versão impressa ISSN 1679-4508versão On-line ISSN 2317-6385
Einstein (São Paulo) vol.9 no.4 São Paulo out./dez. 2011
http://dx.doi.org/10.1590/s1679-45082011rb1929
A ejaculação precoce (EP) é a disfunção sexual masculina mais frequente, estimando-se que acometa 20 a 30% dos homens em algum momento da vida(1). Historicamente, as tentativas de explicar a etiologia da EP incluíram diversas teorias biológicas e psicológicas. A maioria das etiologias propostas não são baseadas em evidência, sendo especulativas, na melhor das hipóteses. As teorias psicológicas incluem o efeito de experiência precoce e do condicionamento sexual, ansiedade, técnica sexual, frequência de atividade sexual e explicações psicodinâmicas. As explicações biológicas incluem teorias evolucionistas, hipersensibilidade do pênis, níveis de neurotransmissores centrais e sensibilidade de receptores, grau de excitação, velocidade do reflexo ejaculatório e nível de hormônios sexuais. Há pouca evidência empírica para sugerir um nexo causal entre a EP e quaisquer dos fatores propostos como sua causa(2).
Foi realizada uma busca no Pubmed, do ano 2000 até os dias atuais, com a finalidade de selecionar publicações relacionadas ao manejo e ao tratamento da EP. Foram incluídas publicações que descrevessem o impacto da EP sobre o homem, sobre a parceira ou sobre o relacionamento, ou que relatassem o impacto da disfunção sexual masculina e incluíssem a EP na análise. Usaram-se referências antigas nos casos de relevância.
O DSM-IV TR define a EP como “início persistente ou recorrente de orgasmo e ejaculação com estimulação mínima antes, durante ou logo após a penetração e antes que o indivíduo o deseje”, causando “acentuada angústia ou dificuldade interpessoal”(3).
Waldinger et al.(4) defenderam o uso de termos específicos da atividade para descrever o tempo de latência da ejaculação (ELT) (como tempo de latência da ejaculação intravaginal ou IELT, no caso intravaginal; OELT, no caso de sexo oral etc.) em vez de um termo mais global, como “tempo de latência entre penetração e ejaculação”, que incluiria toda atividade sexual, exceto a masturbação e a estimulação manual pela parceira. Atividades sexuais diferentes podem, portanto, ter características físicas e táteis significativamente diferentes, que, por sua vez, podem estar diferentemente associadas com o reflexo ejaculatório.
Ao fazer um diagnóstico, os médicos devem também levar em consideração a frequência dos episódios de EP e o período de tempo em que ela tem sido um problema(5). Essa informação irá ajudar a determinar se a EP é generalizada ou situacional, se é permanente (EP primária: desde o início da atividade sexual) ou adquirida (EP secundária: desenvolvida após um período de tempo sem EP). Homens com EP, seja ela primária ou adquirida, geralmente relatam pouca ou nenhuma sensação de controle sobre a ejaculação, baixa satisfação na relação sexual e mais angústia/dificuldades interpessoais, em comparação com homens sem EP, além de menor tempo médio de latência na maioria dos episódios de relação sexual(6). Isso sugere que um diagnóstico completo da EP deva incluir uma avaliação do controle, do tempo de latência, da angústia e/ou das dificuldades resultantes da EP e satisfação sexual.
A idade era tradicionalmente considerada como um fator causal da EP, presumindo-se que os homens mais jovens apresentassem mais problemas(7). No entanto, pesquisas mais recentes sugeriram que esse efeito da idade foi sobremaneira exagerado, ou que a idade pode até estar associada à EP de modo negativo. A idade e/ou a duração do relacionamento podem estar associadas com a frequência e o tipo de atividades sexuais de uma pessoa, e estas, por sua vez, podem influenciar a ELT(8).
Dados recentes demonstram que quase metade dos homens com disfunção erétil (DE) também apresenta EP(9). Os homens com DE precoce podem intencionalmente “apressar” a relação sexual para evitar perda prematura de sua ereção e ejacular com uma latência breve. Isso pode ser agravado pela presença de altos níveis de ansiedade quanto ao desempenho relacionados com sua DE, que somente pioram a prematuridade. Na ausência de uma anamnese sexual completa, esses homens podem ser incorretamente diagnosticados como portadores de EP, em vez de se diagnosticar a DE subjacente(9).
