versão impressa ISSN 0066-782X
Arq. Bras. Cardiol. vol.104 no.2 São Paulo fev. 2015 Epub 28-Nov-2014
https://doi.org/10.5935/abc.20140181
O pós-condicionamento isquêmico (PCI) é um método potente utilizado para proteger o coração contra a lesão de isquemia-reperfusão (I/R). Não está claro se o PCI é eficaz quando a doença cardíaca isquêmica é acompanhada de comorbidades, tais como hipotireoidismo.
O objetivo deste estudo foi determinar o efeito do PCI sobre a lesão de I/R do miocárdio em ratos machos com hipotireoidismo.
O hipotireoidismo foi induzido pela administração de propiltiouracila em água potável na concentração de 500 mg/L durante 21 dias. Os corações de ratos controle e com hipotireoidismo foram perfundidos utilizando o aparelho de Langendorff e expostos a isquemia global por 30 minutos, seguido de reperfusão por 120 minutos. O PCI foi iniciado imediatamente após a isquemia.
O hipotireoidismo e PCI aumentaram significativamente a pressão ventricular esquerda desenvolvida (PVED) e as taxas máximas de variação positiva (+dp/dt) e negativa (–dp/dt) da pressão ventricular esquerda durante a reperfusão em ratos controle (p < 0,05). No entanto, o PCI não teve efeito aditivo no restabelecimento da PVED e das ±dp/dt em ratos com hipotireoidismo. Além disso, o hipotireoidismo diminuiu significativamente os níveis basais séricos (72,5 ± 4,2 vs. 102,8 ± 3,7 μmol/L; p < 0,05) e cardíacos (7,9 ± 1,6 vs. 18,8 ± 3,2 μmol/L; p < 0,05) de NOx. Os níveis cardíacos de NOx não se alteraram no grupo com hipotireoidismo após I/R e PCI mas foram significativamente maiores e menores (p < 0,05) nos grupos controle após I/R e PCI, respectivamente.
O hipotireoidismo protegeu o coração da lesão de I/R, o que pode ser devido à diminuição dos níveis séricos e cardíacos basais de óxido nítrico (NO) e à diminuição dos níveis de NO após I/R. No entanto, o PCI não diminuiu os níveis de NO e não conferiu proteção adicional ao grupo com hipotireoidismo.
Palavras-Chave: Pós Condicionamento Isquêmico; Reperfusão; Hipotireoidismo; Óxido Nítrico; Ratos
Ischemic postconditioning (IPost) is a method of protecting the heart against ischemia-reperfusion (IR) injury. However, the effectiveness of IPost in cases of ischemic heart disease accompanied by co-morbidities such as hypothyroidism remains unclear.
The aim of this study was to determine the effect of IPost on myocardial IR injury in hypothyroid male rats.
Propylthiouracil in drinking water (500 mg/L) was administered to male rats for 21 days to induce hypothyroidism. The hearts from control and hypothyroid rats were perfused in a Langendorff apparatus and exposed to 30 min of global ischemia, followed by 120 min of reperfusion. IPost was induced immediately following ischemia.
Hypothyroidism and IPost significantly improved the left ventricular developed pressure (LVDP) and peak rates of positive and negative changes in left ventricular pressure (±dp/dt) during reperfusion in control rats (p < 0.05). However, IPost had no add-on effect on the recovery of LVDP and ±dp/dt in hypothyroid rats. Furthermore, hypothyroidism significantly decreased the basal NO metabolite (NOx) levels of the serum (72.5 ± 4.2 vs. 102.8 ± 3.7 μmol/L; p < 0.05) and heart (7.9 ± 1.6 vs. 18.8 ± 3.2 μmol/L; p < 0.05). Heart NOx concentration in the hypothyroid groups did not change after IR and IPost, whereas these were significantly (p < 0.05) higher and lower after IR and IPost, respectively, in the control groups.
Hypothyroidism protects the heart from IR injury, which may be due to a decrease in basal nitric oxide (NO) levels in the serum and heart and a decrease in NO after IR. IPost did not decrease the NO level and did not provide further cardioprotection in the hypothyroid group.
