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EVLTraining®: aplicativo para treino do cálculo da densidade de energia endovenosa linear

EVLTraining®: aplicativo para treino do cálculo da densidade de energia endovenosa linear

Autores:

Alexandre Campos Moraes Amato,
Salvador José de Toledo Arruda Amato

ARTIGO ORIGINAL

Jornal Vascular Brasileiro

versão impressa ISSN 1677-5449versão On-line ISSN 1677-7301

J. vasc. bras. vol.15 no.2 Porto Alegre abr./jun. 2016

http://dx.doi.org/10.1590/1677-5449.000816

INTRODUÇÃO

O reconhecimento da termoablação endovenosa como tratamento da insuficiência de veias safenas1 traz a necessidade de maior conhecimento e compreensão do método. Diferentemente da radiofrequência, que possui poucas variáveis de configuração do aparelho e cujo método é mais facilmente reprodutível, a termoablação endovenosa por laser requer o conhecimento do comprimento de onda, potência, energia, irradiância, fluência, tempo e distância, tanto para a escolha do equipamento apropriado como para a realização do procedimento de forma segura. O tipo de fibra ótica utilizada também influencia a quantidade de energia aplicada no tecido biológico. São conceitos da física transpostos para a medicina que necessitam ser amplamente elucidados. A densidade de energia endovenosa linear (linear endovenous energy density – LEED) é a variável mais aceita para padronização, cada vez mais amplamente divulgada. Não deve ser utilizada apenas na comparação de resultados científicos, mas também no intraoperatório para a realização do procedimento com segurança. Para aplicar a LEED, é necessário compreender a física e a matemática usadas na fórmula. Além disso, diferentemente do que se acredita, não é necessário fazer aproximações grosseiras ou técnicas matemáticas mentais difíceis, podendo ser facilmente calculada em tempo real.

Devido às diferenças entre os aparelhos disponíveis para a cirurgia de laser, com apresentação de dados diferentes, a padronização se faz necessária para aplicação da energia pretendida e comparação.

O endolaser venoso possui uma curva de aprendizado maior que outras técnicas exatamente devido à grande quantidade de variáveis que influenciam o resultado final. As múltiplas variáveis também dificultam a comparação entre trabalhos científicos. A alta variedade de equipamentos disponíveis, com grande variação nas informações apresentadas, pode confundir o cirurgião novato, que não saberá qual informação é mais importante para o melhor resultado final.

O treinamento prévio com modelos reais2 e virtuais tem se mostrado eficaz na simulação de procedimentos médicos com intuito educativo, e pode ser eficaz também na padronização da técnica.

Visamos elucidar o uso da LEED como treinamento para adquirir a competência necessária para realizar uma termoablação com êxito.

MÉTODO

O aplicativo para iOS EVLTraining® (Amato, São Paulo, Brasil)3 foi desenvolvido em Objective-C para equipamentos portáteis com o intuito de padronizar a emissão energética em procedimentos de termoablação endovenosa. Entre os diversos parâmetros utilizados para mensuração da energia aplicada e também utilizados em trabalhos científicos, a LEED foi escolhida como padrão no software porque se mostrou adequadamente reprodutível. O método requer estratégia de uso e manipulação do laser, e possui elevada curva de aprendizado. A fixação de parâmetros, com alteração apenas da velocidade de tração, é o método mais reprodutível, porém requer treino e destreza. O aplicativo desenvolvido apresenta um meio virtual de cálculo da LEED, com livre escolha dos parâmetros utilizados, e permite o treino da velocidade de tração da fibra.

Para o teste do software, o equipamento iPhone® (Apple, Cupertino, Estados Unidos) foi envolto em plástico estéril e utilizado com o EVLTraining® no intraoperatório de termoablação endovenosa de safena. Ao tracionar a fibra ótica com o primeiro e o segundo dedos da mão dominante, estes deslizavam tocando sobre a tela capacitiva do celular, permitindo o cálculo em tempo real dos parâmetros aplicados. O procedimento cirúrgico foi gravado em vídeo para posterior análise. Os parâmetros evidenciados no software (Figura 1) foram comparados com os apresentados pelo equipamento de laser (energia parcial), relógio (tempo) e distância (fibra centimetrada).

