versão impressa ISSN 1414-462Xversão On-line ISSN 2358-291X
Cad. saúde colet. vol.26 no.1 Rio de Janeiro jan./mar. 2018
http://dx.doi.org/10.1590/1414-462x201800010217
The absence of functional dentition compromises people´s quality of life, reflecting on their perceptions, including the self-perceived need for dental treatment in adults. However, this relation is not very clear in literature.
To evaluate if the absence of functional dentition is associated to the self-perceived need for dental treatment in adults.
Analytical cross-sectional study was performed, in which data of the National Oral Health Survey conducted in 2010 was used. The age group evaluated was 35 to 44 years. After bivariate and multivariate analyzes, the association between the absence of functional dentition and other variables as the self-perceived need for dental treatment, sociodemographic conditions and health endpoints was verified.
From the 9.564 adults, approximately 20% of the individuals did not show functional dentition. The absence of functional dentition was lower in adults who were aware of the self-perceived need for dental treatment (OR:0.55; IC95%:0.39-0.75). The female gender (OR:1.76; IC95%:1.39-2.22), older age (OR:2.53; IC95%:2.01-3.18) and lower schooling (OR:0.82; IC95%:0.79-0.85) were associated with the absence of functional dentition.
The absence of functional dentition is greater in adults who do not have self-perceived need for dental treatment.
Keywords: tooth loss; adult; oral health; self-concept
A perda dentária destaca-se como um grave problema de saúde pública em todo o mundo, com uma estimativa global de 2,3%, em 2010 1 . Segundo esse estudo de Carga Global de Doenças, Injúrias e Fatores de Risco – GBD, a perda severa dos dentes é a 36ª condição mais prevalente dentre 291 doenças e injúrias pesquisadas, afetando cerca de 160 bilhões de pessoas no mundo 1 . Diante da alta prevalência, a perda dentária deve ser considerada um desafio para o planejamento em saúde pública, ainda mais quando essa perda se inicia precocemente e acomete pessoas mais jovens.
Vários problemas podem surgir na vida diária de indivíduos que perderam dentes naturais, tanto de natureza funcional como social 2 , contribuindo para a redução da qualidade de vida dessas pessoas 3,4 . Algumas funções normais do cotidiano, como mastigar, falar e sorrir, bem como a aparência, podem ser prejudicadas pela perda dos dentes 5,6 . Quando essa perda é severa, o indivíduo pode passar a não ter uma dentição funcional, que é definida pela Organização Mundial de Saúde como a presença/retenção de pelo menos 20 dentes ao longo da vida, com a presença de uma dentição natural funcional, estética e sem necessidade de reabilitação dentária 7 .
A falta de dentição funcional está associada a diversos problemas, como, por exemplo, uma menor ingestão de nutrientes, devido à limitação dos tipos de alimentos que essas pessoas ingerem 8,9 . Além disso, pode-se observar que esta condição de saúde bucal está associada à limitação das funções bucais, que acarreta prejuízos nas atividades diárias 6 . Ressalta-se, ainda, que a presença de dentição funcional tem sido associada a uma maior satisfação com a aparência 5 .
Em contrapartida, a avaliação do impacto que a falta de dentição funcional tem sobre os indivíduos e em suas percepções é um tema que não tem sido bem esclarecido. Sabe-se que condições subjetivas de saúde, como a autopercepção da necessidade de tratamento, refletem, em parte, o grau das deficiências e as disfunções decorrentes da condição de saúde, assim como das percepções e das atitudes dos indivíduos a respeito dessa condição 10 . Portanto, essa autopercepção pode modular os comportamentos em saúde bucal e a importância dada aos problemas bucais, sendo um importante preditor na busca por tratamento. Diante do exposto, o objetivo deste estudo foi avaliar se a falta de dentição funcional em adultos está associada a uma maior autopercepção da necessidade de tratamento odontológico pelos mesmos.
Utilizou-se a base de dados da Pesquisa Nacional de Saúde Bucal ‒ SBBrasil 11 , que foi conduzida respeitando os princípios éticos da Resolução do Conselho Nacional de Saúde n.°196/96, sendo aprovado e registrado pela Comissão Nacional de Ética em Pesquisa, sob o número 15.498/2010.
Estudo transversal analítico de caráter exploratório e metodologia quantitativa, que utilizou dados do SB Brasil 2010 11 . A população alvo avaliada deste levantamento epidemiológico foi de adultos brasileiros com faixa etária de 35-44 anos, sendo um total de 9.564 adultos e, portanto, uma amostra representativa dessa população 11 .
