versão impressa ISSN 1806-3713versão On-line ISSN 1806-3756
J. bras. pneumol. vol.43 no.3 São Paulo mai./jun. 2017
http://dx.doi.org/10.1590/s1806-37562016000000144
A cana-de-açúcar, Saccharum officinarum, é amplamente cultivada no Brasil para a produção de etanol e açúcar, sendo essencial à economia do país.1,2 Sua colheita, quando realizada de forma manual, é precedida por queima dos canaviais para retirar as folhas secas, facilitar o corte e reduzir o risco de animais peçonhentos.3-7
A combustão da cana-de-açúcar libera grande quantidade de material particulado (MP), além de gases, como ozônio, monóxido de carbono, óxido nítrico, óxido de enxofre, formaldeídos, benzopireno e hidrocarbonetos policíclicos aromáticos,6-8 que contribuem para a poluição atmosférica e repercutem negativamente na saúde humana.2,9,10
O MP e os compostos tóxicos gerados na queima são nocivos ao trato respiratório, pois ao serem inalados e depositarem-se nas vias aéreas inferiores, são fagocitados por macrófagos alveolares, que liberam citocinas citotóxicas gerando inflamação.4,8 O estresse causado pela fumaça pode desencadear uma série de reações celulares com o objetivo de alcançar um estado de estabilidade; porém, quando esse estresse é crônico, provoca lesão celular irreversível.11 O MP grosso presente na fumaça lesiona as vias áreas superiores por serem diretamente expostas ao meio externo, enquanto o MP fino se acumula nos brônquios e bronquíolos levando a lesão permanente e fibrose.12,13 Estruturas alveolares são susceptíveis às respostas de natureza inflamatória e podem gerar reações patológicas com consequências obstrutivas e restritivas,11,12,14-16 em geral associadas ao processo de remodelamento tissular.14
Embora conhecidos os riscos gerados pela exposição à fumaça, como a do tabaco ou da queima de combustíveis fósseis, há escassez de trabalhos correlacionados ao tema. Assim, o objetivo da presente investigação foi utilizar um modelo experimental para avaliar os efeitos da exposição à fumaça resultante da queima da cana-de-açúcar sobre mecanismos inflamatórios no tecido traqueal e no parênquima pulmonar, em diferentes períodos de exposição.
Estudo experimental, randomizado e não cego. No estudo, 28 ratos machos Wistar, pesando 250-300 g, foram mantidos sob temperaturas variando de 25-28°C, com ciclo claro/escuro de 12 h, em caixas forradas com serragem e com livre acesso a ração e água filtrada. Os animais foram divididos em quatro grupos: grupo controle (GC), com 4 animais, que ficou sob condições padrão de laboratório por 24 h, e três grupos exposição, com 8 animais cada, correspondendo aos grupos de animais que foram submetidos à inalação de fumaça da queima da palha da cana-de-açúcar por períodos consecutivos de 1, 7 e 21 dias, respectivamente, denominados GE1, GE7 e GE21. Para esse fim, confeccionou-se uma câmara de combustão com um dispositivo portátil com exaustor de ar, onde foram queimadas 200 g de palha da cana-de-açúcar, gerando um fluxo contínuo de fumaça que foi canalizada através de uma tubulação para as gaiolas dos ratos dos grupos experimentais por um período de 2 h, diariamente e no mesmo horário (Figura 1).
Os animais foram eutanasiados com a administração i.p de ketamina/xilazina 5% diluídas em 2 ml de solução salina fisiológica. Após esse procedimento, a traqueia foi exposta e canulada e procederam-se uma laparotomia para o afastamento dos órgãos e a secção da artéria aorta abdominal e da veia cava inferior. A traqueia foi então ocluída por fio de sutura, a fim de se manter os pulmões em capacidade residual funcional. Realizou-se uma toracotomia transesternal, por meio do diafragma, para a retirada das traqueias e dos pulmões. Os órgãos coletados foram lavados com solução salina fisiológica para o exame macroscópico e fixados em formol tamponado a 10%.
