versão impressa ISSN 0066-782X
Arq. Bras. Cardiol. vol.103 no.3 São Paulo set. 2014 Epub 01-Ago-2014
https://doi.org/10.5935/abc.20140110
Stents eluidores de drogas têm sido utilizados na prática médica desde 2002, e apresentam grande eficácia na redução do risco de revascularização do vaso-alvo, e notável redução da taxa de reestenose de 50%-70%. No entanto, a ocorrência de trombose tardia pode comprometer os resultados a longo prazo, especialmente se o risco de trombose for mantido ao longo dos anos. Neste contexto, o registro da prática clínica assume grande importância. Objetivo: Avaliar a eficácia e segurança de stents eluidores de drogas no mundo real.
Relatamos os resultados de todos os pacientes que foram submetidos à intervenção coronária percutânea com stent eluidor de drogas no período entre janeiro de 2002 a abril de 2007, e que foram acompanhados por 8 anos. Os stents eluidores de drogas foram utilizados de acordo com as recomendações clínicas do cardiologista intervencionista e a disponibilidade do stent.
Um total de 611 pacientes foram avaliados, com acompanhamento clínico de 96,2% destes pacientes por até 8 anos. A mortalidade total foi de 8,7%. Infarto não-fatal ocorreu em 4,3% dos casos. A taxa de revascularização do vaso-alvo foi de 12,4% e a da lesão-alvo foi de 8,0%. A taxa de trombose de stent foi de 2,1%. Não houve novos episódios de trombose de stent após o quinto ano de acompanhamento. Uma subanálise comparativa indicou não haver diferenças nos desfechos clínicos apos a utilização dos stents Cypher, Taxus e Endeavor.
Estes resultados indicam que stents eluidores de drogas são seguros e eficazes em acompanhamentos de longo prazo, e que pacientes no mundo real podem beneficiar destes stents, com excelentes resultados a longo prazo.
Palavras-Chave: Stents Farmacológicos/tendências; Resultado do Tratamento; Efetividade; Efeitos a Longo Prazo
Drug-eluting stents have been used in daily practice since 2002, with the clear advantages of reducing the risk of target vessel revascularization and an impressive reduction in restenosis rate by 50%-70%. However, the occurrence of a late thrombosis can compromise long-term results, particularly if the risks of this event were sustained. In this context, a registry of clinical cases gains special value.
To evaluate the efficacy and safety of drug-eluting stents in the real world.
We report on the clinical findings and 8-year follow-up parameters of all patients that underwent percutaneous coronary intervention with a drug-eluting stent from January 2002 to April 2007. Drug-eluting stents were used in accordance with the clinical and interventional cardiologist decision and availability of the stent.
A total of 611 patients were included, and clinical follow-up of up to 8 years was obtained for 96.2% of the patients. Total mortality was 8.7% and nonfatal infarctions occurred in 4.3% of the cases. Target vessel revascularization occurred in 12.4% of the cases, and target lesion revascularization occurred in 8% of the cases. The rate of stent thrombosis was 2.1%. There were no new episodes of stent thrombosis after the fifth year of follow-up. Comparative subanalysis showed no outcome differences between the different types of stents used, including Cypher®, Taxus®, and Endeavor®.
These findings indicate that drug-eluting stents remain safe and effective at very long-term follow-up. Patients in the "real world" may benefit from drug-eluting stenting with excellent, long-term results.
Key words: Drug-Eluting Stents/trends; Treatment Outcome; Effectiveness; Long-Term Effect
Stents eluidores de drogas (SEDs) têm sido usados na prática clínica desde 2002. Estudos clínicos multicêntricos demonstraram as vantagens destes stents em reduzir os principais desfechos clínicos cardiovasculares, principalmente a revascularização do vaso-alvo (RVA), quando comparados com stents metálicos1. Com o aumento do uso destes dispositivos em cenários clínicos não incluídos em ensaios clínicos randomizados, a segurança e eficácia dos SEDs no mundo real começaram a ser questionadas. Os questionamentos sobre a segurança dos SEDs aumentaram após 2006, quando dados preliminares apontaram taxas mais altas de tromboses intra-stent utilizando SED, em comparação com stents metálicos2 - 5.
