versão On-line ISSN 2317-1782
CoDAS vol.28 no.5 São Paulo set./out. 2016 Epub 26-Set-2016
http://dx.doi.org/10.1590/2317-1782/20162015274
Pesquisadores nacionais e internacionais relatam que o desempenho de diferentes habilidades são fatores predisponentes para a aquisição e o desenvolvimento da leitura e escrita, entre as habilidades mais citadas estão as habilidades do processamento fonológico, consciência fonológica, acesso rápido ao léxico mental e memória de trabalho fonológica(1,2).
Pode-se dizer que a linguagem oral, a consciência fonológica e o conhecimento de letras são os três domínios-chave do início da alfabetização que devem ser desenvolvidos para aperfeiçoar o ensino de crianças que estão em situação de risco para problemas de leitura, durante a pré-escola(3).
Foram definidos três perfis de risco para dificuldade de leitura(4). O primeiro perfil consiste em crianças com atraso no desenvolvimento de linguagem, transtorno fonológico ou com distúrbio específico de linguagem (expressivo e/ou receptivo), com dificuldade em uma ou mais habilidades do processamento fonológico, apresentam inteligência não verbal com escores abaixo, adequado ou acima da média e ausência de incapacidades primárias auditivas, visuais e motoras. O segundo perfil consiste em crianças que apresentam dificuldades típicas do primeiro perfil, porém o seu desenvolvimento da linguagem parece ser adequado até a criança enfrentar a exigência de segmentação de palavras em unidades menores, e, dessa forma, possuem dificuldades no início do processo de alfabetização, em especial, dificuldades quanto ao conhecimento de nome de letras e quanto à associação grafema-fonema. Geralmente estas crianças apresentam histórico de transtorno fonológico e histórico familial para dificuldades de leitura, possuem inteligência não verbal com escores abaixo, adequado ou acima da média e ausência de incapacidades primárias auditivas, visuais e motoras. Por fim, o terceiro perfil refere-se às crianças com uma experiência inadequada na pré-escola que resultam em dificuldades globais de habilidades pré-acadêmicas, com ou sem histórico de transtorno fonológico e com histórico de inadequadas exposições à linguagem oral e à alfabetização. Essas crianças, também, possuem inteligência não verbal com escores abaixo, adequado ou acima da média e ausência de incapacidades primárias auditivas, visuais e motoras(4).
Dessa forma, qualquer criança com dificuldade na linguagem oral, na consciência fonológica ou nas construções grafofonêmicas é considerada como de risco para uma futura dificuldade na leitura ou na escrita. Uma vez identificada essas dificuldades, deve ser realizada uma intervenção precoce de modo a minimizar ou eliminar o impacto que essas dificuldades podem causar na vida escolar(4).
A identificação de crianças que estão em risco para dificuldades de leitura pode ser realizada antes do início da aprendizagem da leitura e escrita, sendo que alguns sinais podem ser observados na pré-escola, como: o atraso de linguagem; alterações fonológicas; baixo léxico; dificuldades em aprender o alfabeto, números, cores, dias da semana e formas; dificuldade em aprender a escrever o próprio nome; dificuldades em recitar versos infantis ou dificuldades com a rima; dificuldades de segmentação de palavras; dificuldades em ler palavras isoladas; dificuldade para aprender a relação grafema-fonema(5).
A identificação precoce de crianças com risco para dificuldades de leitura só é possível por meio da sua identificação no início do processo de alfabetização(6).
O ensino de estratégias metafonológicas tem sido o alvo das intervenções propostas para crianças com transtornos ou dificuldades de aprendizagem. As intervenções têm como objetivo o desenvolvimento da atenção e percepção dos sons da fala associados à conversão grafema-fonema(7,8).
Foram descritos na literatura nacional e internacional programas de intervenção, como a remediação fonológica, que envolvem o trabalho com as habilidades de: identificação do som e da letra; identificação de palavras dentro de uma frase; identificação e manipulação de sílabas na palavra; síntese fonêmica; rima; identificação e discriminação de fonemas; segmentação de fonema; subtração de fonemas; substituição de fonemas; e transposição de fonemas, em geral os programas possuem de 18 a 24 sessões(7-12).
A partir de uma revisão bibliográfica sistemática, autores(13) concluíram que, na literatura internacional, nos últimos anos, houve um considerável número de publicações com o uso de programas de intervenção em crianças com risco para dislexia, no entanto, existe um número extremamente menor de publicações brasileiras, evidenciando, assim, a importância do desenvolvimento de trabalhos que envolvam programas de intervenção com enfoque em escolares com risco para a dislexia.
