versão On-line ISSN 2317-1782
CoDAS vol.26 no.4 São Paulo jul./ago. 2014
http://dx.doi.org/10.1590/2317-1782/201420130068
O termo "dificuldade desenvolvimental" é utilizado para incluir condições que direcionam uma criança ao risco de um desenvolvimento abaixo do esperado, ou que inclui condições que farão uma criança ter um desvio, atraso, desordem ou inabilidade no desenvolvimento. O termo está relacionado a todas as crianças que têm limitações no funcionamento ou desenvolvimento para um potencial completo, por exemplo, àquelas que nascem com baixo peso( 1 ).
O baixo peso é caracterizado como o maior determinante de mortalidade, morbidade e de inabilidades na infância e também tem um impacto na saúde, em longo prazo, na vida adulta.
É considerado baixo peso ao nascer a primeira medida de peso do feto ou recém-nascido obtida após o nascimento, menor que 2.500 g( 2 ).
O baixo peso ao nascer está relacionado a inúmeros fatores biológicos, psicossociais e demográficos, tais como: crescimento intrauterino inadequado, menor período gestacional ou prematuridade, a gravidez em faixa etária inferior a 20 anos ou com mais de 35 anos, múltiplas gestações, mães fumantes, desnutrição na gravidez, reduzido número de consultas pré-natais, ausência ou inadequação de acompanhamento durante a gestação, escolaridade da mãe e famílias que vivem em baixas condições sociais ou em países subdesenvolvidos( 1 , 3 ).
Há diversos estudos e discussões demonstrando que o baixo peso ao nascer é fator de risco ao desenvolvimento e constitui o mais importante determinante da mortalidade neonatal, perinatal e infantil.
Estudos sobre o desenvolvimento infantil têm relacionado a idade gestacional e o peso ao nascimento como fatores preditivos para os desfechos dos primeiros anos de vida( 4 - 10 ).
Além disso, devemos considerar suas implicações na aquisição da linguagem( 8 , 11 - 14 ), já que crianças que convivem com riscos biológicos nos primeiros anos de vida são mais propensas a desenvolverem problemas que podem afetar o seu desenvolvimento.
Uma meta-análise considerando 4.125 indivíduos nascidos muito prematuros (menor ou igual a 33 semanas de gestação) e/ou com muito baixo (menor ou igual a 1.500 g) e 3.197 indivíduos nascidos a termo, de 5 a 22 anos de idade demonstrou que os indivíduos prematuros e/ou com muito baixo peso ao nascimento do estudo poderiam apresentar dificuldades: em reter informações, em mudanças entre os conjuntos mentais e para gerar diferentes soluções em um problema particular, déficits severos em habilidades matemáticas, na leitura, na soletração e nas funções executivas. Segundo o estudo, eles enfrentariam sequelas comportamentais em sintomas de desatenção e problemas comportamentais internalizados. Houve uma tendência significante na associação entre o peso ao nascer e as pontuações dos pais para problemas comportamentais internalizados e problemas de atenção( 15 ).
Um estudo realizado no Hospital de Cabueñes, em Gijón (2010), e na Universidade Central do Hospital de Asturias, em Oviedo - Espanha, com uma amostra de 141 crianças (63 crianças prematuras e 78 crianças a termo), com idade média de 8 anos, demonstrou, em avaliação de linguagem e de cognição, que as crianças nascidas pré-termo e com muito baixo peso (≤1.500 g) apresentaram diferenças significativas quando comparadas a crianças a termo, no que diz respeito aos testes de fluência verbal, nos quais as crianças pré-termo e muito baixo peso apresentaram-se muito aquém do normal. Seus escores em testes de Quociente de Inteligência Total (QI), apesar de estarem dentro da normalidade, foram menores em relação às crianças a termo. Esses dados demonstram que a prematuridade associada ao muito baixo peso pode trazer dificuldades na fluência verbal, um dos aspectos da linguagem( 16 ).
