versão On-line ISSN 2316-9117
Fisioter. Pesqui. vol.23 no.2 São Paulo abr./jun. 2016
http://dx.doi.org/10.1590/1809-2950/12606823022016
No figuran descriptas de manera consensual en la literatura las adaptaciones extracelulares, ligadas al mantenimiento de la integridad y del desempeño del sistema musculoesquelético tras inmovilizaciones. En este estudio se evalúa el área del perimisio del tejido conjuntivo y de la sección transversal de las fibras musculares del sóleo y del plantar en ratas inmovilizadas y después rehabilitadas siguiendo los protocolos de estiramiento y de ejercicio excéntrico. En el área evaluada de ambos músculos no se observaron significativas diferencias tras el procedimiento de inmovilizarlos y entrenarlos. Aplicados en diez días, el entrenamiento excéntrico ha sido suficiente para recuperar el área de las fibras para el músculo plantar, mientras que el músculo sóleo ha tardado veintiuno días en recuperarse.
Palabras clave: Inmovilización; Tejido Conjuntivo; Ejercicios de Estiramiento Muscular; Sistema Musculoesquelético
O músculo esquelético representa uma estrutura biológica complexa, composta por elementos contráteis e não contráteis, que possui habilidade de adaptar-se diante dos diversos estímulos fisiológicos e patológicos. O procedimento de imobilização determina mudanças desfavoráveis no músculo, como atrofia muscular e aumento do tecido conjuntivo intramuscular, determinando perda da extensibilidade e limitação dos movimentos1), (2), (3), (4.
Diante das adaptações deletérias causadas pelo desuso e responsividade do sistema musculoesquelético, técnicas de reabilitação muscular vêm sendo desenvolvidas e aprimoradas com o objetivo de amenizar ou reverter essas adaptações. Respostas do tecido não contrátil diante da imobilização e reabilitação têm sido pouco exploradas na literatura, ainda que o papel desses elementos tenham tornado-se mais evidentes nas últimas décadas com o aprimoramento de técnicas de biologia celular e molecular5.
A matriz extracelular do músculo esquelético é composta por colágeno, proteoglicanas e metaloproteinases, estruturas que envolvem as células satélites que, por sua vez, desempenham papel mandatório na regeneração muscular5. Estudos em ratos Wistar adultos têm mostrado que o procedimento de imobilização reduz significativamente a quantidade de colágeno tipo I, e que o colágeno tipo III não sofre alterações quantitativas, em comparação ao grupo controle6. Entretanto, o desuso seguido por reabilitação do tipo alongamento passivo aplicado por 10 dias, composto de 10 repetições de 30 segundos com intervalos de 30 segundos, determinou aumento significativo do colágeno tipo III, em comparação ao grupo controle6.
Após quatro semanas de imobilização e aplicação do alongamento em sessões diárias ou três vezes por semana (10 alongamentos mantidos por 1 minuto com intervalo de 30 segundos), concluiu-se que os protocolos foram efetivos em recuperar a área de secção transversa das fibras do músculo sóleo, em comparação ao músculo contralateral e ao grupo controle7. O alongamento é uma importante técnica capaz de reduzir a desorganização e agregação dos feixes de colágeno e prevenir a perda de sarcômeros em série de músculos imobilizados1), (7, sendo indicada para prevenção de lesões8. Os programas de alongamento utilizados por diversos pesquisadores após imobilização de um segmento se mostram efetivos em restabelecer a amplitude de movimento aos padrões de normalidade das articulações6), (8), (9.
O desenvolvimento de maior tensão nas contrações excêntricas em comparação às concêntricas ocorre pelo afastamento dos miofilamentos e pelo desenvolvimento de tensão passiva nos elementos elásticos, titina e desmina. Além disso, é sabido que o treinamento excêntrico determina maior desenvolvimento de força, fato diretamente associado ao aumento da síntese proteica miofibrilar e hipertrofia muscular10), (11), (12. Apesar da localização anatômica adjacente, na parte posterior da perna, os músculos eleitos para este estudo diferem em suas características citoarquiteturais e bioquímicas. O músculo sóleo é composto predominantemente por fibras do tipo I, dada sua constante ativação na postura estática. Já o músculo plantar apresenta baixa proporção de fibras do tipo I, apresentando predominantemente fibras do tipo IID13. O músculo sóleo, músculo postural, é ainda vigoroso desacelerador da marcha na fase de apoio, e é potencialmente ativado durante o exercício excêntrico, treinamento mais fisiológico na fase pós-desuso. Esses resultados poderão subsidiar, mesmo que indiretamente, conhecimentos acerca da eleição e aplicação de técnicas de reabilitação na fisioterapia. Portanto, protocolos terapêuticos como alongamento e exercício excêntrico favorecem o restabelecimento morfofuncional da musculatura esquelética após situações de desuso.
