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Diadococinesia oral em crianças com fissura labiopalatina operadas e presença de ceceio na produção da fala

Diadococinesia oral em crianças com fissura labiopalatina operadas e presença de ceceio na produção da fala

Autores:

Mahyara Francini Jacob,
Daniela Jovel Modolo,
Katia Flores Genaro

ARTIGO ORIGINAL

Audiology - Communication Research

versão On-line ISSN 2317-6431

Audiol., Commun. Res. vol.20 no.1 São Paulo jan./mar. 2015

http://dx.doi.org/10.1590/S2317-64312015000100001446

INTRODUÇÃO

A fissura labiopalatina, em geral, compromete a fala, uma vez que a realização desta função requer a integridade anatômica e funcional dos órgãos relacionados, da articulação adequada e do funcionamento correto da válvula velofaríngea(1,2). As alterações da fala, nesses casos, são decorrentes de comprometimento do mecanismo velofaríngeo(3,4), como os distúrbios obrigatórios e as articulações compensatórias, bem como da condição dento-oclusal(5-8), que propiciam as adaptações funcionais da língua e dos lábios. De forma geral, em indivíduos com fissura labiopalatina, independentemente da idade e da técnica cirúrgica utilizada no reparo, a condição dento-oclusal acarreta alteração na produção dos fones linguoalveolares [s] e [z], linguodentais [t], [d], [n] e alveolar [ℓ], sendo a interdentalização da língua e o ceceio, as alterações observadas(5,7-9).

No processo de produção da fala, a condição muscular ou habilidade motora oral é essencial e pode ser avaliada por meio do teste da diadococinesia (DDC). Este teste avalia a maturação e a integração neuromotora, que fornecem um índice acústico da velocidade do movimento e do posicionamento articulatório, a partir da realização de repetições rápidas de padrões de contrações musculares opostos(10,11). Para o julgamento dos valores obtidos, o programa Motor Speech Profile Advanced (MSP), da KayPENTAXTM proporciona, automaticamente, parâmetros que resultam em dois tipos de análise: quantitativa e qualitativa. A análise quantitativa relaciona-se à quantidade e à duração das emissões. A quantidade indica o número de emissões por segundo, e é representada pela média da taxa da DDC, e a duração é representada pelo tempo médio entre tais emissões. A análise qualitativa leva em consideração parâmetros das emissões tais como a regularidade, ritmo e/ou estabilidade, e é representada pelo desvio padrão do período da DDC, coeficiente de variação do período da DDC, perturbações do período da DDC e coeficiente de variação do pico da intensidade da DDC(11).

Por essa razão, alguns autores estudaram crianças sem fissura labiopalatina, mas que apresentavam algum distúrbio da fala(10-16). Verificaram que as crianças com distúrbio de fala produziam a maioria das emissões de forma mais lenta(15,16), sendo observada relação significativa positiva entre idade, porcentagem de consoantes corretas e velocidade de fala(17), além de relação entre o aumento da velocidade de emissão das sílabas, de acordo com o avanço da idade(11).

Alguns estudos relacionaram a DDC e a força de protrusão da língua em crianças com ceceio anterior e em crianças sem distúrbio da fala, cujos resultados mostraram maior força da língua e maior número de emissões nas crianças sem alteração da fala, enquanto as crianças com ceceio apresentaram menor força da língua e maior lentidão nas tarefas da DDC(12,14). Este resultado, segundo alguns autores, evidencia relação entre ceceio anterior, fraqueza da língua e velocidade reduzida da DDC, com a baixa inteligibilidade da fala(14).

Apesar de vários estudos analisarem a DDC em crianças sem fissura labiopalatina e com diferentes distúrbios de fala, poucos utilizaram deste teste para avaliar indivíduos com fissura labiopalatina(18-20). Um deles avaliou três adolescentes com fissura palatina, a partir da eletropalatografia e do teste da DDC, tendo verificado maior dificuldade na elevação do ápice lingual e dificuldade na velocidade dos movimentos da língua, no caso com fissura associada à Sequência de Robin(18). Outro, avaliou dez crianças com fissura completa de lábio e palato, dez com fissura de palato, sete com Síndrome Velocardiofacial e 47 sem fissura, encontrando resultado semelhante entre os grupos e constatando que as crianças com fissura completa de lábio e palato não evidenciaram características apráxicas, diferente daquelas com fissura de palato e das com Síndrome Velocardiofacial(19). Outro estudo avaliou crianças e adultos jovens com e sem fissura labiopalatina e os resultados mostraram menor velocidade no grupo com fissura, justificado pela alteração da pressão intraoral(20).

