versão impressa ISSN 1679-4508versão On-line ISSN 2317-6385
Einstein (São Paulo) vol.9 no.3 São Paulo jul./set. 2011
http://dx.doi.org/10.1590/s1679-45082011ao1922
A obesidade grave está associada à taxa elevada de fluxo plasmático renal (FPR)(1), hiperfiltração glomerular, e, consequentemente, maior taxa de filtração glomerular (TFG)(1–3). Hiperinsulinemia(4,5), hiperlipidemia(4,6), e algumas adipocitocinas, como leptina(7) e adiponectina(8), podem contribuir para esse estado de hiperfiltração(9). O tecido adiposo contribui para elevação nos níveis de angiotensina II, que aumenta a reabsorção tubular de sódio e ativa a retroalimentação tubuloglomerular(5,9). Estes mecanismos levam à vasodilatação das arteríolas aferentes, com um consequente aumento de FPR, do gradiente de pressão hidrostática transcapilar e da TFG(2,3).
Na prática clínica a determinação da função renal depende de métodos rápidos e acurados. Já que a medida da depuração de inulina ou a análise de coletas de urina de 12 ou 24 horas para determinação da taxa de filtração glomerular (TFG) é, muitas vezes, impraticável, vários métodos de estimativa de TFG com o uso das concentrações séricas de creatinina (Cr) foram desenvolvidos, resultando em maior utilidade clínica às custas de acurácia reduzida(10,11). A equação de Cockcroft-Gault (CG) é a mais frequentemente empregada na prática clínica(12), mas existem vários outros métodos(13–25). A acurácia dessas equações é controversa em alguns subgrupos de pacientes, especialmente os idosos(26), portadores de diabetes mellitus(27) e obesos(28,29).
O objetivo do presente estudo foi comparar a acurácia de CG e a equação de modificação da dieta em doença renal (MDRD), e de dez outras equações publicadas para estimar a TFG em uma população de pacientes gravemente obesos e em quatro subgrupos dessa população (intolerância à glicose, diabetes mellitus, síndrome metabólica e hipertensão).
Cento e quarenta pacientes gravemente obesos foram selecionados para participar deste estudo, segundo os critérios de inclusão: índice de massa corpórea (IMC) > 40 kg/m2 ou > 35 kg/m2 com duas complicações associadas, idade entre 18 e 60 anos, e nenhum histórico de doença renal. Os pacientes eram todos brasileiros e a maioria era do sexo feminino (64,2%) e branca (80%). O índice de massa corpórea médio foi 46,1 ± 5,4 kg/m2 (40,0 - 65,6 kg/m2) e a idade média, 43,2 ± 7,1 anos.
Os pacientes gravemente obesos foram classificados em um ou mais dos quatro grupos: intolerância à glicose (glicemia de jejum [GJ] > 100 mg/dL), diabetes mellitus (GJ > 126 mg/dL e/ou tratamento específico), síndrome metabólica (segundo critérios da International Diabetes Federation - IDF)(27), e hipertensão arterial (pacientes em tratamento com antihipertensivos). Os 140 indivíduos podiam se enquadrar em mais de um subgrupo ou não necessitavam estar em nenhum dos subgrupos.
Amostras de sangue foram coletadas após um jejum mínimo de 8 horas. Uma amostra de urina de 24 horas também foi coletada de todos os pacientes. Os parâmetros bioquímicos foram medidos usando métodos laboratoriais padrão. A creatinina no soro e na urina foi determinada por calorimetria. Todas as fórmulas usadas para definir TFG, peso corpóreo ideal (PCI), e massa magra (MM) estão descritos na tabela 1. A área de superfície corporal (ASC) não foi usada para corrigir a TFG, porque subestima o valor real de modo significativo(30). Para correção, usamos a altura do paciente medida em metros(31). A hiperfiltração glomerular foi definida como TFG > 135 mL • min−1 • m−2.
