versão impressa ISSN 0021-7557versão On-line ISSN 1678-4782
J. Pediatr. (Rio J.) vol.93 no.2 Porto Alegre mar./abr. 2017
http://dx.doi.org/10.1016/j.jped.2016.05.005
A amamentação é considerada uma das estratégias que mais contribuem para a prevenção de mortes infantis, tem o potencial de salvar mais de 800.000 vidas de crianças com menos de 5 anos por ano em todo o mundo1,2 e reduzir a mortalidade neonatal.3 É recomendada sua prática de forma exclusiva até os 6 meses e complementada até os 2 anos ou mais.4 Apesar de sua relevância, circunstâncias sociais e econômicas podem ter profunda influência na prevalência e duração da amamentação.5,6
Em meados dos anos 1960 iniciaram-se campanhas maciças de marketing para a substituição do leite materno por fórmulas infantis sem qualquer tipo de regulamentação, atingiram-se mães de todos os estratos sociais, que, em conjunto com mudanças culturais ocorridas em relação ao papel da amamentação na sociedade e a crescente inserção das mulheres no mercado de trabalho, levaram ao declínio da duração da amamentação.6-9 Em reação, movimentos mundiais pró-amamentação, principalmente a partir do fim da década de 1970, culminaram com a criação de um conjunto de normas, fundamentadas em princípios éticos, para regulamentar a promoção comercial de produtos que poderiam interferir no aleitamento materno.10,11
Desde o início da década de 1980 leis, normas e programas foram adotados pelo Ministério da Saúde no Brasil para promover e apoiar o aleitamento materno. Foi atribuído a eles o aumento consistente da prevalência e da duração mediana da amamentação desde o fim daquela década,5,6,9,10 como constatado por inquéritos nacionais.12,13 Tais incrementos foram associados à redução de morbidades e diminuição das taxas de internação hospitalar.14,15
Contudo, não se dispõe de série histórica sobre a duração mediana do aleitamento materno anterior à década de 1980, uma vez que o único inquérito nacional conduzido no período (1974-5) obteve informações apenas indiretas sobre essa prática.16 Para esclarecer se a duração do aleitamento materno em nosso meio apresentava trajetória ascendente, estável ou decrescente antes da década de 1980, é preciso lançar mão de dados originados de outros estudos, de natureza comparável àqueles dos períodos subsequentes. O presente estudo tem como objetivos descrever uma série histórica sobre a duração da amamentação de crianças nascidas a partir da década de 1960 e identificar fatores associados à sua interrupção em cada década.
Foram analisados dados do Estudo Pró-Saúde (EPS), investigação epidemiológica longitudinal iniciada em 1999 com uma população de trabalhadores técnico-administrativos de uma universidade no Estado do Rio de Janeiro. O EPS tem por objetivo principal elucidar o papel de determinantes sociais da saúde; entre 1999 e 2013, foram feitas quatro etapas de coleta de dados, incluindo autopreenchimento de questionários, aferições antropométricas e outros exames.
Todos os funcionários técnico-administrativos do quadro efetivo de uma universidade no Estado do Rio de Janeiro foram convidados a participar do estudo (n = 4.030 na fase 1 e n = 2.933 na fase 4). Foram considerados inelegíveis apenas aqueles cedidos a outras instituições ou licenciados por motivos não relacionados à saúde. Os funcionários em licença médica foram convidados a participar do estudo, até com visita domiciliar, quando necessária. Foram elegíveis para o estudo todas as mulheres que tiveram filhos e participaram da fase 1 e da fase 4 do EPS. Mulheres que participaram da fase 1 e da fase 4 foram consideradas somente uma vez. Detalhes do recrutamento e da população estudada são encontrados em outra publicação.17
Para o presente estudo, foram utilizados dados de duração do aleitamento materno relativas ao primeiro filho coletados em duas fases do EPS: fase 1 (1999), e fase 4 (2011-2). O EPS incluiu, em suas duas fases, 2160 mulheres, das quais 1.727 tiveram pelo menos um filho. Para este estudo, foram consideradas somente aquelas que souberam relatar a duração do aleitamento materno do primeiro filho (n = 1.539).