Assim, desses poucos estudos, pode-se constatar que, apesar de envolverem indivíduos com fissura labiopalatina, a amostra por eles utilizada foi restrita e heterogênea, além de abordarem distintos parâmetros da DDC. Deste modo, não fica claro se os parâmetros da DDC estão alterados nessa população. Esse esclarecimento contribuiria com a elaboração mais adequada do planejamento terapêutico, no que se refere a inserir atividades que envolvem habilidade motora. Por essa razão, uma vez que em indivíduos sem fissura labiopalatina a DDC encontra-se alterada na presença de distúrbios de fala e, tendo em vista que o comprometimento estrutural da cavidade oral é uma condição que permanece por muito tempo na vida das pessoas com fissura labiopalatina, mesmo operada, levando a adaptações funcionais na fala, o objetivo do estudo foi correlacionar o desempenho motor oral nas tarefas de DDC, de acordo com o tipo de fissura e com a presença de ceceio, na fala em crianças com fissura labiopalatina, operadas.

MÉTODOS

Estudo retrospectivo não randomizado, aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa em Seres Humanos do Hospital de Reabilitação de Anomalias Craniofaciais da Universidade de São Paulo (USP), parecer número 406.375, sendo parte de um projeto de pesquisa prospectivo mais amplo, também aprovado pelo referido Comitê sob número 288/2009. Assim, tratando-se de um levantamento de dados coletados previamente, foi dispensado o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE). Foi analisada a documentação da amostra total do estudo mais amplo, formado por 60 crianças entre 9 e 12 anos de idade, selecionadas aleatoriamente e distribuídas em dois grupos: 30 com fissura unilateral de lábio e palato (FULP), 14 meninas e 16 meninos, e 30 com fissura isolada de palato (FP), 18 meninas e 12 meninos.

As crianças foram submetidas a cirurgias primárias para a reparação do lábio (queiloplastia), até o 6º mês de vida, e do palato (palatoplastia), entre o 12º e o 24º mês, na própria instituição onde o estudo foi desenvolvido. Não foram incluídas na amostra crianças que realizaram queiloplastia secundária; que usavam aparelho intraoral que interferisse na execução das tarefas solicitadas; que apresentavam fístula oronasal no palato, disfonia moderada a severa, frênulo lingual com extensão curta ou fixação, próximo ao ápice da língua, comprometimento neurológico ou síndromes, articulações compensatórias na produção dos sons plosivos [t] e [k] e disfluência da fala.

Teste da diadococinesia

O número de emissões produzidas por segundo, bem como o tempo médio entre as emissões em milissegundos foram analisados a partir da coleta da DDC, obtida em sala acusticamente tratada, onde os indivíduos permaneciam sentados e com um microfone (AKG, C420) posicionado lateralmente, a 60º e a dez centímetros da comissura labial. O microfone era ligado a uma mesa de som Behringer® de oito canais (XENYX/X1204USB), conectada a um computador Intel® Pentium® 4, CPU 1.80 GHz e 256 MB de RAM; placa de som Audigy II, Creative.

Gravações de amostras de fala relacionadas à repetição das monossílabas “ta”, “ca” e da sequência “pataca” foram realizadas por seis segundos cada(11). A sílaba “pa” não foi testada por tratar-se de ponto articulatório bilabial e a proposta era estudar o ceceio, um distúrbio que não envolve o lábio, mas a habilidade motora da língua. Todas as crianças foram instruídas e treinadas previamente para realizar a produção tão rápida quanto possível, mantendo a articulação clara e precisa, durante a avaliação(11). Após o treinamento, as emissões foram gravadas de duas a três vezes e as amostras armazenadas por meio do software SoundForge 8.0 (Sony®), em taxa de amostragem de 44.100 Hz, canal Mono em 16 bit.

