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Efeitos de diferentes intensidades de exercício físico sobre a sensibilidade à insulina e atividade da proteína quinase B/Akt no músculo esquelético de camundongos obesos

Efeitos de diferentes intensidades de exercício físico sobre a sensibilidade à insulina e atividade da proteína quinase B/Akt no músculo esquelético de camundongos obesos

Autores:

Rodolfo Marinho,
Leandro Pereira de Moura,
Bárbara de Almeida Rodrigues,
Luciana Santos Souza Pauli,
Adelino Sanchez Ramos da Silva,
Eloize Cristina Chiarreotto Ropelle,
Claudio Teodoro de Souza,
Dennys Esper Corrêa Cintra,
Eduardo Rochete Ropelle,
José Rodrigo Pauli

ARTIGO ORIGINAL

Einstein (São Paulo)

versão impressa ISSN 1679-4508versão On-line ISSN 2317-6385

Einstein (São Paulo) vol.12 no.1 São Paulo jan./mar. 2014

http://dx.doi.org/10.1590/S1679-45082014AO2881

INTRODUÇÃO

O exercício físico aumenta a sensibilidade à insulina independentemente da redução da massa corporal e de mudanças na composição corporal.(1) O principal efeito do exercício está relacionado ao aumento da expressão de proteínas intracelulares da via de sinalização da insulina, em particular dos transportadores de glicose no músculo esquelético.(1-3)

Indivíduos obesos e com resistência à insulina têm como característica comum o prejuízo na sinalização da insulina decorrente do processo inflamatório subclínico, apresentando diminuída ação desse hormônio em células alvo e marcante presença de hiperglicemia e hiperinsulinemia de jejum. Estas alterações metabólicas estão associadas a uma menor captação de glicose pelos músculos esqueléticos em resposta à insulina.(4)

Dentre os mecanismos envolvidos com a sinalização da insulina, destaca-se a proteína distal da via molecular deste hormônio, a proteína serina/treonina quinase B/Akt. Amplamente estudada nos últimos anos, a proteína Akt é um importante regulador fisiológico, controlando diversas funções celulares, como crescimento, sobrevivência, proliferação e metabolismo.(5)

A Akt possui três isoformas (Akt1, Akt2, Akt3), sendo que cada uma delas exerce função específica no interior da célula.(5) Estudo prévio mostrou que camundongos knockout da Akt1 têm menor tamanho corporal e aumento das taxas de apoptose quando comparado a seus pares, revelando a importância desta isoforma para a sobrevivência celular.(6) Camundongos knockout da Akt2 desenvolveram características do diabetes mellitus tipo 2, mostrando-se crucial na manutenção da glicemia. Já os animais com ausência da proteína Akt3 tiveram deficiência no desenvolvimento cerebral.(5-8)

A sinalização intracelular da insulina inicia-se com sua ligação a um receptor específico de membrana, uma proteína heterotetramérica com atividade quinase, composta por duas subunidades alfa e duas subunidades beta, denominado receptor de insulina (IR).(9) A ativação do IR resulta em fosforilação em tirosina de diversos substratos, incluindo os substratos do receptor de insulina 1 e 2 (IRS-1 e IRS-2). Após a fosforilação em tirosina, os IRS-1 e IRS-2 associam-se a proteína fosfatidilinositol 3-quinase (PI3-quinase), ativando-a. Esta proteína desencadeia a fosforilação de fosfoinositídeos de membrana e o recrutamento da Akt para próximo da membrana plasmática. Os fosfoinositídeos promovem a fosforilação da proteína dependente de quinase (PDK) ativando-a. E esta, finalmente, ativa a Akt ao fosforila-lá no seu domínio catalítico (Thr308). A proteína Akt ativada tem capacidade de fosforilar e ativar vários alvos metabólicos. A Akt, por exemplo, estimula captação de glicose, síntese de glicogênio e de proteínas no músculo esquelético.(5,10-12)

A captação de glicose estimulada pela Akt no músculo esquelético envolve a fosforilação e ativação de um substrato da Akt, uma proteína de peso molecular de 160 kDa, denominada AS160. Quando fosforilada em treonina 642, esta proteína se dissocia das vesículas que contêm os transportadores de glicose tipo 4 (GLUT-4), permitindo a translocação e exocitose destas vesículas na membrana, aumento da expressão de GLUT-4 e consequentemente, o aumento da captação de glicose.(10,12)

