versão On-line ISSN 1678-4464
Cad. Saúde Pública vol.34 no.3 Rio de Janeiro 2018 Epub 08-Mar-2018
http://dx.doi.org/10.1590/0102-311x00006617
La exposición a contaminantes del aire, que suelen ser cuantificados por agencias ambientales que no están presentes en todos los estados, puede estar asociada a internamientos por enfermedades respiratorias de niños. Se desarrolló un estudio ecológico de series temporales con datos referentes a los internamientos por algunas enfermedades respiratorias de niños menores de 10 años de edad, en 2012, en la ciudad de Cuiabá, Mato Grosso, Brasil. Los niveles medios de material particulado fino (PM2,5) se estimaron mediante un modelo matemático, los datos de temperatura mínima y humedad relativa del aire se obtuvieron del Instituto Nacional de Meteorología, y el número de focos de incendios del Sistema de Información Ambiental. El enfoque estadístico usó el modelo aditivo generalizado de la regresión de Poisson con desfases de 0 a 7 días. Se estimaron los costes financieros y aumentos del número de internamientos derivados de elevaciones de PM2,5. Fueron 565 internamientos (media de 1,54/día; DE = 1,52) y concentración de PM2,5 de 15,7µg/m3 (DE = 3,2). Se encontraron asociaciones entre exposición e internamientos en el segundo semestre, en los lags 2 y 3, y cuando se analizó todo el año, en el lag 2. Una elevación de 5µg/m3 del PM2,5 implicó el aumento de 89 internamientos y costes por encima de los BRL 95 mil para el Sistema Único de Salud. Los datos estimados por el modelo matemático pueden ser utilizados en lugares, donde no existe un monitoreo de contaminantes.
Palabras-clave: Contaminantes Atmosféricos; Material Particulado; Enfermedades Respiratorias; Salud del Niño; Modelos Matemáticos
Doenças respiratórias foram responsáveis por quase 421 mil internações de crianças entre 0 e 10 anos no Brasil, gerando custos para o Sistema Único de Saúde (SUS) de R$ 85 milhões (≈ US$ 34 milhões); cerca de 6.600 internações ocorreram no Estado de Mato Grosso, gerando custos acima dos R$ 4,65 milhões (≈ US$ 1,86 milhão) no ano de 2012 (Departamento de Informática do SUS. http://tabnet.datasus.gov.br/cgi/tabcgi.exe?sih/cnv/nrmt.def, acessado em 03/Jun/2016).
Estudos têm avaliado os efeitos adversos de poluentes do ar sobre a saúde da população, incluindo taxas de mortalidade, de internação e atendimentos emergenciais por doenças respiratórias, sendo que os níveis de poluição do ar, geralmente representados pelas concentrações de PM10, PM2,5, NO2, SO2 e O3, estão associados com o aumento destes eventos 1,2,3,4,5. Arbex et al. 6 discutem as fontes principais desses poluentes, bem como os efeitos no aparelho respiratório. Também há estudos que têm sido publicados no Brasil 7,8,9,10 que apontam as queimadas como possíveis responsáveis por danos à saúde.
O material particulado é uma mistura de partículas líquidas e sólidas em suspensão no ar cuja composição e tamanho dependem das fontes de emissão 11. Pode ser dividido em dois grupos: partículas entre 2,5 e 10μm de diâmetro chamado tipo grosseiro (coarse mode) e partículas com diâmetro menor que 2,5μm chamado particulado fino (fine mode) 11. A importância do material particulado fino é que este se mantém mais tempo em suspensão, pode ser levado a maiores distâncias de sua fonte de origem e, pelo seu diâmetro, atingir porções mais profundas do aparelho respiratório 12.