Um estudo comparou habilidades de linguagem em crianças nascidas pré-termo ou com muito baixo peso (≤1.500 g) com 7 anos de idade a crianças nascidas a termo da mesma idade; o grupo pré-termo ou muito baixo peso demonstrou-se significativamente pior do que o grupo controle em todos os subdomínios de linguagem testados: consciência fonológica, semântica, gramática, discurso e pragmática( 17 ).
Autores( 18 ) analisaram as vocalizações iniciais e sua influência na linguagem de bebês nascidos com muito baixo peso e que foram avaliados aos 2 anos de idade e comparados a crianças nascidas a termo (grupo controle). Os autores destacaram que as vocalizações iniciais se correlacionaram significativamente com o desempenho tardio de linguagem nas crianças com muito baixo peso.
Visto o risco ao desenvolvimento de crianças nascidas com baixo peso, especialmente no que diz respeito à linguagem, temos como hipótese para este estudo que crianças nascidas com baixo peso podem apresentar alterações de desenvolvimento de linguagem, especialmente nos aspectos morfossintáticos.
Esta pesquisa teve como objetivo principal caracterizar a construção de frases de escolares nascidos com baixo peso, inseridos na rede de ensino municipal do município do Embu das Artes (SP). Apresentamos, portanto, como objetivos específicos: comparar o desempenho de linguagem entre escolares que apresentaram baixo peso ao nascer com o de escolares com peso adequado ao nascimento; verificar a associação entre desempenho de linguagem e as variáveis: peso ao nascimento, sexo da criança, idade da criança, idade e escolaridade da mãe.
Estudo retrospectivo, caso controle, cuja amostra foi composta por protocolos de 413 escolares na faixa etária de 6 a 10 anos de idade, dos gêneros masculino e feminino, estudantes de escolas municipais de Embu das Artes (SP), que realizaram avaliação fonoaudiológica e entrevista com a mãe e/ou responsáveis (anamnese) para coleta de informações sobre o desenvolvimento da criança. Houve aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal de São Paulo (CEP/UNIFESP 184.779).
As informações analisadas no presente estudo foram obtidas do projeto "Morbidade, Crescimento e Desenvolvimento de Escolares de 6 a 10 anos de idade nascidos com baixo peso - integralidade e intersetorialidade na atenção à criança no sistema local de saúde. Embu (SP)", realizado entre 2010 e 2012, por equipe interdepartamental da UNIFESP, com apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP) - Programa Pesquisa para o SUS: Gestão Compartilhada em Saúde (PPSUS), aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal de São Paulo (CEP/UNIFESP nº 1142/09).
Nessa ocasião, os dados foram coletados por equipe multidisciplinar, incluindo-se fonoaudiólogas, para a realização do Projeto.
Houve autorização prévia dos pais e/ou responsáveis dos participantes para a utilização das informações coletadas, por meio da assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido. Ademais, para a análise dos dados do presente estudo, houve prévia autorização da coordenadora do Projeto anterior para a utilização dos dados nesta pesquisa, por meio da Carta de Autorização Para Pesquisa em Banco de Dados.
Os critérios de inclusão para o presente estudo foram: faixa etária entre 6 e 10 anos, de ambos os gêneros, que apresentaram peso normal ao nascimento (acima ou igual a 2.500 g e crianças de mesma faixa etária que apresentaram baixo peso ao nascimento (<2.500 g) . Participaram do estudo 175 crianças com peso normal ao nascimento, que constituíram o grupo controle (GC), e 238 crianças com baixo peso ao nascer, que formaram o grupo pesquisa (GP).
A amostra (GC e GP) contou com 182 crianças do gênero feminino e 231 crianças do gênero masculino.
Em relação à idade, a amostra se mostrou bem distribuída em ambos os grupos (11,6% <7 anos; 13,3% de 7 a <8 anos; 25,4% de 8 a <9 anos; 28,1% de 9 a <10 anos; 21,5% 10 anos ou mais).
