On-line version ISSN 1982-0194
Acta paul. enferm. vol.29 no.6 São Paulo Nov./Dec. 2016
http://dx.doi.org/10.1590/1982-0194201600095
Na medicina moderna, a análise de gasometria arterial tornou-se uma das investigações laboratoriais mais comuns como parte da avaliação respiratória de pacientes com doenças agudas.1 Consequentemente, a punção da artéria radial surgiu como um procedimento invasivo realizado regularmente em contextos clínicos.1,2 Esta punção é frequentemente descrita como um procedimento invasivo muito doloroso, desafiador e que não está isento de riscos.2,3 Na verdade, estudos de casos sugerem que erros durante a punção arterial para análise de gasometria arterial podem levar a complicações graves como lesões nervosas, síndrome compartimental aguda, trombose e pseudoaneurisma.3,4 Portanto, é importante que os profissionais de saúde responsáveis pela coleta de amostras de sangue arterial sejam adequadamente treinados e passem por avaliação de competência rigorosa antes de realizar a punção da artéria radial em pacientes vivos.5 São necessários mais estudos com foco especificamente na concepção, implementação e avaliação dos efeitos de diferentes intervenções educacionais na competência dos profissionais de saúde em punção da artéria radial para a análise de gasometria arterial.
Na Espanha e em muitos outros países, os enfermeiros são responsáveis pela coleta de amostras de sangue para análise de gasometria arterial através da punção da artéria radial.1 Em muitos desses países, não há exame de licenciamento e espera-se que os enfermeiros sejam profissionais plenamente competentes e seguros ao completarem a graduação em enfermagem.6 No entanto, a literatura sugere que as oportunidades de praticar procedimentos invasivos em pacientes vivos são geralmente escassas durante os cursos de graduação.7 Esta realidade pode impactar negativamente no desenvolvimento das competências de futuros profissionais de saúde recém-formados, aumentando a ocorrência de erros e comprometendo a segurança dos pacientes.5,8 Consequentemente, com relação à punção arterial e outros procedimentos invasivos, espera-se que os educadores de enfermagem: [1] encontrem estratégias educacionais mais eficazes para facilitar a aquisição de competência dos estudantes de enfermagem;7 e [2] avaliem rigorosamente a competência dos estudantes antes que eles sejam autorizados a realizar procedimentos em pacientes vivos.5,6 A adoção de uma abordagem centrada no indivíduo e baseada na definição holística de competência pode ajudar os educadores de enfermagem a direcionarem efetivamente esses desafios.6-9
Em primeiro lugar, os educadores de enfermagem devem considerar que estratégias educacionais bem-sucedidas se concentram no desenvolvimento igualitário dos domínios cognitivo, psicomotor e atitudinal de competência. Portanto, uma estratégia de treinamento eficaz deve sempre incluir elementos que facilitem a aquisição de conhecimentos e habilidades, e também promovam a autoeficácia dos indivíduos.5,10-12 Em segundo lugar, devem ser utilizados instrumentos válidos e confiáveis para avaliar individualmente estes três domínios de competência. A avaliação rigorosa e abrangente de conhecimentos, habilidades e autoeficácia pode ajudar a determinar a competência individual em procedimentos invasivos como a punção arterial.5,9,13,14 O uso de treinamento de simulação apoia a abordagem centrada no indivíduo e promove a prática segura.10,15
Em diferentes níveis, muitos estudos mostraram que o uso de simulação é eficaz tanto na melhoria quanto na avaliação do conhecimento, desempenho e/ou confiança dos participantes em uma ampla gama de habilidades e procedimentos.8,11,16,17 No entanto, uma formação eficaz baseada em simulação pode demandar intensos recursos, o que pode constituir uma ameaça à implementação em faculdades com orçamento limitado.12,17,18 Nesses casos, demonstrações em vídeo, exemplos com modelos, aprendizado em díades e feedback intermitente mostraram que, quando usados em conjunto com a prática simulada autodirigida, podem beneficiar a aquisição de competência em habilidades processuais ao mesmo tempo que reduzem a necessidade de recursos.8,18-23 Apesar disso, nossa revisão da literatura mostrou escassez de estudos publicados com o objetivo de desenvolver, implementar e avaliar os efeitos de intervenções educacionais que facilitem a aquisição de competência em punção arterial entre os profissionais de saúde em geral e estudantes de enfermagem em particular. Com uso equipamentos de baixa tecnologia e de uma intervenção educacional baseada em evidências, este estudo teve como objetivo avaliar se um workshop de simulação e curta duração sobre punção da artéria radial melhoraria a competência dos alunos de enfermagem a um nível em que eles poderiam praticar o procedimento em um paciente vivo sem comprometer sua segurança.