Portanto, é fundamental que as crianças com risco para dificuldades de leitura sejam identificadas precocemente, viabilizando a intervenção precoce que vise minimizar as futuras dificuldades que estas poderão enfrentar durante a vida escolar.
Assim, o objetivo deste estudo foi comparar a aplicabilidade de um programa de intervenção para crianças com risco para dificuldade de leitura.
Esta pesquisa foi desenvolvida na Clínica Escola da instituição de origem e as análises realizadas obedecem aos critérios do Comitê de Ética da instituição, sendo este estudo só iniciado após a aprovação do referido Comitê sob o parecer de número 489.491/2013.
Participaram do estudo 20 crianças identificadas como de risco para dificuldade de leitura, de ambos os gêneros, de 6 a 7 anos e 11 meses, do primeiro e segundo ano do ensino fundamental, distribuídos em dois grupos:
-. Grupo Experimental (GE): formado por 10 crianças com risco para dificuldade de leitura, sendo que duas crianças frequentavam o primeiro ano do ensino fundamental e oito o segundo ano. Este grupo foi submetido à intervenção.
-. Grupo Controle (GC): formado por 10 crianças com risco para dificuldade de leitura, sendo que duas crianças frequentavam o primeiro ano do ensino fundamental e oito o segundo ano. Este grupo inicialmente não foi submetido à intervenção.
Como critério de inclusão para este estudo, as crianças deveriam estar matriculadas no primeiro ou segundo ano do ensino fundamental, ter histórico de atraso ou distúrbio fonológico, ou seja, pertencer ao primeiro e segundo perfil de crianças de risco apresentado na introdução, e ter a anuência dos pais ou responsáveis por meio da assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.
O critério de exclusão para a participação na pesquisa foi a presença de acuidade visual, auditiva e desempenho cognitivo abaixo dos padrões de normalidade, crianças com outras patologias associadas como síndromes genéticas, neurológicas, neuropsiquiátricas ou deficiência mental e crianças que foram submetidas à intervenção fonoaudiológica anteriormente.
As crianças foram selecionadas a partir da lista de espera de atendimento da Clínica de Fonoaudiologia da instituição de origem; estas crianças já haviam sido submetidas ao diagnóstico multidisciplinar da clínica, sendo diagnosticadas com atraso de linguagem ou distúrbio fonológico.
Para seleção das crianças, a pesquisadora aplicou um questionário anamnésico(14) nos pais e/ou responsáveis, e as crianças foram submetidas a uma avaliação pré e pós-testagem composta pelos seguintes instrumentos:
-. Prova de Consciência Fonológica – Perfil das Habilidades Fonológicas (PHF)(15): Composto por itens que identificam e compõem as habilidades fonológicas de análise, segmentação, subtração, substituição, rimas, rima sequencial, reversão silábica e imagem articulatória.
-. Prova de Memória de Trabalho Fonológica - Não Palavras e Dígitos(16): Composto por dois subtestes, o primeiro subteste consiste na repetição de 40 pseudopalavras que variavam conforme o número de sílabas, de duas a cinco sílabas. E o segundo subteste consiste na repetição de dígitos na ordem direta e inversa.
-. Subteste de Escrita do Alfabeto em Sequência do Teste de Desempenho Cognitivo-Linguístico – versão coletiva(17): Verifica se a criança é capaz de codificar as letras que compõem o alfabeto, sendo que as letras omitidas ou fora da sequência são consideradas como erro, e um ponto foi atribuído para cada letra escrita na ordem correta. As crianças foram solicitadas a escrever em uma folha sulfite A4 o alfabeto em sequência.
-. Subteste de Escrita Sob Ditado do Teste de Desempenho Cognitivo-Linguístico – versão coletiva(17): Composto por 30 palavras e 10 pseudopalavras, seu objetivo é de verificar a codificação de palavras de alta frequência e de pseudopalavras, além de verificar se a criança possui o conhecimento da escrita de palavras de estrutura silábica simples e complexa.
-. Subtestes de Leitura de Palavras e de Leitura de Pseudopalavras do Teste de Desempenho Cognitivo-Linguístico – versão individual(17): Dois subtestes compostos por 70 palavras e 10 pseudopalavras, seu objetivo é verificar a decodificação de palavras de alta frequência e de pseudopalavras (uso da rota lexical), além de verificar se a criança possui o conhecimento de diferentes tipos de sílabas (CV, VC, CVC, CVV e CCV).
