versão impressa ISSN 1808-8694versão On-line ISSN 1808-8686
Braz. j. otorhinolaryngol. vol.82 no.6 São Paulo out./dez. 2016
http://dx.doi.org/10.1016/j.bjorl.2015.11.022
O termo neuropatia auditiva (NA) foi utilizado pela primeira vez em 1996, para definir um grupo de pessoas com sintomas auditivos que tinham em comum o funcionamento normal da cóclea, apesar de apresentarem alteração da função do nervo coclear. Além disso, apresentavam como característica clínica dificuldade de compreensão das palavras, principalmente em ambientes ruidosos, apesar de responder a estímulos sonoros em alguns casos.1 Atualmente, a denominação mais usual é neuropatia/dessincronia auditiva (NA/DA).
Os achados dos exames, em geral, refletem ausência ou grave alteração no potencial evocado auditivo de tronco encefálico (PEATE) quando as emissões otoacústicas (EOA) e/ou o microfonismo coclear (MC) estão preservados, indicando uma função desordenada do nervo auditivo, com função normal das células ciliadas (CC).1-4
Muitas vezes é difícil determinar exatamente o início da NA/DA, porém, a patologia pode ocorrer em todas as idades.4 Sua prevalência foi estimada em 11% em um grupo de 109 crianças deficientes auditivas que falharam na triagem auditiva neonatal (TAN) e no PEATE.5 Outro estudo refere uma prevalência semelhante de 8,44% de 379 crianças avaliadas com alteração do PEATE.4
O MC é um potencial gerado a partir das células ciliadas externas (CCE) e células ciliadas internas (CCI) da cóclea, e sua ausência é compatível com alteração na função dessas células.2,6 Ele é descrito ainda como uma atividade elétrica que antecede as sinapses das CC com o nervo auditivo e, por esse motivo, seu registro aparece antes da onda I no registro do PEATE e mantém sua latência mesmo quando a intensidade do estímulo é diminuída.5
Ainda não estão disponíveis dados relativos aos parâmetros do MC em indivíduos com audição normal ou com perdas auditivas. Entretanto, as gravações do MC atraíram novo interesse após a identificação da NA/DA,1 pois a relação entre a coclear e um estímulo acústico tem sido usada no diagnóstico diferencial de NA/DA, uma vez que a presença do MC serve como evidência de integridade das CCE.7
A literatura recomenda que os testes de função coclear, particularmente o MC, torne-se parte do protocolo da TAN (triagem auditiva neonatal) em todas as crianças com PEATE ausentes ou alterados, auxiliando no diagnóstico da NA/DA.5
O objetivo do estudo foi verificar, por meio de uma revisão integrativa, as características do microfonismo coclear na neuropatia/dessincronia auditiva.
O processo metodológico caracterizou o presente estudo em uma revisão integrativa, com o intuito de reunir dados de pesquisas que auxiliem na compreensão do tema de maneira sistemática e ordenada, aprofundando assim o conhecimento das características do microfonismo coclear na neuropatia/dessincronia auditiva.
A revisão integrativa foi orientada a partir de buscas eletrônicas nas plataformas PubMed e Bireme e nas seguintes bases de dados: MedLine, LILACS e SciELO - Regional. A busca dos dados foi iniciada e concluída no mês de julho de 2014. Foram selecionados para análise os estudos publicados nos idiomas inglês, espanhol ou português. Não houve restrição quanto ao ano de publicação, ou seja, foram analisados os estudos publicados até julho de 2014, sendo os artigos posteriormente selecionados por critérios de inclusão e exclusão.
A estratégia de busca realizada foi por meio do cruzamento dos descritores (DeCS e MeSH), assim como para os termos livres, que são aqueles não encontrados no DeCS e MeSH, mas que possuem relevância para a pesquisa. Os descritores utilizados para localização dos estudos foram Cochlear Microphonic e Cochlear Microphonic Potential, e os termos livres utilizados foram Auditory Neuropathy e Auditory Dyssynchrony.
A estratégia de busca foi direcionada mediante uma questão específica: "Quais são as características do microfonismo coclear na neuropatia/dessincronia auditiva?". Visando identificar os artigos pertinentes com a questão proposta, foi elaborada uma estratégia de busca, empregando os descritores em grupos com, no mínimo, duas palavras-chave. Os cruzamentos foram: Cochlear Microphonic / Auditory Neuropathy / Auditory Dyssynchrony / Cochlear Microphonic AND Auditory Neuropathy OR Auditory Dyssynchrony / Cochlear Microphonic Potential / Auditory Neuropathy / Auditory Dyssynchrony / Cochlear Microphonic Potential AND Auditory Neuropathy OR Auditory Dyssynchrony.
