versão impressa ISSN 1679-4508versão On-line ISSN 2317-6385
Einstein (São Paulo) vol.13 no.1 São Paulo jan./mar. 2015
http://dx.doi.org/10.1590/S1679-45082015ED3306
A inserção da sexualidade nos currículos das escolas médicas se justifica pela associação entre sexualidade e saúde, que pauta cotidianamente o exercício da medicina. Essa associação é notada pela importância conferida à sexualidade nos relacionamentos interpessoais e na qualidade de vida, e, também, pela prevalência das disfunções sexuais na população. Além disso, há altas expectativas dirigidas ao preparo dos médicos para a assistência em saúde sexual, inclusive a grupos vulneráveis, como a população de lésbicas, gays, bissexuais, travestis e transexuais.(1,2)
Apesar desse cenário atual de demandas e expectativas, diversas barreiras são apontadas para uma adequada assistência em saúde sexual. Tais barreiras são antigas e estão relacionadas ao desconforto dos profissionais diante das queixas sexuais dos pacientes, aliado a atitudes heterossexistas, que reforçam vulnerabilidades. A inabilidade de comunicação para a coleta de uma anamnese sexual e o desconhecimento sobre a intersecção entre sexualidade e saúde são também destacados. É nesse contexto que as recomendações para a melhoria da formação médica em sexualidade são reiteradas.(3)
A oferta de temas sexuais nos currículos médicos permanece na pauta mundial dos estudos sobre a sexualidade nos últimos 65 anos. O impacto positivo da inserção de temas sexuais nos currículos médicos foi evidenciado por alunos que apontaram a educação sexual como capaz de ajudá-los a lidar melhor com a própria sexualidade, a reconhecer a diversidade sexual das pessoas e a valorizar as queixas sexuais dos pacientes.(4) Há consenso de que a sexualidade deve ser ofertada em um modelo curricular centrado no aluno e apoiado no tripé constituído por conhecimentos, atitudes e habilidades.(5)
A aquisição de conhecimentos deve abranger aspectos biológicos, psicológicos e socioculturais da sexualidade. O tópico das atitudes é considerado o mais valioso pela observação de que os alunos não se disponibilizam para aprender em situações de desconforto. Então, promover mudanças de atitude diante de situações que envolvam a sexualidade estimula a mudança de comportamento, melhora o conforto dos alunos com o tema, suas habilidades de comunicação e, ainda, favorece a absorção de conhecimentos.(6)
A aquisição de habilidades prepara para a assistência em saúde sexual. Dessa forma, devem ser enfatizadas as habilidades de comunicação, que incluem falar confortavelmente sobre sexo, com o uso de uma linguagem não discriminatória e apropriada ao gênero. Também deve haver treinamento para ensinar os alunos a coletar uma história sexual, fazer o exame físico genital dos pacientes e diagnosticar as disfunções sexuais em seus aspectos orgânicos, psicológicos e sociais.(6) O ensino da sexualidade deve ser ofertado em uma abordagem interdisciplinar, de forma a permear toda a extensão do currículo médico, garantindo a integralidade da saúde sexual na formação médica.(5,6)
Vários inquéritos mundiais foram realizados para conhecer o número de escolas médicas que oferecem o ensino da sexualidade durante a graduação, os assuntos ofertados e o tempo despendido para tal.(3,7) Recente levantamento nacional evidenciou que 96,3% dos professores de 110 escolas médicas brasileiras ofertam temas sexuais com média de 6 horas por disciplina. No entanto, a abordagem ocorre por um viés organicista, patológico e heteronormativo, de forma fragmentada em disciplinas que não se comunicam. Os aspectos psicológicos e sociais da sexualidade que influenciam nos comportamentos sexuais foram pouco abordados pelos professores. Esses dados destacam a necessidade de melhoria na oferta de educação sexual pelas escolas médicas brasileiras para a garantia da assistência integral à saúde sexual da população.(7)