versão impressa ISSN 1806-3713
J. bras. pneumol. vol.40 no.6 São Paulo nov./dez. 2014
http://dx.doi.org/10.1590/S1806-37132014000600003
A asma é uma das condições crônicas mais comuns na população atual.( 1 ) Estima-se que existam cerca de 300 milhões de asmáticos no mundo, sendo 20 milhões apenas no Brasil. ( 2 ) A principal característica fisiopatológica da asma é a inflamação das vias aéreas, presente nas formas leves da doença e mesmo entre os assintomáticos.( 3 ) A terapia deve focar de forma especial a redução da inflamação.
O objetivo principal no manejo da asma é atingir e manter o controle.( 4 ) A manutenção do tratamento deve variar de acordo com o estado de controle do paciente, adicionando-se ou subtraindo-se medicamentos/doses.( 1 ) O tratamento ideal mantém o paciente controlado e estável com a menor dose de medicação possível. Os corticosteroides inalatórios (CIs) são os medicamentos anti-inflamatórios mais efetivos para o tratamento de pacientes que mantêm sintomas semanais, diários ou contínuos.( 5 )
Os CIs disponíveis - beclometasona, budesonida, ciclesonida, fluticasona e mometasona - diferem em potência e biodisponibilidade, mas os estudos não mostraram relevância clínica dessas diferenças.( 6 ) Os long-acting β2 agonists (LABAs, β2-agonistas de ação prolongada) formoterol e salmeterol não devem ser usados em monoterapia, uma vez que não têm ação na inflamação asmática. São muito mais efetivos quando administrados em combinação com um CI.( 1 )
A terapia combinada ou associada é a de escolha quando uma dose média de CI isolado não controla a asma. A adição de LABAs à dose diária de CI diminui sintomas diurnos e noturnos, melhora a função pulmonar, diminui o uso de medicação de resgate, reduz o número de exacerbações( 3 , 7 ) e promove o controle clínico em um maior número de pacientes, de maneira mais rápida e com menores doses de CI.( 8 )
A maior eficácia do tratamento associado levou ao desenvolvimento de inaladores que liberam doses fixas de combinações de CI+LABAs simultaneamente. O tratamento com esse tipo de combinação é tão efetivo quanto a administração das mesmas drogas de forma separada.( 9 ) Inaladores com combinações fixas são mais convenientes para os pacientes, pois podem aumentar a aderência ao tratamento( 10 ) e garantir que o LABA seja sempre administrado junto com o CI.
Além da medicação per se, a aderência ao tratamento, o tipo de inalador e a técnica utilizada na administração da mesma são igualmente importantes para o sucesso do tratamento. A baixa adesão ao tratamento é comum em pacientes asmáticos, variando em taxas de 16% a 50%.( 11 ) O uso correto dos inaladores possibilita o alcance seletivo do medicamento aos pulmões e reduz os efeitos adversos sistêmicos.( 12 , 13 ) A efetividade da medicação inalada depende não somente da formulação e do tipo de inalador utilizado, mas também da habilidade do paciente em executar a técnica de inalação corretamente.( 14 )
Em um estudo que comparou a associação formoterol/budesonida com a associação salmeterol/fluticasona, não foram observadas diferenças estatisticamente significativas na frequência de exacerbações de asma que necessitaram atendimento médico de emergência, de hospitalizações e de uso de corticosteroide oral.( 15 ) Esses achados, no entanto, podem obscurecer diferenças individuais dos componentes. Um grupo de autores concluiu que, quando administrada na metade da dose da budesonida, a fluticasona proporcionou um maior efeito na função pulmonar em todas as doses utilizadas, em todos os grupos etários avaliados e em todos os tipos de dispositivos utilizados quando comparada à budesonida.( 16 ) Também são observadas diferenças nos desfechos utilizando formoterol e salmeterol. O uso de formoterol foi associado a uma melhora acentuada da função pulmonar, menor necessidade de medicação de resgate e uma proporção maior de dias livres de sintomas quando comparado com o de salmeterol.( 17 )
A associação de formoterol e fluticasona não está atualmente disponível no mercado nacional. O produto experimental com essa associação pode ser uma nova opção para o tratamento da asma. O objetivo do presente estudo foi comparar a eficácia e a segurança de medicamentos, todos administrados por inaladores de pó, contendo budesonida/formoterol administrados em cápsulas em separado, fluticasona isolada e a nova combinação fluticasona/formoterol em um único dispositivo. O uso correto desses dispositivos, a preferência por eles e a adesão ao tratamento foram objetivos secundários.