Tabela 1 Fórmulas usadas para estimar a depuração de creatinina (Clcr) em indivíduos gravemente obesos
Padrão-ouro | ||
TFG = Ucr x V / Pcr x 1440 | MM = Peso – Peso gordo | |
Equações avaliadas | ||
Jackson, Pollock(24) | FM = Peso x [(1,61 x IMC) + (0,13 x Idade) – (12,1 x Gênero) – 13,9] / 100 (Mulher = 0; Homem = 1) | |
Jackson, et al.(25) | ||
Sobh et al.(15) | Clcr = [(140 – Idade) / Pcr] x Peso0,54 x Altura0,40 x 0,014 | |
Jelliffe(17) | Clcr (homens) = [(100 / Pcr) – 12] x (ASC / 1,73) | |
Clcr (mulheres) =[(80 / Pcr) – 7] x (ASC / 1,73) | ||
Jelliffe(18) | Clcr = [98 – 0,8(Idade – 20) / Pcr] x (ASC / 1,73) (x 0,9 se for mulher) | |
Mawer et al.(19) | Clcr (homens) = Peso[29,3 – (0,203 x Idade)] x [1 – (0,03 x Pcr)] / (14,4 x Pcr) x (70 / Peso) | |
Clcr (mulheres) = Peso[25,3 – (0,175 x Idade)] x [1 – (0,03 x Pcr)] / (14,4 x Pcr) x (70 / Peso) | ||
Gates(20) | Clcr (homens) = (89,4 x Pcr-1,2) + (55 – Idade) x (0,447 x Pcr-1,1) x (ASC / 1,73) | |
Clcr (mulheres) = (60 x Pcr-1,1) + (56 – Idade) x (0,3 x Pcr-1,1) x (ASC / 1,73) | ||
Bjornsson(22) | Clcr (homens) = [27 – (0,173 – Idade)] x (Peso x 0,07) / Pcr | |
Clcr (mulheres) = [25 – (0,175 – Idade)] x (Peso x 0,07) / Pcr | ||
Davis, Chandler(23) | Clcr = (140 – Idade) / Pcr (x 0,85 se for mulher) | |
Hull et al.(21) | Clcr = [((145 – Idade) / Pcr) – 3] x (Peso / 70) (x 0,85 se for mulher) | |
MDDR completa(14) | Clcr = 170 x Pcr− 0,999 x Idade−0,176 x BUN−0,170 x Albumina0,318 (x 0,762 se for mulher) | |
Cockcroft, Gault(12) | Clcr = (140 – Idade) x Peso / 72 x Pcr (x 0,85 se for mulher) | |
CG-FFM(12) | Clcr = (140 – Idade) x MM / 72 x Pcr (x 0,85 se for mulher) | |
Salazar(13) (Altura em metros) | Clcr (homens) = [137 – Idade] x [(0,285 x Peso) + (12,1 x Altura2)] / Pcr x 51 | |
Clcr (mulheres) = [146 – Idade] x [(0,287 x Peso) + (9,74 x Altura2)] / Pcr x 60 |
TFG: taxa de filtração glomerular; Ucr: creatinina urinária (mg); V: volume urinário (mL em 24 hs); Clcr: depuração de creatinina (mL/min); Pcr: creatinina plasmática (mg/dl); Peso em kg; Altura em cm; albumina in g/dL; BUN: ureia plasmática (mg/dL); MM: massa, Magra (kg); IMC: índice de massa corpórea (kg/m2); ASC: área de superfície corporal.
Correção usada em todas as fórmulas: Clcr (mL/min/m) = Fórmula / Altura (em metros)
O IMC é definido como o peso do indivíduo dividido pelo quadrado de sua altura. Para definir síndrome metabólica (SM), usamos os critérios IDF: circunferência da cintura ≥ 94 cm em homens, ≥ 80 cm em mulheres ou IMC ≥ 30 kg/m2; níveis de triglicérides ≥ 150 mg/dL (1,7 mmol/L) e/ou tratamento específico; níveis de HDL-C < 40 mg/dL (1 mmol/L) em homens, < 50 mg/dL (1,3 mmol/L) em mulheres e/ou tratamento específico; glicemia de jejum ≥ 100 mg/dL (5,6 mmol/L) e/ou paciente com diabetes mellitus tipo 2 (DM2); pressão sanguínea sistólica ≥ 130 mmHg, pressão sanguínea diastólica ≥ 85 mmHg e/ou tratamento específico. O indivíduo teria de apresentar pelo menos três dos cinco fatores de risco para ter diagnóstico de SM(27).