Foram incluídos adultos de 177 municípios, compreendendo 27 capitais brasileiras, das cinco regiões do país (Norte, Nordeste, Centro-Oeste, Sudeste e Sul), tendo sido selecionados por amostragem probabilística por conglomerados, em múltiplos estágios, com probabilidade proporcional ao tamanho e considerando um efeito de desenho igual a 2. A seleção da amostra foi estruturada em dois estágios, para capitais e Distrito Federal, e três estágios, para os municípios do interior das cinco regiões brasileiras. As unidades primárias de amostragem foram os municípios, para o interior das regiões, e o setor censitário, para as capitais.
Os indivíduos foram entrevistados em seus domicílios, com perguntas relacionadas às condições de saúde bucal, demográficas e socioeconômicas e ao uso de serviços odontológicos, além de questões subjetivas de saúde bucal, incluindo a percepção de saúde. Para isso, foi utilizado questionário composto por três dimensões distribuídas em 16 itens. A condição oral de todos os participantes foi avaliada. Os exames odontológicos e entrevistas foram feitos por cirurgiões-dentistas previamente treinados e calibrados 11 . O estudo seguiu os critérios da OMS 12 .
Um recorte do banco de dados foi feito e todos os adultos de 35 a 44 anos que participaram do levantamento foram incluídos na análise. Considerou-se, como variável dependente, a presença ou não de Dentição Funcional, sendo que, para contabilizar a perda dentária, foi considerado todo dente natural ausente devido à extração por cárie ou por qualquer outro motivo (Códigos 4 e 5 do Índice CPOD).
As variáveis independentes foram divididas em três blocos: autopercepção da necessidade de tratamento odontológico, condições sociodemográficas e desfechos em saúde. A autopercepção da necessidade de tratamento odontológico foi determinada pela seguinte pergunta: “O(a) Sr.(a.) acha que necessita de tratamento dentário atualmente?”, com três opções de respostas: “Não, sim e não sabe/não respondeu”, das quais, apenas as duas primeiras foram consideradas para análise. Para as condições sociodemográficas, foram avaliadas a idade (35-39 ou 40-44 anos), o sexo (masculino ou feminino), a raça (branco ou demais raças), a renda familiar (mais de 500 reais ou até 500 reais) e a escolaridade (anos de estudo). Nos desfechos em saúde, a cárie foi medida pela presença de dentes com cavidade evidente, fosse este restaurado ou não, utilizando o Índice CPO-D (sim - com dentes cariados, ou não - sem dentes cariados); a satisfação com dentes e boca foi avaliada pela pergunta: “Com relação aos seus dentes/boca, o(a) Sr.(a.) está: muito satisfeito, satisfeito, nem satisfeito nem insatisfeito, insatisfeito, muito insatisfeito ou não sabe”, das quais, a última resposta não foi considerada nas análises, sendo as duas primeiras agrupadas como satisfeito e as demais como insatisfeito. O impacto na qualidade de vida foi avaliado por perguntas relacionadas à execução de atividades diárias, como dificuldade de se alimentar, falar, sorrir, estudar/trabalhar, dormir, incômodo ao escovar, irritação com os dentes, impacto na vida social e na prática de esportes, totalizando nove perguntas; caso houvesse impacto em alguma dessas atividades, foi considerado haver impacto na qualidade de vida.
Para análise dos dados, utilizou-se o software SPSS® Statistics 18.0. Uma vez que, na pesquisa, foi utilizada amostra complexa por conglomerados, foi feita a correção pelo efeito do desenho amostral, levando em conta o efeito dos conglomerados e atribuindo ponderações aos elementos amostrados. Foi realizada análise descritiva para variáveis categóricas, incluindo a distribuição da amostra e a frequência relativa corrigida (%). Para verificar os fatores associados à falta de dentição funcional, foram realizadas análises bivariada e múltipla. Na análise bivariada, foram estimadas odds ratio (OR) e intervalos de confiança de 95% (IC95%), com a correção pelo efeito do desenho amostral. Aquelas variáveis independentes que apresentaram um nível de significância menor ou igual a 20% (p≤0,20) foram selecionadas para análise múltipla. Foi realizada regressão logística com modelo ajustado em nível de significância de 5% (p≤0,05) para variáveis que permaneceram associadas à falta de dentição funcional.
