivos da universidade cenário da pesquisa, em exercício ativo da função, do campus de Juiz de Fora. Foram considerados inelegíveis: trabalhadores ausentes por motivo de licença médica, licença para qualificação/capacitação e deslocamento para outra instituição. Dos 1.154 trabalhadores elegíveis, 833 (72,2%) aderiram ao estudo.
Utilizou-se um questionário estruturado, contendo as seguintes variáveis sociodemográficas: idade, sexo, escolaridade, situação conjugal, renda familiar em salários mínimos.
As questões referentes às características e condições de trabalho levantadas foram: número de empregos, horário de trabalho, carga horária semanal, tempo de trabalho na universidade, trabalho noturno, trabalho insalubre, penoso e perigoso. Além de questões sobre as demandas psicológicas, controle do processo de trabalho e apoio social por meio da versão brasileira da escala reduzida de estresse no trabalho (Modelo Demanda-controle apoio social). A escala do Modelo Demanda-controle resumida contém 17 questões previamente validadas para a língua portuguesa do Brasil, tendo cinco para avaliar demanda, seis para avaliar controle e seis para apoio social2,5,16.
A coleta de dados foi realizada por meio da aplicação de questionários autopreenchíveis entregues em mãos aos participantes, na própria instituição onde eles trabalhavam. Os servidores preencheram o questionário somente após a leitura e assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE).
Foram selecionadas como variáveis independentes as características ocupacionais e sociodemográficas e como variáveis dependentes as variáveis do Modelo Demanda-Controle. Os dados foram tratados no programa Statistical Package for the Social Sciences (Software SPSS®) versão 20. A análise dos dados foi realizada por meio de estatística descritiva e bivariada dos dados socioeconômicos e demográficos, características do trabalho, apoio social, estresse no trabalho e caracterização segundo as atividades desenvolvidas.
Para o cálculo do estresse psicossocial no trabalho foi utilizada a formulação dos quadrantes do Modelo Demanda-Controle (MDC), que define as seguintes categorias: trabalho de baixa exigência (baixa demanda e alto controle), grupo de referência para o estresse psicossocial no trabalho; trabalho passivo (baixa demanda e baixo controle), que pode ocasionar a redução da capacidade de resolver problemas do cotidiano do trabalho; trabalho ativo (alta demanda e alto controle), aquele que possibilita que o trabalhador desenvolva competências e habilidades em seu trabalho; alta exigência (alta demanda e baixo controle), grupo de maior exposição para o estresse no trabalho2,5,10,11.
Os escores de cada dimensão foram obtidos somando-se as pontuações das respostas e, posteriormente, dividindo-se em duas categorias a partir da mediana, conforme estudo de Alves et al.17. Para a demanda, o ponto de corte foi de 14 pontos e os trabalhadores que obtiveram resultado de 5 a 14 pontos tiveram seus trabalhos classificados em baixa demanda e os valores > 14, em alta demanda. Para o controle, o ponto de corte foi de 17 pontos; e aqueles indivíduos que obtiveram pontuação total entre 6 e 17 pontos foram classificados como tendo baixo controle no trabalho; e os que tiveram > 17 pontos, com alto controle no trabalho. De forma semelhante, o ponto de corte para o apoio social no trabalho foi de 17 pontos, classificando os indivíduos com pontuação ≤ 17 pontos, com baixo apoio social e > 17 pontos, com alto apoio social.
Considerou-se associação significativa entre as variáveis estudadas quando p-valor ≤ 0,05 de acordo com o teste estatístico qui-quadrado. O grupo de referência foi a categoria baixa exigência e o grupo de exposição foi a categoria alta exigência (estresse no trabalho) nas análises bivariadas.
O referido projeto foi aprovado no Comitê de Ética e Pesquisa da universidade, atendendo às exigências éticas e científicas fundamentais para realização de pesquisas com seres humanos. No ano de 2013, este mesmo Comitê autorizou a prorrogação no cronograma da pesquisa.
Os resultados demonstram que a população deste estudo foi composta por 51,5% de homens, sendo a média de idade dos trabalhadores de 46,1 anos (desvio-padrão ± 10,9 anos e variabilidade de 22 a 72 anos). Quanto ao grau de escolaridade, 54,4% possuía pós-graduação e, quanto ao estado civil, 63,7% dos trabalhadores eram casados ou tinham união estável. Em relação à classificação econômica, 45,8% dos trabalhadores referiram receber entre cinco a dez salários mínimos.