-. Nomeação e produção dos sons das letras: As 26 letras do alfabeto foram apresentadas na forma maiúscula e minúscula, sendo solicitada a nomeação e a produção dos sons das letras. Este foi o único instrumento em que foi utilizado o número de erros realizados durante a testagem, assim, quanto menor o número de erros, melhor o desempenho da criança.
Depois da realização da pré-testagem, as crianças com risco para dificuldade de leitura foram submetidas ao Programa de Intervenção de Decodificação Fonológica elaborado pelas pesquisadoras com base em dois estudos internacionais(18,19). O programa foi desenvolvido para ser realizado em duas fases, fase I e fase II.
A fase I é composta de 12 sessões em grupo de duas a três crianças com duração de 50 minutos. Nesta fase, em todas as sessões, as crianças foram submetidas à sondagem da nomeação das 26 letras do alfabeto nas formas maiúscula e minúscula, sendo sondada, também, a produção dos sons das letras.
Em seguida, a terapeuta realizava o treinamento do grupo quanto à relação grafema-fonema. Para isto, cada letra do alfabeto era apresentada impressa em cartões na fonte Cambria (título), tamanho 200 e cor preta. Todas as letras eram apresentadas aleatoriamente nas suas duas formas, maiúsculas e minúsculas, sendo que a terapeuta apresentava para as crianças o nome e sons de cada letra, e, quando a letra possuía mais de um som, todos os sons eram apresentados juntamente com exemplos em palavras reais.
Depois do treinamento da relação grafema-fonema, as letras eram distribuídas entre as crianças e, neste momento, a terapeuta solicitava às crianças a produção do nome, som das letras e uma palavra que iniciasse com a letra. Ainda, para fixação da relação grafema-fonema, foram propostos jogos que tinham o objetivo do treinamento da relação grafema-fonema. Para isto, em todos os jogos, as crianças eram solicitadas a dizer o nome, o som e uma palavra que iniciasse com as letras do alfabeto. Assim, nas 12 sessões da fase I, foram utilizados jogos como jogo da memória, jogo de trilhas, jogo de pesca, jogo de adivinhação e bingo de letras.
Em todas as sessões da fase I, um dos 12 primeiros livros da Coleção Estrelinha(20) era lido para o grupo. Durante a leitura, a terapeuta apontava cada palavra lida para as crianças e, a cada página lida, realizava perguntas do tipo “quem”, “quando”, “onde” e “por que” para as crianças, com o objetivo de auxiliar a compreensão. Depois da leitura, cada criança era solicitada a realizar a segmentação frasal de três frases retiradas do livro lido e realizar a segmentação silábica de três palavras, sendo uma monossílaba, uma dissílaba e uma trissílaba; sendo as palavras, também, retiradas do livro lido.
Para prosseguir para a fase II, as crianças precisavam ter realizado as 12 sessões da fase I e terem alcançado 80% de acerto na sondagem da nomeação das letras maiúsculas, minúsculas e produção dos sons das letras.
A fase II é composta de 12 sessões individuais com duração de 50 minutos. Nesta fase, as crianças eram submetidas à sondagem da nomeação das letras maiúsculas, minúsculas e produção dos sons das letras e revisão da relação grafema-fonema. Ainda, as crianças eram sondadas quanto à leitura de palavras e pseudopalavras monossilábicas. Para esta sondagem, foram utilizadas as seguintes palavras e pseudopalavras, apresentadas em cartões com letras minúsculas, na fonte Cambria (título), tamanho 200 e cor preta:
Bar; cor; sol; bom; mar; vem; nós; fez; mel; sim; pá; se; na; no; lá; pé; só; os; ar; um; as; em; ir; zal; til; pel; ras; pos; liz; him; xer; lor; tar; pu; ji; ca; ga; ra; fo; hi; or; am; al; er; is; ur; om.
Depois das sondagens, era realizado, em todas as 12 sessões da fase II, o treinamento quanto à segmentação e transposição fonêmica ligada às habilidades de leitura de pseudopalavras do tipo consoante-vogal-consoante (CVC). Neste treinamento, a terapeuta solicitava à criança a leitura das pseudopalavras e, em seguida, solicitava que a criança produzisse cada som que formava a pseudopalavra e que realizasse a transposição do último e primeiro som da pseudopalavra, formando, assim, uma nova pseudopalavra ou palavra. Para este treinamento, foram utilizadas as seguintes pseudopalavras, apresentadas em cartões com letras minúsculas, na fonte Cambria (título), tamanho 200 e cor preta:
Nal; gem; vom; jil; dal; dam; nez; zes; pem; ram; sam; sis; gor; jal; ves.