As variáveis com distribuição normal foram expressas como média ± desvio padrão (DP). Os resultados da equação MDRD e da fórmula de CG foram comparados com a TFG por correlação, teste “t” bicaudal pareado, e procedimentos de Bland-Altman(32). A sensibilidade e especificidade de ambas as fórmulas para diagnóstico de hiperfiltração glomerular em pacientes gravemente obesos foram avaliadas com base em curvas ROC - curvas de características de operação do receptor, não paramétricas, geradas plotando-se sensibilidade contra 1 - especificidade, atribuindo ao teste ideal uma sensibilidade = 1 e uma especificidade = 1. As áreas sob as curvas (AUCs) foram calculadas segundo o procedimento de Hanley e McNeil(33) e compiladas por um teste univariado de escore z totalmente pareado, da diferença entre as áreas sob as duas curvas ROC (área de teste). A AUC é comumente > 0,5, com valores que variam de 1 (separação perfeita ideal dos valores testados) a 0,5 (nenhuma diferença aparente de distribuição entre os grupos testados).
Três métodos foram usados para comparar a acurácia de cada equação. O primeiro método avaliou a precisão e o viés conforme descritos por Sheiner e Beal(34), e o segundo foi ANOVA do viés e da precisão entre os métodos de predição seguido de um teste post-hoc de Duncan. O erro preditivo médio (MPE = 1 / n x Σ [Yi – Y], onde Yi é o valor preditivo e Y é o valor medido) foi definido como o viés. Um método tem viés se o IC95% do MPE não inclui zero, e é, portanto, diferente de zero. O método não tem viés [é imparcial] se o IC95% da diferença real da média inclui zero. A precisão de cada equação foi medida pelo erro quadrático médio (RMSE = [1 / n x Σ (Yi – Y)2]1/2). O terceiro método empregou os coeficientes de correlação obtidos usando regressão linear e a correlação da TFG medida versus a TFG estimada. Os intervalos de confiança (ICs) de 95% foram construídos ao redor do viés e da precisão usando a estatística t para avaliar a significância dos primeiros dois métodos. A acurácia de cada equação (% de erro), ou quão bem ela representa a real função renal foi avaliada pela comparação de seus resultados com os do método padrão. Isso foi feito empregando a seguinte equação: (valor preditivo [TFG] – valor real [TFG]) x 100 / valor real. A regressão linear stepwise usando o método backward stepwise foi realizada com níveis séricos de creatinina (Pcr), níveis séricos de albumina (Pal), BUN sérico (PBUN), e variáveis demográficas de idade, altura, e peso corpóreo para o banco de dados inteiro a fim de desenvolver uma equação para a predição da TFG em pacientes gravemente obesos.
Todas as análises estatísticas foram feitas com o pacote de software estatístico SPSS (v15.0; SPSS, Chicago, IL), software MedCalc, e ROCKIT 0.9B (Department of Radiology from The University of Chicago). A significância estatística foi considerada em p < 0,05.
O valor médio medido de TFG foi 91,7 ± 23,2 mL • min−1 • m−2. A equação MDRD média subestimou o valor de TFG (62,9 ± 14,4 mL • min−1 • m−2; p < 0,05 x TFG medido) enquanto a fórmula média de CG superestimou o valor de TFG (125,3 ± 33,3 mL • min−1 • m−2; p < 0,0001 x TFG medido). Conforme é mostrado na Figura 1A, ambas as estimativas mostraram fraca correlação com o valor medido de TFG (fórmula CG r = 0,052, p = 0,538; equação MDRD r = 0,032, p = 0,590 entre valores de r). O procedimento de Bland-Altman (Figura 1B) revelou que um viés para a equação MDRD como a estimação menos TFG (média −28,8 mL • min−1 • m−2, 2 DPs 53,0) se correlacionava de maneira negativa com a média (r = −0,44, p < 0,0001), que não foi o caso para a fórmula CG (média +33,5 mL • min−1 • m−2, 2 DPs 78,8, r = 0,37, p < 0,0001). A análise de curva ROC (Figura 1C) mostrou que a acurácia diagnóstica máxima da equação MDRD para o diagnóstico de hiperfiltração glomerular foi similar à fórmula CG (fórmula CG: AUC 0,639, limite de corte 106,6; equação MDRD: AUC 0,643, limite de corte 55,4; p=0,915). Isso se deveu principalmente a valores similares de sensibilidade e especificidade de ambas as fórmulas (fórmula CG com sensibilidade de 60,8% e especificidade de 66,6%; a sensibilidade da equação MDRD foi 63,5% e a especificidade, 68,1%).