Este foi um estudo de fase III, aleatorizado e aberto, conduzido em seis centros de pesquisa brasileiros. A população do estudo foi composta por pacientes com idade ≥ 12 anos; com diagnóstico de asma persistente leve e moderada,( 1 ) com sintomas há pelo menos 6 meses; estáveis clinicamente há pelo menos 1 mês; apresentando escore no Asthma Control Questionnaire 7 (ACQ-7) ≤ 3 pontos( 18 ); em uso atual de CI equivalente a até 1.000 µg de dipropionato de beclometasona, associado ou não a LABA; e VEF1 pré-broncodilatador > 40% do valor previsto. Foram excluídos os pacientes que necessitaram de internação devido à asma ou que usaram corticosteroide oral ou parenteral nos 3 meses anteriores ao estudo; assim como fumantes ativos nos últimos 3 meses; aqueles que possuíam comorbidades graves; os que participaram de outros estudos clínicos nos últimos 12 meses; grávidas ou lactantes; ou que faziam uso crônico de betabloqueadores. Todos os participantes assinaram o termo de consentimento livre e esclarecido. O estudo foi conduzido de acordo com as boas práticas clínicas e com a Declaração de Helsinki.( 19 ).
Para maior homogeneidade dos grupos e antes da aleatorização, os pacientes foram estratificados conforme o centro de pesquisa e o valor de VEF1 pré-broncodilatador basal: de 40-70% do previsto vs. ≥ 70% do previsto. A aleatorização ocorreu por um sistema eletrônico centralizado na razão 1:1:1 para receber os três braços de tratamento: grupo BUD/FOR, usando a associação de formoterol 12 µg + budesonida 400 µg - cápsulas de pó seco separadas acionadas por dispositivo do tipo Aerolizer(r) - (Foraseq(r); Novartis Biociências S.A., São Paulo, Brasil); grupo FLU, usando fluticasona 500 µg - dispositivo multidose do tipo Diskus(r) - (Flixotide(r); GlaxoSmithKline Brasil, Rio de Janeiro, Brasil); e grupo FLU/FOR, usando a nova associação formoterol 12 µg + propionato de fluticasona 250 µg, - cápsula de pó seco única (Eurofarma, São Paulo, Brasil). acionada por dispositivo CDM-Haler(r) (Emphasys Industrial, Boituva, Brasil). Todos os tratamentos inalatórios foram administrados duas vezes ao dia (12/12 h).
Os pacientes foram avaliados em uma primeira visita de inclusão (VI) e aleatorizados em 15 ± 5 dias - visita de randomização (VR) - sendo reavaliados a cada 4 semanas em três visitas - V1, V2 e visita final (VF). Entre a VI e a VR, os pacientes mantiveram as medicações em uso, realizaram a dosagem de cortisol, receberam um diário para a medida do PFE e, quando apropriado, realizaram um teste de gravidez. O período de seguimento foi de pelo menos 12 semanas. O desfecho primário do estudo foi a medida do VEF1 em L na VF, e os desfechos secundários incluíram a medida seriada do PFE, o nível de controle da asma, o uso adequado do inalador, a frequência de eventos adversos e a variação da dosagem de cortisol sérico, observados ao longo do estudo. Em todas as visitas após a VR, verificou-se a adesão à medicação de estudo através da contagem de cápsulas/doses utilizadas.