Foi feita por meio de questionário multidimensional, autopreenchíveis, com auxílio de pesquisadores de campo e no ambiente de trabalho. Para garantir a qualidade dos dados foram feitos estudo piloto, teste de confiabilidade dos instrumentos e dupla digitação independente.18 A duração da amamentação foi obtida em meses, por meio de questões específicas para mulheres que tiveram pelo menos um filho, incluindo o mês e ano de nascimento, a prática ou não da amamentação e em que mês havia cessado o aleitamento materno, todas referentes ao primeiro filho nascido. As datas de nascimento foram categorizadas em décadas, a partir de 1960.
A renda familiar mensal per capita foi obtida pela conversão da renda líquida domiciliar dividida pelo total de pessoas que dependiam dessa renda e categorizada em terços de renda per capita. Como foram usados dados de renda referentes a dois períodos distintos, os rendimentos relatados na fase 1 foram deflacionados com o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), para maximizar sua comparabilidade com aquela relativa à fase 4. Dados sobre cor/etnia autorreferida foram coletados segundo as categorias do IBGE: preta, parda, branca, amarela e indígena. A idade das mães foi referente à época em que tiveram o primeiro filho. Adicionalmente, as mães foram questionadas em relação ao tipo de parto (cesáreo ou normal).
Para análise da duração do aleitamento materno foram construídas curvas de sobrevida pelo método de Kaplan-Meier para cada década informada, o que representou a probabilidade acumulada de estar amamentando com o decorrer dos meses. O tempo de aleitamento materno foi censurado aos 12 meses e a associação das covariáveis com a duração da amamentação foi estimada por meio da regressão de Cox. Optou-se por não incluir nas análises os indivíduos classificados como de cor/etnia amarela e indígena em função de suas baixas frequências (1,7% e 0,7%, respectivamente). O pressuposto de riscos proporcionais, necessário à regressão de Cox, foi testado (incluindo interações das covariáveis com o tempo) pelos resíduos de Schoenfeld (1982); também foi feito o teste da década de nascimento como variável independente. O nível de significância estatística testado foi de 5%, foi usado o software Stata (StataCorp. 2011.Stata Statistical Software: release 12. College Station, EUA).
A fase 1 do EPS foi aprovada em 1999, pelo Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) do Hospital Universitário Pedro Ernesto (registro nº 224/1999), e em 2011 a fase 4 foi aprovada pelo CEP do Instituto de Medicina Social da Uerj (CAAE nº 0041.0.259.000-11).
Na tabela 1, são apresentadas a idade em terços em cada década estudada. Optou-se por essa classificação porque a idade média das mães aumentou de acordo com a década de nascimento do primeiro filho.
Tabela 1 Terços da idade das mães (em anos) segundo década de nascimento do filho. Estudo Pró-Saúde, 1999 e 2011-2012
Década | 1º terço | 2º terço | 3º terço |
---|---|---|---|
1960-69 | 12-19 | 19-21 | 22-33 |
1970-79 | 14-20 | 21-24 | 24-40 |
1980-89 | 13-24 | 24-28 | 28-40 |
1990-99 | 19-28 | 28-32 | 32-51 |
2000-09 | 22-32 | 33-36 | 37-44 |
A tabela 2 mostra a duração mediana do aleitamento e a razão de Hazard (HR), que expressa o risco de interrupção do aleitamento materno em cada década, tomou-se a década de 1960 como referência. Observou-se risco aumentado de interrupção na década de 1970 (HR = 1,36; p < 0,001) e menor risco na década de 2000 (HR = 0,52; p < 0,001). As curvas de sobrevida para o aleitamento materno são apresentadas na figura 1, na qual se destaca a menor probabilidade de uma mãe permanecer amamentando ao longo dos primeiros 12 meses de vida de seu filho na década de 1970 e maior incremento da duração no período de 2000-09.