Figura 1 Janela principal do aplicativo EVLTraining® evidencia as variáveis controladas. A mesma tela é responsável pela medida pelo toque. 

RESULTADOS

O aplicativo criado mostrou equivalência com as medidas aplicadas no procedimento cirúrgico. A velocidade de tração e a LEED comparadas posteriormente em vídeo foram equivalentes às do procedimento cirúrgico.

DISCUSSÃO

O comprimento de onda é a distância entre valores repetidos sucessivos em um padrão de onda. No caso do laser, o comprimento de onda é determinado pela vibração térmica dos átomos, pela presença de impurezas no material que emite a luz, pela forma de energizá-lo e pelo sistema ótico aplicado. Normalmente, é um valor fixo, embora possa ser alterado com filtros específicos. Portanto, é determinado no momento da aquisição do equipamento de laser. Cada comprimento de onda apresenta um diferente cromóforo, ou seja, um tecido alvo de maior absorção4.

A energia é uma magnitude abstrata que está ligada ao estado dinâmico de um sistema fechado e que permanece invariável com o tempo. A energia térmica é, no fundo, energia cinética. Não se deve confundir energia térmica e temperatura, e também não se deve pensar que a temperatura é uma medida direta da energia térmica de um sistema. A energia térmica é medida em joules (J) no Sistema Internacional de Unidades (SI). Um joule compreende a quantidade de energia correspondente à aplicação de uma força de um newton durante um percurso de um metro. Ou seja, é a energia que acelera uma massa de 1 kg a 1 m/s2 em um espaço de 1 m5. 1J = 1kg x m2/s2. A energia é resultante da potência multiplicada pelo tempo de disparo (J=W*s), ou seja, o controle único da energia permite o controle de duas variáveis: tempo e potência4.

A potência é a grandeza que determina a quantidade de energia concedida por uma fonte a cada unidade de tempo. Em outros termos, potência é a rapidez com que uma certa quantidade de energia é transformada, ou é a rapidez com que o trabalho é realizado. Também pode ser entendida como a força multiplicada pela velocidade. O watt (W) é a unidade de potência do SI. É equivalente a um joule por segundo (1 J/s)4,5.

Portanto, a LEED consiste em potência x tempo / distância, ou W x s / cm. A medida da LEED, apesar de não ser perfeita, compreende quatro variáveis importantes para o laser: a potência, o tempo, a distância e, consequentemente, a energia. Sendo o comprimento de onda fixo, já são cinco variáveis controladas no procedimento. Com apenas uma variável, torna-se factível o controle intraoperatório em tempo real de cinco características importantes do laser.

A irradiância é sinônimo de densidade de potência, que é definida como a potência ótica útil do laser, expressa em W, dividida pela área irradiada, expressa em centímetros quadrados (cm2).

A fluência é o termo utilizado para a taxa de energia que está sendo aplicada ao tecido. Ao multiplicar a irradiância pelo tempo de exposição (s), obtemos a fluência ou densidade de energia expressa em joules por centímetro quadrado (J/cm2)6. A fluência é mais utilizada como parâmetro para laser transdérmico por associar a área atingida pelo laser. O conceito de LEED é a variação da fluência, em que o denominador, em vez da área, é a distância linear, sendo então aplicável a regiões tubulares, como as veias. Obviamente, quando veias são mais dilatadas, a superfície da área interna cilíndrica é maior (Figura 2). Então, com a mesma LEED (que não considera a área), a densidade de energia aplicada ao tecido biológico é menor. Por isso, trabalhos recentes associam o diâmetro da veia a ser tratada com a LEED a ser aplicada7, aumentando conforme o aumento do diâmetro. Nesses casos, a fluência calculada com a área interna da veia seria a mesma: aumentando o denominador, que é a área, o nominador, que é a energia, deve aumentar para manter a fluência estável; mas ao utilizar a LEED como parâmetro, o aumento da área interna da veia não é contabilizado, sendo necessário compensar com o aumento da LEED aplicada.

