Compartilhar

Dextrocardia e não Compactação

Dextrocardia e não Compactação

Autores:

Josef Finsterer,
Claudia Stöllberger

ARTIGO ORIGINAL

Arquivos Brasileiros de Cardiologia

versão impressa ISSN 0066-782X

Arq. Bras. Cardiol. vol.102 no.3 São Paulo mar. 2014

https://doi.org/10.5935/abc.20140028

Caro Editor,

Lemos com interesse o artigo de Gonçalves e cols.1 sobre um paciente com dextrocardia e hipertrabeculação/não compactação de ventrículo esquerdo (HTVE)1. Apresentamos a seguir alguns comentários.

A associação de dextrocardia com HTVE foi relatada repetidas vezes2.

O exato mecanismo fisiopatológico da HTVE ainda não foi esclarecido. Embora uma deficiência no processo de compactação possa ter uma participação em tal mecanismo, há pacientes nos quais a HTVE desenvolve-se ao longo da vida (HTVE adquirida).

Qual foi a causa dos colapsos e da pré-síncope? O paciente foi submetido a ressonância magnética (RM) cerebral para descartar acidente vascular cerebral cardioembólico originário dos espaços intertrabeculares, uma complicação relatada várias vezes em HTVE? Quais os resultados da investigação ultrassonográfica da carótida?

Foi necessária a implantação de um cardiodesfibrilador implantável (CDI) devido a fibrilação ventricular indutível. Durante o seguimento, o CDI alguma vez apresentou uma descarga?

Com frequência, a HTVE associa-se a distúrbios neuromusculares (DNMs). O paciente foi visto por um neurologista para descartar DNM? Esses distúrbios, tais como paralisia periódica ou síndrome de Marden-Walker, foram associados com dextrocardia.

Em geral, a HTVE é familiar. Outros membros da família foram investigados para HTVE? Encontrou-se HTVE em algum parente de primeiro grau? Algum familiar desenvolveu sintomas cardíacos?

O paciente recebeu gadolínio para RM cardíaca. Os radiologistas observaram realce tardio, que poderia indicar fibrose miocárdica? Realce tardio miocárdico pode ser tipicamente encontrado em pacientes com DNM distrófico com comprometimento miocárdico3.

O critério para diagnóstico ecocardiográfico de HTVE de encontro de pelo menos quatro trabeculações de ventrículo esquerdo (VE) na ecocardiografia não foi apresentado por Jenny e cols.4, mas por Stöllberger e cols5.

O valor de 24% de acidente vascular cerebral embólico a partir de trombos intertrabeculares para pacientes com HTVE é alto e não foi indicada sua referência.

Embora a RM cardíaca seja útil para detectar HTVE, ela não é diagnóstica nesse caso. Por outro lado, a ecocardiografia nem sempre pode detectar HTVE, mais frequentemente devido à má qualidade da imagem, à acentuada dilatação de VE, ou ao intenso espessamento miocárdico6.

Alguns casos esporádicos de HTVE apresentam mutações em genes únicos, tais como os gene SCNA5 ou G4.5, sugerindo que nem só HTVE familiar se associa com genes mutados.

A HTVE permanece uma condição enigmática com várias implicações práticas para o acompanhamento dos pacientes. Na HTVE, é essencial considerar todos os aspectos clínicos e científicos não apenas para melhorar o resultado dos pacientes, mas também para contribuir para o esclarecimento da patogênese da condição.

Não há informação quanto a financiamento nem outros benefícios de fontes comerciais para a realização deste manuscrito, nem ainda quanto a qualquer outro interesse financeiro dos autores, que pudessem criar conflito de interesse quanto ao trabalho.

REFERÊNCIAS

1. Gonçalves LF, Souto FM, Faro FN, Mendonça RD, Oliveira JL, Sousa AC. Dextrocardia with situs inversus associated with non-compaction cardiomyopathy. Arq Bras Cardiol. 2013;101(2):e33-6.
2. Baskurt M, Kalyoncuoglu M, Kucukoglu S. Noncompaction cardiomyopathy and dextroversion of the heart. Herz. 2011;36(1):33-6.
3. Binder JS, Weidemann F, Schoser B, Niemann M, Machann W, Beer M, et al. Spongious hypertrophic cardiomyopathy in patients with mutations in the four-and-a-half LIM domain 1 gene. Circ Cardiovasc Genet. 2012;5(5):490-502.
4. Oechslin EN, Attenhofer Jost CH, Rojas JR, Kaufmann PA, Jenni R. Long-term follow-up of 34 adults with isolated left ventricular noncompaction: a distinct cardiomyopathy with poor prognosis. J Am Coll Cardiol. 2000;36(2):493-500.
5. Stollberger C, Kopsa W, Tscherney R, Finsterer J. Diagnosing left ventricular noncompaction by echocardiography and cardiac magnetic resonance imaging and its dependency on neuromuscular disorders. Clin Cardiol. 2008;31(8):383-7.
6. Finsterer J, Stöllberger C. Apical noncompaction in metabolic myopathy may be missed on echocardiography but visible on cardiac MRI or misinterpreted as apical hypokinesia. Int J Cardiol. 2012;160(2):e15-7.
1. Friedman MA, Wiseman S, Haramati L, Gordon GM, Spevack DM. Noncompaction of the left ventricle in a patient with dextroversion. Eur J Echocardiogr. 2007;8(1):70-3
2. Baskurt M, Kalyoncuoglu M, Kucukoglu S. Noncompaction cardiomyopathy and dextroversion of the heart. Herz. 2011;36(1):33-6.
3. Oechslin EN, Attenhofer Jost CH, Rojas JR, Kaufmann PA, Jenni R. Long-term follow-up of 34 adults with isolated left ventricular noncompaction: a distinct cardiomyopathy with poor prognosis. J Am Coll Cardiol. 2000;36(2):493-500.