O GP apresentou a média de 2.078 g e desvio padrão de 437 g de peso ao nascimento, com mínimo de 620 g e máximo de 2.495 g. A idade mínima da mãe ao engravidar no GP foi de 11 anos e a idade máxima foi de 45 anos, tendo desvio padrão de 24,04 anos.
Já no GC, a idade mínima da mãe ao engravidar foi de 15 anos e a idade máxima foi de 40 anos, tendo desvio padrão de 17,67 anos
Os dois grupos apresentaram a média de idade materna de 25 anos. A escolaridade materna de ambos os grupos foi homogênea. A escolaridade da amostra estava distribuída como segue: 0,9% com 1 ano; 12% com 2 anos; 39,4% com 3 anos; 33,5% com 4 anos; 8,6% com 5 anos; 2,2% com 6 anos; 3,4% com 9 anos.
Foram excluídas do estudo crianças com anomalias ou morbidades. Quanto à audição, todos os participantes deste estudo realizaram triagem audiológica.
Analisou-se o desempenho de linguagem das crianças avaliadas por meio do Test of Language Competence-Extended Edition(TLC-E)( 19 ), traduzido e adaptado para o português (nível 1)( 20 ). Foi de interesse no presente estudo analisar o desempenho das crianças no TLC-E do nível 1, em seu subteste 3: Recriando atos de fala.
O Teste de Competência de Linguagem (TLC-E) está dividido em duas partes: o nível 1, para crianças de 5,0 a 9,11 anos; e o nível 2, para a partir da faixa etária de 9,11 anos. Os dois níveis estão divididos em quatro subtestes responsáveis pela avaliação de cada uma dessas capacidades da competência linguística. Ao final de cada subteste, há uma análise qualitativa do avaliador quanto à observação comportamental da criança durante a aplicação do teste( 19 ).
O subteste 3 do nível 1 do TLC-E nomeado como "Recriando Atos de Fala" tem como objetivo avaliar a expressão oral, por meio da habilidade de planejar e formular atos de fala, com base na gramática, processamento de informações e modelo de atos de fala, a partir de palavras-chave, relacionadas a um contexto pré-determinado por uma figura. Ele analisa a organização da estrutura frasal quanto à morfossintaxe, semântica e pragmática, além da memória auditiva. Pode-se ainda medir a extensão média do enunciado (MLU) e realizar uma análise qualitativa do discurso( 19 ).
O subteste três possui 16 itens, dos quais são analisados os escores holísticos e o número de palavras, cada um em uma coluna. Ao final, somam-se as duas variáveis consideradas, para a obtenção de um escore bruto. Esse escore deve ser convertido em escore padrão, ponderado para a faixa etária da criança avaliada, o que permite a classificação do desempenho desta em relação à população de mesma idade( 19 , 20 ).
A pontuação é considerada da seguinte maneira: Coluna 1 - Escore holístico (análise qualitativa da frase) - se a criança não realizou nenhuma sentença: pontuação 0; se há algum desvio sintático na frase dita: pontuação1; se a criança emitiu uma frase correta: pontuação 3. Coluna 2 - Número de palavras (análise quantitativa da frase) - não utilizou nenhuma palavra dada ou não produziu uma sentença: pontuação 0; utilizou uma palavra na formação da sentença: pontuação 1; utilizou as duas palavras-alvo para formação da sentença: pontuação 3( 19 , 20 ).
Para este estudo, foi considerado o desempenho no subteste 3 e foram analisados os escores médios do teste em cada um dos grupos, comparando-se o desempenho entre eles. As médias de idade e o gênero das crianças foram relacionados ao escore e comparados intragrupo e intergrupo. Foram consideradas as variáveis: idade da mãe ao engravidar ou idade do responsável e escolaridade da mãe/responsável como fatores externos. Os dados foram comparados à variável resposta do estudo.
Para a caracterização da amostra, foi realizada a análise estatística descritiva. Na análise das variáveis qualitativas, foram apresentadas as frequências absolutas (n) e as frequências relativas (%). Para as variáveis quantitativas, foram calculadas a média e a mediana, como medidas resumos. Para apontar a variabilidade, foi apresentado o desvio padrão, valor mínimo e máximo e médias.