Foram incluídos os artigos com as seguintes características: ser artigo original, relato de caso ou revisão de literatura; ter como sujeitos de pesquisa indivíduos diagnosticados com neuropatia auditiva.
Foram excluídos os artigos que não descreviam os achados da avaliação audiológica nos indivíduos com NA/DA.
A pesquisa foi realizada de forma independente por dois pesquisadores, e os pontos de conflito foram discutidos em reuniões específicas. A partir da aplicação da estratégia de busca contendo os descritores definidos, a seleção dos artigos encontrados foi realizada em três etapas:
Identificação e leitura dos títulos nas diferentes bases eletrônicas de dados. Foram excluídos aqueles que claramente não se enquadravam em qualquer um dos critérios de inclusão deste estudo.
Leitura dos resumos dos estudos selecionados na primeira etapa. Da mesma forma, foram excluídos aqueles que claramente não se adequavam a qualquer um dos critérios de inclusão preestabelecidos.
Todos os estudos não excluídos nessas duas primeiras etapas foram lidos na íntegra para seleção dos que seriam incluídos nesta revisão.
Todos os estudos utilizados atenderam aos critérios de inclusão definidos no início do protocolo metodológico do presente estudo, no sentido de responderem à pergunta que norteou esta revisão integrativa. Os principais dados de cada artigo foram detalhadamente coletados e inseridos em um banco de dados no programa Microsoft Office Excel 2011.
Para uma melhor apresentação dos resultados, optou-se por considerar as seguintes variáveis dos artigos selecionados: autor, ano/local, tipo de estudo, grau de recomendação/nível de evidência científica, objetivo, amostra, faixa etária, média de idade em anos, testes realizados, resultados e conclusão.
Quanto ao nível de evidência científica, foi utilizada a Classificação de Oxford Centre for Evidence-Based Medicine.8
De acordo com os cruzamentos realizados, nas buscas eletrônicas foi encontrado um total de 1.959 artigos. Seguindo os critérios de exclusão e inclusão definidos no método e subtraídas as referências repetidas constantes em mais de uma base de dados, foi selecionado um total de 14 artigos.
Na base de dados MedLine, via PubMed, cruzando-se as palavras-chave e os termos livres, foram encontrados 1.959 artigos, dos quais 1.913 trabalhos foram excluídos pelo título, 44 resumos foram lidos e 25 artigos foram selecionados para leitura na íntegra. Destes 25, dois eram repetidos e nove foram excluídos. Nas bases de dados LILACS e MedLine via Bireme não foram encontrados artigos para essa busca. Já na base de dados SciELO, foram encontrados dois artigos: um foi excluído pelo título e o outro pela leitura na íntegra.
O fluxograma apresentado na figura 1 mostra uma síntese do processo de obtenção dos artigos selecionados para a revisão integrativa.
A tabela 1 é uma síntese com as características dos estudos incluídos na revisão integrativa.