O estudo foi realizado em uma universidade do sudeste da Espanha entre outubro de 2014 e janeiro de 2015. No contexto nacional deste estudo, a punção da artéria radial para a análise de gasometria arterial é ensinada como parte do programa de graduação em enfermagem. Em muitas faculdades em todo o país - e em todo o mundo -, os orçamentos para a inovação em ensino e aprendizagem são limitados. Isto não se aplica apenas à aquisição de novos equipamentos, mas também à quantidade de recursos humanos dedicados à formação dos estudantes de enfermagem. Por exemplo, no contexto deste estudo, a proporção entre o aluno e professor para o treinamento de habilidades de procedimentos é 1:16. Tradicionalmente, neste contexto, a punção arterial para a análise de gasometria arterial é ensinada como parte de uma palestra de 2 horas sobre “procedimentos de cuidados críticos”. Isto é feito frequentemente em uma sala de aula com grandes grupos de estudantes (até 60 por palestra) e uso de apresentações PowerPoint®, demonstrações em vídeo, demonstrações ao vivo realizadas pelo professor em um braço de venopunção de baixa fidelidade, ou uma combinação destes métodos. Espera-se que os estudantes de enfermagem tenham a oportunidade de praticar o procedimento quando estiverem em estágios clínicos, sob a supervisão direta de seus mentores e em pacientes vivos.
Este foi estudo do tipo quase-experimental, pré-teste e pós-teste com um grupo para avaliar se um workshop único, de simulação, curta duração e uso de equipamentos de baixa tecnologia permitiria que os estudantes de enfermagem alcançassem um nível seguro de competência em punção arterial para análise de gasometria arterial antes de praticar o procedimento em pacientes vivos. Para avaliar rigorosamente a eficácia da intervenção educacional,11 comparamos a proporção de alunos que alcançaram a nota de corte pré-definida para competência antes e após a participação no workshop de simulação sobre punção arterial para análise de gasometria arterial.
O Comitê de Ética e Pesquisa Institucional concedeu aprovação ética antes que um membro da equipe de pesquisa fizesse contato com os potenciais participantes. Foram fornecidas informações por escrito sobre os objetivos e procedimentos do estudo a todos os indivíduos elegíveis, que assinaram voluntariamente um termo de consentimento livre e esclarecido antes de aceitarem participação. Também lhes foi garantido o direito de saírem do estudo a qualquer momento. Os dados demográficos e de avaliação foram anônimos, e as informações foram tratadas e armazenadas confidencialmente.
Os critérios de elegibilidade dos participantes foram: [1] estar inscrito no módulo de cuidados intensivos do programa de graduação em enfermagem e [2] não ter recebido nenhum treinamento em punção arterial. O tamanho da amostra foi calculado a priori usando uma abordagem conservadora.24 Assumindo uma proporção real de 0,5, um erro de tipo I de 5%, e 95% de poder para detectar diferenças estatísticas significativas (p <0,05, bilateral), estimou-se a necessidade de uma amostra total de 82 participantes. Para compensar possíveis perdas, foi adicionado 30% à estimativa do tamanho da amostra. No total, 111 estudantes de enfermagem participaram do estudo. A informação sobre possível observação dos participantes da realização de uma punção arterial em paciente vivo feita por profissional de saúde qualificado foi coletada em conjunto com a dos dados demográficos (idade, sexo e nível educacional).
