Compartilhar

Eletrococleografia na doença de Ménière: é confiável?,

Eletrococleografia na doença de Ménière: é confiável?,

Autores:

Pauliana Lamounier,
Débora Aparecida Gobbo,
Thiago Silva Almeida de Souza,
Carlos Augusto Costa Pires de Oliveira,
Fayez Bahmad Jr.

ARTIGO ORIGINAL

Brazilian Journal of Otorhinolaryngology

versão impressa ISSN 1808-8694

Braz. j. otorhinolaryngol. vol.80 no.6 São Paulo set./dez. 2014

http://dx.doi.org/10.1016/j.bjorl.2014.08.010

Introdução

A hidropisia endolinfática é o substrato histopatológico e achado quase universal nos estudos post morten de pacientes com doença de Ménière. A causa da hidropisia ainda é desconhecida, assim como o mecanismo pelo qual causa disfunção progressiva dos órgãos sensitivos da orelha interna. Várias teorias já foram propostas, e a maioria é baseada na alteração da produção ou da reabsorção da endolinfa.1,2

História familiar está presente em mais de 10% dos pacientes, com predisposição genética, infecções virais, doenças autoimunes sugerindo deposição de imunocomplexos circulantes no saco endolinfático, distúrbios da homeostase da água, tendo as aquaporinas e vasopressinas um papel importante nesse processo.1,2

Uma das hipóteses de Schuknecht, e bem aceita, é que a hidropsia cause ruptura da membrana de Reissner, permitindo que o fluido endolinfático, rico em potássio, entre em contato com a perilinfa e atinja a superfície das células ciliadas e o nervo vestibulococlear, ocasionando perda auditiva e ataques de vertigem.2 Nas fases avançadas da hidropsia endolinfática é comum encontrarmos pacientes com limiares auditivos maiores que 50 decibéis. Outras teorias sugerem que mesmo a distensão da membrana basilar pela hidropsia endolinfática já possa levar à degeneração das células ciliadas e, consequentemente, ao seu mau funcionamento, gerando uma diminuição do AP.1,2

Os critérios diagnósticos da AAO-HNS de 1995 incluem apenas parâmetros clínicos e audiométricos no diagnóstico da doença de Ménière. De acordo com esses critérios, indivíduos com dois ou mais episódios espontâneos de vertigem, com duração maior ou igual a 20 minutos, com perda auditiva documentada em pelo menos uma ocasião e presença de zumbido ou plenitude aural são classificados clinicamente como portadores de doença de Ménière definida. É denominada provável quando ocorre um episódio definido de vertigem na presença de perda auditiva neurossensorial documentada, em pelo menos uma ocasião, plenitude aural ou zumbido. E é classificada como possível na presença de vertigem episódica do tipo Ménière sem perda auditiva documentada ou quando há perda auditiva neurossensorial, fixa ou flutuante, associada a desequilíbrio, sem episódio de vertigem definido.3

O curso flutuante da doença dificulta interpretação de exames como a eletrococleografia, que apresenta, para alguns autores, valor diagnóstico controverso. Estudos mostram resultados desanimadores quanto à sensibilidade e especificidade, entretanto, vários instrumentos podem ser utilizados para aumentar a sensibilidade do referido exame e este permanece como a única ferramenta objetiva para mensurar a hidropsia endolinfática na cóclea.48

A eletrococleografia registra os três potenciais mecanoelétricos da cóclea. O microfonismo coclear é considerado o primeiro passo para o impulso neural, e reflete a soma dos potenciais intracelulares gerados nas células ciliadas da porção mais basal da cóclea durante sua despolarização.4,6,9

O microfonismo coclear é produzido através da variação das correntes de potássio na placa tectória das células ciliadas como resultado de rápidas mudanças iônicas associadas aos movimentos ciliares. Em altas intensidades, a membrana basilar vibra de forma assimétrica em torno de seu ponto médio e o deslocamento excessivo em direção à escala timpânica produz um componente de corrente contínua constante, o potencial de somação (SP).4,5,7,9

A geração do potencial de somação gera controvérsias. Vários autores, como Hall, em 2007, e Durrant, Ding e Salvi, em 1998, acreditam que as células ciliadas internas têm papel primordial na geração do SP. Alguns autores, como Burkand et al., acreditam que o mesmo é gerado tanto pelas células ciliadas internas quanto externas. O potencial de ação é a soma da sincronia dos PA neurais individuais do nervo coclear.46

O objetivo deste estudo foi analisar a aplicabilidade clínica da eletrococleografia no diagnóstico da hidropsia endolinfática, sendo uma usual ferramenta e que ainda gera opiniões conflitantes entre os otorrinolaringologistas.