Apesar do amplo uso de SEDs nos anos subsequentes, ainda há poucos estudos de longo prazo de pacientes que receberam esses dispositivos.
O registro de práticas clínicas foi criado dentro deste contexto, em que todos os pacientes provenientes de duas instituições brasileiras, que receberam SEDs entre 2002 e 2007 - muitas vezes com indicações diferentes das preconizadas - foram acompanhados clinicamente por 8 anos. Os desfechos clínicos destes pacientes foram analisados com base em recomendações recentes, permitindo assim a avaliação da eficácia e segurança desta tecnologia.
Este estudo envolveu pacientes submetidos à intervenção coronária percutânea usando pelo menos 1 SED (modelos Costar, Cypher, Endeavor, Infinium, Janus, Supralimus e Taxus) de janeiro de 2002 a abril de 2007, realizada nos hospitais São Lucas e Mãe de Deus, em Porto Alegre, Rio Grande do Sul, Brasil. Todas as apresentações clínicas da síndrome coronariana aguda com e sem supradesnivelamento do segmento ST e angina estável foram incluídos. O tipo de stent utilizado durante o procedimento foi deixado aos critério do cardiologista intervencionista. Considerando o uso predominante dos stents Cypher(r), Endeavor(r) e Taxus(r), uma subanálise comparando o desempenho destes 3 stents foi realizada.
Os dados referentes as apresentações clínicas dos pacientes no momento do procedimento foram coletados através de uma revisão detalhada dos registros médicos e classificados da seguinte forma: angina estável, angina instável, infarto do miocárdio sem supradesnivelamento do segmento ST, infarto do miocárdio com supradesnivelamento do segmento ST, e infarto do miocárdio (IM) recente (< 3 meses antes do procedimento). Os dados dos procedimentos e desfechos clínicos foram coletados prospectivamente. Insuficiência renal crônica foi definida como uma taxa de filtração glomerular (TFG) < 60 mL/min/1.73 m2 6 (Os resultados clínicos foram classificados da seguinte forma: mortalidade por todas as causas, IM não fatal, aumento da isoenzima MB da creatina quinase (CK-MB) ≥ 3 vezes o limite superior normal, e/ou alterações eletrocardiográficas compatíveis com infarto (e.g., supradesnivelamento do segmento ST ou nova zona inativa); ou, em pacientes submetidos à cirurgia de revascularização do miocárdio, aumento do CK-MB ≥ 5 vezes o limite superior normal. Revascularização da lesão-alvo (RLA) (i.e., revascularização percutânea ou cirúrgica, tratamento de lesões no segmento do stent ou até 5 mm da região proximal ou distal do implante anterior), e RVA (i.e., qualquer revascularização do vaso tratado com SED no procedimento índice).
A trombose de stent foi classificada de acordo com as definições do Academic Research Consortium (ARC) da seguinte forma: definida (i.e., síndrome coronária aguda com visualização do trombo no segmento onde o SED foi implantado), provável (i.e., morte inexplicável dentro de 30 dias ou infarto do vaso-alvo), e possível (i.e., qualquer morte inexplicável após 30 dias). Com base no tempo de ocorrência, a trombose de stent foi definida da seguinte forma: aguda (i.e., dentro das primeiras 24 horas), subaguda (i.e., dentro de 30 dias), tardia (i.e., após 30 dias), e muito tardia (i.e., após 1 ano)7.
A mortalidade total, IM não fatal, e RVA que ocorreram durante o período de acompanhamento foram considerados os principais eventos cardíacos adversos maiores (ECAM).
O sucesso angiográfico foi considerado quando a estenose foi menor que 20% e a trombólise em infarto do miocárdio (TIMI) apresentou fluxo de grau 3 ao final do procedimento. O sucesso clínico foi definido como sucesso angiográfico, conjuntamente com a ausência de complicações clínicas, incluindo morte, IM, revascularização urgente, e acidente vascular cerebral durante a internação índice.