Fragmentos teciduais obtidos do material foram processados de forma convencional e incluídos em parafina para a confecção de lâminas em secções de 5 μm. Os cortes foram corados pelas técnicas de H&E e picrosírius para a análise em um microscópio de luz (BX51; Olympus Optical, Tóquio, Japão) com aumento 100×. Para a obtenção de fotomicrografias, utilizou-se uma câmera digital (C-7070; Olympus. Com o intuito de se realizar uma análise microscópica semiquantitativa, adotaram-se critérios representativos para as alterações histológicas encontradas: leve, moderada e intensa.
Para a análise morfométrica foram obtidas três fotomicrografias de campos não coincidentes dos tecidos estudados. Nos cortes de traqueia, selecionaram-se áreas contendo cartilagem hialina, lâmina própria e epitélio ciliado. No parênquima pulmonar, foram avaliados bronquíolos, alvéolos e vasos sanguíneos. A quantificação da área de massa nuclear, em pixels, para a avaliação do processo inflamatório foi realizada utilizando-se o programa Adobe Photoshop CS5 (Adobe Systems Inc.; San Jose, CA, EUA). Os depósitos de colágeno foram quantificados pela tonalidade vermelha atribuída à coloração picrosírius, que corresponde à presença de colágeno do tipo I. A angiogênese foi analisada por técnica de contagem do número de vasos por quadrante em uma fotomicrografia panorâmica pelo programa BioEstat 5.3.
Uma análise estatística foi realizada pelo teste de normalidade de Shapiro-Wilk. Após a confirmação da normalidade, utilizou-se ANOVA com teste post hoc de Tukey. Nos demais casos, utilizaram-se o teste de Kruskal-Wallis e o teste post hoc de Dunn. Os resultados foram expressos como médias e desvios-padrão dos grupos e em disposições gráficas do tipo box plot. O nível de significância adotado foi de 5%.
O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética e Pesquisa no Uso de Animais de Laboratório da Faculdade Adventista da Bahia, sob o no. 013/2014.
A análise macroscópica da traqueia não revelou alterações na coloração e na integridade tecidual em nenhum dos grupos. Os pulmões dos ratos submetidos à fumaça de GE7 e GE21 apresentaram alterações macroscópicas focais e difusas nos diferentes lóbulos, relacionadas à coloração e à textura tecidual.
As avaliações histológicas de cada grupo revelaram o seguinte:
No GC, não foram reveladas a presença de infiltrados inflamatórios ou alterações estruturais teciduais nas traqueias dos animais (Figura 2). O parênquima pulmonar não apresentou alterações alveolares, septais e bronquiolares, estando compatível com o padrão de normalidade (Figura 3).
Figura 2 Fotomicrografias de secções de traqueia de animais dos diferentes grupos estudados (H&E e picrosírius; aumento, 100×). Em A, grupo controle, apresentando cartilagem hialina compatível com o padrão de normalidade, com preservação do epitélio ciliado e ausência de infiltrados inflamatórios na lâmina própria (seta). Em B, grupo de exposição à fumaça da queima de palha de cana-de-açúcar por 1 dia, mostrando infiltrado inflamatório focal intenso na lâmina própria (seta). Em C, grupo de exposição por 7 dias, mostrando infiltrado inflamatório agudo difuso, com intensidade moderada, na lâmina própria da mucosa (seta) e na região da submucosa, junto às glândulas seromucosas (triângulo), com preservação ciliar. Em D, grupo de exposição por 21 dias, mostrando infiltrado inflamatório difuso com intensidade variando de leve a moderada, na lâmina própria da mucosa (seta). Em E, grupo de exposição por 7 dias, mostrando discreta marcação para colágeno. Em F, grupo de exposição por 21 dias, mostrando presença de intensa acidofilia no tecido conjuntivo, indicando depósitos de colágeno (seta).
No GE1, ocorreu um infiltrado inflamatório de leve intensidade na traqueia em 87,5% dos casos. No entanto, em 12,5% das amostras analisadas, a resposta foi intensa e com predomínio focal (Figura 2). No parênquima pulmonar, 75% dos animais apresentaram processo inflamatório, sendo 50% de células polimorfonucleares, com predomínio da forma difusa sobre a focal. Os infiltrados foram encontrados em áreas perivasculares, que variaram de leve a moderada, em regiões peribronquiolares. Foram evidenciados, também, edema intersticial leve e ausência de depósitos de colágeno (Figura 3).
