versão impressa ISSN 0102-311Xversão On-line ISSN 1678-4464
Cad. Saúde Pública vol.31 no.10 Rio de Janeiro out. 2015
http://dx.doi.org/10.1590/0102-311X00065414
El objetivo del estudio fue estimar la cobertura de vacunación contra la gripe en los ancianos e identificar los factores asociados con la adherencia a la vacunación. Un estudio poblacional de corte transversal, con los datos recogidos en 2006 por el estudio Salud, Bienestar y Envejecimiento. Participaron 1.399 adultos mayores de São Paulo, Brasil. La asociación entre la adherencia a la vacuna y las variables independientes fue evaluada por razones de prevalencia, estimada por la regresión de Poisson. El auto-reporte de vacunación fue 73,8%. La vacunación antigripal fue asociada a edad avanzada, presencia de enfermedades crónicas y atención de salud en el año anterior. Fue observada una asociación negativa con la hospitalización en el año anterior. Se concluyó que era necesario fomentar la vacunación de las personas mayores con menos de 70 años y sin enfermedades crónicas y orientar a los profesionales de la salud para ampliar la cobertura en los grupos con menor participación en las campañas.
Palabras-clave: Gripe Humana; Programas de Inmunización; Vacunación Masiva; Cobertura de Vacunación; Salud del Anciano
A influenza é uma doença respiratória viral que pode causar de pequenos surtos a graves epidemias ou pandemias. Estima-se que cerca de 600 milhões de pessoas apresentem um episódio de influenza ao ano, e a sua disseminação é responsável por processos infecciosos de grande morbimortalidade no mundo, principalmente, entre grupos de maior vulnerabilidade biológica e/ou socioambientais, como os idosos e portadores de doenças crônicas de base, como cardiopatias, diabetes mellitus etc.1. No Brasil, estima-se que, aproximadamente, 22 mil pessoas de todas as faixas etárias morrem anualmente em decorrência da influenza nos períodos epidêmicos. A taxa de hospitalização por influenza e pneumonia é de 6,7 por mil habitantes, aumentando para 12,5 na população mais idosa 2.
A vacinação constitui um dos principais meios de prevenção, contribuindo para redução da mortalidade atribuível à influenza em idosos 3 e apresenta impacto indireto na diminuição das internações hospitalares e dos gastos com medicamentos para tratamento de infecções secundárias, gerando melhores resultados nos indicadores de saúde e da atenção básica 4,5. Com base nesse entendimento, o Ministério da Saúde, desde 1999, realiza campanhas nacionais de vacinação contra influenza e, atualmente, tem como meta vacinar, pelo menos, 80% dos idosos e regularizar a situação vacinal deles frente às situações de vulnerabilidades de origem imunológica. No entanto, a homogeneidade das coberturas vacinais (percentual de municípios que conseguiram atingir a meta de vacinar 80%) permanece baixa, a despeito dos benefícios conhecidos, da gratuidade da vacina e do crescente número de doses aplicadas a cada ano no país: em 2008, apenas 37,6% dos municípios (2.092 dos 5.564) vacinaram 80% ou mais dos idosos 5,6,7.
O Município de São Paulo foi o primeiro a realizar a 1a campanha de vacinação contra a influenza para pessoas com 60 anos de idade ou mais, em 1998. Naquele ano, o município atingiu cobertura de 70%, e, nos anos subsequentes, houve diminuição da cobertura vacinal (57,1% em 1999; 58,0% em 2000; 68,8% em 2001 e 63,7% em 2002), seguida de um novo aumento a partir de 2003. No entanto, esse aumento não foi suficiente para o alcance da meta estabelecida pelo Ministério da Saúde no período de 2009 a 2012, segundo os Informes Técnicos da Secretaria da Saúde de São Paulo, 1999-2013. Em 2006, ano de referência para a análise dos dados do presente estudo, observou-se que 21% da população idosa não aderiu à vacina no Município de São Paulo8.