Tabela 2 Distribuição das mulheres que amamentaram, duração mediana e risco de interrupção do aleitamento materno no primeiro ano de vida por década de nascimento do primeiro filho. Estudo Pró-Saúde, 1999 e 2011-2012
Década | na | Amamentação (n, %)b | Medianac | p25-p75 | HRd |
---|---|---|---|---|---|
1960-69 | 182 | 168 (92%) | 6 | 4-12 | 1,00 |
1970-79 | 324 | 292 (90%) | 5 | 3-8 | 1,36 (1,08-1,69) |
1980-89 | 592 | 549 (92%) | 6 | 4-10 | 1,11 (0,90-1,36) |
1990-99 | 465 | 431 (92%) | 8 | 6-13 | 0,80 (0,65-1,00) |
2000-09 | 136 | 131 (96%) | 12 | 7-19 | 0,52 (0,39-0,70) |
aTotal de mulheres que tiveram o primeiro filho, por década.
bFrequência e percentual de mulheres que relataram ter amamentado, por década.
cDuração mediana do aleitamento materno, em meses.
dRazão de Hazard. A década de 1960 é a categoria de referência.
Figura 1 Curvas de sobrevida para o tempo de aleitamento materno segundo década de nascimento do primeiro filho. Estudo Pró-Saúde, 1999 e 2011-2012.
Na tabela 3 são apresentadas as estimativas do modelo de Cox para associações entre covariáveis e o tempo de aleitamento para cada década estudada. Associações estatisticamente significativas, com a renda e a idade da mãe, concentraram-se na década de 1970. Mulheres mais idosas (3º terço) apresentaram risco de interrupção do aleitamento materno 39% maior quando comparadas com as mais jovens (1º terço). Em relação à renda domiciliar, participantes no segundo e terceiro terços (maior renda per capita) apresentaram maior risco de interrupção da amamentação na década de 1970; na década de 2000 houve uma inversão da associação, em quem mulheres do segundo terço de renda apresentaram menor risco. As mulheres que se declararam de cor preta tiveram menor risco de interrupção do aleitamento materno quando comparadas com as de cor branca nas décadas de 1960 e 1970 e quando comparadas com as de cor branca e parda na década de 1980. O tipo de parto não se associou ao risco de interrupção do aleitamento materno.
Tabela 3 Duração mediana e risco de interrupção do aleitamento materno no primeiro ano de vida por década de nascimento do primeiro filho. Estudo Pró-Saúde, 1999 e 2011-2012
Décadas | 1960 | 1970 | 1980 | 1990 | 2000 | |||||||||||||||||||
---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|
Variáveis | N | mediana | HRa | p | N | mediana | HRa | p | N | mediana | HRa | p | N | mediana | HRa | p | N | mediana | HRa | p | ||||
bIdade da mãe | ||||||||||||||||||||||||
1º terço | 63 | 8 | 1,0 | 97 | 6 | 1,0 | 162 | 6 | 1,0 | 158 | 8 | 1,0 | 51 | 12 | 1,0 | |||||||||
2º terço | 55 | 6 | 1,24 | 0,34 | 95 | 4 | 1,32 | 0,11 | 207 | 6 | 1,11 | 0,36 | 152 | 7 | 1,24 | 0,12 | 47 | 11 | 1,21 | 0,48 | ||||
3º terço | 64 | 6 | 1,34 | 0,17 | 132 | 4 | 1,39 | 0,04 | 212 | 6 | 1,02 | 0,82 | 155 | 8 | 1,22 | 0,17 | 38 | 10 | 1,22 | 0,48 | ||||
cRenda | ||||||||||||||||||||||||
1º terço | 48 | 8 | 1,0 | 88 | 6 | 1,0 | 172 | 6 | 1,0 | 127 | 8 | 1,0 | 44 | 8 | 1,0 | |||||||||
2º terço | 41 | 7 | 1,17 | 0,49 | 82 | 4 | 1,98 | 0,00 | 193 | 6 | 1,20 | 0,11 | 141 | 8 | 0,94 | 0,69 | 44 | 13 | 0,53 | 0,03 | ||||
3º terço | 40 | 6 | 1,30 | 0,26 | 82 | 5 | 1,71 | 0,00 | 127 | 6 | 1,15 | 0,25 | 111 | 8 | 1,02 | 0,85 | 42 | 10 | 0,81 | 0,44 | ||||
Parto | ||||||||||||||||||||||||
Cesárea | 19 | 6 | 1,0 | 98 | 6 | 1,0 | 332 | 6 | 1,0 | 306 | 8 | 1,0 | 114 | 11 | 1,0 | |||||||||
Normal | 147 | 6 | 0,82 | 0,57 | 209 | 5 | 0,94 | 0,69 | 244 | 6 | 0,98 | 0,88 | 155 | 8 | 0,79 | 0,07 | 22 | 13 | 0,64 | 0,22 | ||||
Cor/etnia | ||||||||||||||||||||||||
Preta | 38 | 7 | 1,0 | 80 | 6 | 1,0 | 104 | 7 | 1,0 | 62 | 7 | 1,0 | 17 | 7 | 1,0 | |||||||||
Parda | 70 | 7 | 1,36 | 0,24 | 96 | 6 | 1,15 | 0,43 | 165 | 6 | 1,49 | 0,01 | 114 | 6 | 0,90 | 0,62 | 36 | 8 | 0,79 | 0,54 | ||||
Branca | 67 | 6 | 1,66 | 0,05 | 137 | 4 | 1,66 | 0,00 | 311 | 6 | 1,45 | 0,01 | 269 | 6 | 1,10 | 0,60 | 81 | 8 | 0,79 | 0,48 |
aRazão de Hazard.