Para os pacientes com mais de uma intervenção durante o período de estudo, a primeira intervenção foi considerada procedimento índice.
O acompanhamento clínico foi realizado através de consultas médicas, entrevistas por telefone com o paciente, consulta de registros médicos ambulatoriais e hospitalares, e contato com o médico responsável. Todos os eventos clínicos foram julgados através da análise dos registros por um cardiologista que desconhecia os outros dados clínicos. O primeiro acompanhamento clínico foi realizado 12 meses após o procedimento índice. Posteriormente, um acompanhamento clínico bianual foi realizado.
As angiografias coronárias de linha de base e pós-procedimento foram analisadas por um cardiologista intervencionista experiente. A angiografia coronária quantitativa off-line da intervenção índice foi realizada utilizando um cateter guia para a calibração da ampliação da imagem, e o programa CardioNow Websend DICOM Study Sharing (HeartLab, Inc., Westerly, Rhode Island, Estados Unidos). A análise da medida do diâmetro luminal mínimo e do diâmetro do vaso-referência foi realizada de uma única vez e indicou o menor diâmetro luminal antes e apos a intervenção. As lesões coronarianas foram classificadas de acordo com as diretrizes da American Heart Association and the American College of Cardiology (AHA/ACC)8.
A análise estatística foi realizada utilizando o programa SPSS 19.0, considerando um nível de significância de 5%. As variáveis quantitativas foram expressas como média ± desvio padrão. As variáveis categóricas foram apresentadas como frequência absoluta e relativa e foram comparadas entre si utilizando o teste do qui-quadrado ou teste exato de Fisher, conforme apropriado. Os resíduos ajustados >1,96 (α = 0,05) foram considerados significativos, indicando uma correlação positiva entre as categorias. Curvas de Kaplan-Meier foram desenvolvidas para análise dos desfechos clínicos. A análise de regressão de Cox foi utilizada para determinar a correlação entre as variáveis explicativas e os desfechos clínicos. Todas as variáveis onde p foi menor que 0,20 na análise univariada foram incluídas na análise multivariada, retirando aqueles com os valores de p mais altos. As variáveis onde p < 0,05 foram mantidas no modelo final.
No total, 611 pacientes foram incluídos no registro. O acompanhamento clínico foi concluído em 96,2% dos pacientes, com um acompanhamento médio de 84 (± 12) meses e máximo de 96 meses. As características demográficas e a apresentação clínica dos pacientes são apresentadas na Tabela 1.
Tabela 1 Características demográficas e clínicas no início do estudo
Idade | 63,7 (±11) |
---|---|
Sexo masculino | 338 (62,4%) |
TFG <60 mL/min/1.73 m2 | 165 (32,7%) |
Diabetes | 204 (34,3%) |
Insulino-dependente | 73 (12,4%) |
Não insulino-dependente | 166 (28,2%) |
Hipertensão | 468 (76,2%) |
Dislipidemia | 453 (76,8%) |
Angioplastia coronária prévia | 174 (28,7%) |
CRM prévio | 67 (11,1%) |
Tabagismo | 96 (15,7%) |
Apresentação clínica inicial | |
Angina estável | 363 (60,4%) |
Angina instável | 151 (25,1%) |
IAMSST | 41 (6,8%) |
IAMCST | 24 (4,0%) |
Infarto do miocárdio recente | 22 (3,7%) |
TFG: taxa de filtração glomerular; CRM: cirurgia de revascularização miocárdica; IAMSS: infarto agudo do miocárdio sem supradesnivelamento do segmento ST; IAMCST: infarto agudo do miocárdio com supradesnivelamento do segmento ST
A média de idade foi de 63,7 anos, e o sexo masculino foi predominante (63%). Um terço dos pacientes apresentaram insuficiência renal ou diabetes, mais de dois terços apresentaram hipertensão e dislipidemia, e um pouco mais da metade era fumante. A angina estável foi a apresentação clínica mais comum.