Este estudo teve por objetivo investigar se a aplicação de 10 e 21 dias de exercício excêntrico ou alongamento muscular modifica a área de tecido conjuntivo e a área de secção transversa das fibras musculares e dos músculos sóleo e plantar de ratos submetidos a imobilização.
O presente estudo foi aprovado pela Comitê de Ética em Experimentação Animal da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo sob o protocolo nº 043/2007. Quarenta e duas ratas Wistar com 81 dias de idade foram divididas em oito grupos: 1) controle imobilizado (GCI); 2) controle de 10 dias (GC10); 3) controle de 21 dias (GC21), 4) imobilizado por 10 dias (GI); 5) imobilizado por 10 dias e treinado excentricamente por 10 dias (GITE10); 6) imobilizado por 10 dias e treinado excentricamente por 21 dias (GITE21); 7) imobilizado por 10 dias e alongado por 10 dias (GIAL10); e 8) imobilizado por 10 dias e alongado por 21 dias (GIAL21). Os grupos controle de 10 e 21 dias foram utilizados para comparação pareada por idade com os grupos treinados. Para imobilização, os animais foram previamente anestesiados (Ketamina-95 mg/kg e Xylazina-12 mg/kg), a articulação tíbio-társica direita foi posicionada em flexão plantar máxima e uma estrutura de aço forrada foi utilizada para restringir anatomicamente o membro inferior direito14), (15.
Após a retirada da imobilização, os animais do GITE10 e GITE21 realizaram treinamento em esteira em declive com sessões iniciais de 10 minutos diários, tendo incrementos de 5 minutos por dia até completar 40 minutos, com velocidade média de 17 m/min e inclinação descendente de 16 graus, sendo três dias consecutivos de treino seguidos por um dia de descanso16), (17), (18. Os animais dos grupos GIAL10 e GIAL21 foram submetidos aos protocolos de alongamento mantido obtido pela flexão dorsal máxima realizada por fita adesiva19. O protocolo de alongamento seguiu os mesmos intervalos do treino excêntrico, iniciando-se com 10 minutos de alongamento diários por três dias consecutivos e um dia de intervalo. Houve incrementos diários de 5 minutos a partir do primeiro dia, até serem alcançados 40 minutos de alongamento mantido. Os animais foram eutanasiados por overdose de anestésicos imediatamente após a última sessão do protocolo, e os músculos sóleo e plantar foram removidos. Os fragmentos foram envolvidos em talco, congelados em nitrogênio líquido e estocados em um freezer a −80 ºC.
Cortes histológicos de 5 μm de espessura foram obtidos em criótomo Leica CM 1850 UV (−25 ºC) (Leica Instruments GmbH, Heidelberg, Alemanha) e posteriormente corados com tricrômico de gomori modificado. Análise morfométrica foi realizada com auxílio do software QualiView (Atonus Engenharia de Sistemas Ltda., São José dos Campos, São Paulo, Brasil), cujas imagens foram capturadas, a partir do microscópio de luz Leica DM 2500, em câmera de vídeo digital Leica DFC 300FX conectada a um microcomputador. A área do tecido conjuntivo foi analisada a partir de três campos aleatórios das lâminas do músculo sóleo e do plantar na objetiva de 40×. A área total de cada campo foi de 91.860,51 µm2, composta pelo tecido conjuntivo e pelas fibras musculares. Para determinar a área do tecido conjuntivo perimisial, inicialmente foram mensuradas manualmente todas as fibras musculares de cada campo, analisadas individualmente pelo mesmo avaliador. Posteriormente, da área total dos três campos (3×91.860,51 µm2) foi subtraído o valor total da área de fibras obtidas nos três campos analisados.