Figura 3 Fotomicrografias de secções de tecido pulmonar de animais dos diferentes grupos estudados (H&E e picrosírius; aumento, 100×). Em A, grupo controle, mostrando bronquíolos terminais (triângulo), bronquíolos respiratórios (seta), ductos alveolares e tecido linfoide associado ao brônquio (estrela) sem alterações teciduais. Em B, grupo de exposição à fumaça da queima de palha de cana-de-açúcar por 1 dia, mostrando infiltrados inflamatórios focais perivasculares (setas) e peribronquiolares (triângulo) e infiltrado difuso no parênquima pulmonar (círculo). Em C, grupo de exposição por 7 dias, mostrando alterações na arquitetura alveolar (círculo), presença de infiltrados inflamatórios difusos intensos peribronquiolares e perivasculares (setas). Em D, grupo de exposição por 21 dias, mostrando infiltrado inflamatório alveolar difuso moderado com presença de edema alveolar e perdas septais. Em E, grupo de exposição por 7 dias, mostrando depósitos de colágeno nas regiões perivasculares (setas) e peribronquiolares (triângulo). Em F, grupo de exposição por 21 dias, mostrando depósitos de colágeno perivasculares e peribronquiolares e em região alveolar (círculo).
No GE7, os animais apresentaram infiltrados inflamatórios variando a intensidade de leve (em 62,5%) moderada (em 50,0%) e intensa (em 25,0%) no tecido traqueal (Figura 2). Foi possível visualizar o início da formação de depósitos de colágeno pelo aumento da reação acidófila na traqueia através da coloração picrosírius (Figura 2). Na análise microscópica do parênquima pulmonar, o processo inflamatório ocorreu em 87,5% dos animais, e houve infiltrado de células polimorfonucleares em 62,5% dos casos. Em 75% dos animais, ocorreu processo inflamatório difuso, com intensidade variando de leve a intensa. Ocorreu um padrão de infiltrados perivasculares em 62,5% dos espécimes. Depósitos de colágeno nas regiões perivasculares e peribronquiolares também foram constatados (Figura 3).
No GE21, foi evidenciado infiltrado inflamatório difuso em 75% dos casos, com intensidade de grau leve (25%) a moderado (50%). Não houve casos de infiltrado inflamatório intenso (Figura 2). Na coloração com picrosírius, observou-se intensa acidofilia, indicando presença de colágeno (Figura 2). Pela análise histológica do parênquima pulmonar, foi possível observar infiltrados inflamatórios difusos, com predomínio de células mononucleares, com intensidade variando de leve a intensa em 100% dos animais. Houve inflamação perivascular e peribronquiolar, de leve intensidade, em 50% e 25% dos casos, respectivamente. Observaram-se necrose em 37,5% e angiogênese em 100% dos casos (p < 0,001) quando o grupo foi comparado com o GC e GE1, além de se visualizar áreas de depósitos de colágeno perivasculares e peribronquiolares, também em região alveolar (Figura 3).
A análise morfométrica e estatística (Figura 4) demonstrou presença de processo inflamatório no tecido traqueal nos grupos expostos. As médias da área de massa nuclear, em pixels, foram de 379,78 ± 105,65, no GC; 650,36 ± 147,74, no GE1; 899,18 ± 183,65, no GE7; e 751,96 ± 143,64, no GE21. A resposta inflamatória intensa aconteceu no GE7 na comparação com o GC (p < 0,05). Os dados da análise morfométrica são complementares aos achados da análise semiquantitativa.
Figura 4 Análise morfométrica da traqueia nos grupos controle (GC), exposição à fumaça da queima de palha de cana-de-açúcar por 1 dia (GE1), por 7 dias (GE7) e por 21 dias (GE21). Em A, cinética do processo inflamatório através da análise do tamanho da área nuclear. O GE7 apresentou diferença significante (p < 0,05) quando comparado ao GC. Houve redução da inflamação no GE21, sugestivo de início de reparo tecidual. Em B, determinação de depósitos de colágeno. Apenas o GE21 apresentou diferenças significantes em relação a GC e GE1 (p < 0,01 para ambos).