As médias da idade e da escolaridade foram de 39,3 anos (IC95% 39,2-39,5) e de 8,6 anos (IC95% 8,2-9,0), respectivamente. O sexo feminino (62,3%) predominou na amostra avaliada. Aproximadamente 20% dos indivíduos possuíam menos de 20 dentes na boca (falta de dentição funcional). Diferenças acentuadas foram observadas com relação à autopercepção da necessidade de tratamento odontológico, sendo que a maioria (77%) acreditava necessitar de tratamento. Além disso, para a maioria dos entrevistados, a renda familiar passava dos 500 reais (86,2%). Com relação ao desfecho em saúde, maioria dos adultos não tinha dentes cariados (53,8%), estava insatisfeita com seus dentes e sua boca (58,2%), e acreditava que sua condição bucal tinha impacto na qualidade de vida (55%) ( Tabela 1 ).
Tabela 1 Análise descritiva da dentição funcional e condições sociodemográficas e desfechos em saúde de adultos brasileiros ‒ 2010
Variável | n | % |
---|---|---|
Variável dependente | ||
Dentição Funcional | ||
Sim | 7364 | 79,5 |
Não | 2200 | 20,5 |
Principal variável independente | ||
Autopercepção da necessidade de tratamento* | ||
Não | 1999 | 23,0 |
Sim | 7360 | 77,0 |
Condições sociodemográficas | ||
Idade | ||
35-39 anos | 5027 | 52,1 |
40-44 anos | 4537 | 47,9 |
Sexo | ||
Masculino | 3277 | 37,7 |
Feminino | 6287 | 62,3 |
Raça | ||
Branco | 4049 | 47,6 |
Negro/Amarelo/Indígena/Pardo | 5515 | 52,4 |
Renda familiar em reais* | ||
Mais de 500 reais | 7933 | 86,2 |
Até 500 reais | 1404 | 13,8 |
Desfechos em saúde | ||
Dentes com cárie | ||
Não | 4725 | 53,8 |
Sim | 4839 | 46,2 |
Satisfação com dentes e boca* | ||
Satisfeito | 3800 | 41,8 |
Insatisfeito | 5705 | 58,2 |
Impacto na qualidade de vida | ||
Não | 4562 | 45,0 |
Sim | 5002 | 55,0 |
*Perda de informação
Após análise bivariada, algumas variáveis foram associadas à falta de dentição funcional, como: autopercepção da necessidade de tratamento, idade, sexo, raça, renda, escolaridade, satisfação com dentes e boca, e impacto na qualidade de vida ( Tabela 2 ). No entanto, após regressão logística, foi observada uma maior chance da falta de dentição funcional em quem não tinha percepção da sua necessidade de tratamento odontológico, em quem era do sexo feminino, em adultos com idade entre 40-44 anos e com menor nível de escolaridade ( Tabela 3 ).
Tabela 2 Análise bivariada entre a falta de dentição funcional em adultos com a autopercepção da necessidade de tratamento odontológico, as condições sociodemográficas e os desfechos em saúde de adultos brasileiros ‒ 2010
Variável | Falta de dentição funcional | |||
---|---|---|---|---|
% | OR | IC 95% | Valor p | |
Principal variável independente | ||||
Autopercepção da necessidade de tratamento* | ||||
Não | 25,3 | 1 | ||
Sim | 18,6 | 0,67 | 0,50-0,90 | 0,008 |
Condições sociodemográficas | ||||
Idade | ||||
35-39 anos | 13,3 | 1 | ||
40-44 anos | 28,2 | 2,56 | 2,04-3,21 | <0,001 |
Sexo | ||||
Masculino | 16,5 | 1 | ||
Feminino | 22,9 | 1,50 | 1,18-1,89 | 0,001 |
Raça | ||||
Branco | 17,9 | 1 | ||
Negro/Amarelo/Indígena/Pardo | 22,8 | 1,35 | 1,07-1,71 | 0,011 |
Renda familiar em reais* | ||||
Mais de 500 reais | 19,1 | 1 | ||
Até 500 reais | 29,5 | 1,77 | 1,37-2,30 | <0,001 |
Escolaridade | - | <0,001 | ||
Desfechos em saúde | ||||
Dentes com cárie | ||||
Não | 20,5 | 1 | ||
Sim | 20,4 | 0,99 | 0,82-1,21 | 0,955 |
Satisfação com dentes e boca* | ||||
Satisfeito | 18,2 | 1 | ||
Insatisfeito | 22,1 | 1,27 | 0,98-1,65 | 0,069 |
Impacto na qualidade de vida | ||||
Não | 17,5 | 1 | ||
Sim | 22,9 | 1,40 | 1,12-1,76 | 0,003 |
*Perda de informação
Tabela 3 Regressão logística considerando as variáveis selecionadas na análise bivariada associadas à falta de dentição funcional em adultos brasileiros ‒ 2010
Variável | OR | IC95% | Valor p | |
---|---|---|---|---|
Principal variável independente | ||||
Autopercepção da necessidade de tratamento* | ||||
Não | 1 | |||
Sim | 0,55 | 0,39-0,75 | <0,001 | |
Condições sociodemográficas | ||||
Idade | ||||
35-39 anos | 1 | |||
40-44 anos | 2,53 | 2,01-3,18 | <0,001 | |
Sexo | ||||
Masculino | 1 | |||