Key words: Ischemic Postconditioning; Reperfusion; Hypothyroidism; Nitric Oxide; Rats
O infarto agudo do miocárdio (IAM) é a principal causa de mortalidade humana em todo o mundo1,2, e sua prevalência está aumentando devido ao envelhecimento da população e à presença de comorbidades, tais como obesidade, diabetes, e distúrbios da tireóide1-3. IAM é frequentemente induzido por oclusão parcial da artéria coronária no local de rompimento da placa aterosclerótica1,4. A reperfusão é capaz de impedir a morte do miocárdio isquêmico mas também pode gerar efeitos colaterais, que são denominados de lesões de isquemia-reperfusão (I/R)4. A resposta do miocárdio à isquemia pode ser modulada por diferentes intervenções, tais como o pós-condicionamento isquêmico (PCI)3,5. O PCI é um potente mecanismo de proteção do miocárdio contra lesões de I/R e é induzido por ciclos de períodos curtos de I/R realizados no início da reperfusão após a oclusão prolongada da artéria coronária3,4. Embora o PCI possa ter aplicações clínicas, atualmente a maioria dos estudos sobre PCI tem utilizado miocárdio saudável. A doença arterial coronariana frequentemente coexiste com outras morbidades5. Portanto, mais investigações em condições patológicas são necessárias antes da aplicação clínica do PCI5
O hipotireoidismo é a principal doença da glândula tireoide, afeta o coração de diferentes maneiras e também pode levar ao aumento da morbidade6. De fato, os baixos níveis dos hormônios da tireoide podem afetar a resposta do coração as lesões de I/R6. Desta forma, as intervenções cardioprotetoras, incluindo o PCI, quando usadas nos estados de hipotireoidismo, poderão ter importância clínica em estratégias futuras de monitoramento.
O óxido nítrico (NO) é produzido principalmente pela enzima NO sintase no coração saudável e desempenha um papel importante em funções cardíacas. A isquemia do coração leva a um aumento da produção de NO, o que pode contribuir para a formação de lesões de I/R. No entanto, nenhum estudo investigou as alterações nos níveis de NO em corações de ratos com hipotireoidismo. Portanto, o objetivo deste estudo foi avaliar a resposta do coração ao PCI em um modelo experimental de hipotireoidismo induzido por propiltiouracila (PTU) em ratos. Além disso, alterações nos níveis dos metabólitos de NO (NOx) após lesão de I/R e PCI também foram avaliadas.
Quarenta e oito ratos Wistar machos de 2 meses de idade foram obtidos do biotério do
Instituto de Investigação em Ciências Endócrinas da Universidade de Ciências Medicas
Shahid Beheshti. Foi estabelecido um valor α de 0,05 com duas
caudas de distribuição e poder de 90%, e o tamanho da amostra em cada grupo foi
calculado como sendo de 8 de acordo com a fórmula7: onde,
μ1, S12 e μ2,
S22 representam médias e variâncias dos dois grupos,
respectivamente e d2 = (μ1 – μ2)2. Os
ratos foram mantidos à temperatura de 22 ± 3 °C, umidade relativa de 50 ± 6% e acesso
livre à ração (Pars Co., Teerã) e água corrente durante o período do estudo, e
adaptados a um ciclo invertido de claro/escuro de 12h/12h. Todos os procedimentos
experimentais empregados, assim como o manuseio dos animais, foram realizados de
acordo com as orientações fornecidas pelo comitê de ética local do Instituto de
Investigação em Ciências Endócrinas, Universidade de Ciências Médicas Shahid
Beheshti. O hipotireoidismo foi induzido pela administração de PTU a 500 mg/L em água
potável por 21 dias5,6. Para a determinação da eficácia do tratamento
com PTU, as alterações nos níveis séricos totais de T4, T3, TSH e na atividade de
citrato sintase (CS) no músculo sóleo (método descrito por Srere e cols.8), foram avaliadas em dois grupos de animais
(controle e com hipotireoidismo). Depois de confirmar a ocorrência de
hipotireoidismo, animais do grupo controle e com hipotireoidismo foram divididos em
três subgrupos (controle, controle-I/R (C-I/R), e controle-PCI(C-PCI), e grupo com
hipotireoidismo, hipotireoidismo-I/R (H-I/R), e hipotireoidismo-PCI (H-PCI)) para
experimentos in vitro. Os níveis séricos totais de T4, T3, e TSH
foram medidos no final do período de tratamento utilizando a técnica de ELISA. Os
coeficientes de variação inter-ensaio foram de 3,2% para T4 total, T3 total, e
TSH.