Materiais e método

Revisão sistemática da literatura sobre eletrococleografia em pacientes com diagnóstico de hidropsia endolinfática. Base de dados PUBMED/MEDLINE/BIREME.

A estratégia de busca empregada na revisão bibliográfica foi guiada pela combinação de quatro descritores indexados no DecS (Descritores em Ciências da Saúde) em português: hidropsia endolinfática, doença de Ménière, audiometria de resposta evocada e eletrococleografia, e no MeSH (Medical Subject Headings), em inglês - endolymphatic hydrops; Ménière's disease; audiometry, evoked response.

Critérios de inclusão: Estudos retrospectivos e prospectivos em humanos a partir do ano 2000 sobre a eletrococleografia em pacientes com diagnóstico de hidropsia endolinfática, de acordo com os critérios de diagnóstico do comitê de audição e equilíbrio da Academia Americana de Otorrinolaringologia (1995), publicados em revistas indexadas. Os critérios de inclusão foram definidos por um dos autores, enquanto os demais fizeram a análise dos artigos.

Resultados

Foram selecionados 34 artigos sobre o uso da eletrococleografia em pacientes portadores de hidropsia endolinfática, a partir do ano 2000, tendo sido 15 deles excluídos da revisão por não se tratarem de estudos observacionais. Apenas um estudo transversal foi incluído, e que trata do uso clínico da eletrococleografia entre os otorrinolaringologistas (tabela 1).

Tabela 1 Artigos selecionados sobre o uso da eletrococleografia 

Ano e local da Pesquisa Autor Tipo de estudo População
Japão 2010 Yamamoto et al.28 Estudo observacional retrospectivo 24 pacientes DM
Bélgica 2011 Claes et al.9 Estudo observacional retrospectivo 109 pacientes DM
Coreia 2012 Seo et al.29 Estudo observacional prospectivo 26 pacientes DM
Espanha 2012 Martín-Sanz et al.11 Estudo observacional prospectivo 100 pacientes DM 20 controles
EUA 2003 Devaiah et al.14 Estudo observacional retrospectivo 138 pacientes DM 13 controles
EUA 2010 Nguyen et al.8 Estudo transversal 143 pacientes DM
Japão 2010 Takeda et al.20 Estudo observacional retrospectivo 632 pacientes
Japão 2007 Baba et al.25 Estudo observacional retrospectivo 198 pacientes
Brasil 2003 Soares et al.16 Estudo observacional retrospectivo 32 pacientes DM 10 controles
Índia 2002 Ghosh et al.10 Estudo observacional prospectivo 20 pacientes DM 20 controles
Austrália 2000 Conlon and Gibson.12 Estudo observacional prospectivo 500 pacientes DM 900 controles
EUA 2000 Pappas et al.17 Estudo observacional retrospectivo 252 pacientes DM 20 controles
Coréia 2004 Chung et al.13 Estudo observacional retrospectivo 158 pacientes DM 37 controles
Brasil 2011 Lopes et al.24 Estudo observacional retrospectivo 41 pacientes DM 14 controles
França 2011 Büki et al.22 Estudo observacional retrospectivo 28 pacientes DM
Coréia 2012 Moon et al.23 Estudo observacional retrospectivo 90 pacientes DM
EUA 2005 Kim et al.15 Estudo observacional retrospectivo 97 pacientes DM
Australia 2010 Iseli e Gibson.18 Estudo observacional retrospectivo 40 orelhas DM 67 orelhas controle
Brasil 2006 Ikino et al.26 Estudo observacional retrospectivo 21 pacientes DM 19 controles
Brasil 2002 Ikino et al.27 Estudo observacional retrospectivo 22 pacientes DM

DM, Doença de Ménière.