Figura 2 Modelo 3D de (A) veia cilíndrica e (B) veia dilatada evidencia o aumento da área de superfície interna na dilatação venosa. 

Equipamentos mecânicos automatizados de tração permitem a fixação dos parâmetros e o cálculo prévio da energia que será aplicada ao paciente, mas apresenta desvantagens, como contaminação da fibra para reuso no mesmo procedimento e dificuldade de variação da LEED em veias com diâmetros diferentes.

Caso o equipamento de laser utilizado apresente ao usuário a variável energia parcial a cada disparo, considera-se que o aparelho esteja multiplicando o tempo do disparo (s) pela potência (W). Deve-se notar que o valor incrementa com o passar do tempo. Nesse caso, se for tracionado apenas um centímetro da fibra ótica, seguindo a fórmula apresentada, o denominador será 1 (um), a fórmula será facilmente calculável e o valor apresentado será equivalente à LEED. Disparos contínuos por distâncias maiores que um centímetro dificultam o cálculo mental da LEED, obrigando a observação da velocidade (cm/s).

O software EVLTraining® permite calcular velocidade de tração (cm/s), distância percorrida (cm), tempo (s), energia (J) e, consequentemente, a LEED (J/cm) para treinamento da equipe8. Quando o equipamento de laser utilizado não apresenta a energia parcial, ou quando a equipe não utiliza o método proposto de cálculo de LEED, é necessário realizar múltiplos cálculos mentais. Nesse caso, o treino prévio da velocidade de tração pelo cirurgião pode ser benéfico.

Entre as variáveis intraoperatórias, a potência (W), a energia (J) total, a energia parcial, o tempo (s) e a distância percorrida (cm) são as que exercem o controle sobre o procedimento.

A observação de todas as variáveis ao mesmo tempo dificulta o procedimento, aumentando desnecessariamente a complexidade.

CONCLUSÃO

O software EVLTraining® permite o treino prévio de cirurgião e equipe para a velocidade de tração da fibra ótica que será aplicada.

REFERÊNCIAS

1 Gloviczki P, Gloviczki ML. Guidelines for the management of varicose veins. Phlebology. 2012;27(Supl 1):2-9. . PMid:22312060.
2 Amato ACM, Freitas SL, Veloso PM, Correia TCV, Santos RV, Amato SJTA. Treinamento de punção ecoguiada em modelo de gelatina. J Vasc Bras. 2015;14(3):200-4. .
3 Amato SoftwareEVLTrainingsoftwareSão Paulo2012citado 2016 mar 15
4 van den Bos RR, Kockaert MA, Neumann HA, Nijsten T. Technical review of endovenous laser therapy for varicose veins. Eur J Vasc Endovasc Surg. 2008;35(1):88-95. . PMid:17920307.
5 Barrow GM. Físico-química. Rio de Janeiro: Reverté; 1982.
6 Proebstle TM, Krummenauer F, Gül D, Knop J. Nonocclusion and early reopening of the great saphenous vein after endovenous laser treatment is fluence dependent. Dermatol Surg. 2004;30(2):174-8. PMid:14756646.
7 Maurins U, Rabe E, Pannier F. Does laser power influence the results of endovenous laser ablation (EVLA) of incompetent saphenous veins with the 1 470-nm diode laser? A prospective randomized study comparing 15 and 25 W. Int Angiol. 2009;28(1):32-7. PMid:19190553.
8 Mueller RL, Bridget M, Mueller J. Digital metronomes and metric devices for venous ablation procedures. J Vasc Ultrasound. 2013;37:142-4.