Há, no entanto, algumas evidências de correlação que sugerem que a EP primária se deve à sensibilidade alterada dos receptores centrais de 5-HT (serotonina), e a EP adquirida se deve a altos níveis de ansiedade sexual, ED ou infecção do trato urinário inferior(2). O ELT é provavelmente uma variável biológica, determinada geneticamente e pode ser diferente entre as populações e culturas, variando desde uma ejaculação “extremamente rápida” até uma “média ou lenta”(2). Sugeriu-se que a hipossensibilidade dos receptores 5-HT2C e/ou a hipersensibilidade dos receptores 5-HT1A seriam uma possível explicação da EP primária(2). Homens com baixo nível de neurotransmissores 5-HT e uma provável hipossensibilidade dos receptores 5-HT2C podem ter seu limiar ejaculatório geneticamente “configurado” em um ponto mais baixo e ejacular rapidamente com um mínimo de estimulação, ao passo que homens com um ponto de ajuste mais elevado podem sustentar níveis mais prolongados e intensos de estimulação sexual e exercer maior controle sobre a ejaculação(2). Homens com um ponto de ajuste muito alto podem apresentar ejaculação retardada ou ausente apesar de conseguirem atingir uma ereção completa e de receberem estimulação sexual prolongada(2).
Há fortes evidências de que a longa duração do esforço físico nos homens leva a uma diminuição na concentração do magnésio extracelular devido a uma troca transitória entre os componentes extra e intracelular do magnésio e a um aumento simultâneo na excreção urinária(10). Essa hipomagnesemia pode se manifestar por meio de uma contratilidade não controlada do trato genital masculino, causando emissão e ejaculação(10).
As técnicas comportamentais foram a base do manejo da EP por muitos anos, embora a evidência de sua eficácia a curto prazo seja limitada. Alguns homens utilizam-se de abordagens de autoajuda adquiridas por experiência pessoal, biblioterapia (livros) ou pesquisa na internet. Essas técnicas incluem masturbação imediatamente antes da relação sexual, uso de múltiplos preservativos para reduzir a sensibilidade peniana ou técnicas de distração (exercícios mentais) durante as preliminares, durante a relação sexual, ou ambos.
Vários autores relatam que a ansiedade é uma das causas da EP, e a ansiedade está enraizada no folclore da medicina sexual como a mais provável causa da EP, a despeito da escassez de evidências de pesquisas empíricas que sustentem qualquer papel causal(11). Vários autores sugerem que a ansiedade ativa o sistema nervoso simpático e reduz o limiar ejaculatório, como resultado de uma fase de emissão precoce no ciclo da ejaculação(11).
O nexo causal entre a ansiedade e a EP é especulativo, não contando com o apoio de evidências empíricas. Na verdade, as evidências empíricas contradizem essa hipótese, segundo alguns pesquisadores(12).
As abordagens comportamentais geralmente enfocam o aspecto físico da EP, incluindo a técnica da compressão, descrita pela primeira vez por Masters e Johnson, em 1970(13), e o método “parar-reiniciar”, descrito por Semans, em 1956(14). Esses métodos envolvem o emprego das preliminares sexuais até pouco antes do ponto de ejaculação. Nesse momento, a glande do pênis é comprimida ou a atividade sexual é interrompida, até que passe a vontade de ejacular, quando então a atividade sexual pode ser retomada, e as técnicas são repetidas, conforme necessário.
Contudo, estudos subsequentes relataram altos índices de fracasso com o uso dessas técnicas(15).
A terapia cognitiva ou sexual concentra-se em percepções e sentimentos, melhorando a comunicação entre os parceiros, aumentando as habilidades sexuais e a autoconfiança, e reduzindo a ansiedade associada à atividade sexual(16). Observou-se melhora a curto prazo com essas abordagens comportamentais; entretanto, são limitados os dados sobre a eficácia desses métodos a longo prazo(17).
