On-line version ISSN 1982-0194
Acta paul. enferm. vol.27 no.1 São Paulo Jan./Feb. 2014
http://dx.doi.org/10.1590/1982-0194201400010
O câncer no pênis é uma neoplasia que afeta cerca de 100.000 homens em todo mundo.(1) A sua incidência varia em diferentes comunidades, de acordo com a distribuição geográfica, com os padrões de higiene, religiosos e práticas culturais de várias partes do mundo.( 2 , 3 ) É uma doença que acomete pequena parcela da população, mas geralmente é agressiva, principalmente pelo impacto psicológico que exerce sobre os pacientes.( 4 )
É um tipo raro de câncer nos países ocidentais, sendo mais comum em algumas regiões em desenvolvimento.( 5 ) No Brasil, esse tipo de doença representa 2% de todos os casos de câncer no homem, e responde por mais de 1.000 cirurgias para retirada total do membro.( 2 , 3 ) A região Nordeste do país concentra a maioria dos novos casos dessa neoplasia, com taxas que chegam a 5,7%, superando as taxas de câncer na próstata e na bexiga. As condições socioeconômicas e culturais desta região favorecem o desenvolvimento desse tipo de neoplasia.( 6 - 8 )
Alguns fatores de risco influenciam o desenvolvimento dessa doença, como: não realização da cirurgia de fimose na infância; a prática sexual com diferentes parceiros sem uso de preservativo; higiene íntima precária; infecção por Papilomavírus Humano; e outras doenças sexualmente transmissíveis.( 9 - 12 )
O principal fator de prognóstico desfavorável para pacientes com câncer no pênis é a presença de metástases nos linfonodos regionais.(13) A alta mortalidade por essa doença se dá em razão da demora pela procura do tratamento, que ocorre em média um ano depois do surgimento dos primeiros sintomas.( 9 ) Geralmente, os pacientes procuram o serviço de saúde com a doença em estágio avançado, dificultando assim a possibilidade de tratamento eficaz, evoluindo em média de dois a três anos para o óbito.( 9 )
O autoexame é o método mais eficaz e econômico para a prevenção do câncer no pênis e outras doenças do trato urogenital masculino, sendo necessário um alerta para o desenvolvimento de atividades no nível primário de saúde que chamem a atenção dos homens sobre a importância de consultar um médico periodicamente; manter bons hábitos de higiene; e dar ênfase à prática da circuncisão, ainda na infância, que também é um meio simples de prevenção da doença.( 2 ) Deve-se enfocar na educação à saúde para a detecção precoce da doença e controle efetivo dessa enfermidade.( 3 )
O Ministério da Saude no Brasil instituiu a Política Nacional de Atenção Integral à Saúde do Homem com os objetivos de fortalecer a assistência básica no cuidado com o homem, facilitando o acesso e a qualidade da atenção necessária ao enfrentamento dos fatores de risco das doenças e dos agravos à saúde; e aperfeiçoar os sistemas de informação de maneira a possibilitar o monitoramento adequado que permita tomada de decisão.( 14 )
O objetivo deste trabalho foi descrever os aspectos demográficos e epidemiológicos da mortalidade por câncer no pênis no Estado de Pernambuco, região nordeste do Brasil, no período de 2000 a 2009.
Estudo transversal em uma população de todos os óbitos masculinos de residentes no Estado de Pernambuco que tiveram como causa básica o câncer no pênis ocorridos no período de 2000 a 2009.
Com base nas informações contidas no sistema informatizado sobre mortalidade, após a obtenção de autorização para acesso aos dados, foram analisadas as seguintes variáveis: faixa etária, cor, estado civil, ocupação e região de residência. Para a análise dos dados, foi utilizada estatística descritiva com distribuição de frequência, por meio do programa EpiInfo versão 7, no qual foi calculado o coeficiente de mortalidade (número de óbitos por câncer no pênis / população masculina x 100.000).
O desenvolvimento do estudo atendeu as normas nacionais e internacionais de ética em pesquisa envolvendo seres humanos.
Foram registrados durante o período da pesquisa 183 óbitos que tiveram como causa básica o câncer no pênis. Em relação ao Coeficiente de Mortalidade por tal neoplasia observou-se um acréscimo de 19,04% no período pesquisado, passando de 0,34 por 100 mil homens (2000) para 0,42 (2009) (Tabela 1).
