versão On-line ISSN 1678-4464
Cad. Saúde Pública vol.33 supl.3 Rio de Janeiro 2017 Epub 21-Set-2017
http://dx.doi.org/10.1590/0102-311x00134915
El objetivo del estudio fue describir la tendencia de indicadores de tabaquismo en adultos dentro de las capitales brasileñas. Se utilizó una regresión lineal simple para analizar la tendencia del tabaquismo, según datos de la encuesta telefónica VIGITEL, entre 2006-2014. La prevalencia de fumadores en Brasil cayó 0,645p.p. por año durante el período, variando de un 15,6% (2006) a un 10,8% (2014). Hubo una reducción por sexo, escolaridad, grandes regiones, y en la mayoría de las franjas de edad. La prevalencia de ex-fumadores pasó de 22,2% (2006) a 21,2% (2014), el consumo de 20 cigarrillos o más al día de un 4,6% (2006) a un 3% (2014). Los fumadores pasivos en el domicilio se redujeron 0,614p.p. al año, desde 2009, siendo de un 9,4% en 2014. Los fumadores pasivos en el trabajo se redujeron un 0,54p.p. al año, llegando a un 8,9% en 2014. La tendencia de la prevalencia de fumadores esa la baja, para ambos sexos, los niveles de escolaridad y grandes regiones, en casi todas las franjas de edad. Esto apunta a que la meta global de reducción de un 30% del tabaquismo hasta 2025 tiene potencial para ser alcanzada, reflejando importantes acciones de control de ese factor de riesgo en el país.
Palabras-clave: Hábito de Fumar; Enfermedad Crónica; Contaminación por Humo de Tabaco; Encuestas Epidemiológicas; Vigilancia Epidemiológica
Os malefícios do tabagismo estão amplamente documentados em estudos globais e nacionais 1,2,3. O tabaco constitui o principal fator de risco para as doenças crônicas não transmissíveis (DCNT), que são responsáveis por 63% das mortes no mundo 1 e 72% no Brasil 4,5.
Dentre as doenças relacionadas ao tabagismo, citam-se câncer (pulmão, cavidade bucal, mama, outros), doenças respiratórias crônicas, restrição do crescimento intrauterino, predisposição a partos prematuros, dentre outros, com destaque para as doenças cardiovasculares 6. De forma geral, os riscos para a saúde decorrem tanto do consumo direto do tabaco como também da exposição ao fumo passivo 1,2,6,7.
A Organização Mundial da Saúde (OMS) aponta que, caso nenhuma medida de impacto seja tomada globalmente, as mortes relacionadas ao uso do tabaco projetadas para 2030 chegarão a 8 milhões, ou 10% do total das mortes globais 1,6.
Atualmente, a prevalência de tabaco no mundo é elevada e existem importantes variações entre suas regiões 8. No Brasil, a prevalência do fumo em 1989 era de 34,8% em adultos, tendo apresentado redução importante em pesquisas subsequentes 9,10. Em 2013, a Pesquisa Nacional de Saúde (PNS) apontou prevalência de 14,7% em relação ao tabaco fumado 11.
A redução desse indicador é um compromisso estabelecido pelo Brasil e pela OMS em seus planos lançados, respectivamente, em 2011 e 2013, que são: o Plano de Ações Estratégicas para o Enfrentamento das Doenças Crônicas Não Transmissíveis no Brasil, 2011 a 2022 9,12, e o Plano Global de Prevenção de DCNT (Global Action Plan for the Prevention and Control of NCDs) 13; este último estabelece como meta a redução da prevalência do tabaco no mundo em 30%, entre 2015 e 2025 12. A OMS tem instado os países a realizar o monitoramento do uso do tabaco, enquanto medida fundamental para apoiar políticas de controle e inverter a epidemia do tabaco.
O monitoramento dos produtos do tabaco é um compromisso assumido pelo Brasil, desde a aprovação em 2005 da Convenção-Quadro do Controle do Tabaco da OMS (CQCT-OMS), comprometendo-se a estabelecer progressivamente um sistema nacional para a vigilância epidemiológica do consumo do tabaco e de outros indicadores sociais, econômicos e de saúde. Assim, torna-se fundamental o monitoramento contínuo dos indicadores do tabaco, visando a apoiar as políticas públicas 3. Um bom sistema de vigilância deve acompanhar os indicadores do uso do tabaco, permitindo a implementação de políticas adequadas, a medição do impacto eficiente e, quando necessário, o ajuste das medidas 14.