As características laborais possibilitaram identificar que 83,9% dos trabalhadores possuíam apenas um emprego, 82,8% trabalhavam em horário fixo e 79,1% possuíam carga horária ≤40 horas/semanais. Quanto ao tempo de serviço, 63,9% tinham mais de dez anos de vínculo empregatício. Em relação ao turno de trabalho, 82,8% dos trabalhadores não trabalhavam durante a noite e 38,3% referiram receber adicional por desenvolverem atividades caracterizadas como perigosas, penosas ou insalubres.
A caracterização dos TAEs, quanto às principais atividades desenvolvidas e os cargos ocupados foram: atividades administrativas (33,9%), apoio técnico especializado (28,2%), atividades ligadas à área da saúde (25,5%) e apoio logístico (12,2%).
No que se refere à demanda, ao controle e ao apoio social no trabalho, 73,8% dos trabalhadores apresentaram baixa demanda e 26,2%, alta demanda. No que diz respeito ao controle, 54,1% apresentaram baixo controle e 45,9%, alto controle. A maioria dos trabalhadores apresentou alto apoio social (77,4%) e baixo apoio social no trabalho (22,6%) (Tabela 1).
Tabela 1 Caracterização dos TAEs segundo as demandas psicológicas, controle e apoio social no trabalho, dicotomizados na mediana da distribuição – Juiz de Fora, 2015 (N = 833)*.
Variavéis | Frequência absoluta (n) | Frequência relativa (%) | |
---|---|---|---|
Demanda | |||
Baixa | 597 | 73,8 | |
Alta | 212 | 26,2 | |
Controle | |||
Baixo | 440 | 54,1 | |
Alto | 373 | 45,9 | |
Apoio Social | |||
Baixo | 184 | 22,6 | |
Alto | 630 | 77,4 |
*Diferenças nos n totais devem-se a perdas de informação para algumas variáveis. Dados não informados inferiores a 3%.
A Tabela 2 apresenta a distribuição dos TAEs nos quadrantes do Modelo Demanda-controle. A categoria dos quadrantes que incluiu o maior número de trabalhadores foi o trabalho passivo que combina baixa demanda e baixo controle (39,7%), seguido pelo trabalho de baixa exigência caracterizado pela baixa demanda e alto controle (34,1%). O trabalho de alta exigência (alta demanda e baixo controle) incluiu 14,4% dos trabalhadores da população estudada. Já o grupo com menor quantitativo de trabalhadores foi o trabalho ativo, caracterizado pela alta demanda psicológica e alto controle sobre o trabalho, com 11,8% dos trabalhadores.
Tabela 2 Caracterização dos TAEs segundo os quadrantes do MDC – Juiz de Fora, 2015 (N = 804)*.
Variáveis | Frequência absoluta (n) | Frequência relativa (%) | |
---|---|---|---|
Modelo Demanda-Controle | |||
Trabalho passivo (↓D ↓C) | 319 | 39,7 | |
Baixa exigência (↓D ↑C) | 274 | 34,1 | |
Alta exigência (↑D ↓C) | 116 | 14,4 | |
Trabalho ativo (↑D ↑C) | 95 | 11,8 |
*Diferenças no tamanho da amostra se devem às perdas de informações.
As variáveis socioeconômicas e demográficas e os quadrantes do MDC que mantiveram associação com significância foram escolaridade (p = 0,001) e a renda mensal (p < 0,001) (Tabela 3). O presente estudo não apresentou associação com significância estatística entre as variáveis sexo, idade e estado civil e os quadrantes do MDC.
Tabela 3 Comparação entre a variáveis sociodemográficas e ocupacionais e os quadrantes do MDC. TAEs – Juiz de Fora, 2015 (N = 833).