bTerços de idade da mãe (apresentados na tabela 1).
cTerços de renda familiar per capita: 1 = terço inferior de renda, 3 = terço superior de renda.
O presente estudo investigou a evolução da duração do aleitamento materno entre as décadas de 1960 e 2009 e observou inicial declínio da duração na década de 1970 em comparação com 1960 e posterior retomada nas décadas seguintes. O menor risco de interrupção foi observado no período 2000-09. A evolução da duração aqui observada não pode ser comparada de forma direta com outros estudos que avaliaram a duração ao longo dos anos em função dos métodos empregados para análise, mas seguem padrões semelhantes.5,6,9,10 Na Pesquisa Nacional de Mortalidade Infantil e Planejamento Familiar (PNMIPF)19 e Pesquisa Nacional de Demografia e Saúde (PNDS)12 foram observadas, respectivamente, durações medianas do aleitamento materno de 9 meses (1986) e 14 meses (2006), evolução similar à observada na Pesquisa Nacional de Prevalência do Aleitamento Materno (PPAM),13 feita nas capitais brasileiras em 1999 (9,8 meses) e 2008 (11,3 meses). Em São Paulo, em estudo de base hospitalar com informações relativas aos anos de 1954 a 1985, a duração mediana da amamentação era de aproximadamente 150 dias na década de 1960 e de 100 dias na década de 1970, com posterior aumento para mais de 100 dias na década seguinte.6
A menor duração do aleitamento materno observada na década de 1970, comparada com a década anterior, pode estar associada a distintos e complexos determinantes socioculturais, como a crescente inserção da mulher no mercado de trabalho e as mudanças de paradigma frente à natureza do aleitamento materno,8 constructos esses difíceis de serem mensurados com dados disponíveis em estudos. Contudo, é consensual entre os autores que estudaram esse período que esse declínio coincide com o auge das práticas de marketing e venda que ocorriam sem regulamentação por parte da indústria de alimentos no Brasil e no mundo nesse período e com a arregimentação de profissionais de saúde que estimulavam o uso de fórmulas infantis, então denominadas “substitutas do leite materno”.7-9,13,20 Vale ressaltar que o declínio na duração da amamentação nos países desenvolvidos já ocorria em período anterior (anos 1930), com resgate da prática de amamentação também após a década de 1970.21
No contexto internacional, a prevalência e a duração do aleitamento materno são menores em países desenvolvidos e, ainda assim, nos países em desenvolvimento a prevalência do aleitamento materno exclusivo é de 37%, com grandes disparidades entre as mães mais pobres e mais ricas.1 Nesse cenário desfavorável ao aleitamento materno, Rolins et al. conduziram um estudo de caso publicado no Lancet Breastfeeding Series no qual concluem que o Brasil é um dos casos de sucesso de melhorias nos padrões de amamentação devido ao envolvimento da sociedade e forte apoio e investimento do governo para a adoção de práticas como o monitoramento do código internacional, a adoção de licença maternidade paga e a implantação de uma rede de bancos de leite humano e de hospitais amigos da criança.22
Na análise dos fatores associados ao risco de interrupção do aleitamento materno destacaram-se a renda e a idade da mãe. Mães de idade mais elevada apresentaram risco maior para desmame quando comparadas com as mães mais jovens. Da mesma forma, mães no estrato de renda mais elevado apresentaram risco maior de desmame comparadas com as de menor rendimento, padrão semelhante ao encontrado em distintos grupos e países de todas as regiões: ao analisar 98 inquéritos de países em desenvolvimento, Victora et al. identificaram que, independentemente do país e da região mundial, mães pertencentes aos estratos mais pobres amamentam por mais tempo do que as mais ricas.1 