Recentemente, os terapeutas sexuais combinaram psicoterapia com exercícios comportamentais obtendo mais sucesso. A terapia enfoca as implicações emocionais da EP, a dinâmica do relacionamento e o manejo da ansiedade no tocante ao desempenho. Essa terapia é limitada pelo custo, pela disponibilidade local de terapeutas treinados e pela disposição dos pacientes e parceiros em participar. Como seria de esperar, os melhores resultados foram observados em homens que estavam motivados e esperançosos, e tinham um relacionamento estável e monogâmico com uma parceira cooperativa(18).
As terapias tópicas da EP agem por meio da dessensibilização do pênis e não alteram a sensação de ejaculação(19). Um creme tópico contendo os anestésicos tópicos lidocaína e prilocaína foi eficaz para prolongar IELT em 6 a 8 minutos (contra 1 a 2 minutos com placebo, p < 0,05), mas deve ser aplicado pelo menos 20 minutos (não mais que 45 minutos) antes do contato sexual(20).
Pesquisadores coreanos desenvolveram um creme tópico (SS-cream) composto de produtos naturais, que tem propriedades anestésicas locais e é aplicado no pênis 1 hora antes do contato sexual(19). Em dois estudos clínicos duplo-cegos randomizados, o SS-cream (dose de 20 g) atingiu um IELT médio de aproximadamente 11 minutos, em comparação com o tempo de 2,5 minutos para o placebo(21).
Os inibidores seletivos da recaptação de serotonina (ISRS) são normalmente usados no tratamento da depressão e também da EP, com base na observação de que o retardo da ejaculação é um efeito colateral frequente dessa classe de medicamentos. O tratamento com medicamentos da classe ISRS ativa o receptor 5-HT2C, eleva o ponto de ajuste do limiar ejaculatório e retarda a ejaculação(11). O grau de retardo ejaculatório pode variar bastante em diferentes homens, de acordo com a dosagem e a frequência de administração do ISRS, e o ponto de ajuste geneticamente determinado do limiar ejaculatório(11). A interrupção do tratamento leva ao restabelecimento do ponto de ajuste anterior após 5 a 7 dias, em homens com EP primária(11).
Os resultados de vários estudos mostraram que o ISRS de longa meia-vida prolonga significativamente o IELT em homens com EP, quando administrado em dose diária por muito tempo.
Uma limitação importante da terapia para a EP com os ISRS disponíveis atualmente é que, além de retardar a ejaculação, essa classe de medicamentos foi associada a uma série de efeitos colaterais sexuais indesejáveis. Diminuição da libido (41 a 64%, em homens e mulheres), anorgasmia (31 a 53%, em homens e mulheres) e impotência/DE (DE, 10 a 41%) foram observadas após o tratamento com fluoxetina, paroxetina, fluvoxamina, sertralina e citalopram(22).
Outros tratamentos sistêmicos que foram avaliados para o manejo da EP incluem os inibidores da fosfodiesterase-5 (PDE-5), atualmente licenciados para o tratamento da DE. O possível mecanismo de ação dos inibidores da PDE-5 no tratamento da EP não está claro(23). Apesar do sucesso dos inibidores da PDE-5 no tratamento da DE, não há dados suficientes para sugerir que esses agentes sejam efetivos em homens sem DE. A combinação de um ISRS com inibidores da PDE-5 pode melhorar o IELT de modo significativamente mais acentuado em comparação com a utilização isolada do ISRS, mas a incidência de efeitos colaterais é maior em comparação com a monoterapia com um desses agentes(24). O tratamento com inibidores da PDE-5 pode ser eficaz em homens com DE associada à EP, e essas duas disfunções geralmente ocorrem juntas(25).