Neste sentido, O Ministério da Saúde definiu como prioridade a organização da vigilância das DCNT e a implantação de inquéritos como: o Sistema de Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico (VIGITEL) 15, realizado anualmente desde 2006, com as 26 capitais dos estados brasileiros e Distrito Federal; e os inquéritos domiciliares a cada cinco anos, como a PNS 1 e a Pesquisa Nacional de Saúde dos Escolares, a cada três anos, dentre outros 9.
O estudo atual objetiva descrever a tendência de indicadores relacionados ao tabagismo nas capitais do Brasil e no Distrito Federal, entre 2006 a 2014, coletados por inquérito telefônico VIGITEL.
Foram analisadas informações sobre fatores de risco e proteção com base nos dados do VIGITEL, realizado anualmente, entre 2006 e 2014, por meio de entrevistas telefônicas junto à população adulta (≥ 18 anos de idade), residente nas capitais dos 26 estados brasileiros e no Distrito Federal.
O VIGITEL utiliza amostras probabilísticas da população adulta (≥ 18 anos) com base em cadastro das linhas de telefone fixo das cidades, disponibilizadas anualmente pelas principais operadoras de telefonia fixa no país. São sorteadas 5 mil linhas telefônicas de cada cidade, as quais são divididas em réplicas (ou subamostras) de 200 linhas cada uma, para identificação das linhas elegíveis, ou seja, linhas residenciais ativas. Após confirmada a elegibilidade da linha, é realizada a seleção do morador a ser entrevistado 15.
Foram atribuídos pesos de pós-estratificação para a obtenção de estimativas confiáveis para a população adulta com telefone em cada cidade, considerando as seguintes variáveis: sexo (feminino e masculino), faixa etária (18-24, 25-34, 35-44, 45-54, 55-64 e 65 e mais anos de idade) e grau de instrução (sem instrução ou fundamental incompleto, fundamental completo ou médio incompleto, médio completo ou superior incompleto e superior completo). Maiores detalhes metodológicos podem ser vistos em outras publicações 15,16.
A partir de 2012 o peso pós-estratificação de cada indivíduo da amostra VIGITEL foi calculado pelo método “rake” 16,17, utilizando rotina específica 17 do programa (SAS Inst., Cary, Estados Unidos). Esse método utiliza procedimentos iterativos que levam em conta sucessivas comparações entre estimativas da distribuição de cada variável sociodemográfica na amostra VIGITEL e na população total da cidade. Essas comparações culminam no encontro de pesos que, aplicados à amostra VIGITEL, igualam sua distribuição sociodemográfica à distribuição estimada para a população total da cidade.
O questionário do VIGITEL engloba aproximadamente 90 questões e abrange temas como características demográficas e socioeconômicas dos indivíduos; padrão de alimentação e atividade física; consumo de cigarro e de bebidas alcoólicas, dentre outros.
No estudo atual, foram realizadas análises de tendência temporal entre 2006 e 2014 para os indicadores referentes ao tabagismo: (1) fumantes: foi considerado fumante o indivíduo que respondeu positivamente à questão “O(a) senhor(a) fuma?”, independentemente do número de cigarros, da frequência e da duração do hábito de fumar; (2) ex-fumantes: foi considerado ex-fumante o indivíduo não fumante que respondeu positivamente à questão “O(a) sr(a) já fumou?”, independente do número de cigarros e da duração do hábito de fumar; (3) percentual de fumantes com consumo de 20 ou mais cigarros por dia: número de indivíduos que fumam 20 ou mais cigarros por dia, conforme resposta à questão: “Quantos cigarros o(a) sr(a) fuma por dia?”; a partir de 2009 foram introduzidas questões referentes ao fumo passivo e por isso a tendência aqui apresentada desses dois indicadores refere-se ao período de 2009-2014: (4) percentual de fumantes passivos no domicílio: número de indivíduos não fumantes que relatam que pelo menos um dos moradores do seu domicílio costuma fumar dentro de casa, conforme resposta à questão: “Alguma das pessoas que mora com o(a) Sr(a) costuma fumar dentro de casa?”; (5) percentual de fumantes passivos no local de trabalho: número de indivíduos não fumantes que relatam que pelo menos uma pessoa costuma fumar no seu ambiente de trabalho, conforme resposta à questão: “Algum colega do trabalho costuma fumar no mesmo ambiente onde o(a) Sr(a) trabalha?”. A base do denominador de todos os indicadores investigados é o total de indivíduos entrevistados.