O exercício físico é considerado atualmente uma das estratégias mais importantes para a prevenção e tratamento da resistência à insulina e diabetes mellitus tipo 2. Foram demonstrados em estudos com células in vitro, modelos experimentais de animais diabéticos e em pacientes humanos que uma sessão única de exercício físico é capaz de aumentar a sensibilidade à insulina, sendo este efeito associado a maior fosforilação (ativação) da Akt e de seus substratos no músculo esquelético. Em consequência, observou-se aumento da expressão e translocação do transportador do GLUT-4 e da captação de glicose no músculo esquelético durante e após o exercício físico.(13-17)

Fica claro na literatura que o exercício físico é capaz de promover melhoras significativas na sinalização da insulina no músculo esquelético e na sensibilidade à insulina, no entanto, fazem-se necessárias novas investigações com propósito de identificar os efeitos fisiológicos e moleculares do exercício físico realizado em diferentes intensidades em organismos com resistência à insulina e diabetes.

OBJETIVO

O objetivo deste presente estudo foi investigar os efeitos do exercício físico agudo em diferentes intensidades sobre a sensibilidade à insulina e a fosforilação da Akt no músculo esquelético de camundongos obesos.

MÉTODOS

Caracterização dos animais

Todos os experimentos foram conduzidos em acordo com os princípios e procedimentos de cuidado com o uso de animais experimentais e foram aprovados pelo Comitê de Ética da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP), protocolo nº 2805-1. Os experimentos foram realizados no primeiro semestre de 2013. Foram utilizados vinte e quatro (n=24) camundongos Swiss de seis semanas de vida, provenientes do Centro Multidisciplinar para Investigação Biológica na Área da Ciência em Animais de Laboratório (CEMIB), da UNICAMP. Os animais foram alocados em gaiolas individuais e receberam água e dois tipos de dieta: ração padrão para roedores (C) ou dieta hiperlipidica (DHL) durante o período experimental, ad libitum, os detalhes das dietas encontram-se descritos na tabela 1. Os camundongos foram expostos a ciclos claro/escuro de 12 horas e mantidos a temperatura de 20°C a 22°C. Os animais foram divididos aleatoriamente em quatro subgrupos: grupo controle (n=6) que recebeu dieta padrão (C); grupo obeso sedentário (n=6) que recebeu DHL por 12 semanas (OB); grupo obeso (n=6) que recebeu DHL por 12 semanas e foi submetido ao exercício agudo sem sobrecarga adicional ao peso corporal (OE-1); e grupo obeso (n=6) que também recebeu a DHL por 12 semanas e foi submetido ao exercício agudo com sobrecarga correspondente a 5% da massa corporal dos animais (OE-2).

Tabela 1 . Composição da ração padrão e da dieta hiperlipídica 

Ingredientes Ração padrão Dieta hiperlipídica


g/kg Kcal/kg g/kg Kcal/kg
Amido de milho (q.s.p.) 398 1590 116 462
Caseína 200 800 200 800
Sacarose 100 400 100 400
Amido dextrinado 132 528 132 528
Banha de porco - - 312 2808
Óleo de soja 70 630 40 360
Celulose 50 - 50 -
Mistura de minerais 35 - 35 -
Mistura de vitaminas 10 - 10 -
L-Cistina 3 - 3 -
Colina 2.5 - 2.5 -

Total 1000 3948 1000 5358

Protocolo de exercício físico agudo

O protocolo de exercício físico agudo consistiu de natação, em grupos de seis animais, realizado em tanques cilíndricos de diâmetro interno de 45cm e 60cm de profundidade, com temperatura da água mantida em 32±1°C. Os animais realizaram uma única sessão de exercício de 1 hora, sem sobrecarga adicional para o grupo OE-1 e com sobrecarga adicional equivalente a 5% da massa corporal total para o grupo OE-2, presa a cauda do animal. Previamente a realização do exercício, os camundongos foram adaptados ao meio liquido, sendo inseridos por três dias consecutivos no tanque de natação com água na altura do tórax. Tal procedimento se repetiu nos demais grupos animais, simulando o estresse do meio liquido recebido pelo grupo OE-1 e OE-2. Todos os procedimentos experimentais foram realizados após 24 horas da sessão de exercício físico e com jejum prévio de 8 horas.