Todos os ratos foram anestesiados por injeção intraperitoneal utilizando cetamina/xilazina (50 mg/kg e 10 mg/kg). Os corações de ratos controle e com hipotireoidismo foram removidos e mantidos em tampão de perfusão gelado. Após a canulação da aorta, os corações foram perfundidos no aparelho de Langendorff usando tampão de Krebs-Henseleit (118 mM de NaCl, 25 mM de NaHCO3, 4,7 mM de KCl, 1,2 mM de MgCl2, 2,5 mM de CaCl2, 1,2 mM de KH2PO4, e 11 mM de glicose) em pressão constante de 75 mmHg e pH 7,4, e a solução de Krebs-Henseleit foi oxigenada com 95% de O2 e 5% de CO2. Os corações foram estabilizados durante 20 minutos para a obtenção dos valores basais. Nos grupos C-I/R e H-I/R, após o período de estabilização, os corações foram expostos a isquemia global por 30 minutos seguido de reperfusão por 120 minutos. O PCI foi induzido utilizando seis ciclos de reperfusão por 10 segundos e isquemia por 10 segundos imediatamente apos isquemia global de 30 minutos. Um balão de látex foi inserido no ventrículo esquerdo para permitir a medição de parâmetros hemodinâmicos, incluindo a pressão ventricular esquerda desenvolvida (PVED) como índice de função sistólica, as taxas máximas de variação positiva na pressão ventricular esquerda (+dp/dt) como índice de contração, e de variação negativa na pressão ventricular esquerda (–dp/dt) como índice de relaxamento, além da pressão diastólica final do ventrículo esquerdo (PDFVE) como índice de contratura. Inicialmente, a PDFVE média foi ajustada a 5-10 mmHg em todas as amostras cardíacas através da adição de água no balão de látex. A PDFVE, PVED, e ±dp/dt foram digitalizadas através de um sistema de aquisição de dados (Power Lab, AD instrument, Austrália). Os parâmetros hemodinâmicos pós-isquemia foram avaliados pelo restabelecimento da PDFVE, PVED, e ±dp/dt e expressos em porcentagens dos valores iniciais.
Os níveis séricos e cardíacos de NOx foram medidos pelo método de Griess. Resumidamente, depois de 2 horas de reperfusão, as amostras do miocárdio do ventrículo esquerdo (VE) foram lavadas e homogeneizados em PBS (1:5, peso/volume) e centrifugadas a 15.000 g durante 20 min. O sobrenadante foi desproteinizado pela adição de sulfato de zinco (15 mg/mL). As amostras séricas também foram desproteinizadas com sulfato de zinco (15 mg/mL) e centrifugadas a 10.000 g durante 10 min. Uma alíquota de 100 μL do sobrenadante ou soro foi transferida para uma microplaca e 100 μL de cloreto de vanádio (III) (8 mg/mL) foi adicionado a cada poço da microplaca para reduzir o nitrato a nitrito, após o qual 50 μL de sulfanilamida a 2% e 50 μL de N-1-(naftil)etilenodiamina a 0,1% foram adicionados, e as microplacas foram incubadas a 37 °C durante 30 min. A absorbância foi lida a 540 nm usando um leitor de ELISA (BioTek, Powerwave XS2). A concentração de NOx foi determinada a partir do estabelecimento de uma curva padrão linear utilizando 0 a 100 μM de nitrato de sódio. Os níveis séricos e teciduais de NOx foram expressos em µmol/L. O coeficiente inter-ensaio de variação foi de 4,1%.