Tanto para a emissão das monossílabas “ta” e “ca”, quanto para a sequência “pataca”, uma única avaliadora fez a coleta dos dados e a edição das gravações para posterior análise. Para as análises das monossílabas “ta” e “ca” foram excluídos os dois primeiros e o último segundo de cada emissão, por meio do programa MSP, Modelo 5141, versão 2.5.2 da KayPENTAXTM, e considerado o número de emissões no intervalo de três segundos(11). As análises foram realizadas pelo mesmo programa, que fornece, automaticamente, o número de emissões por segundo, bem como o tempo médio entre as emissões. Já na sequência “pataca”, tanto a edição, quanto a análise quantitativa, foram realizadas por meio do software de edição SoundForge 8.0 (Sony®), sendo excluídos os dois primeiros segundos, permanecendo os próximos três. A contagem do número de emissões por segundo foi realizada de forma manual, com apoio da pista visual e auditiva, uma vez que o programa MSP não analisa a sequência trissilábica como uma única emissão e sim como três monossílabas(11).

Em específico para a sequência “pataca”, quando a criança não conseguiu realizar corretamente tais emissões, mesmo após o treino, esta não foi computada.

Análise da presença de ceceio na fala

Foram analisadas amostras de fala registradas em sistema audiovisual, utilizando filmadora digital (Sony® DCR-DVD810), sustentada por um tripé a um metro de distância do paciente que estava sentado. Tais amostras envolviam a repetição de frases que contemplavam palavras pertencentes a um roteiro de sons alvo, cada qual contendo dez ocorrências, quatro vezes na sílaba inicial, três na sílaba medial e três na sílaba final(8). Na análise, foram considerados os fones alveolares [s] e [z], que totalizaram 20 produções. As amostras de fala foram armazenadas em sequência crescente, quanto ao número do caso na pesquisa, em dispositivos portáteis e entregues para cada examinador.

Dois examinadores com experiência na avaliação da fala receberam orientações verbais e escritas para analisarem as amostras e anotarem a presença de ceceio, ao constatarem distorção acústica audível durante a produção dos fones [s] e [z](21). Para tanto, foi solicitada a análise individual e separadamente, em ambiente silencioso e fazendo uso de fone de ouvido. Posteriormente, os resultados foram analisados e, para alguns casos em que houve discordância entre os examinadores, foi solicitado que um terceiro examinador, também experiente, analisasse as amostras de fala para desempate, estando este ciente de sua posição como terceiro examinador. Assim, a partir da concordância entre dois examinadores, considerou-se presença de ceceio quando este ocorria em, pelo menos, cinco das dez produções de cada fone(22). Vale ressaltar que não houve randomização da amostra para análise destes dados.

A concordância entre examinadores foi verificada por meio do teste Kappa, cujo resultado revelou boa concordância entre eles, 85% (Kappa=0,85) e 90% (Kappa=0,90), respectivamente para os fones [s] e [z]. Uma vez que a concordância foi satisfatória entre os examinadores, a confiabilidade intraexaminador não foi verificada. A análise da frequência desse distúrbio da fala, de acordo com o tipo de fissura, foi verificada pelo teste Qui-quadrado. As comparações dos resultados da DDC entre os dois grupos de fissura, bem como entre os grupos com e sem ceceio foram realizadas pelo teste “t” para amostras independentes. Em todas as análises foram considerados significativos os valores de p<0,05.

RESULTADOS

A comparação dos resultados da DDC entre os grupos FULP e FP, quanto ao número de emissões por segundo (s) e o tempo médio entre as emissões em milissegundos (ms), foram realizadas pelo teste “t” para amostras independentes e não mostraram diferença (Tabela 1).

Tabela 1 Comparação entre as médias e desvios padrão do número de emissões por segundo e do tempo médio por segundo entre as emissões dos grupos 

Grupos Emissões

“ta”   “ca”   “pataca”



Emissões por segundo Tempo médio entre as emissões (ms) Emissões por segundo Tempo médio entre as emissões (ms) Emissões por segundo
FP 4,66 ± 0,61 217,66 ± 26,25   4,06 ± 0,46 249,74 ± 31,98   1,64 ± 0,16
FULP 4,65 ± 0,48 217,49 ± 23,60   3,86 ± 0,58 264,27 ± 38,46   1,67 ± 0,16
Valor de p 0,922 0,985   0,149 0,117   0,614

Teste t para amostras independentes (p<0,05)

Legenda: FP = fissura isolada de palato; FULP = fissura unilateral completa de lábio e palato

A análise da frequência quanto à presença de ceceio, de acordo com o tipo de fissura, mostrou maior ocorrência (60%) no grupo com FULP (p=0,00882) (Tabela 2).