Nas seis primeiras sessões da fase II, foram realizados a estimulação da leitura e o treinamento da segmentação frasal e silábica como descritos na fase I, entretanto, foram utilizados os seis últimos livros da Coleção Estrelinha(20). E, nas seis últimas sessões da fase II, foi realizado o treinamento da leitura por meio de leitura compartilhada, em que a criança lia as páginas do livro alternando a leitura com a terapeuta. Para isto, os seis primeiros livros da Coleção Estrelinha(20) foram utilizados, por apresentarem frases simples e com palavras de estrutura silábica simples.
Ao todo foram utilizados 18 livros infantis nas 24 sessões. Os livros utilizados fazem parte da Coleção Estrelinha(20), sendo que, do primeiro ao sexto, os livros são formados por frases simples e palavras de estrutura silábica simples; do sétimo ao décimo segundo, são formados por frases simples e palavras de estrutura silábica complexa; e, por fim, do décimo terceiro ao décimo oitavo, são formados por frases complexas e palavras de estrutura silábica complexa. Nas sessões de 1 a 18, foram utilizados os livros na ordem de complexidade crescente e, para as sessões de 19 a 24, foram reutilizados os seis primeiros livros.
Programa de Intervenção de Decodificação Fonológica estimula as habilidades de:
-. Nomeação das letras na forma maiúscula e na minúscula;
-. Produção do som das letras;
-. Consciência fonológica no nível de consciência de palavras e sílabas, e no nível de consciência fonêmica;
-. Leitura com o objetivo de compreensão de pequenos livros;
-. Leitura de palavras monossilábicas de estrutura silábica do tipo CVC.
Todas as crianças deste estudo foram submetidas às avaliações pré e pós-testagem, entretanto o GE foi submetido ao programa de intervenção de decodificação fonológica, para posterior comparação com o GC. Ressalta-se que, após o término da pesquisa, o GC também foi submetido ao programa de intervenção, respeitando os critérios éticos conforme a resolução número 466/12 do Conselho Nacional de Saúde.
Os atendimentos foram realizados pela pesquisadora, em sessões em grupos e individuais, com duração de 50 minutos, duas vezes por semana e aconteceram na Clínica de Fonoaudiologia da instituição de origem. Cada criança recebeu três sessões de pré-testagem, 24 sessões de intervenção e três sessões de pós-testagem. A aplicação dos procedimentos foi iniciada em fevereiro de 2014 e finalizada em junho de 2014.
O programa Statistica v.5.1 (Stat Soft Inc., Tulsa, EUA) foi utilizado para analisar todos os resultados. Foi adotado o nível de significância de 5% (0,05) para a aplicação dos testes. Foram utilizadas medidas de análise indutiva, e, dessa forma, para analisar o desempenho de cada grupo nas avaliações pré e pós-testagem, foi utilizado o Teste de Wilcoxon para as variáveis quantitativas em uma distribuição não normal dos dados, porém, para as variáveis quantitativas com uma distribuição dos dados normal, foi utilizado o Teste “t” pareado. Foram, ainda, utilizadas medidas de estatística descritiva para determinar a média e o desvio padrão dos dados coletados.
No total, a amostra da pesquisa foi constituída por 20 crianças, de ambos os gêneros, de seis a sete anos e 11 meses, do primeiro e segundo ano do ensino fundamental. O GE e GC foram compostos por 10 crianças, sendo duas crianças do primeiro ano e oito do segundo ano do ensino fundamental em cada grupo.
Ao analisar o desempenho quanto à consciência fonológica do GE, é possível observar que, após a intervenção, este grupo aprimorou esta habilidade, uma vez que houve diferença significativa para o total e para os subtestes de análise, adição, segmentação, subtração, substituição, reversão silábica e imagem articulatória. Entretanto, o mesmo não foi observado para o GC (Tabela 1). Porém, não foi observada uma melhora significativa quanto aos subtestes de recepção de rimas e rima sequencial em ambos os grupos.