A análise de tendência da série temporal dos indicadores do tabagismo foi estratificada segundo sexo, idade, escolaridade e região do país. A técnica utilizada para estimar a tendência foi o modelo de regressão linear simples, cuja variável resposta (Yi) é a proporção do indicador e a variável explicativa (Xi) é o tempo (ano do levantamento). O sinal negativo do coeficiente angular (β) da reta ajustada pelo modelo indica que a relação entre o indicador e o tempo é decrescente, caso contrário a relação é crescente. O valor do coeficiente angular positivo representa o aumento médio anual na proporção do indicador para cada unidade de tempo, caso contrário representa a queda média anual na proporção.
Foram apresentadas as proporções no período de 2006-2014, a tendência expressa pelo coeficiente angular da reta e o nível de significância da tendência. Medidas de adequação do modelo foram utilizadas, a análise de resíduo, com nível de significância de 5%. Para o processamento dos dados e análises estatísticas, utilizou-se o aplicativo Stata versão 11.1 (StataCorp LP, College Station, Estados Unidos). Foram empregados os comandos indicados para proporções levando em conta os fatores de ponderação atribuídos a cada indivíduo entrevistado nos inquéritos do VIGITEL 15.
Este estudo foi aprovado pela Comissão Nacional de Ética em Pesquisa em Seres Humanos (Conep), parecer nº 355.590. O consentimento livre e esclarecido foi substituído pelo consentimento verbal obtido por ocasião dos contatos telefônicos com os entrevistados.
No presente estudo, verificou-se diferença nas prevalências de tabagismo segundo sexo, idade, escolaridade e região. Apresentaram maiores prevalências ao longo do período homens, população com menor escolaridade, na faixa etária entre 45 a 54 anos, e residentes na Região Sul do país.
Na análise de tendência, a prevalência de fumantes no Brasil apresentou redução relativa de 0,645p.p. a cada ano do inquérito, variando de 15,6% em 2006 a 10,8% em 2014. No sexo masculino, a redução, no período entre 2006 e 2014, ocorreu a uma taxa média de 0,793p.p. ao ano, saindo de 19,3% (2006) e atingindo 12,8% (2014) e, em mulheres, a redução foi de 0,518p.p. ao ano, saindo de 12,4% (2006) e chegando a 9% (2014) (Tabela 1). O percentual de fumantes também reduziu de modo significativo em algumas faixas de idade, a maior redução ocorreu na faixa de 45-54 anos, alcançando 1,082p.p. ao ano; a menor aconteceu nos indivíduos com 65 anos e mais (-0,213p.p. ao ano) (Tabela 1).
Tabela 1 Tendências de percentual de fumantes, por sexo, faixa etária, escolaridade, Brasil e regiões. VIGITEL 2006-2014.
Nota: tendência (+) indica a existência de tendência de aumento significativo; tendência (-) indica a existência de tendência de diminuição significativa. O cálculo do valor de p é feito pela regressão linear. A inclinação representa a variação anual média, em pontos percentuais.
Houve também redução entre todas as faixas de escolaridade. Os mais escolarizados passaram de 10,9% de fumantes em 2006 para 6,8% em 2014, e entre os adultos com até 8 anos de estudo as prevalências também apresentaram declínio, embora os valores ainda sejam mais elevados, caindo de 19,1% (2006) para 14,1% (2014). Reduções significativas também foram encontradas em todas as regiões do país (Tabela 1).
A população total de ex-fumantes reduziu de 22,2% para 21,2%; em homens, o percentual de ex-fumantes caiu de 26,7% para 25,6%. Ainda houve aumento no percentual de ex-fumantes na faixa etária de 55 anos a 64 anos e entre os indivíduos com 0-8 anos de escolaridade, passando de 27,9% para 30,2%. A redução na população de ex-fumantes também foi constatada na Região Nordeste (Tabela 2).
Tabela 2 Tendências de percentual de ex-fumantes, por sexo, faixa etária, escolaridade, Brasil e regiões. VIGITEL 2006-2014.
Nota: tendência (+) indica a existência de tendência de aumento significativo; tendência (-) indica a existência de tendência de diminuição significativa. O cálculo do valor de p é feito pela regressão linear. A inclinação representa a variação anual média, em pontos percentuais.