A morfometria pela coloração de picrosírius revelou ausência de depósitos de colágeno no GC e um leve aumento progressivo na acidofilia em GE1 e GE7; porém, sem significância estatística. Contudo, foi detectada uma maior quantificação de depósitos de colágeno no tecido de traqueia no GE21, quando comparado a GC e GE1 (p < 0,01 para ambos; Figura 4).
A morfometria do parênquima pulmonar foi avaliada pela média da área de massa nuclear, em pixels. No GC, essa foi de 893,13 ± 51,89, compatível com a normalidade. Em GE1 iniciou-se um aumento da celularidade de polimorfonucleares e mononucleares, com área de massa nuclear de 1.373,66 ± 155,43, e atingindo 2.280,98 ± 744,80 no GE7 (p < 0,01 na comparação intergrupo). Porém, houve uma diminuição da área de massa nuclear para 1.251,31 ± 231,75 no GE21, sugestivo de reparo tecidual (Figura 5).
Figura 5 Análise morfométrica do parênquima pulmonar nos grupos controle (GC), exposição à fumaça da queima de palha de cana-de-açúcar por 1 dia (GE1), por 7 dias (GE7) e por 21 dias (GE21). Em A, análise do tamanho da área nuclear mostrando a presença de infiltrado inflamatório em todos os grupos. O GE7 apresentou diferenças estatisticamente significantes quando comparado ao GC, GE1 e GE21 (p < 0,01 para todos). Houve redução da inflamação no GE21, sugestivo de início de reparo tecidual. Em B, quantificação do número de vasos sanguíneos. Houve um aumento no GE7, mas a angiogênese só foi confirmada no GE21 com diferenças significantes quando comparado com GC e GE1 (p < 0,001 para ambos).
A morfometria da angiogênese mostrou que a mesma não ocorreu em GC, GE1 e GE7. Já no GE21 foi detectada a presença de angiogênese em 100% dos casos (Figura 5).
Evidenciou-se que a exposição à fumaça da queima da cana-de-açúcar por diversos períodos de exposição em ratos Wistar esteve associada ao aumento do processo inflamatório no tecido traqueal e pulmonar. Observou-se a presença de infiltrados inflamatórios focais e difusos na fase aguda, com células polimorfonucleares na traqueia dos grupos expostos, principalmente no GE7. Não houve perda de epitélio ciliado em nenhum dos grupos experimentais, quando comparados com o GC. A fibrose tecidual na traqueia foi confirmada no GE21, que correspondeu aos estágios iniciais da fase crônica. No parênquima pulmonar, observaram-se alterações alveolares, vasculares e bronquiolares nos grupos expostos à fumaça, quando comparados com o GC. Os critérios temporais adotados para designar as fases da resposta inflamatória foram baseados em um estudo com ratos Wistar submetidos a sulfato de bleomicina, no qual se caracterizou a resposta inflamatória em aguda, subaguda e de resolução, nos períodos pós-lesão compreendidos entre o 1º e o 7º dia, do 7º ao 14º dia e a partir do 15º até o 30º dia, respectivamente.17
Estudos experimentais observaram inflamação pulmonar caracterizada por infiltrados de macrófagos e neutrófilos, após instilarem MP fino por via intratraqueal em ratos, demonstrando que as citocinas (IL-12 e IFN-γ) têm um papel fundamental na gravidade das lesões,18 assim como, em coelhos, verificou-se um maior recrutamento de macrófagos e de células polimorfonucleares no parênquima pulmonar.19 No presente estudo, verificaram-se alterações inflamatórias, constituídas de células polimorfonucleares e macrófagos alveolares no tecido pulmonar dos ratos a partir do GE1.
Pequenas doses de MP da queima da cana-de-açúcar instilados na traqueia geraram alterações no aparelho respiratório, com redução do espessamento do tecido conjuntivo e aumento da produção de citocinas e quimiocinas pró-inflamatórias.8 No presente estudo, foi confirmado pela morfometria que a fumaça da queima da cana-de-açúcar é capaz de induzir processos necrótico-inflamatórios significantes e progressivos, mesmo em curtos períodos de exposição. Macrófagos alveolares após a fagocitose, assim como células epiteliais do pulmão, demonstram atividade responsiva à exposição de MP com amplificação na produção dos mediadores inflamatórios, podendo levar a certos mecanismos, tais como proliferação e ativação leucocitária, apoptose e reparo endotelial.20 Essas alterações são justificadas devido aos elementos presentes na fumaça, dados que confirmam nossos achados, principalmente no GE7.