Avaliação dos parâmetros metabólicos

Os animais foram avaliados quanto à massa corporal total (balança digital), níveis sanguíneos de glicose e insulina no final do período experimental. Além disso, os animais de cada grupo experimental foram submetidos ao teste de tolerância à insulina (TTI).

Determinação da glicose e insulina

A dosagem da glicose plasmática foi realizada através do método enzimático colorimétrico de glicose oxidase. A insulina plasmática das amostras foi avaliada pelo método ELISA.

Teste de tolerância à insulina

O TTI foi realizado 24 horas após a sessão de exercício de natação. Os animais permaneceram em jejum de 8 horas e logo em seguida foi feita a primeira coleta de sangue em cada animal representando a glicemia no tempo zero do teste. Após isso, a insulina (2U/Kg de massa corporal) foi injetada intraperitonealmente e em seguida, amostras de sangue foram coletadas através da cauda nos tempos 5, 10, 15, 20, 25 e 30 minutos para determinação do valor de glicose sanguínea através do uso de um glicosímetro portátil (Advantage, Boehringer, Mannheim, Germany). A velocidade constante do decaimento da glicose (Kitt) foi calculada usando a fórmula 0,693/t1/2. O t1/2 da glicose foi calculado a partir da curva da análise dos mínimos quadrados da concentração da glicose durante a fase de decaimento linear.(18)

Extração do músculo esquelético e tecido adiposo

Os camundongos foram anestesiados através da administração intraperitoneal de ketamina/diazepam na dose de 50/5mg/kg. A perda dos reflexos pedal e corneal foram utilizadas como controle da anestesia. A cavidade abdominal foi aberta, e após localização da veia porta, 0,2mL de salina ou insulina (10-6 mol/l) foram injetadas. Amostras do músculo gastrocnêmio (porção mista) foram retiradas após 90 segundos da injeção de insulina e foram homogeneizadas em tampão de imunoprecipitação contendo 1% de Triton X 100, 100mM de Tris (pH 7,4), 100mM de pirofosfato de sódio, 100mM de fluoreto de sódio, 10mM de EDTA, 10mM de vanadato de sódio, 2mM de PMSF e 0,1mg/mL de aprotinina a 4°C. O homogeneizado foi centrifugado a 11000 rpm por 30 minutos. No sobrenadante foi determinada a concentração de proteína utilizando o método de Bradford(19) e posteriormente foi realizada a determinação do extrato total e o ensaio de imunoprecipitação com anticorpo específico. Ao final dos procedimentos experimentais o tecido adiposo epididimal foi retirado para avaliação de sua massa total em balança analítica.

Western blot

Após determinação da concentração de proteínas foi aplicada a técnica de western blot e o uso de anticorpos específicos. Inicialmente as amostras, após rápida fervura, foram aplicadas em gel de poliacrilamida para separação por eletroforese (SDS-PAGE). As proteínas separadas em SDS-PAGE foram transferidas para membrana de nitrocelulose em aparelho de transferência da BIO-RAD. A membrana de nitrocelulose foi incubada “overnight” com anticorpo especifico. A ligação de anticorpo a proteínas não-específicas foi minimizada pela pré-incubação da membrana de nitrocelulose com tampão de bloqueio (5% de leite em pó desnatado; 10mmol/L de Tris; 150mmol/L de NaCl; 0.02% de Tween 20) por 1,5 hora. O método de identificação utilizado foi a quimioluminescência, no qual as proteínas de interesse são detectadas incubando-se as membranas com anticorpos primários e em seguida, com anticorpos secundários conjugados com a horseradish peroxidase (HRP). As bandas imunorreativas foram detectadas por quimioluminescência e a densitometria determinada por meio de sistema de captação e análise de imagem.

Anticorpos

Os anticorpos utilizados para o experimento de imunoblot foram anti-Akt e anti-phosphoserina Akt (Ser473) ambos da Santa Cruz Biotechnology, CA, EUA.