Todos os valores foram expressos como média ± EPM A análise estatística foi realizada utilizando o software SPSS versão 20 (SPSS, Chicago, IL, EUA). A análise de variância das medidas (ANOVA) foi utilizada para comparar os parâmetros hemodinâmicos em diferentes tempos. O teste ANOVA para um fator, juntamente com o teste post-hoc de Tukey, foi utilizado para comparar os níveis cardíacos de NOx nos diferentes grupos. O test t de Student foi utilizado para comparar os níveis séricos de NOx, T3, T4, e TSH, e a atividade de CS entre os grupos controle e com hipotireoidismo. Os valores de p < 0,05 de duas caudas foram considerados significativos.
Os níveis séricos de hormônios tireoidianos e a atividade de CS no músculo sóleo foram significativamente menores, ao passo que as concentrações de TSH foram significativamente maiores em ratos com hipotireoidismo. Além disso, as variações de peso foram significativamente menores nos ratos com hipotireoidismo (Tabela 1).
Tabela 1 Características de ratos controle e com hipotireoidismo
Controle (n = 8) | Ratos com hipotireoidismo (n = 8) | |
---|---|---|
Variação de peso (g) | 20.3 ± 3.2 | 8.1 ± 3.5 * |
T3 (nmol/L) | 0.76 ± 0.06 | 0.20 ± 0.04 * |
T4 (nmol/L) | 49.43 ± 2.34 | 17.65 ± 3.42 * |
TSH (ng/mL) | 6.8 ± 0.6 | 29.62 ± 3.7 * |
Atividade de citrato sintase (µmol/ml/min) | 1.2 ± 0.3 | 0.45 ± 0.01 * |
Os dados representam média ± EPM .
*p < 0.05.
Os parâmetros hemodinâmicos basais foram significativamente menores no grupo com hipotireoidismo em comparação ao grupo controle (Tabela 2). Após a indução isquêmica pela interrupção da perfusão coronária, PVED, ±dp/dt, e a frequência cardíaca rapidamente diminuíram e atingiram níveis basais nos corações isolados.
Tabela 2 Função cardíaca no período de estabilização (dados basais)
Controle (n = 8) | Ratos com hipotireoidismo (n = 8) | |
---|---|---|
PDFVE (mmHg) | 8.5 ± 2.2 | 8.8 ± 2.8 |
PVED (mmHg) | 96.8 ± 7.6 | 74.0 ± 6.3 * |
+dp/dt (mmHg/s) | 3135 ± 211 | 2352 ± 434 * |
–dp/dt (mmHg/s) | 2215 ± 185 | 1684 ± 124 * |
Frequência cardíaca (pulso/min) | 283.3 ± 10.4 | 170.2 ± 11.3 * |
Média ± ERM. PDFVE: Pressão diastólica final do ventrículo esquerdo; PVED: Pressão ventricular esquerda desenvolvida: Taxas máximas de variação positiva e negativa na pressão ventricular esquerda (±dp/dt);
*p < 0.05.
A PVED e ±dp/dt se restabeleceram significativamente no grupo H-I/R em comparação com o grupo C-I/R após isquemia de 30 min e reperfusão de 120 min. O PCI aumentou significativamente a PVED e ±dp/dt durante a reperfusão no grupo C-PCI mas não melhorou o restabelecimento destes dois parâmetros no grupo H-PCI (Figura 1). Durante a isquemia de 30 minutos, o grupo com hipotireoidismo apresentou uma diminuição significativa da PDFVE, em comparação ao grupo controle. Além disso, o PCI preveniu significativamente o aumento na PDFVE induzido pela reperfusão no grupo C-PCI (Figura 2).
Figura 1 Recuperação da função cardíaca após a lesão de I/R. A) Pressão ventricular esquerda desenvolvida (PVED); B) Taxas máximas de variações positivas na pressão ventricular esquerda (+dp/dt); C) Taxas máximas de variações negativas na pressão ventricular esquerda (-dp/dt); D) Frequência cardíaca; Controle-I/R, C-I/R; Controle-PCI, C-PCI; Hipotireoidismo-I/R, H-I/R; Hipotireoidismo PCI, H-PCI. Os valores representam média ± EPM; (N = 8 animais). *p < 0,05 quando comparado ao grupo C-I/R.