Figura 1 A: TFG estimada como função de medida urinária (milímetros por minuto por metro) em 140 pacientes com obesidade grave antes da cirurgia. B: Procedimento de Bland-Altman plota as diferenças entre a TFG estimada e medida como função da média da taxa de filtração glomerular por ambos os métodos em 140 pacientes com obesidade grave antes da cirurgia (DGYR). C: Curvas ROC comparando as áreas sob as curvas da fórmula de Cockcroft-Gault e da equação MDRD para diagnóstico de hiperfiltração glomerular (TFG >90 ml • min-1 • m-2) antes da cirurgia (DGYR). • Cockcroft-Gault fórmula (—); o equação MDRD (—). Hiperfiltração glomerular foi definida como TFG > 135 ml • min-1 • m-2. TFG = Taxa de filtração glomerular; DGYR = Derivação gástrica em “Y de Roux”; MDRD = Equação de modificação da dieta em doença renal
As avaliações de viés usando o método de Sheiner e Beal estão alistadas na tabela 2. A inspeção da tabela revela que o viés médio da maioria das equações foi, em geral, alto (> 10 mL/min/m). Para a população inteira, as equações de Salazar-Corcoran e Sobh foram as únicas que se mostraram sem viés, e o de Jelliffe 1971 foi o mais preciso (Tabela 3). ANOVA foi aplicada às avaliações de viés e mostrou que as equações de Sobh e Salazar-Corcoran apresentavam viés semelhante (p = 0,540). A equação de Sobh mostrou viés significantemente menor que as outras equações (p < 0,05) e a equação de Salazar-Corcoran não diferiu de forma significativa das equações de Jelliffe 1971, Jelliffe 1973, e Davis-Chandler (p > 0,05).
Tabela 2 Viés, conforme avaliação por erro preditivo médio, das 12 equações usadas para estimar a depuração de creatinina
TODOS (n=140) Média (IC95%) | IG (n=43) Média (IC95%) | DM (n=24) Média (IC95%) | SM (n=76) Média (IC95%) | HIP (n =66) Média (IC95%) | |
---|---|---|---|---|---|
MDDR(14) | -28,83 (-33,27, −24,39) | -52,14 (-56,13, −48,16) | -37,63 (-46,85, −28,40) | -48,17 (-51,26, −45,09) | -32,17 (-39,13, −25,22) |
Cockcroft, Gault(12) | 33,52 (26,89, 40,15) | 22,62 (15,97, 29,28) | 25,33 (7,67, 42,99) | 12,31 (5,99, 18,64) | 33,72 (23,15, 44,30) |
Sobh et al.(15) | 6,20 (-0,30, 12,70)a | -30,35 (-37,92, −22,79) | -5,37 (-22,00, 11,24)a | -13,13 (-21,20, −5,07) | -3,55 (-12,55, 5,45)a |
Salazar, Corcoran(13) | -5,21 (-11,44, 1,02)a | -40,46 (-48,10, −32,33) | -16,23 (-31,73, −0,72) | -24,18 (-31,87, −16,50) | -13,93 (-22,70, −5,16) |
Jelliffe(17) | -12,37 (-18,06, −6,68) | -45,57 (-51,98, −39,16) | -17,88 (-34,47, −1,30) | -31,41 (-37,93, −24,89) | -17,57 (-25,88, −9,26) |
Jelliffe(18) | -12,27 (-18,07, −6,48) | -47,05 (-53,41, −40,69) | -22,38 (-37,19, −7,57) | -31,43 (-38,27, −24,54) | -20,82 (-28,94, −12,71) |
Mawer et al.(19) | 109,68 (95,57, 123,80) | 62,27 (39,86, 84,69) | 95,06 (62,86, 127,25) | 88,42 (69,09, 107,75) | 95,23 (76,60, 113,86) |
Gates(20) | -53,81 (-59,96, −47,66) | -87,18 (-94,11, −80,25) | -60,15 (-77,15, −43,15) | -72,50 (-80,31, −64,69) | -60,65 (-69,48, −51,82) |
Hull et al.(21) | 31,47 (23,57, 39,37) | 0,47 (-10,96, 11,91)a | 19,10 (0,26, 38,46) | 10,44 (0,88, 20,01) | 24,56 (13,98, 35,14) |
Bjornsson(22) | 27,41 (20,03, 34,80) | -11,60 (-20,58, −2,62) | 15,42 (3,10, 33,96) | 7,64 (-1,70, 16,98)a | 16,95 (7,08, 26,82) |
Davis, Chandler(23) | -21,65 (-27,06, −16,24) | -55,16 (-60,53, −49,78) | -31,28 (-45,84, −16,72) | -40,38 (-46,66, −34,10) | -29,74 (-37,58, −21,90) |
CG MM(12) | -45,87 (-51,26, −40,47) | -76,07 (-83,67, −68,47) | -55,33 (-67,88, −42,78) | -64,67 (-71,11, −58,22) | -54,71 (-62,71, −46,71) |
IG: intolerância a glicose; DM: diabetes mellitus; SM: síndrome metabólica; HIP: hipertensão; IC: intervalo de confiança; CG MM: Cockcroft-Gault usando massa magra; MDDR: modificação da dieta em doença renal.