Os poluentes costumam ser quantificados por estações medidoras de agências ambientais estaduais. No entanto, não são todos os estados que têm agências ambientais, como é o caso do Mato Grosso e sua capital Cuiabá. Uma opção seria o uso de modelos matemáticos que estimam as concentrações dos poluentes do ar como o modelo Chemical Coupled Aerosol and Tracer Transport model to the Brazilian developments on the Regional Atmospheric Modelling System (CCATT-BRAMS), que considera a dinâmica atmosférica. É um sistema de monitoramento operacional em tempo real que utiliza o modelo de transporte. Esse modelo é usado operacionalmente pelo Centro de Previsão de Tempo e Estudos Climáticos do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (CPTEC/INPE) em uma base operacional. Suas estimativas das concentrações de PM2,5 ocorrem a cada três horas, resultando em oito estimativas feitas pelo modelo a 40m de altura do solo, e com resolução de 25x25km 13,14. Aplicações recentes de dados estimados pelo CCATT-BRAMS em estudos epidemiológicos estão em estudos de César et al. 15,16, Silva et al. 17, Nascimento et al. 18 e Carmo et al. 19.
O objetivo deste trabalho foi identificar os efeitos da exposição ao material particulado fino nas internações por doenças respiratórias em crianças de Cuiabá, estado da Região Amazônica com elevado número de focos de queimadas e que não conta com agência ambiental, utilizando dados estimados pelo modelo matemático CCATT-BRAMS.
Cuiabá tem população de cerca de 600 mil habitantes (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. http://cidades.ibge.gov.br/xtras/perfil.php?codmun=51034021, acessado em 03/Nov/2015). Está situada nas coordenadas 15º36’ S e 56º06’ O, com clima tropical. O clima é muito seco e as frentes frias inibem as formações de chuvas, o que faz com que ocorram constantes queimadas. Segundo o Instituto Nacional de Meteorologia (INMET), as temperaturas médias giram ao redor dos 26ºC e no inverno pode cair abaixo dos 10ºC devido às frentes frias provenientes do sul do continente; este fato pode aumentar a ocorrência de doenças respiratórias. Cuiabá apresenta um Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) de 0,785 e conta com 17 hospitais privados e 11 hospitais que atendem ao SUS, que disponibilizam cerca de 1.400 leitos para internação (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. http://cidades.ibge.gov.br/xtras/perfil.php?codmun=51034021, acessado em 03/Nov/2015).
Os níveis de poluição presentes em Cuiabá têm origem nas emissões das indústrias instaladas na região, pela frota de veículos que supera os 400 mil e pelo número de focos de queimadas.
Foi desenvolvido um estudo ecológico de série temporal com dados relativos a internações, que foram obtidos do Departamento de Informática do SUS (DATASUS. http://tabnet.datasus.gov.br/cgi/deftohtm.exe?sih/cnv/nrmt.def, acessado em 03/Jun/2016), referentes às doenças respiratórias traqueíte e laringite (Classificação Internacional de Doenças, 10ª revisão - CID-10: códigos J04.0-J04.9), pneumonias (J12.0-J18.9), bronquite e bronquiolite (J20.0-J21.9) e asma (J45.0-J45.9), em crianças de ambos os sexos com idades até dez anos e residentes em Cuiabá. O período de estudo foi de 1º de janeiro de 2012 a 31 de dezembro de 2012, sendo recuperados dados de internações para os meses de novembro e dezembro de 2012, pesquisando as informações dos meses de janeiro e fevereiro de 2013; estes dados de internação compuseram uma série temporal de todos os dias do ano de 2012, juntamente com as informações das concentrações do material particulado fino (PM2,5) estimadas pelo modelo CCATT-BRAMS (CPTEC-INPE). Os dados diários de queimadas foram obtidos do Sistema de Informações Ambientais (SISAM), e as informações sobre umidade relativa do ar e temperatura mínima do ar foram fornecidas pelo INMET, com agência em Cuiabá.