Com relação aos fatores associados à adesão à vacina anti-influenza, alguns estudos têm mostrado relação significante com a idade, a prática de exercícios físicos e a presença de comorbidades 9,10,11,12,13,14. No entanto, ante as flutuações e diferenças na cobertura da vacinação observadas nas regiões do país, em cada período vacinal, os estudos sobre os fatores associados à adesão à vacina influenza tornam-se ferramentas importantes para o direcionamento de intervenções no sentido de ampliar a cobertura e garantir maior proteção a essa população a cada campanha. O presente estudo teve como objetivo avaliar a cobertura vacinal e investigar os fatores associados à vacinação anti-influenza em idosos não institucionalizados do Município de São Paulo.
Foi realizado estudo epidemiológico transversal de base populacional. Os dados foram provenientes do estudo Saúde, Bem-estar e Envelhecimento (SABE), um estudo longitudinal, com três etapas de coleta de dados realizadas em 2000, 2006 e 2010, coordenado por uma equipe de pesquisadores da Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo (FSP/USP). Levando em consideração ter ocorrido um surto de influenza pandêmico do tipo A em 2009 15, o que pode ter modificado, de modo relevante, a adesão à vacina em 2010, o presente estudo considerou os dados relativos ao ano de 2006.
Realizou-se estudo epidemiológico de base populacional e delineamento transversal. Os participantes foram selecionados por meio de uma amostragem estratificada, representativa dos idosos (60 anos ou mais) não institucionalizados, residentes na cidade de São Paulo. Os dados foram originalmente coletados para a segunda onda do estudo SABE, que teve início em 2000 sob os auspícios da Organização Pan-Americana da Saúde. A amostra original compreendeu o sorteio aleatório de 72 setores censitários (de um total de 263 que foram incluídos na Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística em 1995) como sendo as unidades amostrais primárias. Os domicílios foram as unidades amostrais secundárias do levantamento; eles também foram selecionados aleatoriamente, e todos os indivíduos com 60 ou mais anos de idade residindo nesses domicílios foram convidados a participar, totalizando 2.143 participantes. A cada questionário foi atribuído um peso amostral, que foi calculado como o inverso da fração amostral em cadasetor censitário.
A amostra de 2006 foi constituída pelos indivíduos originalmente incluídos na rodada de 2000 que sobreviveram, foram localizados e aceitaram uma nova participação. Além disso, a amostra foi acrescida de uma nova coorte de 298 idosos de 60-64 anos de idade, para repor o envelhecimento da base populacional do estudo e manter sua representatividade para toda a amplitude etária (60 anos e mais). Dos 2.143 participantes em 2000, foi possível entrevistar novamente 1.115 idosos em 2006. As perdas amostrais foram devidas a 649 óbitos, 178 recusas, 139 idosos não localizados, 51 mudanças para outros municípios e 11 institucionalizações. Considerando os participantes que permaneceram na coorte e os idosos que entraram na rodada de 2006, um total de 1.413 idosos foi entrevistado. Os pesos amostrais aplicados em 2000 foram recalculados de forma a garantir a representatividade da amostra de 2006 relativa à população de 60 anos ou mais do município. A técnica de amostragem do estudo SABE foi detalhada em outra publicação 16.
Todos os participantes foram entrevistados em seus próprios domicílios. Profissionais de saúde especificamente treinados aplicaram um questionário compreensivo sobre características sociodemográficas e comportamentais, sobre qualidade de vida, uso de serviços de saúde e informações clínicas, além de aplicar alguns testes físicos. Detalhes adicionais sobre a metodologia e o instrumento da coleta de dados podem ser encontrados em http://www.fsp.usp.br/sabe/.
A variável dependente foi a resposta direta à questão sobre ter ou não ter recebido a vacina influenza no ano de 2006. Para os que não foram vacinados, foi também perguntado o que motivou essa decisão.