a0,00 incluído no IC95% (sem viés)
Tabela 3 Precisão, conforme a raiz quadrada da média dos erros, e coeficientes de correlação das 12 equações usadas para estimar a depuração de creatinina
TODAS (n=140) Média (IC95%) (r) | IG (n=43) Média (IC95%) (r) | DM (n=24) Média (IC95%) (r) | SM (n=76) Média (IC95%) (r) | HIP (n=66) Média (IC95%) (r) | |
---|---|---|---|---|---|
MDDR(14) | 33,40 (-29,98, −36,83) (0,06)a | 52,19 (48,27, 56,11) (0,48)a | 39,49 (31,85, 47,13) (0,23) | 48,37 (45,46, 51,28) (0,52)a | 37,27 (32,10, 42,43) (0,05) |
Cockcroft, Gault(12) | 40,95 (35,62, 46,27) (0,05)a | 27,87 (23,57, 32,18) (0,44)a | 37,34 (24,23, 50,45) (0,05) | 25,64 (22,01, 29,28) (0,56)a | 40,69 (31,75, 49,63) (0,03) |
Sobh et al.(15) | 31,04 (27,00, 35,08) (0,25)a | 33,08 (26,72, 39,44) (0,23) | 32,64 (23,50, 41,78) (0,35) | 29,57 (24,29, 34,85) (0,39)a | 29,13 (23,67, 34,59) (0,18) |
Salazar, Corcoran(13) | 30,31 (26,61, 34,02) (0,26)a | 42,21 (35,56, 48,86) (0,33)a | 33,02 (23,71, 42,33) (0,35) | 34,41 (29,18, 39,64) (0,42)a | 31,72 (26,52, 36,92) (0,18) |
Jelliffe(17) | 29,12 (25,54, 32,70) (0,22)a | 45,57 (39,16, 51,98) (0,08) | 35,24 (25,06, 45,41) (0,44)a | 36,14 (31,08, 41,20) (0,32)a | 30,83 (25,38, 36,27) (0,15) |
Jelliffe(18) | 29,77 (26,18, 33,36) (0,24)a | 47,38 (41,27, 53,50) (0,13) | 34,25 (24,54, 43,96) (0,34) | 37,03 (31,88, 42,18) (0,35)a | 32,42 (27,14, 37,70) (0,15) |
Mawer et al.(19) | 111,45 (97,73, 125,17) (0,26)a | 68,01 (47,28, 88,75) (0,43)a | 100,02 (70,75, 129,29) (0,33) | 91,67 (73,15, 110,18) (0,45)a | 97,46 (79,55, 115,37) (0,17) |
Gates(20) | 58,01 (53,05, 62,97) (0,24)a | 87,18 (80,25, 94,11) (0,46)a | 66,40 (54,49, 78,31) (0,42)a | 76,05 (70,30, 81,80) (0,42)a | 64,12 (56,95, 71,29) (0,27)a |
Hull et al.(21) | 43,77 (37,73, 49,80) (0,13)a | 30,73 (24,46, 36,99) (0,01) | 35,64 (21,27, 50,01) (0,55)a | 32,33 (25,86, 38,80) (0,09) | 38,00 (30,23, 45,77) (0,03) |
Bjornsson(22) | 39,92 (34,36, 45,47) (0,25)a | 25,30 (19,68, 30,92) (0,22) | 36,87 (25,26, 48,48) (0,38) | 29,89 (23,32, 36,45) (0,39)a | 32,14 (24,95, 39,32) (0,16) |
Davis, Chandler(23) | 32,06 (28,38, 35,74) (0,18)a | 55,16 (49,78, 60,53) (0,06) | 40,70 (31,56, 49,98) (0,31) | 44,28 (39,60, 48,97) (0,27)a | 36,84 (31,13, 42,54) (0,14) |
CG MM(12) | 48,00 (43,15, 52,85) (0,28)a | 76,07 (68,47, 83,67) (0,56)a | 56,07 (44,14, 68,00) (0,22) | 65,72 (59,87, 71,58) (0,45)a | 55,62 (48,02, 63,22) (0,27)a |
IG: intolerância a glicose; DM: diabetes mellitus; SM: síndrome metabólica; HIP: hipertensão; IC: intervalo de confiança; CG MM: Cockcroft-Gault usando massa magra; MDDR: modificação da dieta em doença renal.