Discussão

Nguyen et al. avaliaram o uso de da eletrococleografia entre membros da sociedade americana de otologia e sociedade americana de neurotologia e identificaram que, para aproximadamente 50% dos participantes, a eletrococleografia não tem papel na sua prática clínica, pela variabilidade dos resultados e pela falta de correlação com a sintomatologia do paciente.8

De 25 a 54% dos pacientes portadores de doença de Ménière apresentam eletrococleografia com resultados normais.7,8 Na maioria dos estudos selecionados sobre eletrococleografia em doença de Méniére, o eletrodo transtimpânico é o mais usado. A sensibilidade do transtimpânico varia de 67 a 85%.912

Hall relatou uma sensibilidade de 57% e especificidade de 94%,5 enquanto Chung et al. referem sensibilidade de 71% e especificidade de 96%.13 Devaiah et al., por sua vez, apresentaram sensibilidade de cerca de 60%, que atingiu 92% quando a eletrococleografia foi realizada durante um período sintomático.14

Kim et al. analisaram 60 pacientes com doença de Ménière definida e 37 com doença de Ménière provável ou possível. No geral, 59,8% tiveram índices SP/AP anormalmente elevados. Entre os pacientes com doença de Ménière definida, 66,7% tiveram SP/AP anormalmente elevados, enquanto dentre aqueles com DM provável ou possível, 52,7% tinham eletrococleografias anormais (p = 0,069). Conclui-se, assim, que não foi observada diferença estatisticamente significativa nos resultados da eletrococleografia entre os grupos de doença de Ménière definida e DM provável ou possível. Além disso, aproximadamente 30% das pessoas com doença de Ménière definida não seriam diagnosticados com base em resultados de eletrococleografia. Pela baixa sensibilidade, de acordo com Kim et al., a eletrococleografia não deve desempenhar um papel decisivo na determinação do diagnóstico de doença de Ménière.15

Soares et al. realizaram estudo retrospectivo através de 60 eletrococleografias transtimpânicas. Foram analisadas a relação SP/AP, a amplitude entre o primeiro pico positivo do segundo componente do AP e a linha de base, a amplitude entre o segundo pico positivo do segundo componente do AP e a linha de base, encontrando que a relação SP/AP foi o parâmetro mais sensível e específico para a identificação dos pacientes com diagnóstico de hidropsia endolinfática.16

Comparando os resultados da eletrococleografia transtimpânica e extratimpânica em 20 pacientes com doença de Ménière e 20 do grupo controle, Ghosh et al. relataram diferença significativa na relação SP/AP entre casos e controles. Para um valor de SP/AP de 0,29, encontraram uma sensibilidade de 100% e especificidade de 90% na transtimpânica e 90% e 80% na extratimpânica, respectivamente, concluindo que a eletrococleografia extratimpânica é um método eficaz, de fácil execução na prática clínica e não invasivo, comparado ao método transtimpânico.10

Pappas et al., em estudo retrospectivo, avaliaram eletrococleografia extratimpânica em um grupo de 252 pacientes com diagnóstico de DM e um grupo controle composto por 20 pacientes sadios. O grupo de DM definida apresentou elevação de SP/AP em 74% dos casos, o grupo de DM possível em 64% e grupo bilateral em 66%. Orelhas contralaterais apresentaram razões elevadas em 42% dos casos, onde em 40% destas orelhas ao menos um sintoma contralateral foi evidenciado. Assim, concluíram que a eletrococleografia extratimpânica tem um importante papel nos casos de DM possível, nos quais dados audiológicos são escassos,17 conclusão corroborada por Chung et al., que, em análise retrospectiva de 158 pacientes submetidos à eletrococleografia extratimpânica, 97 mulheres e 61 homens encontraram, para uma razão SP/AP de 0,34, sensibilidade de 71% e 96% de especificidade, reafirmando o papel da eletrococleografia extratimpânica nos pacientes com sintomas menos definidos.13

Os limiares da relação SP/AP são variáveis na literatura. Pappas et al. acreditam que qualquer resultado acima de 0,5 em uma eletrococleografia extratimpânica com cliques em polaridade alternada é sugestivo de hidropsia endolinfática,17 enquanto Iseli e Gibson estabeleceram um valor de 0,33 em uma eletrococleografia transtimpânica.18