Para as comparações dos resultados de cada item do escore holístico, do escore do número de palavras e do escore padrão entre os dois grupos foi utilizado o teste do χ2.
Para as comparações das pontuações totais do escore holístico, do escore do número de palavras, do escore bruto e do escore padrão entre os dois grupos, o teste utilizado foi o t de Student.
Para todos os testes, foi considerado um nível de significância de 5%. Dessa forma, foi considerado haver diferença entre os grupos se p<0,05.
Ainda, foi de interesse a realização da análise por meio de regressão linear e logística para a verificação das variáveis de maior impacto no desempenho da linguagem, obtido no subteste 3 do TLC-E - nível 1. Para essa análise, as variáveis introduzidas no modelo foram: gênero, idade, idade da mãe, escolaridade da mãe e, em relação ao peso, ora foi utilizado peso ao nascer, ora foi utilizado o grupo (peso normal e baixo peso como um único grupo). Pôde-se verificar que não houve multicolinearidade entre as variáveis utilizadas no estudo; sendo assim, todas as variáveis de interesse foram utilizadas nos modelos.
Também, para esta análise, foi considerado um nível de significância de 5%. O R2 aponta a qualidade de ajuste do modelo, sendo que, quanto mais próximo de 1, melhor o ajuste. O valor de p<0,05 mostra se o modelo foi significativo e o valor de p para cada variável mostra se há coeficientes (β) no modelo com valores diferentes de 0.
O software utilizado em toda a análise foi o Statistical Package for the Social Sciences (SPSS) 12.0.
Comparação das pontuações totais
Pelos resultados (Tabela 1), pôde-se observar que apenas houve diferença significativa, entre os grupos, em relação ao número total de palavras (p<0,05), evidenciando que crianças do GC apresentam, em média, maior pontuação em relação ao número total de palavras.
Tabela 1 Escore total (holístico e número de palavras) e total geral do Teste de Competência de Linguagem
Grupo | Valor de p | ||
---|---|---|---|
Peso normal | Baixo peso | ||
Total (holístico) | |||
n | 175 | 238 | 0,470 |
Média | 33,61 | 32,59 | |
Mediana | 38,00 | 38,00 | |
Desvio padrão | 13,42 | 14,54 | |
Mínimo | 0,00 | 0,00 | |
Máximo | 48,00 | 48,00 | |
Total (número de palavras) | |||
n | 175 | 238 | 0,030* |
Média | 27,97 | 24,80 | |
Mediana | 34,00 | 28,00 | |
Desvio padrão | 14,48 | 14,80 | |
Mínimo | 0,00 | 0,00 | |
Máximo | 48,00 | 48,00 | |
Total geral | |||
n | 175 | 238 | 0,098 |
Média | 61,58 | 57,39 | |
Mediana | 70,00 | 64,00 | |
Desvio padrão | 24,84 | 25,77 | |
Mínimo | 0,00 | 0,00 | |
Máximo | 94,00 | 92,00 | |
Total - escore padrão | |||
n | 175 | 238 | 0,386 |
Média | 6,27 | 6,00 | |
Mediana | 6,00 | 6,00 | |
Desvio padrão | 3,00 | 3,11 | |
Mínimo | 0,00 | 0,00 | |
Máximo | 13,00 | 13,00 |
*Dados estatisticamente significantes
Não houve diferença significativa entre os grupos em relação a nenhum dos itens (p>0,05), quanto ao escore holístico.