A prevalência de adultos que referem fumar 20 cigarros ou mais por dia reduziu de 4,6% (2006) para 3% (2014), com redução de 0,195p.p. ao ano. Observou-se diminuição em ambos os sexos, mas ela foi mais acentuada entre homens. Também se deu redução nas faixas etárias de 18-24 anos e 35-54 anos. Também ocorreu redução significativa em todas as regiões do país e entre a população com 0-8 anos de estudo e 12 anos de estudo ou mais (Tabela 3).
Tabela 3 Tendências de percentual de fumo de 20 cigarros ou mais ao dia, por sexo, faixa etária, escolaridade, Brasil e regiões. VIGITEL 2006-2014.
Nota: tendência (+) indica a existência de tendência de aumento significativo; tendência (-) indica a existência de tendência de diminuição significativa. O cálculo do valor de p é feito pela egressão linear. A inclinação representa a variação anual média, em pontos percentuais.
Com relação ao fumo passivo no domicílio, verificou-se redução significativa em todas as categorias de sexo e escolaridade. Tal redução foi maior em mulheres, reduzindo de 13,4% (2009) para 10% (2014) e para os indivíduos com 0-8 anos de escolaridade, passando de 12,7% (2009) para 9% (2014). Também foi encontrada redução significativa em todas as faixas etárias investigadas, com exceção dos indivíduos de 35-44 anos. O fumo passivo no domicílio também apresentou reduções significativas nas regiões Norte, Nordeste e Sudeste (Tabela 4).
Tabela 4 Tendências de percentual de fumo passivo no domicílio, por sexo, faixa etária, escolaridade, Brasil e regiões. VIGITEL 2006-2014.
Nota: tendência (+) indica a existência de tendência de aumento significativo; tendência (-) indica a existência de tendência de diminuição significativa. O cálculo do valor de p é feito pela regressão linear. A inclinação representa a variação anual média, em pontos percentuais.
O fumo passivo no trabalho reduziu de 12,1% (2009) para 8,9% (2014), e permaneceu mais elevado em todo o período entre os homens. Para faixa etária, existiu redução para os indivíduos compreendidos nas faixas entre 25 e 54 anos de idade. Houve redução, também, em todas as regiões, com exceção do Centro-oeste. A redução no fumo passivo no trabalho foi encontrada entre os indivíduos de 0-11 anos de escolaridade (Tabela 5).
Tabela 5 Tendências de percentual de fumo passivo no trabalho, por sexo, faixa etária, escolaridade, Brasil e regiões. VIGITEL 2006-2014.
Nota: tendência (+) indica a existência de tendência de aumento significativo; tendência (-) indica a existência de tendência de diminuição significativa. O cálculo do valor de p é feito pela regressão linear. A inclinação representa a variação anual média, em pontos percentuais.
O Brasil tem feito progressos nos compromissos assumidos referentes às metas nacionais 9 e Globais 13 de redução do tabagismo. Os resultados aqui descritos apontam melhoras importantes nos indicadores do tabaco no país, sendo esses avanços constatados em praticamente todos os estratos de sexo, escolaridade, idade e região, apontando a importância do VIGITEL no monitoramento anual dos indicadores do tabaco 15.
No Brasil, estudos populacionais em adultos sobre tabaco começaram a ser realizados em 1989, como a Pesquisa Nacional sobre Saúde e Nutrição (PNSN), que apontou prevalência em adultos de 34,8% 10. Em 2003, a Pesquisa Mundial de Saúde já mostrou importante redução do tabagismo, passando para 22,4% 10, seguida, em 2008, pela Pesquisa Nacional do Tabagismo (PETab) 18 com 17,2% e, em 2013, pela PNS, com 14,7% 11.
Existem diferenças importantes de gênero, e em geral, os homens fumam mais que as mulheres. A maior prevalência entre as mulheres ocorre na Europa (20%) 6, seguida da região das Américas, onde os homens fumam cerca de 1,5 vez mais que as mulheres 6. Na região do Pacífico Ocidental, as prevalências entre homens são muito elevadas, cerca de 46%, e baixas entre mulheres 6. Da mesma forma, no Sudeste da Ásia, os homens fumam até 10 vezes mais que as mulheres 8. Também nos países do estudo do Global Adults Tobacco Survey, as frequências tendem a ser mais baixas entre mulheres. Nos países como Egito, Índia e Bangladesh, com forte influência religiosa e cultural, as prevalências em mulheres são muito baixas, menores que 2%, contrastando com cerca de 30% entre os homens 8.