Tabela 1 Síntese com características dos estudos incluídos na revisão
Autor | Ano/local | Tipo de estudo | Grau de recomendação/ Nível de evidência científica | Objetivo | Amostra | Faixa etária em anos | Média de idade em anos | Testes | Resultados | Conclusão |
---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|
Deltenre et al. | 1997/ Bélgica | Estudo de caso | C/4 | Descrever uma nova forma de disfunção auditiva caracterizada por PE ATE ausentes,com evidência de função das células ciliadas externas da cóclea, do potencial microfónico coclear e EOA preservadas | 3 | 0 a 4 meses | Não foi referido | PEATE (clipado), EOA, imitanciometria | EOA presente, PEATE ausente com presença do MC, audição residual em um dos casos na Audiometria Comportamental, timpanogramas normais e reflexos acústicos contra laterais presentes | As EOAe o PEATE sozinhos podem indicar uma situação incomum, porém a constatação só ocorre com a gravação do MC. 0 reconhecimento do potencial microfónico isolado a partir de gravações de rotina facilitada pelo uso da inversão das polaridades pode ser valioso para a avaliação neurofisiológica da audição periferia e por isso é altamente recomendável |
Santarelli e Arslan | 2002/Itália | Estudo de caso | C/4 | Descrever os achados obtidos na Ecog em cinco pacientes, um adulto e quatro crianças, com PEATE ausentes e presença de EOAPD | 5 | 3 meses a 19 anos | Não foi referido | EcogT, PEATE clique EOAPD, imitanciometria, audiometria comportamental, audiometria vocal | Em alguns casos a EcogT foi a única ferramenta de diagnóstico confiável para detectar uma lesão periférica como a disfunção do gerador de tronco cerebral | A EcogT na NA fornece uma avaliação confiável da função periférica auditiva. Possibilitando algumas hipóteses sobre o local da lesão |
Rapin e Gravel | 2003/USA | Revisão da literatura | D5 | Identificar um termo adequedo para patologias que afetam a via auditiva central no tronco cerebral e no cérebro de forma seletiva | Não se aplica | Não se aplica | Não se aplica | Não se aplica | A neuropatia auditiva pura é rara, em muitos casos, tanto o 8º nervo e a via auditiva central ou, em alguns casos, CC contribuem para o atípico déficit auditivo e compreensão da fala | O termo NA não é indicado para casos em que a predominância de patologia é no tronco cerebral e deve ser reservado para pacientes em com evidências de que a patologia envolve as células do gânglio espiral ou seus axônios |
Berlin et al. | 2003/USA | Revisão da literatura | D5 | Estudo do diagnóstico e gerenciamento da NA | Não se aplica | Não se aplica | Não se aplica | Não se aplica | últimos 20 anos mostram que, embora a avaliação eletroacústica possa oferecer bons diagnóstico, estas respostas são produtos de um complexo processo fisiológico e não são necessariamente os verdadeiros indicadores de percepção | As tentativas para caracterizar vários aspectos do perfil da NA tem demonstrado que os resultados apresentam um padrão fisiológico comum, devido aos diferentes processos patológicos ou diferente graus de acometimento |
Rance | 2005/Austrália | Revisão da literatura | D5 | Estudar os mecanismos da NA, tipo de disfunção, perfil clínico dos pacientes e principalmente as consequências da percepção de NA, que são bastante diferentes daquelas associadas com PASN | Não se aplica | Não se aplica | Não se aplica | Otoscopia, EcogT, PEATE clique, EOAPD, imitanciometria | Os resultados mostram que em todos pacientes a amplitude e o limiar MC são criticamente dependente do limiar PAC, mostrando uma relação do MC tanto com as CCE quanto com as CCI | A presença de uma patologia do SNC parece melhorar amplitude do MC. Em alguns casos o desaparecimento ao longo do tempo da EOAPD sugere que as alterações na amplitude e duração do MC em pacientes com NA, resultam de uma combinação de perda das CCE e alteração do sistema eferente |
Santarelli et al. | 2006/Itália | Transversal observacional | C4 | Avaliar a amplitude do MC e os limiares auditivos de orelhas normais e de orelhas com variados graus de elevação na gravação do potencial de ação e comparar com os valores correspondentes em um grupo de pacientes com NA | 522 | 7 meses a 47 anos | 3,1 anos | Audiometria tonal e vocal, imitanciometria, EOA e PEATE | A amplitude MC foi significativamente maior nos pacientes com patologia do SNC que nos com audição normal. Respostas do MC foram detectados em todos auditivo pacientes com NA, com amplitudes e limites semelhantes aos calculados por ouvintes normais. A duração do MC foi significativamente maior no grupo com NA | é uma característica distintiva de NA; 2. Pacientes com patologia do SNC apresentaram aumento em amplitude e duração do MC, possivelmente devido à disfunção do sistema eferente; 3. A duração, alta frequência e amplitude do MC foram semelhantes nos pacientes ouvintes normais e com NA. Isto pode resultar de uma combinação variável do tipo de lesão do sistema eferente e perda de CCE |
