versão impressa ISSN 0101-2800versão On-line ISSN 2175-8239
J. Bras. Nefrol. vol.39 no.1 São Paulo jan./mar. 2017
http://dx.doi.org/10.5935/0101-2800.20170017
Caríssimo Editor,
Na última década o diagnóstico da injúria renal aguda (IRA) foi padronizado por meio das classificações de RIFLE, AKIN e mais recentemente KDIGO.1 Também vem sendo sugerido que a intervenção do nefrologista, quando realizada em tempo adequado, apresenta um impacto positivo na evolução do paciente com IRA.2
A provável justificativa para tal fato está na tomada de medidas como: ajuste da dose ou suspensão de medicações potencialmente nefrotóxicas, adequada reanimação volêmica e instituição mais precoce da diálise. Desta forma, é fundamental que intensivistas estejam familiarizados com estas classificações, pois, na maioria das vezes, terão a primeira oportunidade do diagnóstico da IRA em pacientes críticos. A despeito do descrito acima, uma das queixas mais comuns entre os nefrologistas é a de ser chamado nas unidades de terapia intensiva (UTIs) em fases muito avançadas da IRA.
Recentemente avaliamos, por meio de um questionário de 14 perguntas, o conhecimento de intensivistas sobre os critérios diagnósticos de IRA, em oito UTIs de uma capital brasileira, dando mais ênfase ao mais antigo deles (RIFLE). Quarenta e três questionários foram respondidos, sendo que a maior parte dos entrevistados (53,4%) tinha mais de 10 anos de exercício da Medicina e 44,1% trabalhavam há mais de 10 anos com pacientes críticos.
Constatou-se que a maior parte dos intensivistas (55,8%) desconhecia qualquer tipo de critério diagnóstico de IRA e, dos que afirmaram conhecer, apenas 20,9% nomearam critérios realmente pertinentes. Outro dado alarmante é que apenas 25% disseram utilizar estes critérios em sua prática diária, sendo a principal razão a não padronização nas UTIs avaliadas. Estes dados sugerem que a falta de conhecimento seja um dos responsáveis por atrasos na solicitação da avaliação pela equipe da Nefrologia em casos de IRA em UTI.
O tempo adequado para avaliação do nefrologista na IRA é muito discutível, mas há evidências que sugerem que deva ser inversamente proporcional à gravidade do paciente. Recentemente, demonstramos que uma avaliação mais tardia (mais de 24 horas após o diagnóstico da IRA), foi associada com maior mortalidade e evolução para formas mais graves da doença com maior frequência.2
Frequentemente, o intensivista é o médico a ter a primeira oportunidade de reconhecer a IRA ainda em sua fase inicial. No entanto, nossos dados e estudos prévios sugerem que isto não vem ocorrendo. É provável que o desconhecimento sobre os critérios de IRA também aconteça em outros estados e fora do país. Como exemplo, em um estudo realizado no Reino Unido, observou-se que 33% dos pacientes com risco de IRA não foram investigados de forma adequada, clínica e laboratorialmente, o que resultou no dado de que 43% dos que desenvolveram IRA tiveram um diagnóstico considerado tardio.3
Em tempos da busca de novos biomarcadores para o diagnóstico mais precoce da injúria renal em doentes críticos, os dados aqui apresentados sugerem que a ação mais urgente deve ser bem mais simples, como o início de medidas educativas dentro das UTIs, no intuito de familiarizar os intensivistas com as ferramentas clínicas mais recentes para o diagnóstico da IRA. Só assim chegaremos mais cedo.