versão impressa ISSN 1677-5449versão On-line ISSN 1677-7301
J. vasc. bras. vol.17 no.1 Porto Alegre jan./mar. 2018 Epub 12-Mar-2018
http://dx.doi.org/10.1590/1677-5449.007717
A fratura com embolização de cateter totalmente implantável para quimioterapia representa menos de 1% das complicações relacionadas a esse dispositivo. Ela ocorre por compressão do cateter pela primeira costela e clavícula, conhecido como síndrome de pinch-off. A embolização do fragmento pode ocorrer em átrio, ventrículo, artéria pulmonar e veia cava1.
Utilizando os termos embolization, catheter, chemotherapy e fracture na base de dados PubMed, foi encontrado apenas um caso de fratura e embolização de cateter para quimioterapia para a veia cava inferior2, justificando a apresentação do presente caso.
Paciente feminina, 57 anos de idade, submeteu-se em janeiro de 2010 a laparotomia por lesão anexial complexa, sendo diagnosticado no intraoperatório câncer de ovário com carcinomatose peritoneal disseminada, sendo realizada somente histerectomia e salpingooforectomia bilateral, não sendo realizada cirurgia oncológica radical. O exame histopatológico revelou adenocarcinoma de ovário G3. Procedeu-se em fevereiro de 2010 à instalação por punção de um cateter totalmente implantável para quimioterapia na veia subclávia direita, cujo procedimento ocorreu sem intercorrências. O segmento distal do cateter foi deixado na veia cava superior, próximo à entrada no átrio direito.
A paciente submeteu-se a quimioterapia adjuvante baseada em platina e taxol, apresentando boa tolerância. Entretanto, em outubro de 2013, exame radiológico de rotina diagnosticou fratura (Figura 1) e embolização de segmento distal do cateter para veia cava inferior retro e supra-hepática (Figura 2). A paciente não apresentou nenhuma sintomatologia.
Após preparo pré-operatório, a paciente foi encaminhada para o centro cirúrgico. Sob anestesia geral, procedeu-se à retirada do cateter através da veia femoral pela técnica do laço (Figura 3). O procedimento ocorreu sem complicações. Em seguida, o reservatório foi removido. A paciente evoluiu bem, recebendo alta hospitalar no dia seguinte. Atualmente, está sem evidência de doença oncológica 24 meses após a realização do procedimento.
O uso de cateter totalmente implantável normalmente é indicado para pacientes que necessitam de quimioterapia de longa duração para neoplasias malignas1. Seu uso é descrito com baixa taxa de complicação3,4. Entretanto, a permanência prolongada pode levar a uma série de complicações, uma delas potencialmente letal: a fratura e embolização de fragmentos do cateter. Esse é um evento raro, que corresponde a cerca de 1% das complicações relacionadas a esse dispositivo5. Os locais mais frequentes de embolização são para átrio, ventrículo e artéria pulmonar. Os fragmentos de cateter podem causar complicações como perfuração cardíaca, arritmias, sepse e embolia pulmonar, por se comportarem como um corpo estranho no sistema venoso6.
O mecanismo da fratura ocorre pela compressão do cateter na passagem entre a clavícula e a primeira costela, levando ao estresse do material, podendo ocorrer a ruptura parcial ou total. A ocorrência da fratura ocorre geralmente quando o cateter é colocado por punção. O implante, quando realizado por dissecção, seja da veia cefálica ou jugular externa, apresenta uma taxa de fratura menor, pois o cateter não passa entre a primeira costela e a clavícula6.
No presente caso, a fratura ocorreu 26 meses depois da instalação do cateter. Após o término da quimioterapia, se o paciente tem bom prognóstico, o dispositivo deve ser retirado prontamente. No entanto, para pacientes com prognóstico reservado, como câncer de ovário avançado, em que a taxa de recidiva é alta, é prudente deixar o cateter, devido à possibilidade da paciente necessitar de quimioterapia se ocorrer recidiva. A embolização ocorreu para veia cava inferior retro e supra-hepática. Até onde temos conhecimento, apenas um caso de fratura e embolização de cateter para veias hepáticas foi descrito na literatura2.
Geralmente a embolização é assintomática, sendo diagnosticada quando da punção para infusão, coleta de sangue ou heparinização, não ocorrendo refluxo de sangue, o que deve chamar a atenção para a possibilidade de embolização. Nesses casos, uma radiografia simples de tórax estabelece o diagnóstico. A ocorrência de óbito por embolização de cateter totalmente implantável para quimioterapia é um evento raro7.
Os sinais e sintomas associados à síndrome de pinch-off envolvem dificuldade na infusão de fluidos na posição de repouso, tendo o paciente que abduzir seu membro superior a fim de ampliar o ângulo costoclavicular e eliminar a compressão do cateter. O diagnóstico é feito pela análise radiográfica simples de tórax com visualização do reservatório desconectado da parte distal8. O tratamento deve ser realizado o mais precocemente possível, sendo a técnica por acesso endovascular o tratamento padrão, por apresentar baixas taxas de complicações9, como no presente relato, em que o procedimento ocorreu sem intercorrências.
A partir disso, percebe-se que a embolização para veia cava inferior de fragmentos de cateter venoso central totalmente implantável é uma complicação extremamente rara e potencialmente letal. A equipe deve ficar atenta a qualquer sinal de dificuldade de coleta de sangue ou administração de líquidos. O diagnóstico pode ser feito por meio de radiografia simples e o tratamento de eleição é a retirada por abordagem endovascular.