Martín-Sanz et al. encontraram uma sensibilidade de 85% e especificidade de 80% para um limiar SP/AP maior que 0,5 em uma eletrococleografia transtimpânica com o uso de cliques em polaridade alternada. Também relatam que a sensibilidade e especificidade de qualquer teste diagnóstico na doença de Ménière serão sempre sujeitos à variação, dependendo da população em estudo.11

Gibson et al. compararam resultados de eletrococleografia em orelhas com doença de Ménière e sadias com perdas auditivas semelhantes e concluiu que o clique para avaliar SP/AP não é útil para essa diferenciação, mas o tone burst para avaliar amplitude de SP é significativamente diferente nessas populações.19

Colon e Gibson demonstraram que a sensibilidade da eletrococleografia transtimpânica aumenta em 85% quando 1 khz de tone burst foi usado para medir SP. Relataram que a maioria dos especialistas, 58,6%, usa estímulos com clique contra 17,2% usando tone burst e 24,3% usando ambos os estímulos.12

Claes et al. conduziram estudo retrospectivo com 131 resultados de eletrococleografia transtimpânica usando cliques e tone burst, no qual observaram que 91% dos pacientes do grupo de doença de Ménière definida tiveram resultado positivo em uma eletrococleografia na estimulação com tone burst, e 71% do grupo controle (sem doença de Ménière) tiveram resultado negativo. Combinaram limiares audiométricos e de eletrococleografia e identificaram 98% dos casos de ausência de doença de Ménière e 94% dos casos de doença de Ménière definida.9

Takeda et al. realizaram estudo retrospectivo através de eletrococleografia em 632 pacientes com sintomas ao longo de 10 anos. Dentre eles, 334 tinham diagnóstico de doença de Ménière definida, incluindo 95 casos de acometimento bilateral. Encontraram aumento de SP/AP em 56,3% dos pacientes com DM. Também demonstraram que orelhas com maior tempo de sintomas e/ou com sintomas mais graves apresentam maior anormalidades na relação SP/AP. A incidência de aumento de SP foi significativamente maior nos pacientes com duração de doença maior que dois anos ou com várias crises por ano.20 Ge X et al. também concordam que pacientes com um tempo maior de evolução da doença apresentam relação SP/AP com valores mais altos. Também concluíram que o ganho auditivo pós-teste de glicerol não resulta em diminuição da razão SP/AP.21 Eles observaram que, uma vez que o PS se eleve, este persiste por longos períodos, mesmo nos casos de remissão da vertigem e deficiência auditiva, dados corroborados com Kim et al. e Pappas et al.15,17

Buki et al., em estudo retrospectivo, analisaram resultados de eletrococleografia após controle da vertigem por injeção intratimpânica de gentamicina e observaram que a relação SP/AP medida pela eletrococleografia não aumenta estatisticamente quando pacientes ficam ausentes de sintomas. Elevação da amplitude do SP em orelhas com hidropisia endolinfática parece depender principalmente do distúrbio do processo de transdução mecanoelétrica dentro da cóclea, devido à perda de células ciliadas ou intoxicação da perilinfa por potássio ao invés do fator mecânico do deslocamento da membrana basilar.22

Moon et al. observaram que pacientes com SP/AP anormal tiveram significativa elevação nos limiares audiométricos comparados com aqueles que tiveram SP/AP dentro da normalidade, sugerindo que pacientes portadores de DM com hidropisia endolinfática grave apresentam deterioração auditiva mais acentuada ao longo do tempo,23 dados corroborados por Ge X et al.23

Lopes avaliou sensibilidade e especificidade da relação SP/AP e medida angular gráfica em eletrococleografias de 71 orelhas, 41 pacientes com DM 4 14 controles sadios e concluiu que a medida angular gráfica não é sensível e específica o suficiente para o diagnóstico de DM. A associação da relação SP/AP e medida angular gráfica apresentou melhora da sensibilidade em detrimento da especificidade do exame.24

Devaiah et al. realizaram estudo retrospectivo com 138 pacientes com DM que foram submetidos à eletrococleografia transtimpânica no intuito de identificar pacientes com doença de Ménière possível: um grupo controle para pacientes com razão SP/AP dentro da normalidade foi criado e a razão SP/AP e a área da curva da razão para ambos os grupos foi mensurada. Eles identificaram um aumento na sensibilidade da eletrococleografia transtimpânica com cliques com polaridade alternada, através da análise da área da curva da razão de SP/AP no diagnóstico da doença de Ménière, apontando que sete entre oito pacientes com Ménière possível apresentaram um acréscimo na área abaixo da curva SP/AP.14