Tabela 1 População masculina, número de óbitos e coeficiente de mortalidade de câncer no pênis
Ano | População masculina | Número de óbitos | CM |
---|---|---|---|
2000 | 3826657 | 13 | 0,34 |
2001 | 3869994 | 14 | 0,36 |
2002 | 3906948 | 13 | 0,33 |
2003 | 3944176 | 18 | 0,46 |
2004 | 3981380 | 19 | 0,48 |
2005 | 4065743 | 18 | 0,44 |
2006 | 4108668 | 25 | 0,61 |
2007 | 4159898 | 20 | 0,48 |
2008 | 4229628 | 25 | 0,59 |
2009 | 4266933 | 18 | 0,42 |
Média | - | - | 0,45 |
Total | - | 183 | - |
CM - coeficiente de mortalidade
Os dados sociodemográficos demonstraram um maior acometimento nos homens na faixa etária de 60 anos ou mais (n=93, 50,8%), da cor parda (n=99, 54,1%), casados (n=87, 47,6%), aposentados (n=44, 24%) e residentes na região metropolitana da cidade da cidade de Recife (n=82, 44,8%) (Tabela 2).
Tabela 2 Óbitos por câncer no pênis
Variáveis sociodemográficas | n(%) |
---|---|
Faixa etária | |
< 19 | 1(0,6) |
20-39 | 20(10,9) |
40-59 | 69(37,7) |
> 60 | 93(50,8) |
Raça/cor | |
Branca | 66(36,1) |
Parda | 99(54,1) |
Preta | 9(4,9) |
Amarela | 1(0,6) |
Não informado | 8(4,3) |
Estado civil | |
Solteiro | 62(33,9) |
Casado | 87(47,6) |
Viúvo | 20(10,9) |
Outros | 3(1,6) |
Não informado | 11(6,0) |
Ocupação | |
Aposentado | 44(24,0) |
Agricultor | 25(13,7) |
Comerciante | 11(6,0) |
Outros | 75(44,8) |
Não informado | 21(11,5) |
Região de residência | |
Região Metropolitana | 82(44,8) |
Outros municípios do estado | 101(55,2) |
O coeficiente de mortalidade por câncer no pênis no Estado de Pernambuco apresentou um significativo aumento no período estudado, que pode estar relacionado às condições socioeconômicas e dificuldade de acesso aos serviços de saúde.( 8 )
A análise das tendências de mortalidade de cânceres relacionados com papiloma vírus humano no Brasil, por sexo, no período 1996-2010 indicou uma tendência crescente para o câncer no pênis. Acredita-se que o aumento do número de mortes ocorre principalmente devido as alterações da população (tamanho e estrutura de idade). Em termos de risco, está previsto o aumento para o câncer peniano e, consequentemente, aumento na taxa de mortalidade.( 15 )
Destaca-se que, apenas no ano de 2009, houve uma iniciativa do Ministério da Saúde brasileiro visando a ampliação do acesso da população masculina aos serviços de saúde.( 14 )
Em concordância com os resultados deste estudo, outros trabalhos indicam maior incidência da doença entre a sexta e sétima décadas da vida.(7,9,10) O motivo pelo qual a mortalidade ocorre no mesmo período em que incide a doença, se dá pela rápida evolução do tumor, após o diagnóstico, já que este acontece em tempo tardio devido à demora em procurar um serviço de saúde.( 9 )
Um estudo de base populacional que analisou tendências de sobrevivência de pacientes com câncer no pênis na Europa e nos Estados Unidos da América, nos períodos de 1990-1995 e 2002-2007, demonstrou que não houve melhora na sobrevivência.( 16 )
A elevada mortalidade por essa enfermidade se deve a negligência e medo de procurar o serviço de saúde assim que percebe algo de errado no pênis e, também, à grande expansão locorregional do tumor.(9,13) O diagnóstico precoce é essencial para um tratamento eficaz. As modalidades de tratamento variam conforme a apresentação clínica e podem incluir quimioterapia tópica, excisão cirúrgica, cirurgia micrográfica de Mohs, excisão a laser ou ablação, quimioterapia sistêmica e radioterapia.( 17 )
O número de óbitos por câncer no pênis foi maior em homens da cor parda, embora a raça e a cor da pele não sejam fator determinante para esse tipo de tumor, já que o desenvolvimento dessa enfermidade está diretamente ligado a higiene íntima precária e a fimose.(6) Na Índia, um estudo que descreveu o perfil clinico-epidemiológico de pacientes com câncer no pênis, identificou que cerca de um quarto apresentaram com fimose, não eram circuncidados, tinham idade avançada e história de tabagismo.( 18 )
Neste estudo percebeu-se que a maioria dos óbitos ocorreu em homens casados, indicando que o casamento não é um obstáculo para a multiplicidade de parceiros.( 10 )
Foi constatado ainda o predomínio de óbitos por câncer no pênis em homens aposentados, seguidos pelos trabalhadores da agricultura. Tal achado concorda parcialmente com o que foi encontrado por outros autores, que verificaram a predominância dessa neoplasia em agricultores, classe menos favorecida.( 7 )
Os aspectos demográficos e epidemiológicos da mortalidade por câncer no pênis indicaram que a maior parte dos óbitos ocorreu em homens com idade acima de 60 anos, de cor parda, casados, aposentados e residentes na região metropolitana do Recife e que houve um aumento no coeficiente de mortalidade por câncer no pênis.