Para avaliar os fatores associados à vacinação contra a influenza em idosos, foram utilizadas, como variáveis independentes: características demográficas [sexo (masculino, feminino), nacionalidade (brasileira, estrangeira), idade (60-69 anos, 70-79 anos, 80 ou mais), estado conjugal (com ou sem cônjuge), morar sozinho (sim ou não), cor da pele (branca, parda, preta, outras)], socioeconômicas [escolaridade (menos de quatro anos de educação formal, de quatro a sete, oito ou mais) trabalho atual (sim ou não)], condições comportamentais [ingestão de álcool, tabagismo], condições de saúde [autopercepção do estado de saúde, número de doenças crônicas autorreferidas (hipertensão arterial, diabetes, doença pulmonar crônica, doença cardíaca, doença osteoarticular), queda no último ano, depressão e restrição ao leito] e uso e acesso aos serviços de saúde (atendimento à saúde no último ano, local de atendimento e internação no último ano).
A segunda onda do estudo SABE (2006) foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa da FSP/USP, protocolo de pesquisa 1.345. Especificamente para a realização deste estudo, foi obtida a autorização dos coordenadores do estudo SABE e do Comitê de Ética em Pesquisa da FSP/USP, protocolo de pesquisa 48.308.
O estudo de associações não ajustadas foi efetuado por meio do teste de Rao-Scott, que realiza a prova de significância da associação em tabelas de dupla entrada, ajustado pelo desenho amostral, o que é recomendado para estudos com amostras complexas. A avaliação de múltiplas variáveis empregou razões de prevalências como medida de associação entre as variáveis, conforme estimadas por meio da análise de regressão de Poisson. A inclusão de variáveis no modelo múltiplo observou critérios de pertinência à análise estatística (associação significante). A análise dos dados utilizou o programa Stata 12.0 2011 (StataCorp LP, College Station, Estados Unidos), módulo survey, que permite incorporar aspectos referentes ao delineamento complexo de amostragem: estratificação não proporcional das unidades amostrais primárias e secundárias, sorteio de conglomerados e ponderação. O fator de ponderação foi definido pelo inverso da fração amostral e ajustado para que a amostra não apresentasse distorções na distribuição por grupo etário e sexo.
Foram entrevistados 1.413 idosos, dentre os quais, 14 foram excluídos, pois não sabiam (oito) ou não responderam (seis) se haviam sido vacinados contra a influenza. Desse modo, a amostra final foi composta por 1.399 indivíduos, representando 1.017.588 idosos do Município de São Paulo.
A cobertura vacinal observada foi de 73,8%. Dos idosos não vacinados, 68,2% não souberam informar ou não responderam o motivo da não adesão. O principal argumento apresentado pelos que responderam a essa questão foi o fato de não acreditarem na vacina (8,3%).
A Tabela 1 descreve a distribuição das variáveis demográficas e socioeconômicas segundo a adesão à vacina influenza em idosos em 2006. Apenas duas variáveis desse bloco (idade e trabalho atual) se associaram com a vacinação contra influenza. A prevalência de vacinação foi menor para os idosos mais jovens (p < 0,001). Foram vacinados cerca de 80% dos idosos com 70 anos ou mais; essa proporção ficou abaixo de 70% para os idosos de 60-69 anos. A prevalência de vacinação também foi menos elevada para os idosos que trabalhavam no período da coleta de dados: 68,3% contra 75,6% dos que não trabalhavam (p = 0,037).
Tabela 1 Vacinação anti-influenza em idosos (N = 1.399), segundo características demográficas e socioeconômicas. Município de São Paulo, Brasil, 2006.