A espirometria foi efetuada em todas as visitas, realizadas de acordo com as estratégias de manejo da asma.( 2 , 20 ) O PFE foi medido pela manhã e à noite ao longo do tratamento, registrado e coletado (melhor de 3 medidas) através do diário pelo paciente, e avaliado posteriormente pelo investigador.( 21 )
O controle da asma foi avaliado pelo escore do ACQ-7( 18 ) na VI, V1, V2 e VF. O ACQ-7 é composto por sete questões relativas ao controle de sintomas da asma, uso de medicação de resgate e VEF1%. Um escore ≤ 1,57 pontos (total, 6 pontos) indica asma controlada. A avaliação clínica do controle durante o estudo foi realizada pelo investigador segundo os critérios da Global Initiative for Asthma (não controlado, parcialmente controlado e controlado).( 1 )
Entre a VR e a VF, foi verificado o uso adequado do inalador das medicações do estudo, pontuado por uma escala máxima de oito pontos. Durante a V1 e a VF, os pacientes responderam ainda uma avaliação com perguntas categóricas (sim/não) e uma questão de variável contínua (nota de zero a 10) sobre a aceitabilidade e a preferência dos três inaladores. O cortisol sérico foi avaliado no início e no final do estudo. O registro de eventos adversos foi realizado pelo investigador durante a V1, V2 e VF.
Para o cálculo do tamanho da amostra no delineamento de não inferioridade proposto, considerou-se que o desfecho primário VEF1 médio (em L) após 12 semanas de tratamento seria ao menos igual nos três grupos avaliados no presente estudo. A margem de não inferioridade considerada foi de 7,5% e avaliada na análise primária de eficácia perante o grupo BUD/FOR em relação ao VEF1 médio após 12 semanas. Com base em dados da literatura, foi considerado um VEF1 médio de 2,81 L, com desvio-padrão estimado em 0,43 L. Considerando-se um erro alfa unicaudal de 2,5% e um poder estatístico de 80% para o estudo encontrar a diferença máxima de 7,5% para menos entre os grupos (limite de não inferioridade), foi estimado que deveriam ser incluídos 67 pacientes em cada grupo do estudo. Admitindo-se que houvesse perda de seguimento de 15% dos pacientes, o estudo previa incluir 243 pacientes, 81 por grupo.
As variáveis contínuas com distribuição normal foram analisadas por meio de média e desvio-padrão, enquanto mediana e intervalo interquartílico foram usados para as com distribuição não normal. As variáveis categóricas foram descritas por meio de frequências relativas. O teste de Kolmogorov-Smirnov foi utilizado para a avaliação do padrão de distribuição das variáveis na amostra. Variáveis contínuas com distribuição normal foram comparadas por meio de testes T ou ANOVA. Testes não paramétricos foram utilizados para o caso de variáveis com distribuição não normal. O teste de Mann-Whitney foi usado para comparações entre dois grupos, enquanto o teste de Kruskal-Wallis foi usado nas comparações envolvendo três grupos.
Foram incluídos 273 pacientes, e 243 foram randomizados: 79 para o grupo FLU/FOR, 83 para o grupo BUD/FOR e 81 para o grupo FLU. Dos 242 pacientes elegíveis que receberam tratamento - 1 foi excluído após a randomização por uso de betabloqueadores - todos entraram na população de segurança, e 235 entraram na população com intenção de tratamento (ITT) por terem ao menos uma avaliação de qualquer um dos desfechos do estudo. As características demográficas e clínicas dos pacientes na população ITT estão descritas na Tabela 1.