A força do tabagismo junto ao sexo masculino tem explicações históricas, culturais e de mercado. Desde o início do século XX, a propaganda das indústrias do tabaco buscava associar a imagem de força, virilidade e poder ao tabaco 19,20. Na maioria dos países, esse fator acabou por proteger as mulheres, que só iniciaram mais tardiamente o vício. No mundo Ocidental, essa iniciação foi fortemente propagandeada pela indústria do tabaco, como um fator para favorecer a igualdade de gêneros, e fortalecer a emancipação feminina e a autoafirmação 20,21,22. No Brasil, esse movimento foi mais forte nas décadas de 1960 e 1970, além de ser largamente estimulado pela indústria do cinema 3,23.
A redução da prevalência do fumo e do uso do fumo pesado ocorreu em ambos os sexos, em todas as regiões. A literatura aponta que baixa renda e escolaridade estão associadas a maiores prevalências do tabaco tanto no Brasil 3,23 quanto em outros países 8.
Outra tendência importante foi a redução do fumo e do fumo pesado em todos os níveis de escolaridade, sendo a inclinação ainda maior em populações de baixa escolaridade. Tal fator é muito positivo, já que o tabagismo ainda é mais elevado em populações de baixa escolaridade e renda, agravando as iniquidades em saúde e predispondo a maior prevalência de DCNT junto à população mais vulnerável 1. Os gastos com o fumo também oneram economicamente mais a população de baixa renda 18, pelos custos decorrentes do vício e gastos em saúde, sendo importante avançar ainda mais na redução das prevalências nesse estrato.
Todas as regiões apontaram tendência de queda praticamente em todos os indicadores, e as maiores reduções ocorreram no Norte e Nordeste. Destacam-se prevalências mais elevadas de fumo e fumo pesado no Sul e Sudeste. Menores prevalências no Norte e Nordeste têm sido explicadas por questões culturais, menor presença da indústria do tabaco, além de menor prevalência entre mulheres, visto que a iniciação entre elas nessas regiões historicamente sempre foi mais baixa 24. Paralelamente, o Sul apresenta maiores prevalências, dentre os fatores explicativos, são citados aspectos como a grande produção agrícola na região, a presença das indústrias do tabaco 25, além de características culturais, como a influência de populações migrantes no passado, bem como contatos frequentes com populações de países fronteiriços, com elevadas prevalência do tabaco 18,26.
O VIGITEL mostrou redução do fumo passivo no domicilio e no trabalho, em ambos os sexos, e na maioria das faixas de idade, escolaridade e regiões. A Região Centro-oeste não apresentou redução nesses indicadores e a Região Sul se manteve estável quanto ao fumo passivo no domicílio. O fumo passivo expõe os não fumantes aos mesmos riscos e doenças que o fumo direto produz, exceto pela magnitude, enquanto o hábito de fumar pode aumentar o risco de morte de 20-30 vezes, o fumo passivo aumenta o risco em 30 a 50% 25,27.
Dados da PNS apontaram o fumo passivo nos locais de trabalho em 13,5% e no domicílio em 10,7%. Com o decreto que proíbe o fumo nos ambientes coletivos, espera-se que a redução do fumo passivo nos locais de trabalho possa se intensificar ainda mais 11.
Comparando com outros países, o Brasil detém prevalências mais baixas, o que foi apontado em estudo comparativo conduzido em 2012, pela OMS e parceiros 8. Tal estudo apontou que entre 16 países (China, Rússia, Tailândia, Bangladesh, Egito, Índia, México, Filipinas, Polônia, Turquia, Ucrânia, Vietnã, outros), os quais reuniam grande parte da população global, mais de 3 bilhões de habitantes, o Brasil apresentava a menor prevalência de uso do tabaco 8.
Como no estudo atual, o declínio do tabaco também tem sido observado em outros países, como Estados Unidos, Uruguai, Argentina, países da Europa e outros, ainda que globalmente atinja cifras elevadas, apontando que há muito a ser realizado. As maiores prevalências são descritas na Europa, atingindo cerca de 30%, e as menores na África 6.