O número diário de internações hospitalares pelas doenças respiratórias foi a variável dependente e as concentrações médias diárias de material particulado fino, estimadas pelo modelo CCATT-BRAMS, foram a variável independente. Os dias da semana, feriados, número de dias transcorridos desde o início do período, média diária de temperatura e média diária da umidade relativa do ar foram introduzidos como variáveis de controle nos modelos.
Foram calculadas as médias diárias, com os respectivos desvios padrão (DP), valores mínimos e máximos das concentrações do poluente PM2,5, quantificado em µg/m3, das internações, temperatura, umidade relativa do ar e dos focos de queimada para o primeiro semestre, para o segundo semestre e para o ano todo, e apresentados em tabela.
As contagens diárias das internações de crianças foram modeladas separadamente em regressões de Poisson. Para estimar a associação existente entre as variações diárias nas concentrações de material particulado fino e os totais diários de internações hospitalares pelas doenças respiratórias, foram utilizados modelos aditivos generalizados que permitem que efeitos não lineares sejam ajustados de forma adequada usando-se funções não paramétricas, sendo neste estudo as funções splines, que suavizam as curvas de análise. Assumiu-se uma relação linear entre internações hospitalares e o material particulado fino. Para esse grupo etário, estimou-se o impacto dos níveis de material particulado nas internações em dois períodos distintos: primeiro semestre, com o menor número de queimadas, e o segundo semestre, período com o maior número de queimadas, e também considerado o ano todo. Foram incluídas no modelo, como variáveis explicativas, a sazonalidade de curta duração (dias da semana) e sazonalidade de longa duração (número de dias transcorridos).
Os efeitos adversos da exposição à poluição atmosférica apresentam, aparentemente, um comportamento defasado em relação ao período de exposição ao poluente atmosférico, mas não há um consenso quanto ao tamanho desta janela. Isso significa que as internações em um dado dia podem estar associadas tanto à poluição do referido dia como também à poluição de dias anteriores, optando-se por utilizar modelos com defasagens de até 7 dias após a exposição ao poluente. Os coeficientes fornecidos pela regressão de Poisson foram convertidos em riscos relativos (RR); para estimar um excesso de internação devido à exposição ao PM2,5 foram considerados aumentos de 5μg/m3 na exposição a este poluente; foi estimado o aumento percentual (AP) do risco para internação segundo a expressão AP = [(exp(β*5) - 1)*100], em que β é o valor do coeficiente fornecido pelo modelo; e calculada a razão atribuível proporcional (RAP) segundo a expressão:
Com esse valor, foi estimada a fração atribuível populacional (FAP) que permitiu avaliar o número de internações associado a este aumento, segundo a expressão FAP = RAP*N, em que N é o número de internações de crianças com doenças respiratórias no período estudado. Foi estimado o custo para o SUS, segundo o valor médio de cada internação para essas doenças obtidos do DATASUS, e que poderia ser evitado com a diminuição das concentrações de PM2,5. Todas as análises foram realizadas por meio do programa estatístico Statistica v.7 (Statsoft Inc.; http://www.statsoft.com). O nível de significância adotado foi de 5%.
Durante o período estudado foram registradas 565 internações de crianças com até dez anos de idade, sendo a média diária de 1,54 (DP = 1,52) e variando de 0 a 10 internações.
As concentrações médias de PM2,5 foram significativamente maiores no segundo semestre (17,1µg/m3, DP = 3,6) do que no primeiro (14,1µg/m3, DP = 1,8), possivelmente pelo número maior de focos de queimadas no segundo semestre (295), comparado com os do primeiro semestre (6); no entanto, o número de internações foi muito semelhante, 290 no primeiro semestre e 275 no segundo; a concentração média anual de PM2,5 foi 15,7µg/m3 (DP = 3,2) com concentrações diferentes entre os semestres (valor de p < 0,05) (Tabela 1); o mês com o maior número de focos foi setembro com 247 e o máximo de 62 focos em um único dia.