Tabela 1 - Características demográficas e clínicas dos pacientes na população com intenção de tratamento por grupo de estudo (n = 235).a
Características | Grupos | ||
---|---|---|---|
Fluticasona/formoterol | Budesonida/formoterol | Fluticasona | |
(n = 76) | (n = 82) | (n = 77) | |
Idade, anosb | 36,72 ± 17,72 | 40,82 ± 16,88 | 39,08 ± 15,86 |
Sexo | |||
Feminino | 49 (64,5) | 55 (67,1) | 61 (79,2) |
Masculino | 27 (35,5) | 27 (32,9) | 16 (20,8) |
Raça | |||
Branca | 47 (61,8) | 52 (63,4) | 43 (55,8) |
Negra | 16 (21,1) | 11 (13,4) | 15 (19,5) |
Parda | 13 (17,1) | 19 (23,2) | 19 (24,7) |
IMC,b kg/m2 | 27,00 ± 5,63 | 27,37 ± 5,65 | 27,84 ± 4,57 |
História de tabagismoc | |||
Fumou anteriormente | 12 (15,8) | 11 (13,4) | 9 (11,7) |
Nunca fumou | 64 (84,2) | 71 (86,6) | 68 (88,3) |
Avaliação da asma | |||
Controlada | 43 (59,7) | 38 (62,3) | 44 (71,0) |
Não controlada | 1 (1,4) | 2 (3,3) | 2 (3,2) |
Parcialmente controlada | 28 (38,9) | 21 (34,4) | 16 (25,8) |
VEF1, Lb | 2,53 ± 0,78 | 2,53 ± 0,89 | 2,35 ± 0,59 |
VEF1, % do previstob | 82,07 ± 18,06 | 81,44 ± 17,24 | 81,44 ± 17,25 |
IMC: índice de massa corpórea. aValores expressos em n (%), exceto onde indicado. bValores expressos em média ± dp. cFumou anteriormente até três meses antes do estudo.
A população por protocolo (PP) foi composta por 195 pacientes com dados referentes ao VEF1 ao final do estudo. Sete pacientes não entraram na população ITT por não terem realizado visitas após a VI, enquanto 47 pacientes não entraram na população PP por não terem avaliação do desfecho primário, por terem sido excluídos conforme critério do estudo ou por outros desvios significantes (Figura 1).
Figura 1 - Fluxo de pacientes de acordo com a população por protocolo (PP), população com intenção de tratamento (ITT) e população de segurança.
Os medicamentos utilizados nos grupos FLU/FOR, BUD/FOR e FLU apresentaram desempenho semelhante para o desfecho primário VEF1 após 12 semanas. Nos grupos FLU/FOR, BUD/FOR e FLU (população ITT), respectivamente, os valores de VEF1 foram 2,53 ± 0,77 L, 2,50 ± 0,87 L e 2,41 ± 0,62 L, enquanto esses valores na VF foram 2,72 ± 0,81 L, 2,50 ± 0,82 L e 2,45 ± 0,73 L. A Figura 2 apresenta os resultados descritivos de VEF1 (em L e em % do previsto) ao longo do estudo nos três grupos de tratamento. Houve uma diferença significativa ao longo do tratamento entre as avaliações (p < 0,001) mas não entre os grupos. Após 12 semanas, a diferença das médias do VEF1 (população PP) entre os grupos FLU/FOR e BUD/FOR foi de 0,22 L (IC95%: −0,06 a 0,48), enquanto, entre os grupos FLU/FOR e FLU, essa foi de 0,26 L (IC95%: −0,002 a 0,520). A análise primária de eficácia que comparou a nova combinação e a associação budesonida/formoterol demonstrou a não inferioridade, uma vez que o limite inferior do IC95% para a diferença entre a média do VEF1 na VF com os dois produtos (−0,06) foi maior que a margem de não inferioridade pré-estabelecida (7,5% do VEF1 com a associação budesonida/formoterol, ou seja, −0,18). A não inferioridade da combinação fluticasona/formoterol também foi demonstrada na análise secundária de eficácia, que comparou o produto à formulação somente com fluticasona.
Figura 2 - Evolução das medidas de VEF1 em litros (em A) e em % do previsto (em B) nos grupos fluticasona/ formoterol (FLU/FOR), fluticasona (FLU) e budesonida/formoterol (BUD/FOR) e por visita na população com intenção de tratamento (ITT). VI: visita de inclusão; V1: visita 1; V2: visita 2; e VF: visita final.