Variável | Adesão à vacina anti-influenza | Valor de p * | |
---|---|---|---|
Sim (%) [n = 1.067] | Não (%) [n = 332] | ||
Sexo | 0,464 | ||
Masculino | 72,5 | 27,5 | |
Feminino | 74,7 | 25,3 | |
Nacionalidade | 0,368 | ||
Brasileira | 73,5 | 26,5 | |
Estrangeira | 79,9 | 20,1 | |
Idade (em anos) | < 0,001 | ||
60-69 | 69,5 | 30,5 | |
70-79 | 80,2 | 19,8 | |
≥ 80 | 79,4 | 20,6 | |
Escolaridade (anos) | 0,610 | ||
0-3 | 75,3 | 24,7 | |
4-7 | 73,5 | 26,5 | |
≥ 8 | 71,9 | 28,1 | |
Não sabe/Não respondeu | 49,6 | 50,4 | |
Estado conjugal | 0,481 | ||
Sim | 72,5 | 27,5 | |
Não | 75,5 | 24,5 | |
Não sabe/Não respondeu | 100,0 | - | |
Mora sozinho | 0,777 | ||
Sim | 74,7 | 25,3 | |
Não | 73,7 | 26,3 | |
Não sabe/Não respondeu | 100,0 | - | |
Cor da pele | 0,812 | ||
Branca | 73,5 | 26,5 | |
Parda | 73,3 | 26,7 | |
Preta | 72,8 | 27,2 | |
Outra | 78,2 | 21,8 | |
Não sabe/Não respondeu | 100,0 | - | |
Trabalha atualmente | 0,037 | ||
Sim | 68,3 | 31,7 | |
Não | 75,6 | 24,4 | |
Não sabe/Não respondeu | 79,0 | 21,0 |
Fonte: Lebrão & Duarte 45.
* Teste de qui-quadrado de Rao-Scott.
A Tabela 2 apresenta a relação entre características comportamentais e adesão à vacina influenza. Foi estatisticamente significante a maior proporção de vacinados entre os idosos que relataram nunca terem fumado.
Tabela 2 Vacinação anti-influenza em idosos (N = 1.399), segundo características comportamentais. Município de São Paulo, Brasil, 2006.
Variável | Adesão à vacina anti-influenza | Valor de p * | |
---|---|---|---|
Sim (%) [n = 1.067] | Não (%) [n = 332] | ||
Ingestão de álcool nos últimos três meses | 0,109 | ||
Sim | 70,1 | 29,9 | |
Não | 75,5 | 24,5 | |
Tabagismo | 0,035 | ||
Nunca fumou | 76,7 | 23,3 | |
Já fumou/Fuma | 70,7 | 29,3 |
Fonte: Lebrão & Duarte 45.
* Teste de qui-quadrado de Rao-Scott.
Os resultados relacionados às condições de saúde por meio de informação verbal foram comparados segundo a adesão ou não à vacina influenza na Tabela 3. Observa-se que os idosos que relataram ser portadores de doença crônica tiveram maior adesão à vacina contra influenza (p = 0,002).
Tabela 3 Vacinação anti-influenza em idosos (N = 1.399), segundo condições de saúde autorreferidas. Município de São Paulo, Brasil, 2006.
Variável | Adesão à vacina anti-influenza | Valor de p * | ||
---|---|---|---|---|
Sim (%) [n = 1.067] | Não (%) [n = 332] | |||
Autopercepção de saúde | 0,089 | |||
Boa | 71,6 | 28,4 | ||
Ruim | 77,1 | 22,9 | ||
Não sabe/Não respondeu | 69,2 | 30,8 | ||
Número de doenças crônicas | 0,002 | |||
0 | 64,1 | 35,9 | ||
1 | 74,0 | 26,0 | ||
2 ou mais | 77,8 | 22,2 | ||
Queda no último ano | 0,381 | |||
Sim | 76,0 | 24,0 | ||
Não | 73,0 | 27,0 | ||
Depressão | 0,948 | |||
Sim | 72,9 | 27,1 | ||
Não | 74,0 | 26,0 | ||
Não sabe/Não respondeu | 73,6 | 26,4 | ||
Restrição ao leito | 0,201 | |||
Sim | 64,1 | 35,9 | ||
Não | 74,0 | 26,0 |
Fonte: Lebrão & Duarte 45.
* Teste de qui-quadrado de Rao-Scott.
A Tabela 4 apresenta a análise de associações não ajustadas entre adesão à vacina e uso e acesso a serviços de saúde por idosos. Foi mais elevada a proporção de vacinados entre os idosos que utilizaram serviços de saúde no ano que antecedeu a aplicação do questionário. Entretanto, a internação hospitalar no ano anterior esteve associada a uma menor prevalência de vacinação. Também se observou maior adesão à vacina por parte dos participantes do estudo que foram atendidos pelo Sistema Único de Saúde (SUS), na comparação com os idosos que utilizaram serviços privados de saúde.