De forma interessante, essas diferenças se concentraram na década de 1970, mesmo período em que foi observada menor duração do aleitamento materno. A renda mais elevada favorecia o desmame por permitir a aquisição de leites artificiais,14 em um contexto de importante influência da indústria e de desconstrução dos benefícios da amamentação natural.20 Merece destaque, entretanto, a inversão na relação entre renda e desmame observada na década de 2000, cujas mães de maior rendimento apresentaram menor risco de desmame (ainda que estatisticamente significante somente para o estrato intermediário). Essa mudança pode ser entendida como um reflexo da transformação da percepção das mães em relação à importância do aleitamento materno, fruto do esforço de movimentos pró-amamentação e da legislação que regulamentou a publicidade de leites artificiais.9,14
De fato, dados de inquéritos nacionais (1975/1989)14 já sinalizavam essa tendência. A relação entre a duração da amamentação e a renda apresentava-se inversamente associada em 1975, era quatro vezes maior em crianças de menor renda comparadas com as de maior renda. Em 1989, essa diferença diminui para menos do que o dobro e deixou de ser inversamente linear considerando todos os estratos de renda. Ademais, esse fenômeno se repete em 66 países estudados desde a década de 1990, nos quais mulheres dos quintos mais pobres amamentam por mais tempo do que as mulheres dos quintos mais ricos.22
Com relação à cor/etnia, verificou-se no presente estudo uma duração mediana do aleitamento materno menor entre mães brancas em comparação com as mães de cor preta. É possível que haja influências culturais sobre os padrões de alimentação infantil em diferentes grupos étnicos; porém, há poucas evidências a respeito e desconhecem-se como tais padrões têm se modificado e se têm sido influenciados por políticas públicas.23
Algumas limitações deste estudo devem ser destacadas. Primeiro, as informações sobre a renda domiciliar são referentes à época da entrevista, e não do nascimento do filho; entretanto, como essa renda foi categorizada em termos relativos (terços), é possível que essas posições tenham se mantido estáveis. Segundo, o menor tamanho amostral nas décadas de 1960 e 2000 reduziu o poder estatístico para detectar diferenças entre as variáveis nesses períodos; cabe notar, no entanto, que nas décadas de 1980 e 1990 o tamanho amostral foi maior e não foram observadas nesses períodos diferenças estatisticamente significativas em relação à amamentação. Quanto ao possível viés de memória, um estudo de teste-reteste sobre a duração autorrelatada do aleitamento materno foi conduzido em uma subpopulação de mulheres acompanhadas desde 1999 no EPS; a confiabilidade de curto prazo (14 dias) e de longo prazo (13 anos) foi considerada adequada, indicou que o viés de memória pode não ser importante no estudo (Robaina et al., no prelo). A validade externa do estudo pode ser questionada, mas a semelhança com a evolução dos padrões de aleitamento materno observados no nível nacional permite, ao menos, levantar hipóteses sobre a evolução do aleitamento materno desde a década de 1960.
Os resultados apresentados neste estudo mostraram a dinâmica da evolução da duração do aleitamento materno no decorrer das décadas, com menor duração na década de 1970 em relação à década anterior e subsequente aumento da duração nas décadas seguintes. Além disso, foram observadas diferenças individuais mais marcantes entre a população de mães na década de 1970. O decorrente aumento da duração do aleitamento materno nas décadas seguintes sugere que a adoção de políticas, normas e práticas em favor da promoção, proteção e apoio ao aleitamento materno, adotadas a partir da década de 1980, foram favoráveis a essa prática.