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Equivalência cultural da versão brasileira do protocolo Evaluation of the Ability to Sing Easily

Equivalência cultural da versão brasileira do protocolo Evaluation of the Ability to Sing Easily

Autores:

Bruna Rainho Rocha,
Felipe Moreti,
Elisabeth Amin,
Glaucya Madazio,
Mara Behlau

ARTIGO ORIGINAL

CoDAS

versão On-line ISSN 2317-1782

CoDAS vol.26 no.6 São Paulo nov./dez. 2014

http://dx.doi.org/10.1590/2317-1782/20142014175

INTRODUÇÃO

Os protocolos de autoavaliação vocal têm se desenvolvido e se especificado desde a década de 1990( 1 ) e são considerados como importantes ferramentas de mensuração do conhecimento do indivíduo sobre o impacto do seu problema em suas relações sociais e profissionais( 2 ). Apesar de seu uso frequente, a maioria deles, com suas respectivas traduções, adaptações culturais( 3 ) e validações para o Português brasileiro( 4 - 9 ), ainda é direcionada para doenças específicas. Sendo assim, não são adequados para uso com indivíduos de vozes saudáveis, como profissionais da voz, que merecem uma avaliação específica( 10 - 12 ). Para preencher essa lacuna, foi criado o protocolo Evaluation of the Ability to Sing Easily (EASE)( 13 ), que avalia as percepções dos cantores sobre o estado de sua voz cantada após uma apresentação, oferecendo um panorama imediato sobre o uso da voz .

O EASE foi desenvolvido em Inglês e, para o uso em outras línguas, deve ser traduzido e culturalmente adaptado de acordo com as regras internacionais do Scientific Advisory Committee of Medical Outcome Trust ( 14 ).

O objetivo deste estudo foi realizar a equivalência cultural da versão brasileira do protocolo EASE, por meio de sua adaptação cultural e linguística.

MÉTODOS

A pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa do Hospital Municipal e Maternidade Escola Dr. Mário de Moraes (parecer nº 721.483 e CAAE: 32107014.2.0000.5454). Todos os participantes assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.

Participaram 41 cantores brasileiros em atividade, sem distinção de estilo musical, gênero, idade ou nível socioeconômico-cultural.

A versão original foi traduzida para o Português brasileiro por duas fonoaudiólogas fluentes na língua estrangeira (tradutora 1 - T1 e tradutora 2 - T2). Essas traduções foram sobrepostas, resultando na primeira versão em Português (VP). Foi realizada a retrotradução por uma terceira fonoaudióloga, também fluente em Inglês, sem acesso à versão original do instrumento e aos objetivos do estudo.

A tradução e a retrotradução foram comparadas entre si e ao instrumento original. As discrepâncias existentes foram analisadas e discutidas por um comitê composto por cinco fonoaudiólogos especialistas em voz, com proficiência em Inglês e conhecimento do vocabulário específico da população de cantores. As mudanças necessárias foram realizadas por consenso e chegou-se ao protocolo final, intitulado Evaluation of the Ability to Sing Easily para o Brasil (EASE-BR).

Como o protocolo original, o EASE-BR permaneceu com 22 questões e quatro alternativas para marcação da frequência de ocorrência da situação descrita: "não", "um pouco", "moderadamente" e "muito". Das 22 questões, 19 são itens com descritores usuais de fadiga e limitação vocais e os três remanescentes são aspectos positivos e novos na literatura. O escore é uma soma simples dos 19 itens negativos, sendo 0=não, 1=um pouco, 2=moderadamente e 3=muito, com os três itens positivos (questões 6, 12 e 21) somados de forma reversa, a saber: 3=não, 2=um pouco, 1=moderadamente e 0=muito.

Para a equivalência cultural, o EASE-BR foi aplicado em 41 cantores brasileiros (32 na primeira etapa e nove na segunda), com o acréscimo da opção "não aplicável" para identificação de questões não compreendidas ou não apropriadas para a população-alvo e cultura brasileira.

RESULTADOS

Na primeira etapa, cinco dos 32 cantores inicialmente avaliados encontraram dificuldade para o preenchimento de três questões (itens 3 - "Minha voz está rachando e quebrando"; 8 - "Minha voz parece tensa" e 21 - "Se fosse preciso, eu poderia cantar novamente"). Por essa razão, o comitê de fonoaudiólogos realizou nova adaptação das sentenças não compreendidas ou consideradas inapropriadas. O item 8 foi modificado para "Sinto minha voz tensa" por consenso pelo comitê de juízes. Já os itens 3 e 21, modificados respectivamente para "Minha voz está falhando e quebrando" e "Se fosse preciso, eu poderia cantar novamente agora", foram modificados após não compreensão pela população-alvo da forma inicialmente traduzida. O EASE-BR modificado foi então aplicado em mais nove cantores vocalmente saudáveis e não foram identificadas barreiras culturais e/ou conceituais. Todo o processo de tradução, equivalência semântica e cultural do EASE para o Português brasileiro encontra-se no Quadro 1.