Anastasio et al. | 2008/Brasil | Relato de caso | D5 | Demonstrar a aplicabilidade clínica da Ecog-ET no diagnóstico diferencial da NA quando comparada ao PEATE | 1 | 4 anos | Não de aplica | EOA, PEATE click, PEATE 0,5 e 1 KHz tom pip e exame de imagem | Uma criança com 4 anos de idade, com diagnóstico de NA realizou a Ecog-ET com tone burst de 2000Hz nas polaridades de rarefação e condensação | A Ecog-ET permitiu uma análise mais detalhada do MC quando comparada ao PEATE tendo, portanto aplicabilidade clínica na investigação da função coclear na NA |
Ahmmed et al. | 2008/Reino Unido | Relato de caso | C4 | Estudar o dilema de diagnóstico em torno da presença de CM juntamente com elevação significativa dos limiares no PEATE em bebês que falham na TAN | 1 | 6 semanas | Não se aplica | EOAT, Ecog, PEATE, por clique, por VO e toneburst (500; 1000 e 2000 Hz) | PASN diagnosticada através de história clínica e familiar, exame físico e de imagem que mostrou aquedutos vestibulares alargados. Presença de MC na presença de limiares muito altos no PEATE clique e a obtenção dos limiares para e no PEATE por tom pip 0,5 kHz pode não ser adequado para diferenciar entre PASN e outros condições associadas com NA | Há uma necessidade de revisão no protocolo de TAN/ NA existente no Reino Unido e uma nova pesquisa para estabelecer parâmetros para auxiliar no diagnóstico diferencial do MC. Uma abordagem audiológica e médica holística é essencial para gerenciar os bebês que falham na TAN |
Riazi e Ferraro | 2008/USA | Relato de casos | C4 | Avaliar técnicas que podem otimizar a gravação do MC em seres humanos por meio de uma variedade de parâmetros de estímulo e condições de blindagem que visam inibir / reduzindo artefato que pode contaminar o CM | 11 | 7 crianças e 4 adultos | Não refere | EOAT, Ecog, PEATE, por clique e toneburst (500, 1000 e 2000 Hz) | Os resultados sugerem que é mais fácil separar o MC do artefato de estímulo usando um eletrodo no Canal Auditivo e estímulos toneburst . Além disso, a blindagem eletromagnética e aterramento dos cabos de força e o transdutor acústico foram eficazes na redução e/ou eliminação artefato de estímulo | Os resultados deste estudo normativo podem ajudar a melhorar o diagnóstico do MC em NA e outros distúrbios relacionados com a audição |
Talaat et al. | 2009/Egito | Estudo de prevalência | B2B | Detectar a prevalência da NA entre crianças e jovens com perda de auditiva de grau severo a profundo | 112 | 6-32 meses | 19 meses | Audiometria comportamental ou de reforço visual, PEATE por clique e toneburst (500 Hz), Imitanciometria | 15 pacientes foram diagnosticados de acordo com nossos critérios para o diagnóstico | A prevalência de NA no grupo de estudo foi de 13,4%. Recomendamos o registro do MC para serem testados rotineiramente durante a avaliação do PEATE sempre que os resultados obtidos forem alterados |
Mo et al. | 2010/China | Transversal observacional | C4 | Descrever os achados audiológicos da NA | 48 | 6-58 meses | Não foi referido | Audiometria comportamental, EOAPD, PEATE por clique e imitanciometria | Havia 40 crianças com um perfil de NA bilateral e 8 casos unilaterais, nas orelhas contralaterais desses casos, havia 3 orelhas com limiares no PEATE melhor do que 30 dB NHL, o que indica a função auditiva normal, e 5 com PEATE ausente ou severamente alterado. Além disso, 4 crianças foram diagnosticadas como Deficiencia do Nervo Auditivo após mais investigação usando ressonância magnética ouvido interno | Os resultados audiológicos neste grupo de crianças apresentam variabilidade em relação aos limiares do PEATE e a morfologia das ondas, os limiares comportamentais e presença de MC e EOAPD. Isso pode refletir a natureza heterogênea da NA. Além disso, as patologias concomitantes do ouvido interno ou distúrbio no ouvido médio pode revelar NA. PEATE ausente ou severamente alterado juntamente com presença MC são as medidas mais confiáveis para detectar NA |