Tabela 1 Valores médios com os respectivos desvios padrão (DP), mínimo e máximo do número de internações, material particulado fino (PM2,5), temperatura mínima e umidade relativa do ar. Cuiabá, Mato Grosso, Brasil, 2012.
Média (DP) | Mínimo-Máximo | |
---|---|---|
Internação | ||
Primeiro semestre | 1,6 (1,7) | 0-10 |
Segundo semestre | 1,5 (1,4) | 0-6 |
Ano todo | 1,5 (1,5) | 0-10 |
PM2,5 (μg/m3) | ||
Primeiro semestre | 14,1 (1,8) | 12,0-26,8 |
Segundo semestre | 17,0 (3,6) | 12,5-28,3 |
Ano todo | 15,6 (3,2) | 12,0-28,3 |
Temperatura mínima (ºC) | ||
Primeiro semestre | 21,0 (2,4) | 12,6-24,6 |
Segundo semestre | 20,2 (3,6) | 9,0-27,8 |
Ano todo | 20,6 (3,1) | 9,0-27,8 |
Umidade relativa do ar (%) | ||
Primeiro semestre | 78,9 (7,3) | 62,3-96,0 |
Segundo semestre | 61,9 (13,3) | 35,0-89,8 |
Ano todo | 70,4 (13,7) | 35,0-96,0 |
Nos dados das concentrações dos poluentes obtidos do CCATT-BRAMS houve vinte dias sem valores de estimação para o PM2,5, (5,5% do período analisado), e em nove dias (2,5%) as concentrações médias de PM2,5 apresentaram valores acima do limite considerado como tolerável para a saúde (25µg/m3), sendo que a maioria destes eventos ocorreu no segundo semestre.
Os valores dos coeficientes referentes à exposição ao material particulado, fornecidos pela regressão de Poisson, para o primeiro semestre, para o segundo e para o ano todo são mostrados na Tabela 2.
Tabela 2 Valores dos coeficientes referentes à exposição ao material particulado, fornecidos pela regressão de Poisson, para o primeiro semestre, para o segundo semestre e para o ano todo. Cuiabá, Mato Grosso, Brasil, 2012.
Lag | Primeiro semestre | Segundo semestre | Ano todo |
---|---|---|---|
0 | -0,04415 (0,03789) | 0,02773 (0,01859) | 0,00906 (0,01525) |
1 | -0,05908 (0,03805) | 0,01932 (0,01871) | 0,01407 (0,01512) |
2 | -0,02072 (0,03779) | 0,06201 (0,01757) | 0,03430 (0,01446) |
3 | -0,01099 (0,03865) | 0.03729 (0.01773) | 0,02780 (0,01479) |
4 | 0,00166 (0,03647) | -0,01718 (0,01906) | 0,00171 (0,01589) |
5 | 0,00557 (0,04181) | -0,00121 (0,01920) | 0,01273 (0,01643) |
6 | -0,02107 (0,04324) | 0,03359 (0,01876) | 0,02304 (0,01579) |
7 | -0,01509 (0,04036) | 0,01662 (0,01871) | 0,01921 (0,01565) |
Nota: os valores em negrito representam valor de p < 0,05.
A exposição ao material particulado fino esteve associada significativamente (valor de p < 0,05) às internações no segundo semestre (lag 2 e lag 3) e quando analisado o ano todo, no lag 2. Esses coeficientes transformados em RR com os respectivos intervalos de 95% de confiança (IC95%) foram RR = 1,064 (1,028-1,101), RR = 1,038 (1,003-1,075) e RR = 1,035 (1,006-1,065) para os lags 2 e 3 do segundo semestre e para o lag 2 do ano todo, respectivamente.
A Figura 1 mostra o AP para as internações no primeiro semestre, segundo semestre e ano todo.