Tabela 2 Frequência de ceceio na fala, de acordo com o tipo de fissura 

Ceceio Grupo Valor de p Total

FP FULP
Presente 23,33% (n=7) 60,00% (n=18) p=0,00882* 41,67% (n=25)
Ausente 76,67% (n=23) 40,00% (n=12) 58,33% (n=35)

Teste Qui-quadrado (p<0,05)

*Maior frequência no grupo FULP

Legenda: FP = fissura isolada de palato; FULP = fissura unilateral completa de lábio e palato

Ao comparar os valores dos parâmetros da DDC entre os grupos com e sem ceceio, quando se considerou o grupo como um todo, ou seja, independente do tipo de fissura (Tabela 3), e também ao considerar individualmente cada grupo (Tabelas 4 e 5), não se verificou diferença em todas as tarefas testadas.

Tabela 3 Comparação dos valores da diadococinesia, segundo a presença de ceceio na fala, considerando o grupo como um todo 

Emissões   Ceceio Valor de p

Presente (n=25) Ausente (n=35)
“ta” Emissões por segundo 4,56 ± 0,45 4,72 ± 0,60 0,252
Tempo médio entre as emissões (ms) 221,40 ± 21,76 214,81 ± 26,65 0,313

“ca” Emissões por segundo 3,92 ± 0,57 3,99 ± 0,50 0,590
Tempo médio entre as emissões (ms) 260,30 ± 37,47 254,59 ± 34,95 0,541

“pataca” Emissões por segundo 1,67 ± 0,18 1,64 ± 0,15 0,528

Teste t para amostras independentes (p<0,05)

Tabela 4 Comparação dos valores da diadococinesia segundo a presença de ceceio na fala, no grupo com fissura unilateral completa de lábio e palato 

Emissões   Ceceio Valor de p

Presente (n=18) Ausente (n=12)
“ta” Emissões por segundo 4,61 ± 0,48 4,70 ± 0,49 0,605
Tempo médio entre as emissões (ms) 219,21 ± 23,45 214,91 ± 24,63 0,633

“ca” Emissões por segundo 3,81 ± 0,58 3,95 ± 0,58 0,507
Tempo médio entre as emissões (ms) 263,33 ± 38,97 258,19 ± 38,53 0,489

“pataca” Emissões por segundo 1,70 ± 0,16 1,59 ± 0,17 0,106

Teste t para amostras independentes (p<0,05)

Tabela 5 Comparação dos valores da diadococinesia de acordo com a presença ou não de ceceio, no grupo com fissura isolada de palato 

Emissões   Ceceio Valor de p

Presente (n=7) Ausente (n=23)
“ta” Emissões por segundo 4,43 ± 0,35 4,73 ± 0,66 0,253
Tempo médio entre as emissões (ms) 227,02 ± 16,86 214,75 ± 28,18 0,287

“ca” Emissões por segundo 4,21 ± 0,45 4,02 ± 0,46 0,340
Tempo médio entre as emissões (ms) 239,96 ± 25,23 252,71 ± 33,68 0,364

“pataca” Emissões por segundo 1,59 ± 0,20 1,65 ± 0,15 0,399

Teste t para amostras independentes (p<0,05)

DISCUSSÃO

Avaliar a função motora oral nos casos com fissura labiopalatina se justifica, tendo em vista que, desde antes do nascimento, esses indivíduos convivem com comprometimentos estruturais da cavidade oral e essa condição pode permanecer por longa data durante o tratamento reabilitador. As alterações estruturais da cavidade oral favorecem as adaptações funcionais, especialmente da língua, para a realização das funções orofaciais(2,6-8). Além disso, a presença da DVF e das alterações dento-oclusais são responsáveis por distúrbios específicos da fala(1,2,5,9,23).

Assim, avaliar o desempenho motor oral em indivíduos com fissura labiopalatina permitiria esclarecer se os ajustes funcionais por eles realizados para compensar o problema estrutural comprometeriam essa habilidade. Neste sentido, a análise da DDC possibilita avaliar a habilidade motora oral, a partir das tarefas de repetições rápidas de sílabas e sequências silábicas(10,11).