Pelos resultados quanto ao escore do número de palavras (Tabela 2), pôde-se observar que houve diferença significativa entre os grupos em relação ao item "No parquinho", em que as palavras-alvo foram "casa" e "antes" (item 3) e ao item "Brincando de esconde-esconde", em que as palavras-alvo foram "atrás" e "esconder" (item 6) (p<0,05), evidenciando que:
Tabela 2 Teste de Competência de Linguagem do subteste 3: itens relacionados ao número de palavras
Grupo | Valor de p | ||||
---|---|---|---|---|---|
Peso normal | Baixo peso | ||||
n | % | n | % | ||
Item 3 (número de palavras) | |||||
0 | 29 | 17,2 | 44 | 19,2 | 0,016* |
1 | 24 | 14,2 | 57 | 24,9 | |
3 | 116 | 68,6 | 128 | 55,9 | |
Item 6 (número de palavras) | |||||
0 | 14 | 8,4 | 48 | 21,4 | 0,001* |
1 | 63 | 38,0 | 88 | 39,3 | |
3 | 89 | 53,6 | 88 | 39,3 |
*Dados estatisticamente significantes
Em relação ao item "No parquinho", há um maior percentual de crianças com pontuação 3, ou seja, com a pontuação máxima no GC do que no GP.
Em relação ao item "Brincando de esconde-esconde", há um maior percentual de crianças com pontuação 3, ou seja, com a pontuação máxima no GC do que no GP.
Os coeficientes significativos estão destacados em asterisco nas tabelas. A seguir, serão apresentados os modelos ajustados, que apresentaram um valor de R2 alto, indicando boa qualidade de ajuste dos modelos em cada situação.
O modelo final se apresentou bem ajustado (p<0,05) e com alto R2 e sua interpretação encontra-se a seguir (Tabela 3):
Tabela 3 Análise considerando a informação de peso no modelo
β | Valor de p | |
---|---|---|
Sexo (masculino) | 0,154 | 0,662 |
Idade da criança (anos) | 0,063 | 0,496 |
Idade da mãe (anos) | 0,072 | 0,001* |
Escolaridade da mãe | 0,439 | <0,001* |
Peso da criança ao nascer | 0,795 | 0,002* |
*Dados estatisticamente significantes; valor de p do modelo <0,001; R2=0,792
A cada um ano aumentado da idade da mãe, fixando as demais variáveis do modelo (indivíduos com as demais características idênticas), aumenta em 0,072 a pontuação padrão do teste.
A cada um ano aumentado da escolaridade da mãe, fixando as demais variáveis do modelo (indivíduos com as demais características idênticas), aumenta em 0,439 a pontuação padrão do teste.
A cada quilograma aumentado do peso da criança ao nascer, fixando as demais variáveis do modelo (indivíduos com as demais características idênticas), aumenta em 0,795 a pontuação padrão do teste.
O modelo final se apresentou bem ajustado (p<0,05) e com alto R2 e segue a sua interpretação (Tabela 4):
Tabela 4 Análise considerando a informação de grupo no modelo
β | Valor de p | |
---|---|---|
Sexo (masculino) | 0,195 | 0,584 |
Idade da criança (anos) | 0,196 | 0,017* |
Idade da mãe (anos) | 0,086 | <0,001* |
Escolaridade da mãe | 0,503 | <0,001* |
Grupo (peso normal) | 0,368 | 0,333 |
*Dados estatisticamente significantes; valor de p do modelo <0,001; R2=0,789
A cada um ano aumentado da idade da criança, fixando as demais variáveis do modelo (indivíduos com as demais características idênticas), aumenta em 0,196 a pontuação padrão do teste.
A cada um ano aumentado da idade da mãe, fixando as demais variáveis do modelo (indivíduos com as demais características idênticas), aumenta em 0,086 a pontuação padrão do teste.
A cada um ano aumentado da escolaridade da mãe, fixando as demais variáveis do modelo (indivíduos com as demais características idênticas), aumenta em 0,503 a pontuação padrão do teste.
Não houve diferenças na comparação do escore holístico entre os grupos, ou seja, não houve diferenças na pontuação quanto à análise qualitativa da frase, que classifica se a criança realiza uma sentença ou não e, ainda, se a frase está sintaticamente correta. Isso aponta para uma produção similar do GP em relação ao GC, segundo os critérios propostos por autores( 19 ). Entretanto, quando considerada a pontuação quanto ao número de palavras (Tabela 2), houve um maior percentual de crianças com pontuação máxima no GC.