O procedimento PROC MIXED do programa SAS foi utilizado, e as comparações múltiplas das áreas médias do tecido conjuntivo entre os diferentes grupos foram feitas em modelo heterocedástico (que considera grupos com variâncias diferentes) de regressão linear, considerando um ajuste de Bonferroni. A informação de medidas repetidas da área para cada animal foi introduzida no modelo por efeitos aleatórios. O pressuposto de normalidade de resíduos do modelo foi verificado por métodos gráficos. Para as inferências, considerou-se um nível de significância de 5%.
Os resultados obtidos indicaram que nenhum grupo mostrou alteração significativa na área de tecido conjuntivo perimisial dos músculos sóleo e plantar (Figuras 1 e 2). Por outro lado, a área média de secção transversa das fibras musculares do músculo sóleo do GI reduziu significativamente em comparação ao GCI (GCI × GI; p<0,0001). Ambos os protocolos de treino excêntrico e alongamento mantido, aplicados por 10 ou 21 dias, promoveram o aumento da média das áreas das fibras musculares (GI × GIAL10; GI × GIAL21; GI × GITE10; GI × GITE21; p<0,0001). Entretanto, somente o treino excêntrico realizado por 21 dias foi eficiente no restabelecimento da área de secção transversa das fibras, em comparação aos controles (GC21 × GITE21; NS) (Tabela 1).
Figura 1 Médias da área do tecido conjuntivo com os respectivos intervalos de confiança de 95% do músculo sóleo dos diferentes grupos estudados
Figura 2 Médias da área do tecido conjuntivo com os respectivos intervalos de confiança de 95% do músculo plantar dos diferentes grupos estudados
Tabela 1 Média da área das fibras musculares dos grupos experimentais do músculo sóleo
Grupos | Área média das fibras musculares |
---|---|
GC10 | 2895,59 (2705,8 - 3085,38) |
GC21 | 2718,56 (2529,11 - 2908,01) |
GCI | 2824,9 (263,51 - 3015,29) |
GI | 1470,59* (1293,81 - 1647,37) |
GIAL10 | 2038,06# (1860,73 - 2215,4) |
GIAL21 | 2356,79# (2178,97 - 2534,61) |
GITE10 | 2361,4#□ (2182,81 - 2539,99) |
GITE21 | 2562,94#◊ (2384,2 - 2741,68) |
*p<0,001 quando comparado a GCI
#p<0,001 quando comparado a GI
□p<0,001 quando comparado a GIAL10
◊p<0,001 quando comparado a GIAL21
No músculo plantar, o período de imobilização reduziu significativamente a área de secção transversa das fibras musculares (GCI × GI; p<0,0001). Diante de ambos os protocolos de reabilitação, alongamento e treino excêntrico por 10 e 21 dias, houve aumento significativo da área média das fibras musculares (GI × GIAL10; GI × GITE10; GI × GIAL21; GI × GITE21; p<0,001). Também foi observado que, nesse músculo, o treino excêntrico aplicado por 10 e 21 dias foi eficiente no restabelecimento da área de secção transversa das fibras musculares (GC10 × GIATE10; GC21 × GITE21; NS) (Tabela 2).
Tabela 2 Média da área das fibras musculares dos grupos experimentais do músculo plantar
Grupos | Área média das fibras musculares |
---|---|
GC10 | 1882,93 (1722,42 - 2043,43) |
GC21 | 2001,59 (1840,77 - 2162,41) |
GCI | 1793,32 (1633,21 - 1953,44) |
GI | 1380,84* (1222,55 - 1539,14) |
GIAL10 | 1607,74# (1449,43 - 1766,05) |
GIAL21 | 1819,63# (1661,29 - 1977,98) |
GITE10 | 1815,31#□ (1656,94 - 1973,68) |
GITE21 | 1922,38#◊ (1763,99 - 2080,77) |
*p<0,001 quando comparado a GCI
#p<0,001 quando comparado a GI
□p<0,001 quando comparado a GIAL10
◊p<0,001 quando comparado a GIAL21
Após períodos de imobilização em posição encurtada, ocorrem importantes adaptações, como atrofia muscular e alteração do tecido conjuntivo intramuscular1), (3. São poucos os estudos que buscaram investigar a resposta do tecido conjuntivo intramuscular diante de intervenções de desuso e reabilitação1), (2), (3), (4. Coutinho et al.14 observaram que, após imobilização por quatro semanas, ocorreu desorganização e redução do estado de agregação dos feixes de colágeno para o músculo sóleo.