Com o propósito de se obter grupos homogêneos, para esse estudo foram selecionadas crianças que haviam sido operadas na mesma instituição, em idades preconizadas pela literatura, ou seja, com domínio dos fones analisados, produção articulatória mais precisa e dentadura mista, com os incisivos centrais e laterais já erupcionados(21), uma vez que a ausência destes dentes poderia causar um falso resultado.

A análise dos resultados obtidos indicou semelhança quanto aos parâmetros de tempo médio entre as emissões (ms), bem como quanto ao número de emissões por segundo, para todas as repetições testadas, entre os grupos FULP e FP. Verificou-se pouca variabilidade nos valores nos dois grupos, conforme mostra o desvio padrão. Este resultado indica que, apesar das alterações estruturais mais extensas no grupo FULP, a alteração não interferiu na habilidade motora para a produção das sílabas “ta” e “ca” e da sequência “pataca”.

Apesar de não ser utilizado um grupo controle, quando comparados os valores do número de emissões por segundo aos valores relatados na literatura para indivíduos sem fissura e com idade entre 5 e 93 anos, constatou-se que os resultados do presente estudo estão de acordo com a literatura(10,11). Os valores obtidos para a sílaba “ta” foram de 4,66±0,61 no grupo FP e 4,65±0,48 no grupo FULP, o que poderia variar entre 3,33 e 7,1. Em relação à sílaba “ca”, obteve-se os valores de 4,06±0,46 e 3,86±0,58, respectivamente para os grupos FP e FULP, os quais poderiam variar de 3,18 à 6,6.

Para a emissão da sequência trissilábica “pataca”, foram obtidos os valores de 1,64±0,16 no grupo FP e 1,67±0,16 no grupo FULP, sendo concordante com achados anteriores(10,11).

Observou-se 60% de presença de ceceio no grupo FULP e 23,33% no grupo FP, durante a produção de fala, sendo significativa a maior frequência de alteração no grupo cuja fissura envolvia o lábio e o palato. Este resultado pode ser explicado pelo posicionamento incorreto da língua, o que altera os pontos articulatórios ocasionalmente encontrados, decorrentes da condição dento-oclusal, comprometimento estrutural e redução do espaço intraoral, mesmo após a correção cirúrgica(1,5-8,10-19, 23-25).

Por outro lado, no FP, não era prevista a presença de ceceio, pois esse tipo de fissura não demanda grandes alterações na oclusão. Contudo, ao estudar 40 crianças sem fissura e com idade entre 4 e 10 anos, alguns autores referiram que os fones com maior frequência de distorção na produção eram [s] e [z](21).

Analisando o desempenho motor oral nas tarefas da DDC nos dois grupos avaliados neste estudo, no que se refere à interferência do ceceio, não se constatou diferença nos valores entre os casos que apresentavam ceceio e aqueles que não apresentavam ceceio, independente do tipo de fissura. Este resultado indica que apesar da posição da língua mais anterior para compensar a alteração estrutural, visando à produção dos fones alveolares, a habilidade motora não foi influenciada, quando avaliada por meio da DDC, possivelmente devido à adaptação funcional que esses indivíduos realizam ao longo de sua vida. Tal achado é contrário aos estudos que investigam a DDC em indivíduos com diferentes tipos de distúrbios articulatórios, comparativamente a indivíduos sem alteração na fala(12,13,16).

Para a realização deste estudo, foram encontradas algumas limitações, como a dificuldade da obtenção de uma amostra maior, tendo em vista os critérios de inclusão, em especial a presença de articulações compensatórias na produção dos sons [t], [k], [s] e [z], uma vez que são fones mais alterados nessa população(1,3,9). Além disso, como já citado, há poucos estudos na literatura que utilizaram a DDC para avaliar indivíduos com fissura labiopalatina(18-20), o que limitou a comparação dos resultados obtidos.

CONCLUSÃO

O desempenho nas tarefas da DDC não sofreu alteração segundo o tipo de fissura palatina. A presença de ceceio foi mais frequente no grupo com fissura unilateral completa de lábio e palato. Todavia, a presença do ceceio durante a produção da fala não modificou o desempenho nas tarefas da DDC.

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