Shi et al. | 2012/China | Transversal observacional | C4 | Investigar as características e significado clínico do MC no diagnóstico de NA entre lactentes e crianças | 36 | 3 meses a 9 anos | 3 anos | Audiometria comportamental, EOAPD, PEATE por clique e imitanciometriaAudiometria comportamental, EOAPD, PEATE por clique e imitanciometria | Não houve diferença significativa na duração ou amplitude do MC entre o grupo com NA o grupo de ouvintes normais. Porém as amplitudes do MC com NA e EOAPD ausentes foram significativamente menores que nos ouvintes normais | O MC pode é muito importante no diagnóstico de NA. As amplitudes máximas do MC foram sempre encontrados em torno de 0,6 ms. É mais útil para o diagnóstico da NA a análise dos padrões de amplitudes do MC e das funções das CCE e CCI juntas |
Liu et al. | 2012/China | Retrospectivo de coorte transversal | C4 | Explorar possível correlação entre a deficiência do nervo coclear NA unilateral | 85 | 2-23 anos | Não foi referido no | Audiometria tonal, EOAPD, EOAT, PEATE por clique e imitanciometria | Oito casos foram diagnosticados com NA unilateral causada por deficiência do nervo coclear. 7 tiveram timpanograma tipo "A" com EOA normal bilateral, o ultimo tinha timpanograma unilateral tipo "B", EOA ausente e MC presente, de acordo com alteração da orelha média. PEATE ausentes em todos os pacientes e as respostas neuronais a partir da cóclea não foram revelados quando vistas por meio de ressonância magnética do canal auditivo interno | A deficiência do nervo coclear pode ser vista pela evidência eletrofisiológica e pode ser um importante causa de NA unilateral. A ressonância magnética do canal auditivo interno é recomendado para o diagnóstico desta doença |
Penido e Issac | 2013/Brasil | Estudo de Coorte | C4 | Determinar a prevalência da NA em sujeitos com PASN | 2292 | 0-95 anos | Não foi referido | Audiometria tonal e vocal; imitanciometria; EOA; PEATE e do MC | 1,2% apresentaram NA. Desses 29,6% tinham PANS leve; 55,5% moderada; 7,4% grave e 7,5% profunda. 14,8% estavam entre 0 e 20 anos, 33,4% entre 21 e 40 anos, 44,4% entre 41 e 60 anos e 7,4% acima de 60 anos | A prevalência da NA foi de 1,2% em sujeitos com PASN |
PEATE, potencial evocado auditivo de tronco encefálico; EOA, emissões otoacústicas; EOAT, emissões otoacústicas transientes; EOAPD, emissões otoacústicas produto de distorção; MC, microfonismo coclear; NA, neuropatia auditiva; DA, dessincronia auditiva; TAN, triagem auditiva neonatal; Ecog, eletrococleografia; EcogT, eletrococleografia timpânica; EcogET, eletrococleografia extratimpânica; PASN, perda auditiva sensorioneural; CCE, células ciliadas externas; CCI, células ciliadas internas; PAC, potencial de ação composto.
Em virtude do crescimento recente de estudos na área de NA, destacam-se nesta revisão pesquisas entre os anos de 1996 e 2014. Todos os artigos selecionados relacionam a NA com o registro do MC, por meio de dois testes específicos, o PEATE e a Ecog, utilizando-se métodos invasivo ou não invasivo, além de outros testes que avaliam a função auditiva.
Houve maior investimento em pesquisas nessa área no final da década de 90, quando a NA foi descrita.1 Desde então os estudos buscam explicar o que ocorre na NA, a localização da lesão, os fatores de risco, a prevalência e os testes diagnósticos mais precisos.
Com relação à localização, a literatura aponta uma ampla possibilidade, uma vez que a lesão pode ocorrer em diversas estruturas ou em mais de uma ao mesmo tempo, como nas CCI, nas fibras do nervo auditivo ou nas suas sinapses.9 Outro estudo sugere que há uma anormalidade no sistema auditivo localizada no VIII nervo, nos neurônios ganglionares, nas CCI, entre as suas sinapses ou de uma combinação entre eles.1
Os fatores de risco estão em geral ligados a problemas neonatais, como prematuridade, baixo peso, anóxia, hipóxia, hiperbilirrubinemia, necessidade de ventilação mecânica e hemorragia intracraniana,10 além de desordens genéticas e mitocondriais11 e de história familiar positiva para problemas auditivos.3,12
De acordo com os estudos apresentados nesta revisão, a prevalência de NA entre crianças e jovens com perda de auditiva de grau severo a profundo foi de 13,49 e de 1,2% em indivíduos com PANS.13 A prevalência também foi descrita, em crianças com critérios de risco para NA, como sendo de 1 em 433 (0,23%), e no grupo de crianças com déficit de audição permanente foi de 1 em 9 (11,01%).5 Outro estudo refere a prevalência de 8,44% em um grupo de 379 crianças com alteração do PEATE.4