Análise estatística

Os resultados foram expressos como média±erro padrão da média. Quando comparado dois grupos, foi utilizado teste t de Student para dados não pareados. Quando necessário utilizou-se análise de variância, seguida de teste post hoc de Bonferroni para comparação múltipla de médias, sendo adotado o nível de significância p<0,05.

RESULTADOS

Parâmetros fisiológicos e metabólicos

A tabela 2 compara os dados dos camundongos dos grupos controle (C), OB, OE-1 e do OE-2. Observa-se que a massa corporal total dos animais que receberam a dieta hiperlipídica foi significativamente superior em relação ao grupo controle. Entretanto não houve diferença entre estes grupos (OB, OE-1 e OE- 2). Resultados semelhantes podem ser observados para o peso da gordura epididimal total. Os roedores pertencentes aos grupos OB, OE-1 e OE-2 apresentaram conteúdo de gordura epididimal significativamente maior em relação ao grupo controle. Contudo, não houve diferenças entre os grupos de animais obesos induzidos por dieta.

Tabela 2 . Parâmetros fisiológicos e metabólicos 

Massa corporal (g) Gordura epididimal (g) Glicemia jejum (mg/dL) Insulina jejum (ng/ml)
C (n=6) 28,4±1,88 0,6±0,10 98,6±3,96 2,9±0,62
OB (n=6) 51,4±3,12* 2,9±0,16* 306±26,60* 8,8±0,62*
OE-1 (n=6) 53,6±2,88* 3,1±0,12* 186±21,40** 9,0±0,62*
OE-2 (n=6) 56,2±3,33* 3,1±0,21* 154±31,50** 8,9±0,62*

Os valores de glicemia de jejum encontrados nos animais dos grupos OB, OE-1 e OE-2 foram significativamente maiores em relação ao grupo controle. Satisfatoriamente os camundongos exercitados OE-1 e OE-2 apresentaram menor concentração desta hexose quando comparado ao grupo OB. No entanto não houve diferença significativa entre os grupos submetidos a diferentes intensidades de exercício físico agudo.

Por fim, os valores de insulinemia foram significativamente maiores nos camundongos OB, OE-1 e OE-2 quando comparados ao grupo controle. Isso demonstra que o exercício físico agudo realizado não alterou os valores de insulina dos animais.

Fosforilação da proteína Akt no músculo esquelético

Verifica-se que a fosforilação da Akt no músculo esquelético aumentou em todos os grupos experimentais (C2, OB, OE-1 e OE-2) quando estimulado por insulina em relação ao grupo controle que recebeu salina (C1) (Figura 1A). Nos camundongos OB, a fosforilação da Akt foi reduzida em 2,3 vezes após injeção de insulina quando comparado com os camundongos controles (C2). Já nos animais OE-1 e OE-2, a fosforilação da Akt aumentou 2,0 e 2,1 vezes, respectivamente, quando comparado aos animais OB (Figura 1A). Não houve diferença estatística na fosforilação da Akt entre os grupos OE-1 e OE-2. Em relação à expressão da Akt não houve diferença estatística entre os grupos estudados (Figura 1B).

Figura 1 A-B . Fosforilação e expressão da proteína quinase B/Akt no músculo esquelético (gastrocnêmio). C1: controle com injeção de salina; C2: controle com injeção de insulina; OB: grupo obeso com injeção de insulina; OE-1: grupo obeso exercitado com injeção de insulina e sem sobrecarga e OE-2: grupo obeso exercitado com injeção de insulina e com sobrecarga. IB: técnica de imunoblot. *p<0,05, diferente do C1; #p<0,05: OB diferente dos grupos C2, OE-1 e OE-2  

Exercício físico agudo aumenta a sensibilidade à insulina

Verifica-se que os camundongos sedentários alimentados com a dieta hiperlipídica tiveram menor taxa de consumo de glicose quando comparados com os camundongos controles (C: 5,0±0,49; OB: 1,78±0,68%/min). Por outro lado, os animais que realizaram o exercício físico agudo tiveram aumento na taxa de captação de glicose no TTI (OE-1: 3,98±0,45; OE-2: 4,33±0,72), quando comparado aos animais obesos sedentários, sendo os valores não diferentes do grupo controle. Tais resultados mostram que uma única sessão de exercício físico de natação foi capaz de aumentar a captação de glicose em camundongos obesos (Figura 2).