ap < 0,05
Para a população com tolerância à glicose prejudicada, a única equação que não apresentou viés foi o método de Hull. A equação de Bjornsson foi o método mais preciso. A aplicação de ANOVA demonstrou que o método de Hull não diferiu de maneira significativa da equação de Bjornsson (p = 0,820), e mostrou viés significantemente menor que todas as outras equações (p < 0,05). A única equação que foi imparcial (sem viés) para os pacientes gravemente obesos com diabetes mellitus foi a fórmula de Sobh, que também foi a mais precisa de todas as equações estudadas. A aplicação de ANOVA revelou diferentes vieses dentre todas as equações (p < 0,0001). A equação de Sobh difere significantemente apenas das equações de Mawer, Gates, e CG-MM (p < 0,05).
Em pacientes gravemente obesos com síndrome metabólica, a equação de Bjornsson foi a única sem viés, e a equação de Sobh foi a mais precisa. A equação de Bjornsson apresentou o menor viés de todas as equações (p < 0,0001), exceto as de CG, Sobh, e Hull (p > 0,05). Finalmente, em pacientes hipertensos gravemente obesos, Sobh foi a única equação sem viés. O viés do método de Sobh não diferiu entre as equações de Jelliffe 1971, Jelliffe 1973, Salazar-Corcoran, e Bjornsson (p > 0,05). A equação de Salazar-Corcoran mostrou a melhor acurácia (% de erro = 2,72 ± 5,08%), seguida de Jelliffe 1973 (% de erro = −5,85 ± 40,13%) (Fig. 2). O uso de ANOVA revelou diferentes acurácias dentre todas as equações (p < 0,0001). A equação de Salazar-Corcoran foi a mais acurada de todas as equações (p < 0,0001), exceto para Sobh, Jelliffe 1971, Jelliffe 1973, e Davis-Chandler (p > 0,05).
Na população inteira, os coeficientes de correlação variaram de 0,05 a 0,28 e foram razoavelmente consistentes de um subgrupo para o outro. O grupo de tolerância à glicose prejudicada apresentou a pior correlação de todos os subgrupos, com coeficientes de correlação que variavam de 0,01 a 0,56. Na síndrome metabólica, encontramos a melhor correlação, com coeficientes de correlação que variavam de 0,09 a 0,56. Dentro da população inteira e de cada subgrupo, a equação de Hull apresentou os menores coeficientes de correlação (variação de 0,01 a 0,55), e a CG-MM e a CG apresentaram a maior (variação de 0,22 a 0,56 e de 0,03 a 0,56, respectivamente).
A regressão linear stepwise conduzida no grupo todo usando a TFG como a variável dependente e altura e creatinina como variáveis independentes produziu a seguinte equação:
TFG (mL/min/m) = 253,263 + 73,112 (Creatinina em mg/dL) ∓ 101,683 (Altura em m)
Essa equação apresentou um coeficiente de correlação de 0,57 (EP = 29,12) e não apresentou viés (viés = −0,25 mL/min/m; IC95% = −5,33, 5,32) e foi precisa (precisão = 26,72; IC95% = 23,84, 29,60) para a população inteira. A acurácia dessa equação foi de 4,94 ± 23,78%, e o coeficiente de correlação entre os valores medidos e estimados de TFG com essa equação foi de 0,427 (p < 0,0001). As variáveis de idade, peso, albumina sérica, e concentração de BUN não mostraram melhorar a correlação de maneira significativa.