Dentre os limites do estudo referentes à metodologia utilizada pelo VIGITEL, destaca-se o fato de a entrevista ocorrer em população adulta nas capitais de estados brasileiros e no Distrito Federal que possuem telefone fixo, limitando a representatividade da amostra. Tal problema é minimizado pelo uso de fatores de ponderação, que buscam igualar as características demográficas da amostra do VIGITEL às características da população geral de adultos, segundo dados do censo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). A partir de 2012, todas as prevalências do VIGITEL foram atualizadas em função da utilização de metodologia rake de pós-estratificação e atualização das estimativas populacionais anualmente, mediante as projeções dos censos. Dessa forma, as análises de tendência aqui apresentadas foram recalculadas e podem diferir de dados publicados anteriormente 23.
O monitoramento dos indicadores do tabaco nos países é uma necessidade real frente às metas de redução estabelecidas no Plano Global de DCNT da OMS 13. Entretanto, mais de cem países no mundo ainda não dispõem de iniciativas de monitoramento, tornando difícil comparar e monitorar com precisão as tendências do consumo de tabaco 14. O Brasil tem sido considerado um exemplo no mundo pelo monitoramento do tabaco e recebeu, em 2015, um prêmio da Fundação Bloomberg pelas iniciativas na organização do monitoramento e da vigilância do tabaco no país 28.
Também o Brasil tem sido reconhecido internacionalmente pelas ações no campo da regulação, educação, prevenção e governança 8,28. As medidas regulatórias adotadas estão em conformidade com as intervenções custo-efetivas na prevenção de DCNT publicadas pela OMS 1, como: (a) o aumento de impostos e preços sobre os produtos do tabaco; (b) a proibição do fumo em lugares públicos; (c) a inclusão de advertências sobre os perigos do consumo de tabaco; (d) a proibição da propaganda, do patrocínio e da promoção de tabaco 1. Dentre as medidas regulatórias recentes, destaca-se a Lei no 12546/2011 , sobre ambientes livres de tabaco e sua regulamentação pelo Decreto Presidencial nº 8.262/2014, que proibiu o fumo em ambientes fechados, regulamentou a exposição dos cigarros exclusivamente nos pontos de venda, ampliou o espaço ocupado pelas advertências sanitárias 15. Outras medidas ampliaram o aumento da taxação dos cigarros para 85% e definiram o preço mínimo do tabaco, conforme as melhores evidências para redução do tabaco. Outro fator que melhorou a governança das ações foi a adesão do Brasil à CQCT-OMS, em 2005 6,29.
Futuros avanços nesse campo são necessários como a retomada do tema dos aditivos, que foi regulamentado em 2012 pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), por meio de Resolução da Diretoria Colegiada (RDC nº 14/2012). Essa norma proibiu o uso de aditivos nos cigarros, que são substâncias que dão sabores açucarados, e outros, além de aromatizantes, resultando em produtos mais palatáveis e que objetivam a iniciação do cigarro junto ao público jovem 30. Contudo, a medida foi questionada pela indústria do tabaco em 2013, e desde então o Supremo Tribunal Federal concedeu liminar com efeito suspensivo. Outra discussão global tem sido liderada pela Austrália, e consiste na adoção de embalagens genéricas de cigarros, sem logotipos e textos promocionais. Torna-se importante a adesão do Brasil a essas embalagens, como forma de proteger os adolescentes e jovens. Essas e outras medidas são necessárias para a continuidade do processo de enfrentamento do consumo do tabaco.
O estudo aponta a melhora de todos os indicadores relacionados ao consumo do tabaco no país, ao longo do período analisado. Houve redução da prevalência de fumantes segundo sexo, idade, escolaridade e todas as regiões. Redução de fumantes pesados, ou consumo de 20 cigarros ou mais diariamente, segundo sexo, idade, escolaridade e regiões. Ocorreu redução do fumo passivo no domicílio, segundo sexo, idade, escolaridade e regiões Norte, Nordeste e Sudeste. Redução do fumo passivo no trabalho; segundo sexo, idade, escolaridade e regiões, exceto Centro-oeste. O aumento de ex-fumantes aconteceu na faixa etária de 55-64 anos, 65 anos e mais e para os indivíduos de baixa escolaridade.
As reduções das prevalências aqui analisadas confirmam o declínio contínuo do fumo no país e apontam que, provavelmente, as metas de redução do Plano de Enfrentamento de DNCT, Nacional e Global serão atingidas ou até superadas.