A dapoxetina é um novo ISRS de meia-vida curta que está em desenvolvimento para o tratamento da EP. Em modelos pré-clínicos, mostrou-se que esse medicamento inibe significativamente os reflexos de expulsão ejaculatórios, atuando no nível supraespinhal(26). De modo semelhante a outros ISRS, a dapoxetina exerce seus efeitos principalmente por meio da inibição do transportador de recaptação da serotonina, tendo atividade inibitória mínima nos transportadores da recaptação de noradrenalina e dopamina(27). No entanto, ao contrário dos ISRS de meia-vida longa, que normalmente são administrados de forma crônica (diária) e podem levar dias ou semanas para atingir as concentrações plasmáticas do estado de equilíbrio dinâmico(28), a dapoxetina é um ISRS de meia-vida curta, que pode ser mais adequado para o tratamento da EP(29).
Na análise integrada de dois ensaios clínicos(30), a proporção de parceiros cuja satisfação na relação sexual no início do estudo foi “regular”, “boa” ou “muito boa” variou de 53 a 58% entre os grupos sob tratamento. Ao final desse estudo, essa proporção manteve-se inalterada no grupo placebo, ao passo que nos grupos que receberam 30 e 60 mg de dapoxetina, a proporção aumentou para 72 e 78%, respectivamente (p < 0,0001 para ambos). Em vários estudos, mostrou-se que a dapoxetina melhora significativamente o IELT, em comparação com os valores basais e placebo, ou seja, um tempo de 1,66 minutos, 3,03 minutos e 3,15 minutos, respectivamente, para o grupo placebo e para os grupos que receberam 30 e 60 mg de dapoxetina, quando o medicamento foi tomado de 30 a 60 minutos antes da relação sexual. Quando tomado 3 a 4 horas antes da relação sexual, o IELT foi de 1,79 minutos, 3,06 minutos e 3,97 minutos, respectivamente, para o grupo placebo e para os grupos que receberam 30 e 60 mg de dapoxetina(30). Melhoras semelhantes foram observadas na percepção da parceira do sexo feminino em relação ao controle do homem sobre a ejaculação(31).
A EP é a mais frequente disfunção sexual masculina, com uma estimativa de 20 a 30% dos homens que relataram apresentar EP (definida de várias formas) em algum momento de sua vida(1). Apesar dessa taxa de prevalência, poucos homens recebem tratamento médico ou psicológico eficaz para a EP, embora relatem autotratamento com uma variedade de abordagens comportamentais, cremes ou produtos naturais(32). A omissão na busca de tratamento pode ser atribuída à sensibilidade pessoal sobre o problema, omissão dos pacientes ou de seus médicos em discutir questões sexuais, e à percepção de que não existem intervenções eficazes.
O Global Study of Sexual Attitudes and Behaviors revelou que apenas 9% dos homens relataram terem sido questionados sobre sua saúde sexual por um médico durante uma consulta de rotina nos últimos 3 anos(33). Em contraste, 48% dos homens acreditavam que o médico deveria rotineiramente inquirir sobre questões de saúde sexual(33).
Uma abordagem de equipe envolvendo um psicoterapeuta e um médico pode oferecer melhor ajuda aos casais que sofrem mais angústia ou que não respondem à terapia inicial. O conceito de coaching está ao alcance de médicos de família e clínicos gerais que sejam sensíveis e tenham interesse, tempo e conhecimento para oferecer ao paciente breves e objetivas intervenções psicoeducacionais. Essas sessões básicas de aconselhamento sexual, juntamente de terapia medicamentosa, devem incluir o esforço de obter um feedback sobre a eficácia da autoajuda e das técnicas comportamentais no contexto das relações sexuais do casal. Esse esforço deve se concentrar na diminuição da ansiedade em relação ao desempenho e reforçar a autoestima do paciente e a comunicação do casal.
A ejaculação precoce é uma disfunção que afeta homens de todas as idades. É a mais frequente disfunção sexual masculina e tem efeitos significativos sobre a qualidade de vida tanto do homem quanto de sua parceira. Várias abordagens têm sido utilizadas em seu tratamento, incluindo a terapia cognitiva e comportamental, os agentes tópicos e a terapia com medicamentos, tais como os inibidores da PDE-5 e os ISRS. A dapoxetina é um ISRS de meia-vida curta, que foi formulado para tratar a EP, e seus resultados parecem muito promissores.