Os participantes foram divididos aleatoriamente em grupos de 16 alunos e participaram de um workshop de simulação e duração de 1,5 horas sobre punção arterial para análise de gasometria arterial. Dois membros da equipe de pesquisa e dois especialistas independentes projetaram o workshop. A intervenção educacional começou com uma introdução de 5 minutos sobre os objetivos da sessão, a estrutura e os resultados da aprendizagem. Em seguida, os participantes assistiram um vídeo palestra de 10 minutos sobre punção arterial para análise de gasometria arterial,25 seguido por dois exemplos de modelagem sem falhas realizados pelo facilitador. O primeiro destes exemplos de modelagem foi realizado em silêncio e o segundo incluiu uma descrição simultânea do procedimento. Além disso, foi realizado um exemplo de modelagem com falhas e solicitado aos participantes que identificassem e descrevessem os erros e explicassem a maneira correta de fazê-lo. Todos os exemplos de modelagem foram executados em 25 minutos utilizando uma abordagem de simulação híbrida que compreendia um simulador de punção arterial (Arterial Puncture Wrist de Kyoto Kagaku Co., Japan®) e um indivíduo que fez papel do doente. Isso permitiu que o facilitador demonstrasse as habilidades técnicas envolvidas no procedimento e as habilidades de comunicação necessárias para garantir uma interação enfermeiro-paciente eficaz. Por fim, os alunos foram agrupados em díades e os últimos 50 minutos do workshop foram dedicados à prática simulada autodirigida. Um membro da díade atuou como um paciente, permitindo que o outro praticasse a interação enfermeiro-paciente enquanto realizava punção arterial no simulador. A proporção de aluno para simulador foi 4:1, o que significa que enquanto um membro da díade praticava usando o simulador, o outro observava. O facilitador forneceu feedback individual intermitente a todos os participantes. Embora os alunos fossem encorajados a fornecer feedback uns aos outros, o uso de feedback simultâneo era proibido. Para minimizar o viés, o mesmo facilitador ministrou todos os workshops de treinamento e a proporção professor-aluno foi de 1:16.
As habilidades de procedimento, o conhecimento e a autoeficácia na punção arterial para a análise de gasometria arterial foram avaliados individualmente em todos os participantes antes (pré-teste) e imediatamente após (pós-teste) a aplicação da intervenção.
Para avaliar a habilidade dos participantes na punção arterial, eles foram submetidos a um cenário de simulação híbrida com um indivíduo atuando como paciente e o simulador de punção arterial para realização do procedimento invasivo. O desempenho dos participantes foi observado e avaliado utilizando o instrumento chamado Arterial Puncture Skills Assessment Tool (APSAT). O conhecimento dos participantes foi avaliado através de um questionário de múltipla escolha com 20 itens (AP-MCQ). Ambas as ferramentas de avaliação foram desenvolvidas com base nas diretrizes internacionais sobre as melhores práticas em amostras de sangue arterial e na ferramenta de outros autores.25-27A avaliação psicométrica do AP-MCQ e do APSAT incluiu uma revisão crítica de um painel de 10 especialistas e um estudo experimental com 58 alunos. As propriedades psicométricas de ambas as ferramentas são apresentadas na tabela 1. Por fim, a autoeficácia dos participantes foi medida com uso da escala chamada Arterial Puncture Self-Efficacy Scale (APSES).5
Tabela 1 Propriedades psicométricas do AP-MCQ* e APSAT**
Propriedades psicométricas | Instrumento | |
---|---|---|
AP-MCQ* | APSAT** | |
Confiabilidade | ||
Consistência interna | 0,90 | 0,96 |
Coeficiente alfa de Cronbach | ||
Estabilidade temporal - testada em quatro semanas | 0,85 | 0,78 |
Coeficiente de correlação Spearman entre teste e reteste | ||
Validade | ||
Validade de conteúdo | 0,92 | 0,97 |
Índice de Validade de Conteúdo médio | ||
Validade de critérios | 0,63 | 0,70 |
Correlação com outras ferramentas que medem conceitos semelhantes | ||
Validade de construto | ||
Número de fatores estruturais + porcentagem de variância explicada por fatores | 1 (62,1) | 5 (79,8) |
Capacidade de diferenciação entre grupos conhecidos = valor p <0,05 | <0,05 | <0,05 |
1 AP-MCQ é o questionário de múltipla escolha utilizado para avaliar o conhecimento em punção arterial; 2APSAT é uma lista de verificação usada para avaliar habilidades em punção arterial
Os resultados das avaliações dos participantes sobre conhecimentos, habilidades e autoconfiança variaram de 0-100. Seguindo referenciais de estudos similares, considerou-se que os participantes demonstraram um nível seguro de competência em punção arterial para análise de gasometria arterial ao alcançar os seguintes resultados médios: APSAT≥70%, AP-MCQ≥80% e APSES≥70%.11,22 Pela estrutura multidimensional do APSAT e do APSES, para calcular o escore final médio, foi estipulado que os participantes deveriam atingir mais de 70% em todas as dimensões dos instrumentos.