Figura 2 Variação de PDFVE (contratura isquêmica) durante o experimento. Pressão diastólica final do ventrículo esquerdo (PDFVE). Os valores representam média ± EPM, (N = 8 animais); *p < 0,05 quando comparado ao grupo C-I/R. Controle-I/R, C-I/R; Controle-PCI, C-PCI; Hipotireoidismo-I/R, H-I/R; Hipotireoidismo PCI, H-PCI. Os valores representam média ± EPM, (N = 8 animais); *p < 0,05 quando comparado ao grupo C-I/R.
Os níveis séricos e cardíacos de NOx foram significativamente menores no grupo com hipotireoidismo, em comparação ao grupo controle. I/R e PCI não tiveram efeito sobre os níveis cardíacos de NOx no grupo com hipotireoidismo, ao passo que I/R induziu um aumento acentuado nos níveis cardíacos de NOx e PCI retardou significativamente o aumento nos níveis cardíacos de NOx induzido por I/R no grupo controle (Figura 3).
Figura 3 Variação nos níveis cardíacos (acima) e séricos (abaixo) de NOx nos grupos controle e com hipotireoidismo. Controle-I/R, C-I/R; Controle-PCI, C-PCI; Hipotireoidismo-I/R, H-I/R; Hipotireoidismo-PCI, H-PCI. Os valores representam média ± EPM, (N = 8 animais); *p < 0,05 quando comparado ao grupo controle. #p < 0,05 em comparação ao grupo C-I/R.
Nossos resultados indicaram que o hipotireoidismo é capaz de reduzir as lesões induzidas por I/R no coração de ratos, o que pode ser devido à diminuição nos níveis de NO. O PCI teve efeitos protetores contra a lesão de I/R em ratos controle mas não teve nenhum efeito aditivo em ratos com hipotireoidismo.
A diminuição na variação de peso e na atividade de CS no músculo sóleo, e a diminuição dos níveis séricos dos hormônios da tireoide e aumento dos níveis de TSH, indicaram que a indução do hipotireoidismo foi realizada com sucesso.
Os valores basais da PDFVE, PVED, e ±dp/dt foram menores no grupo com hipotireoidismo, em comparação com o grupo controle, e estes resultados são compatíveis com os de estudos anteriores5,6,9,10. Várias alterações, incluindo o aumento da expressão de fosfolamban e isomiosina V3 e a diminuição na expressão de Ca2+ ATPase no retículo sarcoplasmático e do receptor de rianodina, ocorrem no coração de ratos com hipotireoidismo e, portanto, o hipotireoidismo frequentemente resulta em disfunções cardíacas5,6,9,10. Em resposta ao I/R, o grupo com hipotireoidismo recuperou a PDFVE, PVED, e ±dp/dt, um resultado que demonstra que o hipotireoidismo pode proteger o coração contra lesões de I/R, e este resultado é suportado por outros estudos6,11.
Os mecanismos de proteção cardíaca contra I/R no hipotireoidismo não foram totalmente elucidados e esta proteção pode ser devido a alterações metabólicas6,12. Já foi relatado que os níveis de ATP, oxigênio, e glicogênio em ratos com hipotireoidismo diminuem lentamente durante a isquemia e aumentam no início da reperfusão6,11-13. Por outro lado, foi mostrado que os corações de ratos com hipertireoidismo, apesar de apresentarem metabolismo elevado, podem ser protegidos contra lesões de I/R, e assim a tolerância conferida pelo hipotireoidismo às lesões de I/R não pode ser explicada apenas com base na diminuição do metabolismo durante a isquemia14.