Tabela 1 Desempenho das crianças quanto à habilidade de consciência fonológica, pré e pós-testagem
Variável | Grupo | Momento da avaliação | Média | Desvio Padrão | Valor de p |
---|---|---|---|---|---|
Análise | GE | Pré | 11,90 | 3,21 | 0,0003* |
Pós | 15,10 | 1,73 | |||
Análise | GC | Pré | 9,10 | 5,40 | 0,4016 |
Pós | 10,00 | 5,96 | |||
Adição | GE | Pré | 4,50 | 1,27 | 0,0002* |
Pós | 6,40 | 1,26 | |||
Adição | GC | Pré | 4,20 | 0,79 | 1,0000 |
Pós | 4,20 | 0,63 | |||
Segmentação | GE | Pré | 6,60 | 2,59 | 0,0086* |
Pós | 9,00 | 1,79 | |||
Segmentação | GC | Pré | 7,00 | 1,94 | 0,7803 |
Pós | 6,90 | 1,97 | |||
Subtração | GE | Pré | 2,70 | 2,16 | 0,0031* |
Pós | 5,10 | 1,91 | |||
Subtração | GC | Pré | 2,60 | 2,22 | 0,8321 |
Pós | 2,70 | 2,06 | |||
Substituição | GE | Pré | 1,30 | 0,95 | 0,0085* |
Pós | 2,30 | 0,82 | |||
Substituição | GC | Pré | 1,30 | 1,25 | 0,7577 |
Pós | 1,20 | 1,03 | |||
Recepção de Rimas | GE | Pré | 5,40 | 1,90 | 0,1381 |
Pós | 6,40 | 2,63 | |||
Recepção de Rimas | GC | Pré | 5,20 | 1,93 | 0,4226 |
Pós | 5,80 | 2,20 | |||
Rima Sequencial | GE | Pré | 5,20 | 1,03 | 0,2788 |
Pós | 4,60 | 1,35 | |||
Rima Sequencial | GC | Pré | 4,60 | 1,35 | 0,1039 |
Pós | 3,80 | 1,47 | |||
Reversão Silábica | GE | Pré | 1,00 | 0,94 | 0,0223* |
Pós | 1,80 | 1,13 | |||
Reversão Silábica | GC | Pré | 0,50 | 0,53 | 0,1773 |
Pós | 1,00 | 0,82 | |||
Imagem Articulatória | GE | Pré | 6,00 | 2,11 | 0,0293* |
Pós | 7,80 | 0,63 | |||
Imagem Articulatória | GC | Pré | 6,60 | 2,12 | 0,2012 |
Pós | 5,80 | 2,20 | |||
TOTAL | GE | Pré | 43,80 | 9,70 | 0,0000* |
Pós | 58,50 | 8,66 | |||
TOTAL | GC | Pré | 41,10 | 11,81 | 0,8828 |
Pós | 41,40 | 13,26 |
*Valores significativos (p<0,05) – Teste t de Student e Teste de Wilcoxon
Legenda: GE: Grupo Experimental; GC: Grupo Controle; DP: Desvio padrão
Observou-se que houve diferença significativa na pré e pós-testagem para o GE na habilidade de memória de trabalho fonológica para o total de não palavras, na habilidade de memória de trabalho fonológica na ordem direta e no total para dígitos. Enquanto que o GC, não submetido à intervenção, demonstrou melhora apenas para não palavras de cinco sílabas (Tabela 2).
Tabela 2 Desempenho das crianças quanto à habilidade de memória de trabalho fonológica, pré e pós-testagem
Variável | Grupo | Momento da avaliação | Média | Desvio Padrão | Valor de p |
---|---|---|---|---|---|
NP 2 | GE | Pré | 18,90 | 2,18 | 0,1088* |
Pós | 19,90 | 2,12 | |||
NP 2 | GC | Pré | 19,00 | 1,33 | 0,3938 |
Pós | 18,70 | 1,16 | |||
NP 3 | GE | Pré | 19,20 | 1,32 | 0,3452 |
Pós | 18,40 | 2,12 | |||
NP 3 | GC | Pré | 16,90 | 2,47 | 0,8321 |
Pós | 17,10 | 2,28 | |||
NP 4 | GE | Pré | 14,20 | 4,47 | 0,5910 |
Pós | 14,00 | 3,53 | |||
NP 4 | GC | Pré | 11,10 | 5,55 | 0,7077 |
Pós | 10,80 | 5,39 | |||