A fórmula de CG é um meio simples, amplamente utilizado, e recomendado de avaliar a função renal, mas a estimativa pela fórmula de CG, neste estudo, tem fraca correlação com o valor de TFG determinado em amostras de urina (r = 0,052). Estudos anteriores determinaram que o principal problema com a fórmula de CG é a superestimativa da TFG(35,36); mesmo assim, ela é baixa, o que também comprovamos. Nossos resultados sugerem que essa superestimativa altera a sensibilidade da fórmula CG para o diagnóstico de hiperfiltração glomerular.
A presença do peso nessa fórmula é provavelmente a principal causa de erro, especialmente em pacientes com obesidade severa. Na fórmula de CG, a TFG é proporcional ao peso corpóreo. Entretanto, a maior parte do peso corporal excessivo na obesidade é constituída de gordura, que não produz creatinina. Segundo uma relação de proporcionalidade, um paciente obeso que perde 10% do seu peso corpóreo perderia 10% da TFG. Em contraste, Solert et al. descobriram que uma perda de peso induzida por dieta de 20% era associada a um aumento de 20% na TFG(37).
A equação MDRD deriva dos resultados de 1.070 pacientes com insuficiência renal, e foi validada em outros 558 pacientes. Essa equação claramente foi mais acurada do que a fórmula de CG nessa população e não requer o uso do peso corpóreo(14). Todavia, a equação MDRD ainda não foi validada em indivíduos com doença renal(14). Nós mostramos que ela subestima a TFG em altos níveis, como já foi relatado em outros estudos(37,38).
Nosso trabalho mostra resultados similares de CG e da equação MDRD para pacientes gravemente obesos. Em suma, ambas as equações são imprecisas para pacientes gravemente obesos. As diretrizes da National Kidney Foundation Practice Guideline for Chronic Kidney Disease recomendam medir a TFG por meio de métodos de depuração na obesidade(39).
Desde o início da década de 1970, várias equações e nomogramas foram publicados para a estimativa da TFG a partir da creatinina plasmática, mas a seleção de qual equação é a melhor para a aproximação da função renal de um dado paciente continua sendo assunto de debate. Alguns estudos foram conduzidos para investigar o desempenho preditivo dessas equações e nomogramas em grupos específicos de pacientes, como os gravemente obesos. Muitos desses estudos apenas analisaram o desempenho preditivo a partir de algumas equações selecionadas, e nem todas avaliaram precisão, viés, e acurácia; alguns dos primeiros estudos apenas compararam equações baseadas em regressão linear. Recentemente, alguns pesquisadores estudaram o desempenho preditivo de muitas equações em subgrupos de pacientes(10), mas a acurácia dessas equações na obesidade severa permanece desconhecida.
A equação de CG pode ser considerada a equação padrão - ouro de predição da TFG, sendo usada como referência por muitos para a comparação da acurácia de várias outras equações. Neste estudo, a fórmula CG mostrou viés em todos os subgrupos de pacientes obesos, assim como com a equação MDRD, outro procedimento padrão - ouro. Para toda a população obesa, apenas a equação de Salazar-Corcoran, que foi desenvolvida especificamente para uso em pacientes obesos(13), e a fórmula de Sobh não mostraram viés. Ademais, o achado de que a equação de Salazar-Corcoran tem o menor viés também é consistente com pesquisas anteriores(10,29).
O subgrupo de pacientes diabéticos apresentou o menor viés geral, e a segunda maior precisão de todos os subgrupos analisados neste estudo. Embora em comparação com os outros subgrupos, o viés foi, em geral, baixo para cada equação, a única equação sem viés foi a de Sobh. Analisando todas as 12 equações, existem tendências evidentes de subestimar a TFG, sendo que 8 equações tendem a subestimar e 4, a superestimar a TFG. Enquanto a fórmula CG mostrou ter bom desempenho em pacientes de peso normal com nefropatia diabética(27,40), neste estudo a fórmula CG superestimou a TFG em 33,52 mL/min/m em pacientes diabéticos gravemente obesos, semelhante a outros estudos(41).