Em relação às características angiográficas, a maioria das lesões foi localizada na artéria descendente anterior esquerda 348 (56,4%). A maioria das lesões (96,4%) foi do tipo B2 ou do tipo C (Tabela 2).
Tabela 2 Características qualitativas dos vasos-alvo e lesões-alvo
Pacientes | 611 |
---|---|
Vaso-alvo | |
Principal artéria coronária esquerda | 13 (1,8%) |
Artéria anterior descendente | 394 (56,4%) |
Artéria circunflexa | 128 (18,0%) |
Artéria coronária direita | 177 (23,0%) |
Lesões tratadas | 712 |
Número de lesões por paciente | 1,17 |
Tipo de lesão* | |
Tipo A | 3 (0,4%) |
Tipo B1 | 22 (3,6%) |
Tipo B2 | 355 (49,8%) |
Tipo C | 332 (46,6%) |
Classificação de acordo com as diretrizes da American Heart Association and the American College of Cardiology (AHA/ACC).
A média do diâmetro-referência do vaso-alvo foi de 2,87 mm (± 0,46), com um diâmetro luminal mínimo de 0,92 mm (± 0,51) antes do procedimento, e comprimento médio da lesão de 15,75 mm (± 8,37). No total, 748 stents eluidores de drogas e 83 stents metálicos foram utilizados no procedimento índice. Sucesso angiográfico foi observado em 98,2% dos casos. Outras características angiográficas são apresentadas na Tabela 3.
Tabela 3 Angiografia coronária quantitativa e dados de procedimento
Pré-TIMI - Fluxo grau 3 | n (%) |
---|---|
0 | 38 (6,20) |
1 | 14 (2,40) |
2 | 30 (4,90) |
3 | 529 (86,50) |
Média (DP) | |
Diâmetro de referência (mm) | 2.87 (0,46) |
Diâmetro luminal mínimo antes do procedimento (mm) | 0.92 (0,51) |
Comprimento da lesão (mm) | 15,75 (8,37) |
Pressão máxima do implante SED (atm) | 14.88 (2,75) |
Diâmetro mínimo luminal final no stent (mm) | 2.82 (0,48) |
Diâmetro mínimo luminal final no segmento (mm) | 2.41 (0,61) |
Número médio de stents por paciente | 1,3 |
Tipo de stent eluidor de drogas | n (%) |
Costar | 25 (3,34) |
Cypher | 255 (34,2) |
Endeavor | 118 (15,7) |
Infinium | 9 (1,20) |
Janus | 6 (0,80) |
Supralimus | 44 (5,80) |
Taxus | 291 (38,09) |
Sucesso angiográfico | 600 (98,20) |
Pós-TIMI - Fluxo grau 3 | n (%) |
0 | 1 (0,16) |
1 | 2 (0,32) |
2 | 5(0,81) |
3 | 603 (98,7) |
Utilização de inibidor tipo IIB/IIIA | 24 (3,90%) |
Pré-dilatação da lesão | 397 (65,0%) |
Os dados representam valores absolutos e porcentagens, ou médias e desvios-padrão.
As curvas Kaplan Meyer livres de eventos são mostradas na Figura 1. Considerando um acompanhamento médio de 84 meses (± 12), observou-se uma mortalidade total de 8,7%. Apenas 4,3% dos pacientes apresentaram um novo IM não fatal, e 8% dos pacientes necessitaram de nova revascularização da lesão-alvo; 5,4% dos procedimentos foram percutâneos, e 2,6% foram realizados por meio de cirurgia. A incidência de trombose de stent definida ou provável foi de 2,1%. As revascularizações do vaso-alvo e da lesão-alvo foram de 12,4% e 8,0%, respectivamente (Tabela 4). A ocorrência de trombose de stent durante o acompanhamento está descrita na Tabela 5. Todas as revascularizações do vaso-alvo e da lesão-alvo foram tratadas pelo cirurgião que realizou o procedimento índice. Dos 13 episódios de trombose, 10 necessitaram de internação e foram tratados no hospital onde os procedimentos índice foram realizados, embora os operadores não tenham sido os mesmos. Todos os procedimentos apresentaram uma evolução favorável. Os outros 3 pacientes foram tratados em outros hospitais e por cirurgiões diferentes. Contudo, 2 deles morreram nas primeiras 24 horas após o procedimento de resgate.