Baba et al. realizaram estudo retrospectivo de 198 pacientes submetidos à eletrococleografia transtimpânica comparando a razão SP/AP e área da curva da razão SP/AP. Em relação à razão, encontraram sensibilidade em 57,1% dos pacientes com DM definida, 39,6% dos pacientes com DM provável e 50% dos casos que se converteram de provável para definida. Em relação à área da curva SP/AP, encontraram 43,9%, 27,7% e 30%, respectivamente, concluindo que a análise da área da curva da razão SP/AP em uma eletrococleografia transtimpânica, necessariamente, não aumenta a sensibilidade no diagnóstico da hidropisia endolinfática comparados com a amplitude SP/AP.25

Ikino et al. usaram eletrococleografia transtimpânica para analisar 21 pacientes com doença de Ménière definida e 19 pacientes de audição normal com outros distúrbios cocleovestibulares. Eles compararam SP/AP, diferença de latência de AP e área da curva de SP-AP, e calcularam a sensibilidade diagnóstica destes parâmetros. A média da área da curva SP/AP foi de 1,89 ms no grupo de estudo e 1,58 ms no grupo de controle. A média de SP/AP foi de 0,37 no grupo de estudo e 0,22 no grupo controle. O produto médio da área da curva de SP-AP e SP/AP foi 75,26 ms no grupo de estudo e 34,60 ms no grupo de controle. A média da diferença de latência de AP foi de 0,13 ms no grupo de estudo e 0,07 ms no grupo de controle. As diferenças entre os grupos foram estatisticamente significativas para os parâmetros avaliados. As sensibilidades para a área da curva da razão SP-AP, a relação SP/AP e a diferença de latência de AP no grupo de estudo foram de 33,3, 52,4 e 23,8%, respectivamente. Eles concluíram que a utilização dos parâmetros estudados não aumentou a sensibilidade da eletrococleografia, independentemente de ser utilizado isoladamente ou em conjunto com o SP/AP. O cálculo do SP/AP apresentou a maior sensibilidade.26

Ikino et al. também analisaram 22 pacientes, 16 do sexo feminino e 8 do sexo masculino, através de eletrococleografia transtimpânica, com o objetivo de examinar a latência de clicks condensados e rarefeitos e as diferenças entre essas latências em pacientes com doença de Ménière. Os oiro casos (36,4%) em que a relação SP/AP foi maior ou igual a 0,33 foram definidos como Grupo 1, enquanto os 14 casos (63,6%) em que a relação SP/AP foi abaixo de 0,33 foram definidos como Grupo 2. Em 36,4% dos pacientes, a relação entre potencial de somação e o potencial de ação foi maior do que 0,33, e para esses pacientes a latência para clique condensado, latência para clique rarefeito e as diferenças entre suas latências foram 1,94 ms, 1,84 ms e 0,25ms, respectivamente. Nos demais pacientes esses valores foram 1,71 ms, 1,71 ms e 0,09 ms. Eles concluíram que a latência para clique condensado e a diferença entre as latências para condensado e rarefeito não foram significativamente maiores em pacientes com hidropisia endolinfática.27

Yamamoto et al. realizaram estudo por imagem de RNM após administração intratimpânica de gadolíneo e observaram que a razão SP/AP obtida à eletrococleografia extratimpânica com cliques usando rarefação e condensação estava aumentada em pacientes com hidropsiaendolinfática significativa, exceto nos pacientes em estágio inicial da doença, com três meses de início dos sintomas.28

Seo et al. também demonstraram hidropisia endolinfática na cóclea (81%) e no sáculo (69%) usando RNM 3 Tesla após gadolíneo intratimpânico correlacionado com limiares anormais à eletrococleografia. Utilizaram como alterado o limiar de SP/AP com estímulo clique maior que 0,33, e tone burst em 1.000 Hz foi considerado anormal se a magnitude absoluta do PS fosse menor ou igual a 3 microvolts.29

Estudos analisaram a diferença na especificidade e sensibilidade dos métodos de coleta transtimpânico e extratimpânico. Nossa revisão demonstrou que o transtimpânico seria mais eficaz, no entanto, assim como Pappas, Gosh e Chung, também consideramos o método extratimpânico como eficaz, de fácil execução na prática clínica e não invasivo.10,13,17 Observamos que a eletrococleografia tem seu papel principalmente nos casos de dados audiológicos escassos e sintomas menos definidos.