Quadro 1. Processo de tradução e adaptação cultural do protocolo Evaluation of the Ability to Sing Easily (EASE)(13) para o Português brasileiro *Itens com aspectos positivos e pontuação reversa Legenda: T1 = tradutor Inglês-Português número 1; T2 = tradutor Inglês-Português número 2; VP = versão em Português da compilação das traduções do T1 + T2 

A composição final da versão brasileira traduzida e culturalmente adaptada do EASE, chamada de EASE-BR (Anexo 1), apresenta 22 itens, como o protocolo original.

DISCUSSÃO

A obtenção da equivalência cultural é a primeira etapa para a validação de protocolos e é essencial para que não existam barreiras entre o instrumento e sua população-alvo em diferentes países( 14 ). Essa etapa já foi realizada com sucesso em validações de outros protocolos no Brasil( 4 - 9 ), que serviram de exemplo e modelo para este projeto. No caso da fase de adaptação do EASE para o Brasil, três, das 22 frases que o compõem, precisaram ser revistas até que o protocolo fosse aceito pela população-alvo.

O EASE é um protocolo específico para cantores, desenvolvido para ser sensível às sutilezas da voz dessa população( 13 ). Com a conclusão do processo de tradução e adaptação para o Português brasileiro, terá início o processo de validação do EASE-BR. Nessa etapa, será verificada a possibilidade de seu uso como instrumento de prevenção e detecção precoce de problemas vocais, levando em consideração a alta demanda dos cantores. Seu uso será importante, visto que a maioria dos protocolos de autoavaliação de voz é direcionada para doenças específicas( 4 - 9 ) e não são adequados para indivíduos de vozes saudáveis.

CONCLUSÃO

Foi verificada equivalência cultural entre o EASE e sua versão traduzida para o Português brasileiro, o EASE-BR. A validação do EASE para o Português brasileiro está em andamento, após a conclusão dessa etapa.

REFERÊNCIAS

1. Colton RH, Casper JK, Leonard R. Anamnese, exames e avaliações. In: Colton RH, Casper JK, Leonard R. Compreendendo os problemas da voz: uma perspectiva fisiológica no diagnóstico e tratamento das disfonias. 3ª edição. Rio de Janeiro: Revinter; 2010. p. 195-251.
2. World Health Organization. WHOQOL. Measuring Quality of Life. The World Health Organization Quality of Life Instruments (THE WHOQOL-100 AND THE WHOQOL-BREF). Geneva: WHO; 1997.
3. Moreti F, Zambon F, Oliveira G, Behlau M. Cross-cultural adaptation of the Brazilian version of the Voice Symptom Scale: VoiSS. J Soc Bras Fonoaudiol. 2011;23(4):398-400.
4. Gasparini G, Behlau M. Quality of Life: validation of the Brazilian version of the Voice-Related Quality-of-Life (V-RQOL) Measure. J Voice. 2009;23(1):76-81.
5. Behlau M, Alves dos Santos LM, Oliveira G. Cross-cultural adaptation and validation of the voice handicap index into Brazilian Portuguese. J Voice. 2011;25(3):354-9.
6. Paulinelli BR, Gama AC, Behlau M. Validation of the Vocal Performance Questionnaire in Brazil. Rev Soc Bras Fonoaudiol. 2012;17(1):85-91.
7. Costa T, Oliveira G, Behlau M. Validation of the Voice Handicap Index: 10 (VHI-10) to the Brazilian Portuguese. CoDAS. 2013;25(5):482-5.
8. Ricarte A, Oliveira G, Behlau M. Validation of the Voice Activity and Participation Profile protocol in Brazil. CoDAS. 2013;25(3):242-9.
9. Moreti F, Zambon F, Oliveira G, Behlau M. Cross-cultural adaptation, validation, and cutoff values of the Brazilian version of the Voice Symptom Scale-VoiSS. J Voice. 2014;28(4):458-68.
10. Behlau M, Zambon F, Madazio G. Managing dysphonia in occupational voice users. Curr Opin Otolaryngol Head Neck Surg. 2014;22(3):188-94.
11. Warhurst S, McCabe P, Madill C. What makes a good voice for radio: perceptions of radio employers and educators. J Voice. 2013;27(2):217-24.
12. Paoliello K, Oliveira G, Behlau M. Singing voice handicap mapped by different self-assessment instruments. CoDAS. 2013;25(5):463-8.
13. Phyland DJ, Pallant JF, Benninger MS, Thibeault SL, Greenwood KM, Smith JA, et al. Development and preliminary validation of the EASE: a tool to measure perceived singing voice function. J Voice. 2013;27(4):454-62.
14. Aaronson N, Alonso J, Burnam A, Lohr KN, Patrick DL, Perrin E, et al. Assessing health status and quality-of-life instruments: attributes and review criteria. Qual Life Res. 2002;11(3):193-205.