Tabela 4 Resultados clínicos no final do acompanhamento
n (%) | |
---|---|
Mortalidade global | 53 (8,7) |
IAM não fatal | 26 (4,3) |
RVA | 76 (12,4) |
RLA | 49 (8,0) |
CRM | 16 (2,6) |
ACTP | 33 (5,4) |
Trombose | 13 (2,1) |
IAM: infarto agudo do miocárdio; RVA: revascularização do vaso alvo; RLA: revascularização da lesão-alvo; CRM: cirurgia de revascularização miocárdica; ACTP: angioplastia coronária transluminal percutânea.
Tabela 5 Ocorrência de trombose durante o acompanhamento
Ano de acompanhamento | n |
---|---|
Primeiro | 1 |
Segundo | 2 |
Terceiro | 2 |
Quarto | 3 |
Quinto | 5 |
Sexto | 0 |
Sétimo | 0 |
Oitavo | 0 |
A terapia médica usada no acompanhamento clínico final está mostrada na Tabela 6. No primeiro ano de acompanhamento, 95% dos pacientes usaram aspirina e 87% usaram clopidogrel. No final do acompanhamento, a maioria dos pacientes estava utilizando aspirina (AAS) e estatinas, e menos de 1/4 dos pacientes estava utilizando clopidogrel.
Tabela 6 Medicações em uso no acompanhamento final
AAS | 424 (69,6%) |
Clopidogrel | 147 (24,4%) |
AAS + Clopidogrel | 138 (22,5%) |
Estatinas | 420 (71,6%) |
Betabloqueadores | 292 (4,6%) |
Inibidores da ECA | 200 (33,2%) |
Antagonistas do receptor AT2 | 94 (15,6%) |
Nitratos | 102 (16,9%) |
AAS: ácido acetil salicílico; IECA: inibidor da enzima conversora da angiotensina
A análise multivariada indicou que idade > 60 anos e infarto do miocárdio prévio foram correlacionados com a mortalidade. Idade > 60 anos e a presença de cálcio nas lesões foram correlacionadas com o desfecho clinico de RLA. Para eventos de infarto do miocárdio, a presença de cálcio nas lesões foi correlacionada positivamente com a mortalidade. Para o desfecho clinico de trombose, ECC < 60 mL/min/1.73 m2 foi o único preditor associado. Para ECAM, o preditor infarto do miocárdio prévio apresentou uma correlação positiva.
Para todos os resultados clínicos, ECC < 60 mL/min/1.73 m2 mostrou uma correlação positiva e significativa. Estes resultados são apresentados na Tabela 7.
Tabela 7 Preditores de desfechos clínicos utilizando análise multivariada
FC (IC 95%) | P | |
---|---|---|
Mortalidade | ||
Idade > 60 anos | 3,33 (1,01 - 10,97) | 0,048 |
Infarto agudo do miocárdio prévio | 5,9 (1,91 - 18,19) | 0,002 |
TFG < 60 mL/min/1.73 m2 | 6,96 (2,7 - 17,95) | 0 |
RLA | ||
Idade > 60 anos | 0,48 (0,25 - 0,90) | 0,022 |
TFG < 60 mL/min/1.73 m2 | 2,73 (1,18 - 6,33) | 0,019 |
Presença de cálcio na lesão | 2,88 (1,23 - 6,72) | 0,015 |
Infarto | ||
TFG < 60 mL/min/1.73 m2 | 2,91 (0,96 - 8,83) | 0,06 |
Presença de cálcio na lesão | 4,43 (1,69 - 11,63) | 0,003 |
Trombose de stent | ||
TFG < 60 mL/min/1.73 m2 | 3,33 (0,88 - 12,63) | 0,077 |
ECAM | ||
Infarto agudo do miocárdio prévio | 113,74 (48,14 - 268,75) | < 0,0001 |
TFG < 60 mL/min/1.73 m2 | 2,75 (1,23 - 6,16) | 0,014 |
TFG: taxa de filtração glomerular; TLR: revascularização da lesão alvo; ECAM: evento cardíaco adverso maior
A subanálise comparativa entre os 3 SEDs mais frequentemente utilizados revelou que o dispositivo Taxus(c) apresentou tendência para uma correlação positiva com a necessidade de RVA em 16,8% dos casos (p=0,053) quando comparado com os stents Cypher e Endeavor, onde a correlação positiva foi de 9,5% e 10,2%, respectivamente. Esta diferença não foi confirmada quando apenas RLA foi avaliada, como mostrado na Tabela 8. A ocorrência de ECAM, trombose de stent (definida e provável), e infarto não foram significativamente diferentes entre os três stents.