Ao examinar o grupo de intolerância à glicose, o viés é o maior e a precisão é a menor de todos os subgrupos estudados. Todas as equações mostraram viés, com a exceção da equação de Hull, que apresentou o menor viés de todas as equações do estudo. A equação MDRD, que foi o melhor método para triagem de função renal em pacientes de peso normal com intolerância à glicose(42), mostrou viés e imprecisão em pacientes obesos.
Uma correlação direta foi sugerida entre hipertensão relacionada à obesidade e hiperfiltração(2,43). Enquanto todas as equações, exceto o método Sobh, mostraram viés nos pacientes hipertensos severamente obesos, esse subgrupo apresentou a maior precisão geral e teve o segundo menor viés geral. Finalmente, no subgrupo de síndrome metabólica, todas as equações apresentaram viés, exceto a fórmula de Bjornsson.
As tendências observadas no grupo inteiro e em cada um dos quatro subgrupos foram que a equação de Sobh teve o melhor desempenho geral, sendo sem viés e preciso no grupo todo e também em dois dos subgrupos. Com a exceção da equação de Salazar-Corcoran no grupo todo, de Hull no subgrupo de intolerância à glicose, e de Bjornsson no grupo de síndrome metabólica, todas as outras equações apresentaram o maior viés e a menor precisão. Os padrões – ouro da fórmula CG e da equação de MDRD apresentaram altos valores de erros médios e baixos valores preditivos médios. Em geral, se um método cujo viés variou menos de ±10% a partir da média da TFG medida é considerado clinicamente aceitável, então as equações de Sobh e Salazar-Corcoran são aceitáveis na população toda. Nos subgrupos, podemos aceitar Sobh para os grupos de diabetes e hipertensão (condições frequentemente associadas à obesidade), de Hull para intolerância à glicose, e de Bjornsson para a síndrome metabólica.
Com exceção de drogas nefrotóxicas, que não foram administradas aos pacientes, nosso estudo é limitado pela falta de controle de várias drogas que podem afetar a TFG ou o ensaio de creatinina, o pequeno número de pacientes, e pelo fato de que influências da dieta não foram controladas. Muitos pacientes também apresentavam mais de uma comorbidade, facilitando a existência de confusão. Ademais, usamos a amostra de urina de 24 horas para medir a TFG e não a infusão de substâncias externas, tais como 99T c DTPA (ácido dietileno-triaminopentaacético ligado ao tecnécio marcado), iotamalato, inulina, iohexol, e 51Cr-EDTA, que são procedimentos padrão - ouro. As estimativas de creatinina da TFG têm suas limitações. Todas as equações de estimativas dependem de uma predição da taxa de excreção de creatinina em 24 horas, que é uma função da massa muscular. Além disso, a depuração da creatinina não é mais amplamente realizada em função da dificuldade de assegurar uma coleta completa de urina.
A falta de consenso nos resultados de estudos anteriores que avaliaram a acurácia de equações para a estimativa da taxa de filtração glomerular pode se dever, em parte, à heterogeneidade nas condições dos pacientes ou das doenças. Este estudo usou um banco de dados médio e avaliou o desempenho preditivo de 12 equações distintas, diferente de estudos anteriores que analisaram números menores de equações.
Os achados e os resultados do presente estudo sugerem que as equações de MDRD e CG são imprecisas em pacientes obesos. A superestimativa e a influência do peso reduzem a sensibilidade e a acurácia da fórmula CG. A equação de MDRD é mais difícil de calcular na prática clínica e subestima os níveis da TFG.
Este estudo demonstra que a equação de Salazar-Corcoran frequentemente é uma estimativa sem viés [imparcial] da TFG para muitos pacientes, independentemente da comorbidade subjacente. Além disso, a equação de Sobh ou a equação de regressão apresentada aqui podem ser o método preferido para a estimativa da TFG em pacientes gravemente obesos, que muitas vezes são diabéticos e hipertensos, quando a facilidade de aplicação não é prioridade. Entretanto, assim como a recomendação da diretriz da National Kidney Foundation Practice Guideline for Chronic Kidney Disease, nós acreditamos que a amostra de urina de 24 horas é o método de escolha para a avaliação da taxa de filtração glomerular em pacientes gravemente obesos.