Feminino | 1,76 | 1,39-2,22 | <0,001 | |
Escolaridade | 0,82 | 0,79-0,85 | <0,001 |
*Perda de informação
A presença de dentição natural funcional e estética com, no mínimo, 20 dentes e sem necessidade de prótese dental é um dos objetivos das práticas de saúde bucal, segundo a OMS 7 , sendo essa condição influenciada por fatores individuais e contextuais 13 . Este estudo apresentou resultados de uma amostra de adultos representativa da população brasileira 11 , na qual a prevalência estimada de adultos sem dentição funcional foi de 20,5% nos adultos brasileiros, na faixa etária de 35-44 anos. Observe-se que essa porcentagem é menor do que a observada na população de adultos da mesma faixa etária do Estado de São Paulo (35,7%) 14 .
A falta de dentição funcional esteve associada à autopercepção de necessidade de tratamento, sendo que aqueles indivíduos que tinham menos de 20 dentes na boca percebiam menos a necessidade de tratamento odontológico. Essa associação também foi observada em outro estudo, no qual a maioria dos adultos (72,5%) com menos de 20 dentes na boca acreditava não necessitar de tratamento odontológico 14 . Essa associação pode ser explicada pelo fato de que a presença de dentes na boca faz com que o indivíduo se preocupe mais com sua saúde bucal, já que a manutenção dos mesmos tem influência direta na qualidade de vida 14 .
Além disso, pode-se observar que grande quantidade de indivíduos tinha dentes cariados (46,2%), fato que poderia justificar a maior autopercepção da necessidade de tratamento em quem tinha dentição funcional. Estudo mostra que um menor número de dentes hígidos foi associado com a autopercepção negativa da saúde bucal, possivelmente por gerar desconfortos clínicos, podendo comprometer a função mastigatória e estética, além de comprometer a fala e o sorriso 15 . Assim, a cárie pode estar associada à dor de dente, o que gera insatisfação com sua condição bucal e leva o indivíduo a procurar atendimento odontológico 15 .
A autopercepção em saúde abrange a compreensão que o indivíduo possui sobre o seu próprio estado de saúde, baseando-se em experiências anteriores e no contexto social, cultural e histórico em que está inserido, englobando elementos subjetivos relacionados ao seu bem-estar 16 . A autopercepção é utilizada como um indicador importante para complementar as informações obtidas pelas medidas clínicas 17 , uma vez que possui alta sensibilidade e alto valor preditivo positivo. Portanto, essa medida pode ser utilizada para identificar a proporção de adultos que necessitam de tratamento odontológico em uma população 18 . Dessa forma, a consciência dessa variável apresenta informações importantes para o planejamento dos serviços públicos odontológicos.
A falta de dentição funcional também esteve associada com a idade, ou seja, pessoas com idade mais avançada tinham mais chance de ter menos de 20 dentes na boca. Esse fato também foi observado em outros estudos 19-21 . Observa-se que, com um aumento da idade, ocorre um aumento no CPOD, que passa a ser composto basicamente pelo componente “perdido” 11,14 . O Índice CPOD caracteriza-se por ser cumulativo, ou seja, as experiências em saúde bucal do paciente são apresentadas de forma acumulada ao longo de sua vida. Diante dessa premissa do indicador, juntamente com a apresentação de dados que evidenciam o aumento do CPOD e, sobretudo, com prevalência do componente “perdido”, com o passar da idade, precisamos levantar uma reflexão sobre as práticas de atenção em saúde bucal prestadas ainda nos dias de hoje. Quais mudanças são necessárias para visualizarmos uma estabilização do CPOD, em vez do seu aumento? Estaria esse aumento relacionado à falta de profissionais na Atenção Primária, na qual as ações preventivas são mais fortemente implementadas? O presente estudo não avaliou essas questões; todavia, são questões que precisam ser discutidas por estudos com diferentes desenhos metodológicos, pois, apesar de todas as mudanças que fortaleceram as Políticas de Saúde Bucal terem sido de extrema relevância, ainda não foram suficientes para alterar o quadro.