A análise estatística de dados foi realizada usando o IBM® SPSS® versão 21 para Mac®. Primeiramente, com uso do teste de McNemar, foram comparadas as contagens e a proporção de alunos que alcançaram os valores de referência para competência, conhecimento e autoeficácia na punção arterial no pré-teste e pós-teste. Em seguida, a competência dos participantes foi dicotomizada e a proporção de alunos que demonstrou competência no pré-teste e pós-teste também foi comparada usando o teste de McNemar.
As características demográficas dos participantes e os dados sobre a observação direta prévia de uma punção arterial para gasometria arterial estão na tabela 2. Os alunos que observaram enfermeiros qualificados realizando o procedimento (n = 16) completaram o workshop, mas seus dados não foram incluídos na análise, pois isso poderia ser considerado uma forma de treinamento. Além disso, nove participantes não completaram corretamente todas as ferramentas de avaliação autoadministradas e também foram excluídos da análise. Por fim, o total de 86 conjuntos de dados foi analisado.
Tabela 2 Características demográficas do total de participantes do workshop (n = 111) e a amostra final do estudo (n = 86)
Características | Participantes do workshop (n=111) n(%) | Amostra final do estudo (n=86) n(%) |
---|---|---|
M ± D.P. | M ± D.P. | |
Idade (anos) | 22,36 ± 5,49 | 22,01 ± 5,48 |
Gênero | ||
Feminino | 82(73,9) | 66(76,7) |
Masculino | 29(26,1) | 20(23,3) |
Nível educacional (completo) | ||
Ensino médio (secundário) | 79(71,2) | 66(76,7) |
Outras | 32(28,8) | 20(23,3) |
Punção arterial observada em paciente vivo | 16(14,4) | 0(0) |
A amostra final (N = 86) não havia recebido nenhuma forma de treinamento em punção arterial antes da intervenção educacional, e aproximadamente 77% (n = 66) dos participantes eram do sexo feminino. A idade média dos participantes incluídos na análise foi 22 anos (DP = 5,48, intervalo = 19-50). Em termos de nível educacional, 77% (n = 66) destes participantes tinham ingressado no programa de graduação em enfermagem após completar o ensino médio (secundário).
A tabela 3 apresenta a quantidade e proporção de alunos que atingiram os parâmetros de segurança para as seguintes variáveis: habilidades, conhecimento, autoeficácia e competência em punção arterial. Em resumo, a proporção de alunos que alcançou os parâmetros de segurança no pós-teste foi significativamente maior do que no pré-teste para todas as variáveis do estudo (p <0,05).
Tabela 3 Quantidade (proporções) de participantes que atingiram o valor de referência para todas as variáveis que medem a competência em punção arterial. Comparações baseadas no teste de McNemar1
Variáveis | Workshop de simulação | ||
---|---|---|---|
Pré-teste n=86 n(%) | Pós-teste n=86 n(%) | Valor p | |
Conhecimento em punção arterial | |||
≥80% do AP-MCQa respondido corretamente | 1(1,2) | 64(75,3) | <0,05 |
Autoeficácia em punção arterial | |||
≥70% alcançado na APSES totalb | 18(20,9) | 81(94,2) | <0,05 |
≥70% alcançado na subescala ‘Preparação do paciente e material’ da APSES | 33(38,4) | 86(100) | <0,05 |
≥70% alcançado na subescala ‘Punção arterial e gestão da amostra’ da APSES | 22(25,6) | 81(94,2) | <0,05 |
Habilidades em punção arterial | |||
≥70% alcançado no APSAT totalc | 4(4,7) | 74(86) | <0,05 |
≥70% alcançado na subescala ‘Comunicação com paciente’ do APSAT | 15(17,4) | 84(97,7) | <0,05 |
≥70% alcançado na subescala ‘Preparação de material’ do APSAT | 7(8,1) | 80(93) | <0,05 |
≥70% alcançado na subescala ‘Controle de infecção e anestesia’ do APSAT | 8(9,3) | 82(95,4) | <0,05 |
≥70% alcançado na subescala ‘Procedimento de punção arterial’ do APSAT | 17(19,8) | 85(98,8) | <0,05 |
≥70% alcançado na subescala ‘Gerenciamento da amostra’ do APSAT | 14(16,3) | 84(97,7) | <0,05 |
Competência em punção arterial | |||
Competência globald alcançada | 0(0) | 56(61,1) | <0,05 |
a AP-MCQ é o questionário de múltipla escolha utilizado para avaliar o conhecimento em punção arterial; b APSES é a escala utilizada para avaliar a autoeficácia em punção arterial; c APSAT é a lista de verificação usada para avaliar habilidades em punção arterial; d Competência global = ≥80% do AP-MCQ respondido corretamente e ≥70% alcançado em todas as subescalas da APSES, e ≥70% alcançado em todas as subescalas do APSAT