Considerando-se a análise do ano todo, uma diminuição de 5μg/m3 nas concentrações do material particulado fino implicaria uma diminuição de 89 internações; se considerarmos isoladamente o segundo semestre, a redução seria de 73 internações. A redução dessas 89 internações poderia diminuir as despesas com o SUS, considerando um custo médio da ordem de R$ 1.065,00, em até R$ 95 mil (≈ US$ 38 mil).
São poucos os estudos realizados com dados de Cuiabá sobre os efeitos da exposição aos poluentes do ar nas internações por doenças respiratórias em crianças com até dez anos; as doenças selecionadas neste trabalho correspondem à cerca de 80% de todas as internações por doenças respiratórias nesta faixa etária (DATASUS. http://tabnet.datasus.gov.br/cgi/deftohtm.exe?sih/cnv/nrmt.def, acessado em 03/Jun/2016). Neste estudo, foi identificada associação significativa entre a exposição ao PM2,5 e as internações.
A utilização de dados estimados pelo modelo CCATT-BRAMS está descrita em alguns estudos, como o de Silva et al. 17, realizado, também, em Cuiabá. Esses autores encontraram associação entre a exposição ao PM2,5 e internações nos lags (1, 2 e 5) para o ano todo, e nos lags (1, 5 e 6) no período seco (segundo semestre), em função do aumento de 10µg/m3 deste poluente. Os valores médios de concentração do PM2,5 do estudo desses autores foram 7,5µg/m3 e 11,9µg/m3 para as médias anual e no segundo semestre, sendo que no nosso estudo foram bem mais altos: 15,67µg/m3 e 17,03µg/m3.
Em outro trabalho realizado em Mato Grosso 20, utilizando as estimativas do modelo CCATT-BRAMS sobre o efeito da exposição ao PM2,5 e a ocorrência de doenças respiratórias em crianças e idosos, foi possível encontrar associações significativas entre a ocorrência de internações por doenças respiratórias e o percentual de horas críticas anuais de material particulado menor que 2,5 micra.
Em Taubaté, localizado no Vale do Paraíba paulista, foi identificada associação entre a exposição ao material particulado fino PM2,5 e as internações por pneumonia e asma, no mesmo período, mas em crianças com até dez anos de idade 15; os valores de risco relativo de internação foram significativos para os lags (0 e 2-5) e foi estimado um aumento percentual do risco de internação entre 20% e 38% com um aumento de 5µg/m3 na concentração do PM2,5, com consequente aumento de 38 internações.
Em Piracicaba, importante polo sucro-alcooleiro do Estado de São Paulo, foi identificada a associação entre exposição ao PM2,5 e internações por doenças respiratórias em crianças nessa mesma faixa etária 16. Os valores dos RR significativos foram 1,008 para o lag 1 e 1,009 para o lag 3. O incremento de 10μg/m3 nas concentrações de PM2,5 implicou um aumento no RR entre 7,9 e 8,6 pontos percentuais.
Em Volta Redonda (Rio de Janeiro), com análise de dados de internação hospitalar por pneumonia, bronquite aguda, bronquiolite e asma, segundo dados diários de concentrações de PM2,5, também estimados pelo CCATT-BRAMS, as exposições estavam associadas significativamente nos lag 2 (RR = 1,017), lag 5 (RR = 1,022) e lag 7 (RR = 1,020) 18; a concentração média de PM2,5 encontrada no estudo de Volta Redonda foi de 17,2μg/m3. A redução em 5μg/m3 na concentração de PM2,5 poderia reduzir em até 76 casos as internações, com diminuição nos gastos de R$ 84 mil/ano (≈ US$ 33 mil) 18.
Diferenças nos valores dos riscos relativos para internações segundo exposição ao material particulado fino podem ser devidas não só às concentrações encontradas nos estudos anteriormente citados, bem como na composição do material absorvido no particulado que é diferente segundo área urbana ou região de queimadas na Região Amazônica. Em áreas urbanas há altas concentrações de metais como Cr, Co, Zn, Ni e Cu e íons como SO4 -2, NO3 - e NH+4; na Região Amazônica o black carbon (BC) é o principal componente do PM2,5, sendo que a fração iônica corresponde a 20% do PM2,5 representado por Cl-, SO4 -2, K+10.