Baixa exigência (↓D ↑C) | Trabalho ativo (↑D ↑C) | Trabalho passivo (↓D ↓C) | Alta exigência (↑D ↓C) | p valor* | |
---|---|---|---|---|---|
Escolaridade | 44 | 12 | 83 | 33 | 0,001 |
(até Ensino Médio completo) | 25,6% | 7,0% | 48,3% | 19,2% | |
Renda de 1 a 5 salários | 63 | 22 | 113 | 50 | < 0,001 |
mínimos | 25,4% | 8,9% | 45,6% | 20,2% | |
Um emprego | 231 | 66 | 275 | 96 | 0,001 |
34,6% | 9,9% | 41,2% | 14,4% | ||
Trabalho diurno | 240 | 66 | 271 | 81 | |
36,5% | 10,0% | 41,2% | 12,3% | < 0,001 | |
Turno de trabalho fixo | 227 | 73 | 274 | 83 | |
34,6% | 11,1% | 41,7% | 12,6% | 0,012 | |
Carga horária ≤ 40 horas | 218 | 55 | 270 | 82 | |
34,9% | 8,8% | 43,2% | 13,1% | < 0,001 | |
Tempo de serviço: 1 a 5 anos | 84 | 13 | 74 | 17 | |
44,7% | 6,9% | 39,4% | 9,0% | 0,02 |
*teste qui-quadrado.
As variáveis relacionadas às características do trabalho e os quadrantes do MDC que mantiveram associação com significância foram: número de empregos (p = 0,001), horário de trabalho (p = 0,012), carga horária semanal (p < 0,001), trabalho noturno (p < 0,001) e tempo de serviço (p = 0,002) (Tabela 3). A variável adicional por trabalhar com atividades insalubres, perigosas e penosas e os quadrantes do MDC não obtiveram associação com significância (p = 0,27).
Trabalhadores com escolaridade até Ensino Médio completo, com baixos salários, com apenas um emprego, trabalho diurno, com turno de trabalho fixo, carga horária ≤40 horas/semanais concentraram-se no trabalho passivo. A variável tempo de serviço na universidade para aqueles que as desempenhavam seu trabalho há menos tempo (1 a 5 anos) concentraram-se na categoria de baixa exigência.
A Tabela 4 apresenta a distribuição da população de estudo em função dos quadrantes do MDC e do apoio social. A variável apoio social obteve associação com significância com os quadrantes do MDC (p < 0,001).
Tabela 4 Comparação entre a variável apoio social e os quadrantes do MDC. TAEs– Juiz de Fora, 2015 (N = 794)**.
Categorias | Baixo Apoio Social | Alto apoio social | p valor* |
---|---|---|---|
Baixa exigência(↓D ↑C) | 38 | 235 | < 0,001 |
21,1% | 38,3% | ||
Trabalho ativo (↑D ↑C) | 23 | 71 | |
12,8% | 11,6% | ||
Trabalho passivo (↓D ↓C) | 57 | 259 | |
31,7% | 42,2% | ||
Alta exigência (↑D ↓C) | 62 | 49 | |
34,4% | 8,0% | ||
Total | 180 (100%) | 614(100%) |
*teste qui-quadrado.
**diferenças no tamanho da amostra se devem às perdas de informação.
Nota-se que a categoria dos quadrantes que incluiu o maior número de trabalhadores foi o trabalho passivo associado ao alto apoio social (n = 259; 42,2%). No entanto, no que se refere ao baixo apoio social, a categoria dos quadrantes que incluiu o maior número de trabalhadores foi o trabalho de alta exigência (n = 62; 34,4%), que combina alta demanda e baixo controle, sendo considerado o grupo de exposição. Já o grupo com menor quantitativo de trabalhadores na categoria de baixo apoio social foi o trabalho ativo (alta demanda e alto controle sobre o trabalho), com n = 23 (12,8%).
Os dados evidenciaram que, na população estudada, houve uma distribuição proporcional de homens e mulheres entre os trabalhadores e, embora a diferença tenha sido pequena entre os gêneros (51,5% e 48,5%, respectivamente), predominaram os homens. Entretanto, há que se dar ênfase ao panorama do trabalho feminino, pois além das atividades remuneradas, as mulheres ainda têm que dedicar parte de seu tempo às atividades domésticas, ao cuidado com os filhos e outros familiares, o que pode ter como consequência uma sobrecarga de atividades para estas trabalhadoras18–20.
Quanto ao grau de escolaridade, 54,4% dos trabalhadores tinham pós-graduação, o que pode ser explicado pelo fato deles atuarem numa universidade pública, terem estabilidade no emprego, concorrerem ao percentual de vagas gratuitas destinadas aos servidores para os cursos de pósgraduação que são ofertados nesta universidade, o que constitui num estímulo à sua inserção em processo de capacitação e ao desenvolvimento de habilidades adicionais.