NP 5 | GE | Pré | 6,90 | 6,30 | 0,0839 |
Pós | 11,00 | 6,62 | |||
NP 5 | GC | Pré | 8,30 | 5,87 | 0,0367* |
Pós | 9,50 | 6,19 | |||
TOTAL NP | GE | Pré | 56,90 | 11,93 | 0,0151* |
Pós | 64,20 | 11,06 | |||
TOTAL NP | GC | Pré | 55,30 | 12,57 | 0,4664 |
Pós | 56,10 | 12,05 | |||
DD | GE | Pré | 13,70 | 3,09 | 0,0414* |
Pós | 14,60 | 3,24 | |||
DD | GC | Pré | 13,90 | 5,13 | 0,0528 |
Pós | 15,50 | 3,66 | |||
DI | GE | Pré | 5,70 | 2,26 | 0,4620 |
Pós | 6,10 | 1,85 | |||
DI | GC | Pré | 5,40 | 3,06 | 0,7698 |
Pós | 5,60 | 2,76 | |||
TOTAL D | GE | Pré | 19,40 | 5,10 | 0,0962 |
Pós | 20,70 | 4,47 | |||
TOTAL D | GC | Pré | 19,30 | 7,26 | 0,1404 |
Pós | 21,10 | 6,00 |
*Valores significativos (p<0,05) – Teste t de Student e Teste de Wilcoxon
Legenda: NP 2: Não palavras 2 sílabas; NP 3: Não palavras 3 sílabas; NP 4: Não palavras 4 sílabas; NP 5: Não palavras 5 sílabas; TOTAL NP: Total para não palavras; DD: Dígitos na ordem direta; DI: Dígitos na ordem inversa; TOTAL D: Total para dígitos; GE: Grupo Experimental; GC: Grupo Controle; DP: Desvio padrão
No desempenho quanto às habilidades de escrita e de leitura (Tabela 3), o GE mostrou que aprimorou a habilidade de escrita e leitura de palavras e pseudopalavras após o programa de intervenção, porém o GC não demonstrou o aprimoramento destas habilidades.
Tabela 3 Desempenho das crianças quanto às habilidades de escrita e leitura, pré e pós-testagem
Variável | Grupo | Momento da avaliação | Média | Desvio Padrão | Valor de p |
---|---|---|---|---|---|
Alf | GE | Pré | 18,20 | 7,77 | 0,0158* |
Pós | 20,40 | 6,28 | |||
Alf | GC | Pré | 19,60 | 7,34 | 0,8438 |
Pós | 19,80 | 6,94 | |||
EP | GE | Pré | 5,70 | 5,79 | 0,0058* |
Pós | 12,00 | 7,89 | |||
EP | GC | Pré | 7,80 | 6,94 | 0,1824 |
Pós | 9,40 | 7,70 | |||
ENP | GE | Pré | 0,90 | 0,99 | 0,0039* |
Pós | 3,00 | 2,16 | |||
ENP | GC | Pré | 3,20 | 4,54 | 0,2471 |
Pós | 4,00 | 3,80 | |||
TOTAL E | GE | Pré | 6,60 | 6,57 | 0,0034* |
Pós | 15,00 | 9,96 | |||
TOTAL E | GC | Pré | 7,00 | 6,68 | 0,0616 |
Pós | 10,00 | 10,26 | |||
LP | GE | Pré | 24,20 | 21,25 | 0,0019* |
Pós | 47,00 | 26,73 | |||
LP | GC | Pré | 29,40 | 25,43 | 0,0565 |
Pós | 32,50 | 25,69 | |||
LNP | GE | Pré | 3,90 | 3,38 | 0,0057* |
Pós | 7,00 | 3,85 | |||
LNP | GC | Pré | 3,90 | 3,45 | 0,5910 |
Pós | 3,60 | 3,24 |
*Valores significativos (p<0,05) – Teste t de Student e Teste de Wilcoxon
Legenda: Alf: Escrita do alfabeto; EP: Escrita de palavras; ENP: Escrita de não palavras; TOTAL E: Total da escrita; LP: leitura de palavras; LNP: Leitura de não palavras; GE: Grupo Experimental; GC: Grupo Controle; DP: Desvio padrão
Por fim, ao quantificar os erros quanto à nomeação de letras maiúsculas e minúsculas e quanto à produção dos sons das letras (Tabela 4), observou-se que houve diferença significante para o GE, o que não foi observado no GC.