Tabela 8 Diferenças entre os stents com relação ao desfecho clínico
Cypher | Endeavor | Taxus | valor de p | |
---|---|---|---|---|
n | 255 | 118 | 291 | |
Mortalidade | 11 (4,3) | 2 (1,7) | 10 (3,4) | 0,47 |
RVA | 19 (9,5) | 9 (10,2) | 39 (16,8) | 0,05 |
RLA | 14 (7,0) | 7 (8,0) | 22 (9,5) | 0,63 |
Infarto do miocárdo | 24 (12,0) | 12 (13,6) | 41 (17,7) | 0,24 |
Trombose de stent | 3 (1,5) | 1 (1,1) | 7 (3,0) | 0,42 |
ECAM | 21 (8,20) | 9 (7,6) | 27 (9,2) | 0,88 |
RVA: revascularização do vaso-alvo; RLA: revascularização da lesão-alvo; ECAM: evento cardíaco adverso maior.
Os resultados do nosso estudo demonstraram que o uso de SEDs é eficaz a longo prazo e que os resultados de ensaios clínicos randomizados podem ser replicados na prática clínica, apesar da inclusão de pacientes com uma ampla variedade de características clínicas e angiográficas de alto risco e complexidade9 - 17.
No presente estudo, a baixa incidência de eventos clínicos tais como nova revascularização e trombose de stent foi semelhante a dados de estudos recentes, que demonstraram a ocorrência reduzida destes eventos com SEDs a longo prazo. A taxa de mortalidade observada durante os 8 anos de acompanhamento foi semelhante à reportada na maioria dos estudos randomizados com até 6 anos de acompanhamento9 - 13.
A longo prazo, o acompanhamento dos pacientes foi um diferencial importante deste registro. Os primeiros dados sobre a eficácia e segurança dos SEDs em pacientes consecutivos não selecionados que apresentaram doenças complexas veio do registro RESEARCH, que demonstrou que o uso do stent Cypher está associado a taxas significativamente mais baixas de eventos cardíacos adversos maiores e à RVA, em comparação com stents metálicos durante os 6 meses de acompanhamento12.
A redução da incidência de novas revascularizações apos 8 anos de acompanhamento relatado no presente estudo também corrobora os dados observados em estudos clínicos anteriores, que indicaram a necessidade reduzida de nova revascularização da lesão-alvo, especialmente após 1 ano9 - 20. Portanto, a hipótese de que SEDs apenas adiariam o fenômeno da reestenose foi rejeitada.
Em relação ao perfil de segurança dos SEDs, observamos que a incidência de trombose de stent foi baixa. O uso reduzido de clopidogrel ao final do período de acompanhamento era esperado, visto que a terapia antiplaquetária dupla tem sido recomendada por 12 meses após o uso de SEDs.
A duração da terapia antiplaquetária dupla é um tema de debate quando se discute o risco de trombose de stent21 - 24. A maior incidência de trombose de stent foi observada quando a terapia antiplaquetária dupla foi interrompida durante os primeiros 6 meses após a angioplastia24. No entanto, o impacto do uso da terapia antiplaquetária dupla a longo prazo é discutível. A incidência de trombose de stent foi baixa em nosso estudo, apesar do baixo uso de medicamentos antiplaquetários ao final do período de acompanhamento, ao passo que uma taxa de trombose de stent mais alta foi observada no primeiro ano após a realização da angioplastia índice.