A análise dos registros de PFE pela manhã e a noite apontou que não houve diferenças significativas entre os grupos em relação ao início do estudo. No entanto, a avaliação do PFE combinado (manhã + noite) ao longo do estudo mostrou que houve diferenças significativas entre os grupos (p = 0,02), que houve efeito das visitas (p < 0,001) e que também houve interações entre visitas e grupos (p = 0,01). O PFE combinado ao final do estudo (população ITT) nos grupos FLU/FOR, BUD/FOR e FLU, respectivamente, foi de 382,1 ± 118,4 L/s, 364,9 ± 115,2 L/s e 324,3 ± 92,1 L/s. Esses resultados sugerem que houve um aumento gradual do PFE global ao longo do estudo, especialmente nos grupos FLU/FOR e BUD/FOR.
A Figura 3 mostra a evolução dos escores de ACQ-7 por grupo de tratamento durante o estudo (ITT). Como pode ser observado, houve diferenças estatisticamente significativas entre os tratamentos na V1 (p < 0,001) e na VF (p < 0,05), mas não na VR e na V2. O escore médio do ACQ-7 ao final de 12 semanas de tratamento para os grupos FLU/FOR, BUD/FOR e FLU, respectivamente, foi de 0,71 ± 0,7 pontos, 0,93 ± 0,07 pontos e 0,98 ± 0,07 pontos. As medianas dos escores de ACQ-7 na VF mostram que houve diferenças significativas entre os grupos de tratamento (p < 0,05). Esses resultados da interação grupo e avaliação sugerem que houve uma redução gradual nos escores do ACQ-7 ao longo do estudo nos três grupos, mas que essa redução foi mais consistente no grupo que usou as associações CI+LABA, sendo essa mais significativa no grupo FLU/FOR.
Figura 3 - Evolução dos escores do Asthma Control Questionnaire 7 (ACQ-7) nos grupos fluticasona/ formoterol (FLU/FOR), fluticasona (FLU) e budesonida/ formoterol (BUD/FOR) na população com intenção de tratamento (ITT). VI: visita de inclusão; V1: visita 1; V2: visita 2; e VF: visita final.
A avaliação do controle da asma pelos investigadores mostra que a proporção de pacientes com asma controlada era semelhante no início e se alterou durante o estudo. Nos grupos FLU/FOR, BUD/FOR e FLU, respectivamente, a proporção inicial de pacientes foi de 59%, 60% e 66%, enquanto a proporção no final foi de 83%, 63% e 68%, com uma tendência a diferença significativa (p = 0,08) no grupo FLU/FOR.
Os resultados dos escores de uso dos inaladores acima de 7 pontos (> 90% acertos) em todas as visitas mostraram que os pacientes sabiam utilizá-los adequadamente, sem diferenças entre os grupos. A escala decimal de preferência pelo tipo de inalador tampouco mostrou diferenças entre os grupos, com valores acima de 8 pontos (> 80%). A Tabela 2 mostra a adesão aos tratamentos, indicando uma grande variação nos grupos entre o início e o final do estudo. Entretanto, não houve diferenças nas medidas de tendência central de adesão entre eles.
Tabela 2 - Adesão ao tratamento na população com intenção de tratamento por grupo de estudo (n = 235).
Adesão | Grupos | ||
---|---|---|---|
Fluticasona/formoterol | Budesonida/formoterol | Fluticasona | |
VR a V1 | (n = 75) | (n = 82) | (n = 77) |
Média ± dp | 97,6 ± 12,9 | 94,2 ± 12,3 | 87,7 ± 18,0 |
Variação | 50,0-142,8 | 8,9-111,1 | 10,8-106,5 |
Mediana (IIQ) | 98,2 (93,4-100,0) | 97,0 (90,6-100,0) | 93,7 (82,2-100,0) |
V1 a V2 | (n = 72) | (n = 78) | (n = 66) |
Média ± dp | 98,1 ± 7,4 | 95,0 ± 7,45 | 95,0 ± 7,4 |
Variação | 66,6-121,1 | 62,5-111,1 | 66.3-110.0 |
Mediana (IIQ) | 98,2 (95,8-100,0) | 96,7 (90,9-100,0) | 96,4 (91,8-100,0) |
V2 a VF | (n = 72) | (n = 73) | (n = 62) |
Média ± dp | 97,5 ± 5,9 | 96,8 ± 7,2 | 92,7 ± 11,4 |
Variação | 75,3-108,5 | 72,2-127,6 | 42,8-107,2 |
Mediana (IIQ) | 99,4 (96,0-100,0) | 98,2 (94,6-100,0) | 96,35 (88,5-100,0) |
VR: visita de randomização; IIQ: intervalo interquartílico; e VF: visita final.