Figura 2 . Teste de Tolerância à Insulina. C: grupo controle; OB: grupo obeso; OE-1: grupo obeso exercitado sem sobrecarga e OE-2: grupo obeso exercitado com sobrecarga. *p<0,05, diferente do C; #p<0,05, diferente do OB 

DISCUSSÃO

Estudos têm demonstrado que a sensibilidade à insulina aumenta com a prática de exercícios físicos, sejam estes realizados de maneira aguda ou crônica, mesmo quando não ocorre redução da massa adiposa corporal.(1,3,20) No presente estudo não foi observado diferença na massa corporal total e no conteúdo de gordura epididimal entre os grupos experimentais. Este resultado era esperado uma vez que uma única sessão de exercício físico não é suficiente para induzir mudança na composição corporal dos camundongos. Por outro lado, o protocolo de exercício físico agudo de natação foi capaz de aumentar a sensibilidade à insulina e a fosforilação da Akt nos animais obesos, sendo esta uma proteína chave da via de sinalização da insulina.

Luciano et al.(21) verificaram que a sensibilidade e a sinalização da insulina (via IRS/PI3-quinase/Akt) no músculo esquelético e no tecido adiposo epididimal de camundongos magros aumentaram após o período de seis semanas consecutivas de treinamento físico de natação, com sobrecarga adicional de 5% em relação à massa corporal dos animais. Tal fato demonstrou que o exercício físico é eficiente em aumentar a responsividade à insulina em tecidos periféricos insulino sensíveis como músculo esquelético e adiposo de animais saudáveis.

Entretanto, na condição de obesidade há um aumento na produção e liberação de citocinas pró-inflamatórias, provenientes do tecido adiposo infiltrado de macrófagos, que em conjunto com o aumento de ácidos graxos livres provenientes da lipólise e da ingestão de uma dieta rica em gordura saturada causam prejuízos na sinalização da insulina e hiperglicemia.(22) Recentes estudos observaram que alguns tipos de ácidos graxos provenientes da dieta, com destaque para os saturados, são capazes de se ligar e ativar proteínas de membrana denominadas de Toll Like Receptor 4 (TLR4). Quando ativados, estes receptores desencadeiam uma resposta inflamatória e esta ativação promove consequências negativas para a via de sinalização da insulina.(3,22) Isto ocorre, porque o TLR4 tem a capacidade de ativar as proteínas serina-quinases IKKβ (Ikappakinase beta) e JNK (c-jun N-terminal quinase), conhecidamente de ação pró-inflamatórias. Deste modo, estas proteínas promovem a fosforilação em serina 307 do receptor de insulina e dos substratos do receptor de insulina 1 e 2 (IRS1 e 2), diminuindo o sinal da insulina em diferentes tecidos.(3,22)

Além disto, o receptor TLR4 desencadeia a ativação da via IKK/IκB/NFκB. Ao ser ativado, o IKKβ promove fosforilação do I&κB, o que provoca a dissociação do complexo IκB/NFκB. Por ser um fator de transcrição, quando livre dentro da célula, o NFκB é capaz de se translocar para o núcleo e promover a transcrição de novas citocinas inflamatórias, como o fator de necrose tumoral alfa (TNF-α), de proteínas fosfatases, como a proteína fosfatase 1B (PTP1B), e da enzima óxido nítrico sintase induzível (iNOS), com reconhecido efeito negativo sobre o sinal molecular da insulina. Desta maneira, observa-se um aumento do quadro inflamatório subclínico associado à obesidade e consequentemente, da resistência à insulina na obesidade.(3,22)

Diante deste quadro inflamatório associado à obesidade e resistência insulina, pesquisadores de diversas partes do mundo têm investigado o papel do exercício físico em restaurar a sinalização da insulina e aumentar a captação de glicose em resposta ao exercício físico. Em estudo recente, foi mostrado que tanto o exercício agudo, quanto crônico são capazes de restaurar a sensibilidade à insulina, reduzindo a ativação do TLR4 e das proteínas serina-quinases JNK e IKKβ, em animais obesos.(3) Neste estudo de Oliveira et al.(3) foi observado que a supressão da via inflamatória perdurou 24 e 36 horas após a última sessão de esforço físico. Sendo que o protocolo de exercício físico utilizado no programa de treinamento de natação dos roedores foi semelhante ao aplicado no presente estudo. No entanto, o experimento foi realizado com ratos Wistar que embora desenvolvam obesidade e resistência à insulina, nem sempre apresentam hiperglicemia como observado em camundongos Swiss, utilizados em nosso estudo.