Estudo realizado com técnicos administrativos de uma Instituição de Ensino Superior estadual revelou que o aprimoramento do nível de instrução do trabalhador é um aspecto positivo para a qualidade de vida no trabalho. No entanto, quando o nível de formação do trabalhador é superior ao exigido para seu cargo, bem como sua remuneração não é compatível com seu nível de formação, é possível que isso cause desmotivação, queda de produtividade, conflitos com a chefia, dentre outros aspectos21.
A categoria dos quadrantes do Modelo Demanda-Controle, que incluiu o maior número de pessoas, foi o trabalho passivo (39,7%), que combinou baixa demanda e baixo controle, sendo esta considerada a segunda exposição mais problemática para a saúde, pois não possibilita que o trabalhador se desenvolva, propiciando a ocorrência de uma atrofia gradual de aprendizagem de habilidades12,22.
Há evidências sobre a associação entre o estresse no trabalho com vários desfechos utilizando o MDC, tais como hipertensão arterial17,23, insônia24, enxaqueca25, doença coronária26, obesidade27, transtornos mentais28, dentre outros.
Em pesquisa realizada no Estudo Pró-Saúde, que associou o MDC com a hipertensão arterial em uma população feminina, houve maior prevalência de hipertensão arterial entre o grupo com trabalho passivo (28,3%), demonstrando o impacto na saúde destes trabalhadores17.
Já o Estudo Longitudinal de Saúde do Adulto (ELSA Brasil), realizado com servidores públicos de cinco universidades, observou que indivíduos com trabalho passivo, ativo e de alta exigência foram mais propensos a ter um diagnóstico de enxaqueca, quando comparados com indivíduos com baixa exigência no trabalho25.
Resultados semelhantes ao deste estudo foram encontrados entre trabalhadores da Finlândia, no qual também houve predomínio do trabalho passivo, sendo que este esteve presente em 34% dos homens e 33% das mulheres29.
No entanto, resultados diferentes foram encontrados com servidores públicos do estudo Whitehall II de Londres, Estudo de Saúde de Helsinque e o Estudo com servidores públicos japoneses, que associou o estresse no trabalho com comportamentos adversos de saúde e obesidade. Em Londres, homens com trabalho passivo estiveram mais propensos a ser fisicamente inativos, o mesmo foi encontrado com mulheres em Helsinque. Além disso, mulheres londrinas expostas ao trabalho passivo tiveram menos tendência a consumir bebidas alcoólicas e ser tabagistas30.
Além disso, o baixo controle sobre o processo de trabalho, juntamente com a baixa demanda, ou seja, a categoria de trabalho passivo pode se comportar como fator desestimulador, contribuindo para o aumento da insatisfação no trabalho31.
A falta de situações desafiadoras relevantes para o trabalhador pode causar a queda na produção do indivíduo e a diminuição da capacidade de produzir soluções para as atividades e os problemas enfrentados no cotidiano do trabalho2,32.
A redução do controle sobre o trabalho e o aumento da influência negativa das demandas do trabalho na vida particular, foram os mais importantes fatores associados à redução da capacidade para o trabalho33.
Ao associar as variáveis sociodemográficas e econômicas com as variáveis do MDC, obteve-se associações significativas com a escolaridade e a renda mensal. Sendo que, na categoria escolaridade (até Ensino Médio completo) e a renda em salários mínimos “de um a cinco salários”, “de cinco a dez salários”, concentraram-se na categoria de trabalho passivo. Já na faixa de renda “mais de dez salários”, predominou o trabalho de baixa exigência. Portanto, trabalhadores com escolaridade até Ensino Médio completo, e com estratos de renda inferiores, possuem menor controle sobre o processo de trabalho.
Estudos com trabalhadores de enfermagem corroboraram com a presente investigação, uma vez que, entre os sujeitos desta pesquisa, não graduados e os de renda per capita inferiores identificou-se maior frequência de trabalhadores nas categorias trabalho passivo e alta exigência. Isto equivale a dizer que ambas as categorias envolvem trabalho com baixo controle. No referido estudo, trabalhadores com baixo controle apresentaram 1,67 mais chances de desenvolver distúrbios psiquiátricos menores quando comparados aos trabalhadores com alto controle, demonstrando como o trabalho que envolve baixo controle é nocivo para a saúde34.