É sabido que o tamanho das partículas presentes na fumaça da queima da biomassa tem influência negativa sobre vias aéreas.21,22 O tamanho do MP inalado determina as manifestações clínicas no organismo quanto à granularidade variável das partículas. O MP grosso (< 10 µm) fica retido na via área superior e pode ser removido pela atividade ciliar; os MPs finos (< 2,5 µm) e ultrafinos/nanopartículas (< 0,1 µm) são geralmente resultantes da oxidação incompleta de materiais de carbono.22-24 Os MPs finos/ultrafinos possuem a capacidade de chegar aos alvéolos e ser submetidos à fagocitose pelos macrófagos alveolares, apresentando maiores efeitos deletérios, como alterações na mecânica pulmonar, colapso alveolar e estresse oxidativo, em ratos.23-26 Exposições crônicas às partículas finas estão altamente associadas a maiores índices de doenças respiratórias crônicas.3
Na exposição direta da fumaça de biomassa (esterco) em camundongos durante 7 dias consecutivos, observou-se um aumento significativo da celularidade, principalmente de macrófagos, nos pulmões.27 A exposição à fumaça da cana-de-açúcar gerou infiltrados inflamatórios de intensidades variadas nos animais do presente estudo, sendo que, no GE7, houve um infiltrado inflamatório mais significativo tanto em tecido traqueal como em parênquima pulmonar, pois houve áreas de inflamação com maior gravidade.
Os danos no parênquima pulmonar exposto cronicamente à fumaça de biomassa (esterco) com a fumaça de cigarro incluem inflamação intersticial de moderada a intensa, inflamação perivascular e brônquica, congestão vascular, destruição alveolar, aumento do número de macrófagos e aumento da espessura da parede vascular.3 No presente estudo, apesar de a exposição ocorrer apenas na forma aguda, foi possível notar uma crescente alteração da estrutura alveolar (perdas septais) na comparação com o GC, sendo o MP fagocitado principalmente no GE1. Áreas sugestivas de necrose foram identificadas principalmente em GE7 e GE21, e a angiogênese foi confirmada no GE21.
Coelhos expostos cronicamente à queima de biomassa e de cigarro apresentam inflamação perivascular, peribronquiolar, infiltrado no parênquima e fibrose, com proliferação do epitélio respiratório e alterações enfisematosas.28 Demonstramos, pela técnica de picrosírius, que, no GE7 e GE21, houve áreas de depósitos de colágeno no tecido traqueal, nas regiões peribronquiolar e vascular, assim como em áreas difusas do parênquima pulmonar, que sugerem que a exposição continuada pode levar ao processo fibrótico tecidual.
Em relação a alterações na estrutura alveolar no GE7 e a ruptura de septos interalveolares no GE21, constatamos por critérios morfológicos alterações condizentes com um estudo realizado em ratos que revelou um aumento dos espaços alveolares no grupo que foi exposto à fumaça do cigarro em 24,6% dos animais quando comparados com o GC, que não foi exposto.29
Portanto, com base nos dados obtidos, podemos afirmar que a exposição aguda à fumaça da queima da cana-de-açúcar é capaz de induzir graves danos ao sistema respiratório. Os componentes presentes na fumaça da cana-de-açúcar desencadeiam processos inflamatórios na traqueia com a presença de células polimorfonucleares e induzem também infiltrado inflamatório no parênquima pulmonar de ratos Wistar, com a presença de edemas intersticiais e alveolares. Alterações da arquitetura alveolar e angiogênese foram também evidenciadas.
Pesquisas adicionais tendo como alvo a exposição prolongada e a dosagem de marcadores pró-inflamatórios necessitam ser realizadas a fim de demonstrar os possíveis danos causados pela exposição crônica dos componentes presentes na fumaça da cana-de-açúcar, uma vez que os trabalhadores dos canaviais e a população circunvizinha ficam expostos a essa por longos períodos da vida.