Estudos que compararam a incidência de trombose de stent utilizando SEDs e stents metálicos não revestidos têm gerado dados conflitantes. Devido à baixa incidência de trombose de stent (0,5% a 1,0% ao ano), os ensaios clínicos não incluíram trombose de stent como desfecho primário. Em uma meta-análise25 , 26, a incidência de trombose de stent foi semelhante após o uso de SED e stents metálicos não revestidos durante o primeiro ano. Após um ano, o risco de trombose de stent parece ter sido mais alto26. Em outro estudo, não houve diferença na incidência de trombose de stent entre SEDs e stents metálicos não revestidos durante os 15 meses de acompanhamento27. Em uma meta-análise de ensaios limitados à angioplastia primária no infarto agudo do miocárdio, a taxa de trombose de stent observada para SEDs e stents metálicos não revestidos foi semelhante apos 1 ano de acompanhamento27.
Dados de ensaios clínicos diferem de estudos observacionais na frequência de desfechos clínicos após o uso de SEDs e stents metálicos não revestidos. Embora ensaios clínicos tenham demonstrado que a mortalidade e taxas de IM foram semelhantes para SEDs e stents metálicos não revestidos, estudos observacionais no mundo real indicaram a redução na mortalidade, favorecendo o uso de SEDs21 - 25. Além disso, estudos recentes indicaram uma redução significativa na ocorrência de trombose de stent com o uso da segunda geração de SEDs em relação a stents metálicos não revestidos9 , 28.
O efeito de diferentes gerações de SEDs sobre os desfechos clínicos também deve ser considerado. Poucas comparações foram feitas entre os stents Cypher, Taxus, e Endeavor. Um destes estudos indicou que o stent Endeavor não é inferior ao Cypher e é superior ao Taxus, quando a mortalidade por todas as causas, IM, e RVA foram avaliados aos 12 meses29 , 30. No nosso registro, as incidências de trombose, IM, e RLA foram semelhantes com o uso de cada um dos 3 stents. Observou-se uma diferença significativa na incidência de RVA entre os grupos, e uma incidência mais alta de RVA com o uso do stent Taxus.
Comparações diretas entre os stents Cypher e Taxus indicaram uma menor ocorrência de trombose de stent e RLA com o uso do stent Cypher31. Outro estudo comparativo entre os stents Endeavor e Taxus durante um período de acompanhamento de mais de 1 ano indicou uma menor incidência de trombose de stent com o uso do stent Endeavor32. Embora esses estudos sugerem uma maior incidência de trombose com o uso do stent Taxus em comparação com outros stents de primeira geração, os resultados são variáveis e inconclusivos quando a trombose de stent é avaliada como desfecho primário21. Estudos recentes comparando os stents de segunda geração Xience V e Taxus demonstraram uma menor incidência de trombose de stent com o uso do Xience V9 , 22 , 23, apesar da adesão dos pacientes à terapia antiplaquetária dupla ter sido semelhante durante o primeiro ano de acompanhamento. Uma recente meta-análise de ensaios clínicos revelou uma baixa incidência de trombose com o uso do SED Xience V em comparação com o stent Taxus30. Assim, embora diferenças nas taxas de trombose de stent entre os tipos de SED possam existir, a magnitude desta diferença é difícil de avaliar34 - 36.
Os resultados de estudos desta natureza não podem ser comparados com os de ensaios clínicos, devido à sua natureza não-randomizada. No entanto, os registros do mundo real permitem avaliar os resultados em cenários clínicos não contemplados em estudos randomizados.
Em conclusão, o presente estudo demonstrou o perfil de segurança favorável e a eficácia dos SEDs durante um período de acompanhamento clínico de longo prazo no mundo real, incluindo uma proporção significativa de pacientes com alto risco cardiovascular, validando assim o uso de SEDs no tratamento de rotina de pacientes com doença arterial coronariana.