Corroborando com estes achados, Ropelle et al.(20) observaram aumento da sensibilidade à insulina em ratos obesos submetidos a um protocolo de exercício agudo. No entanto, neste estudo foi utilizado um protocolo de exercício com um volume acentuado, aplicando-se duas sessões de esforços de 3 horas de duração, com 45 minutos de intervalo entre elas. Além disso, não foi utilizada carga adicional a massa corporal durante o exercício de natação, podendo ser considerado de baixa intensidade.

Ao comparar dois protocolos de exercício físico com volume e intensidade diferentes, Da Silva et al.(23) observaram que tanto um protocolo de exercício de volume alto, com 6 horas de duração e sem carga adicional, quanto um protocolo de volume baixo, de 45 minutos com sobrecarga de 5,5% da massa corporal dos animais (equivalente à máxima fase estável de lactato) em ratos obesos, foram eficazes em restaurar a sensibilidade à insulina, suprimir a expressão proteica e fosforilação das serina quinases, JNK e IKKβ e aumentar a fosforilação de proteínas da via de sinalização da insulina (IR, IRS-1 e Akt). Com isso os autores mostraram que o exercício físico de curta duração foi capaz de promover resultados similares aos encontrados com o exercício de longa duração. Apesar dos resultados serem de grande importância à literatura, uma vez que exercícios de menor volume provavelmente sejam mais facilmente tolerados por obesos, sobretudo, sabendo que a obesidade dificulta a execução de exercícios que exigem deslocamento da massa corporal. Os autores não verificaram se existem diferenças nas respostas de exercícios em intensidades diferentes dentro de um protocolo de menor volume.

Em nosso estudo, camundongos Swiss obesos induzidos por dieta hiperlipídica se mostraram resistentes à insulina e apresentaram menor fosforilação da proteína Akt se comparado aos animais controles magros. Ao contrário, os animais submetidos ao protocolo de exercício agudo de 1 hora, sem ou com carga adicional de 5% da massa corporal se mostraram mais sensíveis à insulina e tiveram aumento na fosforilação da Akt se comparado a seus pares obesos não exercitados. Porém, independentemente do protocolo de exercício físico não foi encontrado diferença nessas variáveis. Isso mostra, que os animais obesos exercitados sem carga adicional atada ao corpo puderam se beneficiar de maneira semelhante ao exercício de maior intensidade (realizado com carga adicional). Estes resultados têm grande relevância para a aplicação prática de protocolos de exercício físico na população obesa, tendo em vista que o exercício aeróbio de menor intensidade e menor volume podem ser mais facilmente tolerados por esse público, principalmente no inicio de um programa de condicionamento físico.

Ao estudar o aumento da captação de glicose induzida pelo exercício em indivíduos obesos e obesos com diabetes tipo 2, O’Gorman et al. relataram que uma sessão aguda de exercício físico de 1 hora a 75% do VO2pico, realizado em uma bicicleta ergométrica, não foi suficiente para aumentar a sensibilidade à insulina nestes indivíduos.(24) Porém após a realização de sete sessões com o mesmo volume e intensidade da sessão aguda, os pesquisadores observaram aumentos na captação de glicose através do teste de clamp hiperinsulinêmico-euglicêmico e na expressão do transportador de glicose tipo 4 (GLUT4) nos pacientes obesos com diabetes tipo 2. Entretanto ao analisar a expressão das proteínas da via de sinalização da insulina não observaram diferenças entre o estado basal e pós-exercício físico.(24) Este fenômeno pode ser explicado porque o exercício físico consegue estimular vias independentes da insulina para o aumento da captação de glicose, como a via da proteína quinase ativada por AMP (AMPK).(10,16) A AMPK é ativada em situações de déficit energético e aumenta a translocação do GLUT4 para a membrana da célula muscular. E também, pelo fato do exercício físico conseguir aumentar a captação de glicose em outros tecidos insulino sensíveis, como o tecido adiposo.(25)