Sobre a variação dos estímulos para obtenção dos resultados, observamos que o clique não é útil para diferenciação entre orelhas sadias e com doença de Ménière. Nos estudos de Gibson, Colon e Claes, foi demonstrado que o tone burst aumenta a sensibilidade do teste.9,12,19 No que se refere à polaridade dos estímulos, não encontramos diferença estatisticamente significativa em relação às diferenças de latência para condensado e rarefeito.

Concluímos que a relação SP/AP foi o parâmetro mais sensível e específico para diagnóstico, dados corroborados por Soares, Baba e Ikino.16,25,26 Lopes e Devaiah relatam um aumento na sensibilidade do teste quando é feita a associação da relação SP/AP com a área da curva da razão para diagnóstico.14,24 Os limiares SP/AP são variáveis na literatura, com diagnóstico para valores maiores que 0,5, de acordo com a maioria dos autores pesquisados.

Vários autores também analisaram a relação da amplitude do SP com o tempo de duração da doença. Foi identificado que orelhas com maior tempo de sintomas apresentaram maiores anormalidades na relação SP/AP e, uma vez o SP elevado, este persiste por longos períodos.

Conclusão

A eletrococleografia é uma importante ferramenta no diagnóstico da hidropsia endolinfática. A revisão da literatura identificou que o método extratimpânico é eficaz, não invasivo e de fácil execução na prática clínica. Novas técnicas são capazes de aumentar a sensibilidade do teste, como o uso do tone burst e a análise da área da curva da razão SP/AP associada à medida da relação SP/AP.

A eletrococleografia ainda permanece como o único exame capaz de mensurar objetivamente a hidropsia endolinfática na cóclea e cumpre seu papel auxiliando o otorrinolaringologista no manejo da doença de Ménière, principalmente quando os dados audiológicos são escassos e os sintomas menos definidos.