Há uma concordância na literatura compulsada em relação aos achados de exames em pacientes com neuropatia que apresentam EOA e MC presentes, PEATE ausente ou muito alterado e reflexos acústicos ausentes.9,10,12-23 Na audiometria, o padrão descrito é perda auditiva permanente ou flutuante de vários graus, com configuração plana ou ascendente,12,17 além de dificuldade de percepção de fala, principalmente com ruído.9,10,12,14-17,22,23 As EOA estão presentes, entretanto podem desaparecer com o decorrer dos anos.16 Os resultados de exames eletrofisiológicos objetivos como presença de EOAT, PEATE ausente ou muito alterado e presença do MC têm surgido como primeira ferramenta de diagnóstico para NA em lactentes.4,24 Além disso, os pacientes com NA possuem uma alteração do efeito supressor das EOA provocado pelas vias auditivas eferentes.25 A ausência da supressão das EOA sugere que a função olivococlear eferente está alterada.24
Diante do verificado nos exames da função auditiva, a presença do MC passa a ser o achado determinante no diagnóstico diferencial da NA.16
O protocolo utilizado para registrar o MC por meio da Ecog ou do PEATE deve sempre optar pela inversão das polaridades, usadas para confirmação da inversão do registro e, portanto, da confirmação do MC.13,16,17,19,22 Além disso, a utilização de fones de inserção é importante para possibilitar o bloqueio do tubo plástico, imprescindível para a confirmação da resposta biológica, descartando a presença de artefato elétrico do sinal.13,17,20 Os fones de inserção devem ser sempre usados no PEATE para permitir os que artefatos de estímulo sejam separados dos potenciais cocleares.2 Outro estudo também confirmou a resposta do MC fechando o tubo de estímulo para evitar o sinal acústico de atingir o canal auditivo, abolindo os artefatos.5
Alguns estudos referem o uso da Ecog como teste de diagnóstico da NA. Porém, há relatos de que a eletrococleografia transtimpânica (EcogT) é a ferramenta padrão ouro para avaliar o MC,9,16,17 pois a Ecog permite uma análise mais detalhada da função coclear em relação ao PEATE.9,17 Entretanto, as gravações no promontório são consideradas mais sensíveis do que no canal auditivo, e isso resulta numa melhor relação sinal-ruído, pois o MC surge em primeiro lugar a partir das porções mais basais da cóclea, com uma contribuição insignificante das regiões apicais.7
Em um dos estudos revisados não foi encontrada diferença significante entre a amplitude do MC em ouvintes normais e em indivíduos com NA. As amplitudes máximas de MC para quase todos os pacientes foram em torno de 0,6 ms após o estímulo.13 A literatura refere que o MC em indivíduos com NA são especialmente proeminentes e persistem vários milissegundos após um estímulo transiente.2,24 Outro estudo relatou média das amplitudes do MC de 0,4 ms em pacientes com NA, valores significantemente maiores do que aqueles em pessoas com audição normal.24
A duração do MC foi maior no grupo com NA que no grupo de ouvintes normais.13,16 Em pacientes com NA no PEATE o MC aparece amplo, podendo durar até 4-6 ms, podendo ser confundido com atividade elétrica do tronco cerebral, porém não sofre alteração com a diminuição da intensidade, mas sim com a inversão da polaridade do estímulo.25
De maneira geral, a literatura compulsada concorda quanto a localização, fatores de risco e achados clínicos da NA e refere que seu diagnóstico diferencial é confirmado a partir do registro do MC, pois mesmo em estado avançado da NA o MC permanece presente.
Nesta revisão foram encontrados estudos que descrevem os exames mais utilizados para detalhar as características do microfonismo coclear na neuropatia/dessincronia auditiva. Para tanto, vários tipos de estudos foram selecionados, o que pode parecer uma limitação, porém, por outro lado, pode apresentar diferentes perspectivas sobre o tema, levando sempre em consideração os critérios de seleção previamente definidos.
A partir dos estudos incluídos nesta revisão de literatura, é possível concluir que:
A presença do MC é um achado determinante no diagnóstico diferencial da NA.
O protocolo de registro do MC deve contar com o uso de fones de inserção, a inversão da polaridade e o bloqueio do tubo do estímulo para impedir a interferência de artefato elétrico.
A amplitude do MC na NA não apresenta diferença significante entre a amplitude do MC em ouvintes normais.
A duração do MC é maior em indivíduos com NA.