No último levantamento nacional, o CPOD dos adultos foi de 16,75, sendo que, aproximadamente, 45% eram representados pelo componente “perdido” 11 . Já o CPOD dos idosos foi de 27,53 e 91,9% foram de dentes perdidos 11 , o que mostra um aumento do índice com a idade. Esse aumento do componente perdido com o aumento da idade pode estar relacionado ao principal motivo pelo qual adultos e idosos procuram o atendimento odontológico, a dor de dente 14 , que, dependendo da gravidade do caso, a extração dentária é indicada como único tratamento. Além disso, deve-se ressaltar que, durante muitos anos, a Odontologia foi marcada por um modelo curativista, no qual predominava um tratamento odontológico cirúrgico-restaurador 22 ; portanto, a falta de dentição funcional em pessoas de maior idade pode ser herança desse antigo modelo de atenção.
Ademais, indivíduos do sexo feminino tinham menos dentição funcional. Estudos mostram que a perda dental é maior em mulheres 19,21,23-25 , situação que pode ser explicada pelo fato de que elas utilizam os serviços odontológicos com maior frequência 19,26 , o que pode acarretar um sobretratamento, levando à perda precoce do elemento dentário 19 . A avaliação das consequências da perda dentária de acordo com o gênero torna-se particularmente relevante, pois as mulheres mais jovens apresentam uma percepção mais negativa em relação à perda do elemento dental do que os homens mais velhos 27 e os profissionais devem estar atentos a esse fato, no sentindo de responder integralmente às demandas de seus pacientes.
Observou-se que quanto menor a escolaridade, maior a falta dentição funcional. Associação semelhante é observada na literatura, segundo a qual pessoas com um menor número de dentes possuem menor renda, menor escolaridade e menos acesso aos serviços de saúde 13,21,24,25,28 . O nível de escolaridade está relacionado com a consciência e o entendimento de que consultas de rotina são importantes para a prevenção das doenças, sendo que uma maior regularidade nas consultas é observada em indivíduos com maior nível de escolaridade 29,30 . Ademais, pessoas com nível socioeconômico (NSE) mais elevado e, consequentemente maior escolaridade, têm maior poder de compra de serviços 29 . Todos esses fatores podem reduzir a perda dentária. Note-se que, muitas vezes, indivíduos de baixo NSE têm, como opção de tratamento, as extrações dentárias, em vez de tratamentos mais conservadores 31 .
Dados obtidos através de levantamentos epidemiológicos como este adquirem mais significado quando se ouve o indivíduo e se conhece a sua autopercepção da necessidade de tratamento, sua autopercepção em saúde bucal e o impacto que os problemas de saúde têm na sua qualidade de vida. Os resultados mostram que a falta de dentição funcional ainda é um problema a ser enfrentado na população brasileira, inclusive na faixa etária avaliada neste estudo. Ressalta-se que os resultados do presente estudo são fundamentais para o aprimoramento de políticas de saúde bucal, como para o planejamento, a organização e o monitoramento dos serviços de saúde. Além disso, sabe-se que o país está em fase de planejamento de uma nova Pesquisa Nacional de Saúde Bucal – SBBrasil 2020 e esses dados também podem contribuir para um melhor planejamento desse novo levantamento epidemiológico.
Uma das limitações do estudo é o fato de ser um estudo transversal; portanto, as hipóteses relativas aos possíveis fatores associados à falta de dentição funcional em adultos devem ser interpretadas com cautela, não sendo possível inferir uma relação causal entre os fatores. Além disso, utilizaram-se dados secundários e não é possível fazer avaliação de outras variáveis explicativas relevantes ao desfecho.
A partir dos resultados, conclui-se que a falta de dentição funcional está associada à autopercepção da necessidade de tratamento odontológico, mostrando que aqueles que têm menos dentes na cavidade bucal não percebem que necessitam de tratamento odontológico.