O objetivo deste estudo foi elaborar e implementar um workshop de simulação sobre punção de artéria radial para análise de gasometria arterial e explorar seus efeitos na competência dos estudantes de enfermagem. Em resumo, a participação em um workshop de simulação com duração de 1,5 horas resultou em uma proporção significativamente maior de alunos que alcançaram e demonstraram níveis adequados de conhecimento, habilidade, autoeficácia e competência geral que lhes permitiria realizar com segurança a punção de artéria radial para análise de gasometria arterial em pacientes vivos. No entanto, quase 40% dos participantes não atingiram o nível preestabelecido de competência requerido para serem autorizados a realizar uma punção da artéria radial em paciente vivo. Longe de interpretar esse achado como um fracasso da intervenção educacional implementada neste estudo, vemos este resultado como um sucesso, na medida em que demonstra que o workshop de simulação não somente permitiu que mais que 60% dos alunos alcançassem um nível seguro de competência em punção arterial para análise de gasometria arterial, mas também permitiu que os educadores identificassem aqueles que poderiam não realizar o procedimento em pacientes vivos com segurança. No entanto, são necessários mais estudos sobre como apoiar estes alunos e melhorar a intervenção educacional utilizada neste estudo.
No cenário do estudo, como em muitas outras faculdades com recursos limitados, a criação de um treinamento de simulação realista e eficaz pode ser um desafio.12,17,18 Consequentemente, os pesquisadores se concentraram em projetar e implementar uma intervenção educacional inovadora que, sendo potencialmente eficaz na melhoria da competência dos alunos de enfermagem em punção arterial, só exigiria a despesa extra de aquisição de simuladores de baixa tecnologia. Neste contexto, a evidência sugeriu que o uso de vídeo e demonstrações ao vivo,19-22 a prática autodirigida com simulação híbrida,8,19 aprendizagem por díades,18,23 e feedback intermitente21 poderiam melhorar a competência dos estudantes em procedimentos invasivos. Corroborando os achados desses estudos, nossos resultados mostraram que a integração da prática autodirigida com simulações híbridas e demonstração de vídeo e facilitadora, observação de pares e feedback intermitente também podem melhorar significativamente o conhecimento, as habilidades e autoeficácia em procedimentos invasivos dos estudantes de enfermagem, tais como punção da artéria radial.
Resultados publicados anteriormente sugerem que o uso de simuladores de baixa tecnologia pode não ser eficaz na melhoria da aquisição de habilidades em venopunção dos estudantes de enfermagem se não for feito em combinação com simuladores de alta tecnologia.16 Entretanto, concordando com Reinhardt et al.,28 nosso estudo demonstrou que o uso de simuladores de baixa tecnologia não necessariamente impede que os alunos adquiram confiança e competência em punção arterial. De fato, em combinação com pacientes simulados, os simuladores de baixa fidelidade serviram para criar uma representação precisa de cenários da vida real.29 Isto pode ter contribuído para a melhoria observada na proporção de participantes que alcançaram os valores de referência para habilidades psicomotoras e de comunicação.19 Esta melhoria na habilidade dos participantes também pode ter sido influenciada positivamente por outros fatores. Por exemplo, as demonstrações do procedimento em vídeo e do facilitador em um simulador podem ter reduzido as demandas cognitivas que a aprendizagem dessas habilidades impõe aos alunos.22 A prática autodirigida pode ter aumentado a motivação para aprender dos participantes e lhes deu a oportunidade de repetir o procedimento até atingir o domínio das habilidades.8,11 A aprendizagem em díades pode ter fomentado o ensino e a observação por pares, reduzido o tempo necessário para a aplicação prática e aumentado a motivação dos participantes para o aprendizado.18,23 Por fim, o feedback intermitente dos colegas e facilitadores pode ter contribuído para corrigir erros e consolidar ganhos de aprendizado ao mesmo tempo que minimizou distrações.21
Embora as habilidades sejam um elemento primordial da competência, também se espera que os alunos adquiram certo nível de conhecimento e autoeficácia antes de serem autorizados a praticar procedimentos invasivos em pacientes vivos.10-12 Nesse sentido, o presente estudo mostrou que a participação em um workshop de simulação pode melhorar o conhecimento e autoeficácia dos alunos de enfermagem em punção arterial.