Tabela 4 Desempenho das crianças quanto às habilidades de nomeação e produção do som de letras maiúsculas e minúsculas, pré e pós-testagem
Variável | Grupo | Momento da avaliação | Média | Desvio Padrão | Valor de p |
---|---|---|---|---|---|
N_Maiús | GE | Pré | 5,90 | 6,40 | 0,0044* |
Pós | 1,40 | 3,10 | |||
N_Maiús | GC | Pré | 3,50 | 4,20 | 0,8226 |
Pós | 3,40 | 3,84 | |||
N_Min | GE | Pré | 9,30 | 6,40 | 0,0005* |
Pós | 1,60 | 3,72 | |||
N_Min | GC | Pré | 7,40 | 5,72 | 0,1401 |
Pós | 6,10 | 5,88 | |||
P_Som | GE | Pré | 21,50 | 3,57 | 0,0000* |
Pós | 2,10 | 3,18 | |||
P_Som | GC | Pré | 21,40 | 7,92 | 0,3452 |
Pós | 21,90 | 7,28 |
*Valores significativos (p<0,05) – Teste t de Student e Teste de Wilcoxon
Legenda: N_Maiús: Nomeação de letras maiúsculas; N_Min: Nomeação de letras minúsculas; P_Som: Produção do som das letras. GE: Grupo Experimental; GC: Grupo Controle; DP: Desvio padrão
O programa de intervenção de decodificação fonológica utilizado na pesquisa estimula as habilidades de nomeação das letras nas formas maiúscula e minúscula; produção do som das letras; consciência fonológica, no nível de consciência de palavras, sílabas e fonêmica; leitura com o objetivo de compreensão de pequenos livros; e leitura de palavras monossilábicas de estrutura silábica do tipo CVC.
Considerando as habilidades diretamente estimuladas pelo programa de intervenção, ou seja, habilidades treinadas durante as sessões, na Prova de Consciência Fonológica, o desempenho do GE melhorou significativamente após a intervenção, porém o GE não teve aumentos significativos nos escores dos subtestes que avaliavam a rima sequencial e recepção de rimas, o que pode ser derivado da estimulação oferecida pelo programa, uma vez que as habilidades de consciência fonológica para rima não foram estimuladas ou treinadas.
Resultado semelhante também foi observado em um estudo que utilizou um programa de remediação fonológica, o qual não possui o treinamento de rima(10). Contudo outro estudo(7), que utilizou um programa de intervenção com a estimulação da rima, também não observou melhora significativa desta habilidade.
Todavia, crianças pequenas têm maior facilidade em lidar com atividades que envolvam sílabas, aliterações e rimas do que fonema, devido ao desenvolvimento espontâneo da consciência de segmentos suprafonêmicos(21). Este desenvolvimento espontâneo não foi observado nos grupos estudados ou nos estudos citados.
Outros estudos de intervenção, com crianças no início do processo de alfabetização, crianças com transtornos de aprendizagem ou crianças com risco para dificuldade de leitura, que incluem o treino da consciência fonológica, também encontraram resultados semelhantes de melhora da consciência fonológica e das habilidades de leitura e escrita após a intervenção(22-24).
Depois da intervenção, o GE demonstrou melhora significativa no conhecimento do nome e som das letras. Entretanto, o GC não demonstrou melhora na avaliação pós-testagem, o que evidência que as crianças não apresentam melhoras espontâneas ou pela estimulação da escola, e que a melhora observada no GE foi decorrente da intervenção oferecida. Autores(3), também, encontraram diferença significativa na comparação pré e pós-testagem do conhecimento do nome e som das letras em crianças de risco para dificuldade de leitura que receberam o treinamento do conhecimento de letras. Estes resultados, também, foram encontrados em outros trabalhos de intervenção para crianças com risco para dificuldade de leitura(22,23).
Autores(25) utilizaram um programa de intervenção que estimulou a consciência fonêmica, a relação grafema-fonema e a leitura oral de livros. O programa foi aplicado em 152 crianças de cinco anos com baixa capacidade verbal, identificadas como de risco para dificuldade de leitura e escrita, após aplicação do programa, obtiveram resultados de melhora significativa das habilidades de conhecimento de nome e som de letras, da consciência fonológica, quanto à consciência fonêmica, e da habilidade de leitura e escrita de palavras.
Quanto às habilidades de leitura de palavras e pseudopalavras, foram observados aumentos significativos nas crianças do GE após a intervenção, enquanto que as crianças do GC não melhoram seu desempenho.
As competências metalinguísticas de consciência silábica, consciência fonológica e conhecimento do nome das letras, estimuladas pelo programa de intervenção, relacionam-se fortemente com as habilidades de leitura de palavras, sendo que o maior desenvolvimento das habilidades de consciência fonológica leva a um maior desenvolvimento das habilidades de leitura, bem como o conhecimento do nome das letras aprimora a habilidade de realizar a relação fonema-grafema(26). Portanto, a evolução das crianças do GE quanto à leitura de palavras e pseudopalavras pode estar relacionada com o desenvolvimento das competências metalinguísticas.