Por outro lado, Järvinen et al.1 e Józsa et al.20 observaram aumento pronunciado do tecido conjuntivo nas regiões peri e endomisial no músculo sóleo de ratas após três e quatro semanas de imobilização gessada. Entretanto, Mattiello-Sverzut et al.21, também avaliando o músculo sóleo, não observaram alterações na área de tecido conjuntivo perimisial em animais adultos após 14 dias de imobilização gessada. Da mesma forma, Benedini-Elias et al.15 não encontraram diferença significativa na área do tecido conjuntivo perimisial após analisarem o músculo sóleo de ratas bebês submetidas a desuso durante 10 dias.
As divergências nos resultados diante da expressão de tecido conjuntivo perimisial desencadeada por imobilização parecem estar relacionadas ao tempo e ao tipo de restrição funcional. Soma-se a isso o fato de a composição do tecido conjuntivo perimisial ser majoritariamente colágeno tipo III e, como demonstrado por Cação-Benedini et al.6, o procedimento de imobilização aplicado por 10 dias não causar alterações quantitativas do colágeno tipo III quando comparado ao grupo controle. É sabido ainda que diferentes padrões de adaptações podem se manifestar no músculo esquelético nas diferentes fases da vida22, e estudos científicos discutem a síntese de colágeno em diferentes condições fisiológicas e experimentais. Karpakka et al.23 observaram diminuição de marcadores da síntese de colágeno durante a redução da atividade muscular.
A imobilização determinou redução significativa da área média das fibras musculares em relação aos controles. Cação-Benedini et al.6 e Cornachione et al.12 também observaram redução significativa do diâmetro das fibras do músculo sóleo após 10 dias de imobilização utilizando dispositivo idêntico e técnica de análise diferente. O treinamento físico adotado após situações de desuso determina regeneração muscular mediante um processo altamente estruturado e dependente da interação de fatores ligados à degeneração e regeneração tecidual5.
Elementos da matriz extracelular, anteriormente considerados apenas estruturais e passivos, desenvolvem papel fundamental na regeneração muscular pós-lesão, uma vez que a matriz extracelular libera fatores de crescimento para a sinalização celular necessária a esse processo5. A regulação da síntese de colágeno, um dos principais componentes da matriz extracelular, desenvolve o papel de cicatrização muscular, evitando seu excesso5. Por esse motivo, é importante a realização de estudos que analisem o comportamento dos elementos contráteis e não contráteis do músculo esquelético confrontando diferentes procedimentos terapêuticos pós-imobilização.
É sabido que alongamento e exercício excêntrico promovem adaptações musculares; Cornachione et al.24 observaram melhora do trofismo dos músculos sóleo e tibial anterior, previamente submetido a desuso, após 21 dias de corrida em esteira em declive. Em relação ao alongamento mantido, não foram observados resultados satisfatórios para a área das fibras nos músculos estudados. Mattiello-Sverzut et al.21 demonstraram que o alongamento manual, por 10 dias consecutivos, sendo 10 séries de 15 segundos cada, não foi capaz de aumentar o diâmetro das fibras do músculo sóleo, em comparação ao grupo somente imobilizado. O programa de exercícios excêntricos realizado em declive por 21 dias promoveu a recuperação da área das fibras musculares dos músculos aqui estudados, apresentando características similares às observadas nas condições controle.
Em associação aos protocolos de reabilitação, os animais foram mantidos em gaiola, podendo caminhar livremente utilizando os quatro membros. A descarga de peso nos membros proporciona ao músculo uma carga mecânica tênsil, que, por sua vez, determina adaptações teciduais tróficas que refletem, sob a ótica morfológica, centralização nuclear, lesões em delta, splitting e lobulação de fibras6. Porém, alguns estudos mostram a inabilidade do exercício de alongamento em aumentar a área de secção transversa das fibras musculares18. Assim, neste estudo, o treino de marcha livre pode ter representado um estímulo adicional que favoreceu as adaptações observadas na área de secção transversa das fibras musculares, em especial no grupo alongado.
O tecido conjuntivo perimisial não sofre modificações quantitativas após 10 dias de imobilização associada ou não à reabilitação. O programa de treinamento excêntrico de apenas 10 dias restabelece a área das fibras musculares para o músculo plantar. O músculo sóleo requer maior período de reabilitação, 21 dias de treino excêntrico, para atingir suas características de base.