A melhoria na proporção de participantes que alcançaram o marco de referência de conhecimento pode ter sido influenciada pelas diferentes metodologias educacionais utilizadas. Por um lado, a videoconferência inicial e os dois exemplos de modelagem sem falha podem ter contribuído para disseminar o conhecimento envolvido no procedimento.25 Por outro lado, o exemplo de modelagem com falha, a prática autodirigida em díades e o feedback individual podem ter facilitado sua consolidação através da promoção da reflexão individual, da discussão em grupo, da implementação prática e da autoavaliação de tal conhecimento.20 Da mesma forma e em concordância com resultados de estudos anteriores, a implementação de exemplos de modelagem, da prática simulada autodirigida e da aprendizagem em díades parece ter promovido um aumento na proporção de estudantes que relataram um alto nível de autoeficácia na punção arterial.8,18 Este aumento da autoeficácia dos participantes pode ter contribuído para a aquisição final de competência, na medida em que pode ter impulsionado a sua motivação para aprender e influenciado positivamente a sua perseverança e vontade de trabalhar.17,30
Tanto quanto sabemos, este não é apenas o primeiro estudo focado na concepção, implementação e avaliação dos efeitos de um workshop de simulação em punção arterial para estudantes de enfermagem, mas também o primeiro que mede a competência em termos de conhecimento, habilidades e autoeficácia. No entanto, existem algumas limitações que podem restringir a generalização e interpretação de nossos resultados. Em primeiro lugar, a amostra do estudo foi convenientemente selecionada, o que significa que os resultados não podem ser generalizados para populações com características diferentes. Em segundo lugar, por contenções organizacionais, foi possível desenhar somente um grupo de estudo pré-teste e pós-teste. A ausência de um grupo para comparação de resultados torna muito difícil determinar se as melhorias na competência dos participantes são causadas diretamente por nossa intervenção educacional. Em terceiro lugar, embora possamos dizer que o workshop de simulação contribuiu para o aumento da proporção de participantes que alcançaram a competência em punção arterial, não podemos identificar qual é o efeito real de cada metodologia educacional sobre a competência dos alunos. Por fim, neste estudo, não foi possível medir a retenção de competência dos alunos e sua capacidade de transferi-la para a prática clínica. Portanto, não podemos garantir se os ganhos educacionais dos participantes após o workshop de simulação serão mantidos ao longo do tempo e se eles seriam capazes de apresentar níveis semelhantes de competência ao realizar o procedimento em pacientes vivos.
A punção da artéria radial para análise de gasometria radial é um procedimento arriscado e desafiador. Consequentemente, enfermeiros e estudantes de enfermagem devem ser treinados e avaliados antes de serem autorizados a praticar punção arterial em pacientes vivos. A concepção e implementação de um workshop com duração de 1,5 horas usando demonstração em vídeo, exemplos de modelagem, aprendizado em díades, feedback intermitente e simulação híbrida autodirigida usando equipamentos de baixa tecnologia podem melhorar a competência dos estudantes de enfermagem na punção de artéria radial para análise de gasometria arterial. Estudos futuros devem utilizar desenhos experimentais com o objetivo de comparar os efeitos de diferentes estratégias educacionais sobre a aquisição, retenção e transferência de competências de enfermeiros e estudantes de enfermagem na punção arterial. Igualmente, é necessário realizar mais pesquisas sobre como apoiar aqueles que não atingem o nível de competência requerido para a prática em pacientes vivos após o treinamento de simulação em punção arterial.