A literatura já tem demonstrado a relação entre o número de palavras no vocabulário, a fluência verbal e o acesso lexical com a morfossintaxe, estando ela relacionada a aspectos semânticos( 21 - 25 ), o que direciona à ideia de que a competência lexical está relacionada com a capacidade do falante em decidir sobre a gramaticalidade das palavras, assim como sua correta inserção em determinado contexto( 21 ).
Nos itens em que houve diferença ("No parquinho" e "Brincando de esconde-esconde"), as palavras-alvo utilizadas foram "antes" e "atrás", respectivamente, preposições com sentido de temporalidade e de local, com funções de advérbios. Os advérbios teriam uma maior complexidade por serem de classe aberta, mais heterogênea e de maior mobilidade na frase. Já as preposições seriam de classe fechada, porém não menos complexas( 22 , 26 , 27 ). A morfossintaxe, portanto, estaria fortemente interligada a aspectos semânticos e a ordenação dos advérbios em uma dada sentença teria a influência de fatores sintáticos, semânticos e discursivos( 23 ).
Há que se considerar a dificuldade que essas crianças poderiam ter em associar palavras para a formação de sentenças. A palavra "casa" é comumente relacionada, por um falante da língua portuguesa, a palavras como "cama", "família", "quarto", "TV"( 24 ). A experiência com palavras criaria uma estrutura dinâmica na memória que envolveria representações de palavras e suas conexões com outras palavras( 24 ), diferentemente da proposta apresentada às crianças de nosso estudo, em que a palavra-alvo, "casa", estaria associada à palavra "antes".
A Tabela 1 demonstrou que as crianças nascidas com baixo peso utilizaram um menor número de palavras em suas sentenças do que as crianças com peso normal ao nascimento, ou seja, utilizaram com menor frequência as duas palavras solicitadas. Estudos demonstram que crianças nascidas com baixo peso apresentam alterações na fluência verbal, na memória de trabalho, alterações na linguagem expressiva, na comunicação verbal e não verbal, problemas de aprendizagem, função executiva pobre e problemas atencionais( 4 , 8 , 13 , 15 , 16 , 18 , 28 ). Essas habilidades têm impacto na construção de frases. As Funções Executivas estariam fortemente relacionadas às realizações acadêmicas e/ou ao funcionamento comportamental e talvez mostrassem uma explicação para os problemas que crianças nascidas prematuras e/ou com muito baixo peso apresentam nestes domínios( 15 ).
Segundo a literatura, por meio de medidas do vocabulário e da extensão média do enunciado de crianças entre 4 anos e 6 anos e 11 meses com Alteração Específica de Linguagem (AEL), foi possível observar que a ampliação do vocabulário expressivo esteve relacionada à ampliação do uso de sentenças mais extensas e ao uso de palavras de classe fechada, o que confirmou que para o desenvolvimento sintático é fundamental o processo de aquisição de palavras( 25 ). Isso poderia explicar a dificuldade com a classe fechada de palavras "antes" e "atrás", também observada nas crianças nascidas com baixo peso de nosso estudo (Tabela 2), sendo que a dificuldade poderia estar associada ao vocabulário, o que influenciaria na construção frasal e no número menor de palavras utilizadas nas sentenças quando comparadas às crianças com peso normal ao nascimento (Tabela 1).
Estudos demonstraram haver relação entre memória auditiva e vocabulário com leitura e consciência morfológica, com correlações fortes, positivas e significativas entre a consciência morfológica e a tarefa de memória auditiva( 29 ). Visto que crianças com baixo peso ao nascer poderiam apresentar alterações de memória de trabalho( 15 , 30 ) e alterações em habilidades auditivas( 30 ), isso poderia explicar o por quê de suas inabilidades na formulação de sentenças e a dificuldade em memorizar e utilizar as palavras-alvo pronunciadas pelo avaliador em suas frases, além da redução no número de palavras em suas frases, destacadas nas Tabelas 1 e 2.