Nos grupos FLU/FOR, BUD/FOR e FLU, respectivamente, os eventos adversos considerados não graves mais comuns foram crise asmática (13,92%, 16,87% e 17,50%), nasofaringite (13,92%, 21,69% e 21,25%) e rinite (15,19%, 16,87% e 25,00%).
Considerando a população de segurança (n = 242), apenas 2 pacientes do grupo FLU/FOR tiveram registros de evento adverso grave: crise asmática em 1 e intoxicação medicamentosa em 1, relacionada e não relacionada ao tratamento do estudo, respectivamente.
A mediana do nível de cortisol sérico ao final do tratamento estava dentro da normalidade, não havendo diferenças estatisticamente significativas entre os grupos FLU/FOR, BUD/FOR e FLU (9,85 ± 6,46 µg/dL, 10,32 ± 5,19 µg/dL e 9,35 ± 4,69 µg/dL, respectivamente).
O presente estudo comparou a eficácia e a segurança da combinação fluticasona/formoterol 250/12 µg em cápsula única de pó seco com a associação budesonida/formoterol 400/12 µg em cápsulas separadas de pó seco inalado e com fluticasona 500 µg em pacientes com asma leve e moderada. A análise primária de eficácia (VEF1) demonstrou a não inferioridade da nova combinação fluticasona/formoterol em relação à associação budesonida/formoterol e à fluticasona isolada. De forma semelhante, ficou demonstrado que o controle da asma foi semelhante entre os grupos, com uma pequena diferença a favor de melhor controle no grupo FLU/FOR ao final do estudo. Encontrou-se também um PFE mais elevado ao final do estudo nos grupos que usaram formoterol. A adesão, a preferência, a aceitabilidade e os eventos adversos foram semelhantes entre os grupos estudados.
Apesar de a não inferioridade ter sido comprovada pelas análises realizadas, não foi possível demonstrar a superioridade da combinação fluticasona/formoterol no presente estudo. A eficácia, segurança e tolerância da combinação fluticasona/formoterol foram avaliadas em um estudo com desenho semelhante ao nosso; porém, foram utilizados medicamentos com aerossóis pressurizados.( 22 ) A combinação fluticasona/formoterol em um único dispositivo aerossol, a associação fluticasona/formoterol em dispositivos aerossóis separados e a fluticasona isolada foram igualmente não inferiores em relação aos valores do VEF1 e os desfechos de segurança. Analises post hoc de ambos os estudos mostraram diferenças significativas em sintomas, controle e PFE da combinação fluticasona/formoterol em dispositivo único (pó e aerossol), especialmente em comparação a fluticasona isolada. Estudos com um número maior de pacientes talvez pudessem mostrar melhor essas diferenças.
A não inferioridade da combinação fluticasona/formoterol aerossol com a combinação fluticasona/salmeterol em dispositivo multidose foi igualmente demonstrada.( 23 ) Porém, a reposta ao tratamento foi mais rápida no grupo que usou formoterol, com um possível impacto em preferência e aderência. No presente estudo, dois grupos usaram formoterol, não permitindo diferenciá-los claramente. Apesar da preferência, aceitabilidade e média/mediana de adesão aos diferentes dispositivos também terem sido semelhantes, pode-se ver na Tabela 2 que os valores mínimos de adesão ao final do estudo nos grupos FLU/FOR e BUD/FOR foram superiores aos do uso do CI isolado.