As diferentes vias moleculares, incluindo proteínas quinases c-Jun N-terminal, proteínas quinases ativadas por mitógeno, e NO podem desempenhar um papel essencial na resposta do coração à lesões de I/R6,15,16. Nossos resultados mostraram que o níveis séricos e cardíacos basais de NOx foram menores nos grupos com hipotireoidismo. Além disso, os níveis de NOx aumentaram após I/R no grupo controle mas não no grupo com hipotireoidismo. A diminuição nos níveis de NOx no coração de fetos de ratos com hipotireoidismo foi previamente relatada17, com base na qual aparentemente os baixos níveis de NOx durante o período experimental podem ter sido um importante fator de cardioproteção induzida pelo hipotireoidismo.
A função do NO em lesão miocárdica de I/R não foi completamente elucidada e é uma questão muito complexa. Alguns estudos têm demonstrado um papel protetor do NO, enquanto outros relataram um efeito prejudicial18-20. Estudos experimentais recentes indicaram que os níveis de NO são próximos aos níveis basais em tecido cardíaco mas aumentam durante a isquemia porque a síntese enzimática de NO (através da NO sintase 3) e não enzimática (através da acidose tecidual) aumenta durante a isquemia. Apesar de um pequeno aumento nos níveis de NO poder ser cardioprotetor, um aumento maior pode ser prejudicial19,21-25. O efeito prejudicial de NO no coração em resposta a I/R é mediada por peroxinitrito18. Quando os seus níveis aumentam, o NO reage com o superóxido e produz peroxinitrito, que é mais tóxico e pode provocar apoptose em células cardíacas. Desta forma, pode-se supor que o hipotireoidismo protege o coração isquêmico através da diminuição da produção de NO e consequente diminuição do estresse nitro-oxidativo18-28.
Em nosso estudo, o PCI protegeu o coração contra a lesão de I/R no grupo C-PCI através do restabelecimento da PDFVE, PVED, e ±dp/dt, mas não teve efeito significativo no grupo H-PCI, o que demonstra que o PCI pode perder a sua eficácia no grupo com hipotireoidismo. Os resultados do presente estudo foram semelhantes aos de estudos anteriores utilizando ratos diabéticos, que mostraram que o pré-condicionamento e PCI perderam seus efeitos protetores contra as lesões de I/R nos corações destes ratos4,29.
A possibilidade dos mecanismos subjacentes ao PCI não estarem operantes no miocárdio não saudável ainda precisa ser esclarecida. Estudos anteriores têm indicado que o PCI e o pré-condicionamento protegem o coração de ratos saudáveis de lesões de I/R pela diminuição dos níveis cardíacos de NO após o período de isquemia18,31. Da mesma forma, no nosso estudo, 6 ciclos de PCI diminuíram significativamente os níveis cardíacos de NOx após 30 minutos de isquemia no grupo C-PCI, mas esta diminuição não foi observada no grupo H-PCI. Além disso, o PCI não causou nenhuma diminuição adicional dos níveis de NOx no coração dos animais com hipotireoidismo. Estes resultados demonstraram a ineficiência do PCI em garantir proteção adicional contra lesões de I/R no grupo com hipotireoidismo. Tanto o PCI quanto o hipotireoidismo reduziram os níveis de NOx em resposta a I/R e protegeram o coração contra lesão de I/R, indicando que o NOx é um componente crítico de proteção conferida pelo PCI e hipotireoidismo.
Uma das limitações do estudo é que não medimos a atividade da NO sintase, que pode ter um papel importante na cardioproteção proporcionada pelo PCI em ratos com hipotireoidismo18,32. Além disso, nossos resultados são limitados a ratos machos, embora o hipotireoidismo seja mais prevalente no sexo feminino33.
O hipotireoidismo restabeleceu a PDFVE, PVED, e ±dp/dt após a I/R no coração de ratos, o que pode ser devido à diminuição dos níveis de NOx e NOx após o período de I/R. Apesar do PCI proporcionar proteção por si só, esta variável não esteve associada a diminuição mais pronunciada dos níveis de NOx e não proporcionou proteção adicional ao grupo com hipotireoidismo. O efeito protetor abolido após o PCI no grupo com hipotireoidismo pode estar relacionado ao comprometimento das vias do NO.