Por outro lado, apesar de os trabalhadores desta pesquisa apresentarem predominantemente trabalho passivo, eles têm alto apoio social (77,4%) e apenas 22,6% deles tiveram baixo apoio social, ao se relacionarem com colaboradores e chefes. O baixo apoio social pode impactar negativamente sobre a saúde do trabalhador5,35.
Numa investigação com trabalhadores de hospitais (servidores públicos) utilizando o MDC, o apoio social e do burnout para identificar a duração do absenteísmo-doença segundo Licenças para Tratamento de Saúde (LTS), houve aumento de 2,04 a expectativa de dias de LTS diante do baixo apoio do colega, o que pressupõe que independentemente de se estar relacionado a um trabalho passivo ou não, o baixo apoio social pode contribuir para o adoecimento36.
O estresse ocupacional repetido e o baixo apoio social do trabalho entre servidores públicos britânicos do estudo Whitehall II, aumentou o risco de transtorno depressivo maior (TDM), o que demonstra a relevância do apoio social no trabalho28.
Em pesquisa realizada sobre os custos anuais com tratamento de saúde e licenças médicas relacionados ao estresse no trabalho na França, concluiu-se que o impacto econômico das doenças causadas pelo estresse no trabalho fornece subsídios para a formulação de políticas públicas com ênfase em ações preventivas37.
Dentre as limitações deste estudo, podemos citar que o fato de a população pesquisada possuir um emprego público, estar inserida na universidade, que se caracteriza por ser um serviço do setor terciário e ter estabilidade na inserção no mercado de trabalho, não permite que os dados sejam estendidos para a população geral. Embora permita comparações com populações com características semelhantes.
O tipo de desenho utilizado também é uma limitação do estudo, uma vez que os estudos transversais não permitem estabelecer uma relação temporal entre os eventos, ou seja, não se pode dar às relações entre exposição-desfecho caráter de causalidade38.
Outra limitação inerente ao presente estudo refere-se às formas de avaliar a exposição ao estresse encontradas na literatura, que são diversas. Em outras palavras, existem múltiplas formas de se categorizar os escores de demanda psicológica e controle. Além da formulação dos quadrantes é comum o uso das formas contínuas das dimensões do modelo39, da razão entre demanda/controle, além das formulações logarítmica da subtração40. É possível que os diferentes métodos de categorização encontrados na literatura tenham dificultado as comparações entre os estudos38,41.
Ao analisar a demanda psicológica e o controle do trabalho dos TAEs de uma universidade pública do estado de Minas Gerais, foi possível identificar que a categoria de trabalho passivo predominou entre a população de estudo.
Constituem em pontos positivos desta investigação: a heterogeneidade sociodemográfica e a estabilidade no emprego, que contribuíram, respectivamente, com a variabilidade dos determinantes sociais de saúde desta população e com a possibilidade de monitoramento do trabalhador em longo prazo e à variedade de ocupações desempenhadas pelos TAEs, uma vez que é adequado para o modelo teórico utilizado nesta investigação (Modelo Demanda-Controle Apoio Social).
Como contribuições para a saúde destes trabalhadores, sugere-se intervenções no sentido de que estes trabalhadores se tornem agentes de mudanças nos processos de trabalho por eles realizados, de forma que eles possam ser responsáveis pelas decisões tomadas no cotidiano de seu trabalho. Sugere-se também uma readequação dos postos de trabalho, considerando os resultados encontrados nesta pesquisa, segundo os quatro quadrantes do MDC, para que os trabalhadores possam desempenhar atividades que sejam adequadas aos seus perfis.
Para que se possa pensar em políticas públicas de trabalho nas universidades, além de estudos epidemiológicos, como este, é importante a realização de pesquisas com abordagens qualitativas para verificar a percepção dos trabalhadores sobre seu processo de trabalho, para responder às questões que envolvem a complexidade do ser humano, verticalizando em aspectos subjetivos. Além disso, é necessário envolver na comunicação dos resultados as instâncias superiores da universidade e os sindicatos das categorias profissionais de modo a sensibilizar para as mudanças necessárias.
Neste sentido, ressalta-se que este estudo é a primeira etapa de uma pesquisa mais ampla que tem a intenção de subsidiar um estudo de coorte prospectiva, podendo contribuir para sanar algumas das dificuldades acima apresentadas e possibilitar outras análises e discussões a respeito da saúde dos TAEs.