Em um estudo realizado em 26 cidades americanas 21, para os anos 2000-2003, foi encontrado um aumento de 2,07% (IC95%: 1,20-2,95) nas internações respiratórias, quando se considerava um incremento de 10μg/m3 na concentração média de PM2,5 de dois dias. Esse resultado sugere que partículas provenientes de fontes de combustão industriais e tráfego podem, em média, ter maior toxicidade 21. Em Pequim (China), com dados de 2007 a 2012, os resultados mostraram elevado número de correlação da concentração de partículas finas com o número de pacientes atendidos por doenças respiratórias nos ambulatórios, e que as partículas finas menores tinham efeitos mais evidentes na doença do sistema respiratório do que as partículas maiores 22.
Em uma revisão com 1.628 estudos desenvolvidos em cidades latino-americanas 23, foram selecionados nove para a análise qualitativa e sete para as análises quantitativas. Nessa revisão, para o aumento de 10μg/m3 nas concentrações diárias de PM2,5 foi associado, significativamente, o aumento do risco de mortalidade respiratória em todas as idades (RR estudado = 1,02, IC95%: 1,02-1,02), sendo que os autores concluem que a exposição em curto prazo a PM2,5 em cidades da América Latina está significativamente associada ao aumento do risco de mortalidade respiratória. Essa revisão mostra que estudos envolvendo material particulado fino ainda são poucos 23.
Este trabalho tem limitações, uma delas é que no artigo foi estudado só o poluente PM2,5, sem ajuste por outros poluentes como O3, NO2, SO2 e CO. Outra possível limitação pode residir no fato de ser o particulado fino estimado por modelagem matemática; quanto a esta observação, há forte correlação (r ≈ 0,84) entre os dados estimados e observados experimentalmente 20. Também não foi considerada a força dos ventos no local de estudo, que poderiam diluir as concentrações dos poluentes, ou potenciar as mesmas, trazendo poluentes de regiões próximas a Cuiabá, o que sem dúvida influenciaria o número de internações por doenças respiratórias.
Outra possível limitação é que, embora os dados das internações tenham sido obtidos de uma fonte oficial (DATASUS) costumeiramente utilizada, eles podem conter erros diagnósticos, além de não oferecer informação sobre o estado nutricional das crianças, seu histórico médico, condição de moradia, se é fumante passivo, entre outras que podem estar associadas às doenças respiratórias. Também não foi possível obter informação sobre a circulação de vírus sincicial respiratório. Os dados de internação referem-se somente àqueles ocorridos na rede pública, excluindo as internações de caráter privado ou por planos ou operadoras de saúde. Há que apontar que a fonte utilizada presta-se principalmente para fins contábeis. Também não é possível saber se quem foi exposto foi internado ou se quem foi internado foi pela exposição ao particulado fino. O trabalho indica uma associação e não uma causalidade.
Mesmo considerando essas limitações, foi possível encontrar associação entre a poluição e as internações por doenças respiratórias, em que a exposição ao PM2,5 representou um fator de risco para doenças respiratórias. Também é importante destacar a importância da utilização do modelo CCATT-BRAMS, que permitiu o desenvolvimento do estudo em local sem estação medidora e sua aplicabilidade em outros municípios sem estações ambientais medidoras de poluição do ar.
Os resultados apresentados mostram que durante o período de poucas chuvas, correspondente ao segundo semestre, os riscos de internações por doenças respiratórias são significativamente maiores e permitem ao gestor de saúde desenvolver ou implantar políticas públicas para a redução das concentrações deste poluente com redução dos custos, tanto social para os familiares, como financeiros para o SUS, bem como estar preparados para um possível aumento da demanda nos ambulatórios e prontos-socorros da cidade.