Os estudos de intervenção(18,19) mostraram que a estimulação da nomeação de letras e da relação grafema-fonema, juntamente com o treino direto da leitura de pseudopalavras monossilábicas do tipo CVC, tem como resultado a generalização da habilidade de leitura treinada para a leitura de palavras e pseudopalavras de diferentes extensões e de diferentes estruturas silábicas não treinadas. Pode-se dizer que o programa elaborado, também, obteve como resultado a generalização da habilidade de leitura.
Portanto o GC não teve sua habilidade de leitura aprimorada com a estimulação oferecida na escola, considerando que houve um intervalo de três meses entre os momentos de pré e pós-testagem. Corroborando outros estudos em que os escolares com diagnóstico ou dificuldades de leitura não submetidas aos diferentes tipos de intervenções não têm o aprimoramento espontâneo das habilidades de leitura e escrita(11,27).
Todavia, as habilidades de memória de trabalho fonológica e escrita não foram estimuladas diretamente pelo programa de intervenção utilizado, visto que não foram utilizadas estratégias com o objetivo de treinar estas habilidades durante as sessões, entretanto, o GE teve estas habilidades aprimoradas.
Contudo, ambas as habilidades foram estimuladas de forma indireta, visto que a memória foi indiretamente trabalhada, pois as mesmas estratégias e objetivos foram utilizados em todas as sessões. Quanto à escrita, a consciência fonológica tem sido associada à habilidade de escrita, tendo um papel importante na aquisição do sistema de escrita alfabética(28), sendo assim, a melhora da habilidade de consciência fonológica influencia positivamente a escrita.
Assim, na habilidade de escrita de palavras e pseudopalavras, foi verificada melhora significativa, por meio do aumento de palavras e pseudopalavras escritas corretamente pelo GE Subteste de Escrita Sob Ditado. As médias para escrita de palavras deste grupo após intervenção não chegaram ao esperado para escolaridade, porém houve uma melhora qualitativa da escrita, pois estas crianças antes da intervenção tinham dificuldades de realizar a relação fonema-grafema para escrever, sendo que, após a intervenção, verificou-se a melhora deste aspecto, entretanto os erros devido às irregularidades da língua e/ou devido às regras contextuais foram observados.
Outros estudos de intervenção que estimulam a consciência fonológica e/ou o conhecimento do alfabeto demonstram melhoras da escrita após a intervenção, mesmo esta habilidade não sendo diretamente treinada(29).
Autores(30) encontraram que existe uma alta correlação entre a consciência fonológica e a linguagem escrita, sendo que a correlação entre as habilidades de consciência fonológica e a escrita são significativas em crianças de cinco e seis anos.
No GC, não foi observada a mesma evolução que o GE demonstrou na comparação pré e pós-testagem, assim, pode-se dizer que mesmo a escrita não sendo diretamente treinada no programa de intervenção, ela foi incrementada pelo programa. Visto que este grupo continuou recebendo a instrução escolar durante os três meses da pesquisa, entretanto, apenas o GE foi submetido ao Programa de Intervenção de Decodificação Fonológica.
O GE demonstrou melhora significativa para a habilidade de memória de trabalho no escore total para não palavras e para dígitos na ordem direta. Um programa de remediação fonológica, aplicado em escolares com distúrbio de aprendizagem, demonstrou a melhora da habilidade de memória de trabalho fonológica(29). Crianças de risco para dislexia submetida à intervenção fonológica associada à correspondência grafema-fonema, também demonstraram melhora significativa da habilidade de memória de trabalho fonológica, entretanto o grupo de crianças sem risco e não submetidos ao programa não tiveram melhoras desta habilidade(23).
Pode-se dizer que o programa de intervenção de decodificação fonológica possui aplicabilidade para aprimorar as habilidades pré-requisitos e habilidades de leitura e escrita de crianças com risco para dificuldade de leitura, uma vez que o programa aprimorou as habilidades de conhecimento do alfabeto, consciência fonológica, memória de trabalho fonológica, leitura e escrita de palavras e pseudopalavras.
O programa de intervenção de decodificação fonológica foi elaborado para ser aplicado em crianças de seis a sete anos e 11 meses, do primeiro ou segundo ano do ensino fundamental e com risco para dificuldades de leitura, dessa forma, as atividades do programa foram propostas para esta população.
É importante ressaltar que crianças identificadas como de risco para dificuldade de leitura necessitam de uma estimulação adicional, além da habitual oferecida na escola, uma vez que as crianças com risco que receberam estimulação sobre o conhecimento do nome e som das letras, da consciência fonológica e da leitura obtiveram a evolução das habilidades do processamento fonológico e das habilidades de leitura e escrita.