Em nenhum dos modelos de regressão (Tabelas 3e 4) a variável sexo apresentou impacto sobre a pontuação padrão do teste de linguagem, o que vai de encontro à literatura, que tem demonstrado, uma diferenciação entre os gêneros em pontuações de testes que medem problemas totais e internalizantes, em sintomas atencionais, em medidas de desempenho mental e de linguagem( 9 , 13 , 14 ).
A Tabela 3 mostra que, quando se considerou o peso ao nascer como variável principal no modelo de regressão, as variáveis de proteção idade da mãe e escolaridade da mãe tiveram impacto positivo sobre a construção de frases, demonstrando que quanto maior a idade e a escolaridade da mãe, melhor o desempenho da criança na pontuação padrão do teste. Além disso, constatou-se que, quanto mais alto o peso ao nascer, melhor o desempenho na habilidade de construção de frases. Todas essas informações corroboram os dados da literatura. Um estudo realizado considerando prematuros nascidos de baixo peso demonstrou que a renda familiar e as condições de nascimento, a idade gestacional e o peso ao nascer, estavam relacionados à extensão frasal (número de palavras produzidas) da criança, tendo o grupo de baixo peso um pior desempenho. Os autores do estudo observaram que a escolaridade materna e a renda familiar tiveram diferenças entre o grupo termo e o pré-termo baixo peso, tendo este último uma renda familiar e escolaridade materna inferior( 12 ). Estudos que compararam crianças nascidas com baixo peso (BP) e crianças nascidas com peso normal demonstraram um processo de linguagem mais lento em crianças nascidas com BP, e o peso ao nascimento foi uma variável crítica para o desempenho nos testes de linguagem aplicado( 10 ).
Ainda sobre os resultados da Tabela 3, nosso estudo vai ao encontro da literatura quando se refere ao nível educacional materno relacionado ao tamanho do feto (que inclui o peso). Este fator também pode ser preditor do QI da criança de peso normal e de baixo peso ao nascer, que tem relação com medidas da linguagem e cognição( 11 ). A condição socioeconômica pode ser preditor de problemas de aprendizagem em crianças extremamente prematuras e com menos de 1.000 g ao nascimento( 30 ). A escolaridade materna, o modelo familiar e o grau socioeconômico são fatores influenciadores para crianças com peso moderadamente baixo ao nascimento do que para crianças com peso adequado ao nascimento, pois as crianças com baixo peso teriam uma maior propensão e risco para alterações cognitivas e de linguagem, como problemas de atenção, Autismo, Transtorno do Déficit de Atenção/Hiperatividade( 13 ).
Ao serem considerados os dois grupos (Baixo Peso e Peso Normal) como um único grupo no modelo de regressão linear (Tabela 4), verificou-se que quanto maior a idade da criança, a idade da mãe e a escolaridade da mãe, melhor o desempenho na construção de frases, o que também vai ao encontro da literatura, que demonstra que quanto maior a idade da criança e o nível educacional materno, melhor o desempenho na linguagem e nas habilidades atencionais( 14 ). Pesquisas têm demonstrado que o nível educacional materno pode ser um fator influenciador no QI e Quociente de Inteligência Verbal (QIV)( 11 ).
As crianças nascidas com baixo peso deste estudo utilizaram número menor de palavras, quando comparadas àquelas com peso adequado ao nascimento, para a construção de frases a partir de figuras e palavras apresentadas.
As crianças nascidas com baixo peso demonstraram dificuldade morfossintática em itens que apresentavam como alvo palavras abstratas e de maior complexidade.
A escolaridade e a idade da mãe tiveram impacto nos dois grupos, assim como a idade da criança, que se mostraram relacionadas ao desempenho do teste. Além disso, o peso ao nascer influenciou no desempenho em linguagem, demonstrando que quanto maior o peso ao nascimento, melhor o desempenho na linguagem.