Em nosso estudo, observou-se que o exercício físico agudo foi capaz de aumentar a sensibilidade à insulina nos animais obesos. Esta mudança ocorreu, ao menos em parte, pelo ao aumento da fosforilação da proteína Akt no músculo esquelético dos roedores obesos exercitados. Porém, o exercício físico têm se mostrado capaz de aumentar a captação de glicose em resposta à insulina também no tecido adiposo. Peres et al.(25) ao submeterem animais a um treinamento físico de sete semanas observaram maior resposta da via de sinalização da insulina nos adipócitos, com aumento na captação de glicose e na fosforilação em tirosina dos substratos do receptor de insulina 1 e 2 (IRS-1 e IRS-2), maior associação do IRS-1 com a PI3-quinase e por consequência, aumento da fosforilação da proteína Akt. Em adição, o exercício físico como previamente dito estimula a captação de glicose através da via da AMPK, favorecendo a entrada desta hexose no músculo em contração,(16,17) mesmo quando a via de sinalização da insulina está prejudicada.

Embora em nosso estudo não tenha sido avaliado estes aspectos, é possível que eles colaborem para o aumento da sensibilidade à insulina corporal total observada no teste de tolerância à insulina em animais obesos submetidos ao exercício agudo e, portanto, tenham contribuído para a homeostase da glicose nestes animais. Estes mecanismos precisam ser mais amplamente investigados em diferentes protocolos de exercício físico.

Em outro estudo, também utilizando indivíduos obesos e obesos com diabetes tipo 2, Christ-Roberts et al.(26) observaram que oito semanas de treinamento físico aeróbio com duração de 45 minutos e intensidade de 70% VO2pico foi eficiente para aumentar a captação de glicose tanto nos voluntários obesos, quanto nos obesos diabéticos. O treinamento físico também proporcionou aumento na expressão de GLUT4 e da proteína Akt nos dois grupos, no entanto, este aumento na expressão da Akt não foi acompanhado pelo aumento de sua fosforilação, nem de mudanças em outras proteínas da via de sinalização da insulina. Neste sentido, fica notório a importância de mais estudos com protocolos de exercício físico agudo e crônico na população obesa e obesa com diabetes para melhor elucidar os efeitos do exercício físico sobre a via de sinalização da insulina.

Ademais, o aumento na fosforilação da Akt com o exercício físico pode ser resultante de uma melhora no processo inflamatório observado em estudos prévios na literatura.(3,22,23) Conforme apresentado anteriormente, algumas proteínas pró-inflamatórias com atividade aumentada na obesidade são capazes de prejudicar a via de sinalização da insulina, agindo especialmente sobre proteínas proximais da via de sinalização da insulina. Dentre elas, as serina quinases JNK e IKK são capazes de fosforilar em serina 307 o receptor e os substratos do receptor de insulina (IR e IRSs, respectivamente) e prejudicar o sinal da insulina, culminando com menor fosforilação da Akt. E sabidamente, o exercício físico reduz a atividade destas proteínas e restaura a ação da insulina.(3,22,23)

Mais recentemente descoberta, a proteína TRB3 (a mammalian homolog of Drosophila Tribbles), tem sua expressão aumentada na obesidade e tem a capacidade de se ligar fisicamente a Akt, inibindo sua ativação, e deste modo prejudica os efeitos biológicos provenientes de sua atividade, como por exemplo, a translocação do GLUT4 para a membrana da célula muscular.(27,28) Um estudo realizado por Matos et al.(28) demonstrou que o exercício físico agudo foi capaz de diminuir a expressão de TRB3 e restaurar a fosforilação da Akt no músculo esquelético de animais obesos.(28) Este é um outro mecanismo molecular pelo qual o exercício físico é capaz de aumentar a fosforilação da Akt. Embora no presente estudo não tenha sido feito a análise da expressão da TRB3, é possível que ambos os protocolos de exercício físico tenham reduzido a expressão da TRB3 e consequentemente, isso tenha colaborado para o aumento na fosforilação da Akt após a sessão aguda de exercício físico.

CONCLUSÃO

Assim, nossos dados demonstram que os protocolos de exercícios físicos de baixa intensidade ou com intensidade moderada representam diferentes estratégias para restaurar a sensibilidade à insulina com a mesma eficácia na condição de obesidade.

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