Duas meta-análises( 24 , 25 ) e uma revisão sistemática( 17 ) reportaram que o uso da fluticasona está associado a melhores desfechos do que o uso da budesonida. Apesar de um número pequeno de estudos comparativos na época, a fluticasona foi associada com uma maior prevenção de exacerbações da asma.( 17 ) Outra diferença observada é a necessidade de doses maiores de budesonida para atingir o controle similar da asma, provavelmente devido à molécula da fluticasona apresentar maior afinidade de ligação ao receptor de corticosteroide e a características farmacocinéticas diferentes.( 26 )
A eficácia de qualquer terapia inalatória para asma na prática clínica depende de uma série de fatores, incluindo a eficácia da droga, a quantidade de medicamento liberado, o manuseio correto do dispositivo, a técnica inalatória e a aderência. A baixa adesão ao tratamento de manutenção e a falta de controle do asmático em quase 50% dos estudos, mesmo em protocolos de pesquisa, parecem depender desses outros fatores. Mais de 100 combinações de inalador/medicamento estavam disponíveis há 5 anos.( 27 ) O advento do hidrofluoralcano e de novos medicamentos, assim como novos inaladores, aumentou nesse período. O critério para escolher o melhor inalador é diferente do ponto de vista de quem o cria ou fabrica, do paciente que o usa ou de quem o prescreve.( 28 ) No mundo real, a eficácia clínica, a disponibilidade local do dispositivo, seu preço e a preferência/aceitabilidade do paciente devem ser considerados. A opção pela utilização, no presente estudo, de cápsula única duas vezes ao dia contendo a formulação fluticasona/formoterol na forma de pó seco parece contribuir para a adesão ao tratamento. Os medicamentos na forma de pó são mais fáceis de utilizar que os aerossóis.( 29 )
O dispositivo inalatório utilizado pela nova combinação fluticasona/formoterol (CDM-Haler(r)) foi testado in vitro em relação ao dispositivo Diskus(r) para a determinação dos PFEs gerados em 4 kPa a volume constante e para a avaliação da uniformidade da dose liberada e da dose de partícula fina na distribuição aerodinâmica. Os resultados mostraram uniformidade de dose liberada e de distribuição aerodinâmica no início, meio e fim de 360 atuações em 10 inaladores testados.( 30 )
O ponto forte do presente estudo é seu delineamento, em consonância com outros estudos de não inferioridade multicêntricos realizados com esse objetivo. A metodologia permitiu utilizar análises de ITT e PP para avaliar a população estudada e o desfecho primário, respectivamente. Por outro lado, talvez o estudo ficasse mais robusto se só fossem incluídos pacientes mais graves e não controlados. A opção por excluir esses pacientes foi deliberada, pois o número de pacientes para atingir a não inferioridade teria sido muito maior, com uma falha de inclusão maior que a de 15% verificada. Note-se também que o uso de medidas de controle de asma pelos pacientes e pelos investigadores, assim como avaliações objetivas de adesão e de uso do dispositivo inalado permitiriam detectar sinais de eficácia em partes da população estudada, permitindo inferências sobre a personalização do tratamento dos asmáticos.
Estudos nacionais com novos medicamentos (fase III) são importantes para analisar respostas específicas a eles na população estudada. Órgãos regulatórios de países como Japão e China, por exemplo, exigem estudos nacionais para permitir sua comercialização nesses países por entenderem essa diversidade de reposta ao tratamento. Estudos multicêntricos brasileiros na área respiratória e com grande número de pacientes são escassos. Os resultados encontrados no presente estudo mostram a importância de realizá-los, especialmente quando se pretende disponibilizar medicamentos que, na sua forma/apresentação, podem se adequar melhor a aceitação, preferência e adesão do paciente local.
Em conclusão, o presente estudo demonstrou a não inferioridade da nova combinação fluticasona/formoterol em cápsula única inalatória em relação aos medicamentos de referência budesonida/formoterol e fluticasona. Além disso, essa combinação apresentou eficácia e segurança comparáveis, além do controle da asma persistente com uma avaliação objetiva do uso e da adesão ao tratamento com dispositivos inalatórios. Essa combinação CI+LABA desenvolvida agora como terapia de manutenção única representa uma opção de tratamento eficaz adicional para asma persistente, em especial em pacientes que não estejam respondendo adequadamente a CI isolado ou a outras combinações ou associações de CI e LABA.