REFERÊNCIAS

1. Pirodda A, Brandolini C, Chiara Raimondi M, Gaetano GF, Modugno GC, Borghi C. Meniere's disease: update of theories and a proposal of explanation. Acta clínica Bélgica. 2010:65-73.
2. Schuknecht HF. Ménière's disease, pathogenesis and pathology. Am J Otolaryngol. 1982;3:349-52.
3. Committee on Hearing and Equilibrium. Guidelines for the diagnosis and evaluation of therapy in Meniere's disease. American Academy of Otolaryngology Head and Neck Foundation Inc. Otolaryngol Head Neck Surg. 1995;113:181-5.
4. Durrant J, Wang J, Ding D, Salvi R. Are inner or outer hair cells the source of summating potentials recorded from the round window? J Acoust Soc Am. 1998;104:370-7.
5. Hall JW, Antonelli PJ. Assessment of peripheral and central auditory function. In: Bailey BJ, Jackler RK, Pillsbury HC 3rd, Lambert PR, editors. Head and neck surgery – otolaryngology. 3rd ed. Philadelphia: Lippincott Williams & Wilkins; 2001. p. 1666.
6. Burkard RF, Eggermont JJ, Don M. Auditory evoked potentials: basic principles and clinical application. In: Electric and magnetic fields of synchronous neural activity. Baltimore: Lippincott Williams & Wilkins; 2007. p. 2-21.
7. Campbell KC, Harker LA, Abbas PJ. Interpretation of electrocochleography in Meniere's disease and normal subjects. Ann Otol Rhinol Laryngol. 1992;101:496-500.
8. Nguyen LT, Harris JP, Nguyen QT. Clinical utility of electrocochleography in the diagnosis and management of Ménière's disease: AOS and ANS member ship survey data. Otol Neurotol. 2010;31:455-9.
9. Claes GM, De Valck CF, Van de Heyning P, Wuyts FL. The Ménière's Disease Index: an objective correlate of Ménière's disease, based on audiometric and electrocochleographic data. Otol Neurotol. 2011;32:887-92.
10. Ghosh S, Gupta AK, Mann SS. Can electrocochleography in Meniere's disease be noninvasive? J Otolaryngol. 2002;31:371-5.
11. Martín-Sanz E, Sánchez JE, Julião MG, Luzardo CZ, Patino TM, Riesco LR, et al. Extratympanic electrocochleography in Ménière'sdisease. Acta Otorrinolaringol Esp. 2012;63:421-8.
12. Conlon BJ, Gibson WP. Electrocochleography in the diagnosis of Meniere's disease. Acta Otolaryngol. 2000;120:480-3.
13. Chung WH, Cho DY, Choi JY, Hong SH. Clinical usefulness of extratympanic electrocochleography in the diagnosis of Ménière's disease. Otol Neurotol. 2004;25:144-9.
14. Devaiah AK, Dawson KL, Ferraro JA, Ator GA. Utility of area curve ratio electrocochleography in early Meniere disease. Arch Otolaryngol Head Neck Surg. 2003;129:547-51.
15. Kim HH, Kumar A, Battista RA, Wiet RJ. Electrocochleography in patients with Ménière's disease. Am J Otolaryngol. 2005;26:128-31.
16. Soares LCA, Conegundes LSO, Fukuda C, Munhoz MSL. Da eletrococleografia transtimpânica em pacientes com e sem hydrops endolinfático e limiares auditivos iguais ou maiores que 50 decibéis. Rev Bras Otorrinolaringol. 2003;69:74-82.
17. Pappas DGJ, Pappas DGS, Carmichael L, Hyatt DP, Toohey LM. Extratympanic electrocochleography: diagnostic and predictive value. Am J Otolaryngol. 2000;21:81-7.
18. Iseli C, Gibson WA. Comparison of three methods of using transtympanic electrocochleography for the diagnosis of Ménière's disease: click summating potential measurements, tone burst summating potential amplitude measurements, and biasing of the summating potential using a low frequency tone. Acta Otolaryngol. 2010;130:95-101.
19. Gibson WP. A comparison of two methods of using transtympanic electrocochleography for the diagnosis of Meniere's disease: click summating potential/action potential ratio measurements and toneburst summating potential measurements. Acta Otolaryngol Suppl. 2009:38-42.
20. Takeda T, Kakigi A. The clinical value of extratympanic electrocochleography in the diagnosis of Ménière's disease. ORL. 2010;72:196-204.
21. Ge X, Shea JJ. Transtympanic electrocochleography: a 10-year experience. Otol Neurotol. 2002;23:799-805.
22. Büki B, Platz M, Haslwanter T, Jünger H, Avan P. Results of electrocochleography in Ménière's disease after successful vertigo control by single intratympanic gentamicin injection. Audiol Neurootol. 2011;16:49-54.
23. Moon IJ, Park GY, Choi J, Cho YS, Hong SH, Chung WH. Predictive value of electrocochleography for determining hearing outcomes in Ménière's disease. Otol Neurotol. 2012;33:204-10.
24. Lopes KC, Munhoz MSL, Santos MAR, Moraes MFD, Chaves AG. A medida angular gráfica como parâmetro de avaliação da eletrococleografia. Braz J Otorhinolaryngol. 2011;77:214-20.
25. Baba A, Takasaki K, Tanaka F, Tsukasaki N, Kumagami H, Takahashi H. Amplitude and area ratios of summating potential/action potential (SP/AP) in Ménière's disease. Acta Otolaryngol. 2009;129:25-9.
26. Ikino CM, Almeida ER. Summating potential-action potential waveform amplitude and width in the diagnosis of Ménière's disease. Laryngoscope. 2006;116:1766-9.
27. Ikino CM, Almeida ER, Caminha GP, Crespi PR. Electrocochleography with condensation and rarefaction click stimulation in Meniere's disease. Braz J Otorhinolaryngol. 2002;68:870-3.
28. Yamamoto M, Teranishi M, Naganawa S, Otake H, Sugiura M, Iwata T, et al. Relationship between the degree of endolymphatic hydrops and electrocochleography. Audiol Neurootol. 2010;15:254-60.
29. Seo YJ, Kim J, Choi JY, Lee WS. Visualization of endolymphatic hydrops and correlation with audio-vestibular functional testing in patients with definite Meniere's disease. Auris Nasus Larynx. 2013;40:167-72.