Tabela 4 Vacinação anti-influenza em idosos (N = 1.399), segundo uso e acesso a serviços de saúde. Município de São Paulo, Brasil, 2006.
Variável | Adesão à vacina anti-influenza | Valor de p * | ||
---|---|---|---|---|
Sim (%) n = 1.067 | Não (%) n = 332 | |||
Atendimento à saúde no ano anterior | 0,005 | |||
Sim | 75,3 | 24,7 | ||
Não | 61,2 | 38,8 | ||
Local de atendimento | 0,023 | |||
Público | 76,8 | 23,2 | ||
Privado | 73,3 | 26,7 | ||
Não sabe/Não respondeu | 63,9 | 36,1 | ||
Internação no ano anterior | 0,044 | |||
Sim | 66,9 | 33,1 | ||
Não | 74,6 | 25,4 |
Fonte: Lebrão & Duarte 45.
* Teste de qui-quadrado de Rao-Scott.
O modelo final de regressão múltipla de Poisson para explicar a adesão à vacina contra influenza em idosos foi apresentado na Tabela 5. Dentre os fatores demográficos e socioeconômicos, observa-se que apenas a idade mais elevada permaneceu como fator de predisposição associado ao desfecho. A prevalência de adesão foi 1,13 (IC95%: 1,06-1,21) e 1,11 (IC95%: 1,02-1,21) vez mais elevada para os idosos de 70-79 anos e de 80 e mais anos, respectivamente, quando comparados com aqueles de 60-69 anos. O modelo também apontou maior proporção de vacinados contra a gripe em idosos com relato de uma ou mais doenças crônicas, com atendimento à saúde no ano anterior e sem internação hospitalar no mesmo período.
Tabela 5 Modelo de regressão de Poisson final para adesão à vacina anti-influenza em idosos (N = 1.399). Município de São Paulo, Brasil, 2006.
Adesão à vacina anti-influenza | ||
---|---|---|
RP bruta | RP ajustada | |
RP (IC95%) | RP (IC95%) | |
Características demográficas * | ||
Idade (anos) | ||
60-69 | 1,00 | 1,00 |
70-79 | 1,15 (1,08-1,24) | 1,13 (1,06-1,21) |
≥ 80 | 1,14 (1,05-1,24) | 1,11 (1,02-1,21) |
Condições de saúde autorreferidas ** | ||
Número de doenças crônicas | ||
0 | 1,00 | 1,00 |
1 | 1,15 (1,03-1,30) | 1,13 (1,01-1,27) |
≥ 2 | 1,21 (1,08-1,37) | 1,18 (1,06-1,32) |
Uso e acesso de serviços de saúde *** | ||
Atendimento à saúde no ano anterior | ||
Não | 1,00 | 1,00 |
Sim | 1,23 (1,04-1,46) | 1,40 (1,08-1,80) |
Local de atendimento | ||
Privado | 1,00 | 1,00 |
Público | 1,05 (0,97-1,13) | 1,07 (0,99-1,15) |
Internação no ano anterior | ||
Não | 1,00 | 1,00 |
Sim | 0,90 (0,80-1,01) | 0,84 (0,75-0,96) |
IC95%: intervalo de 95% de confiança; RP: razão de prevalência.
Fonte: Lebrão & Duarte 45.
* Condições demográficas e socioeconômicas não ajustadas pelas demais variáveis;
** Condições de saúde autorreferidas ajustadas por condições demográficas;
*** Variáveis relativas ao uso e acesso de serviços de saúde ajustadas entre si e por características demográficas e condições de saúde autorreferidas e comportamentais.
A proporção de idosos vacinados na amostra (73,8%) é compatível com a estimativa da Secretaria Municipal de Saúde de São Paulo (SMS-SP), cujos registros evidenciam que 79% das pessoas com idade igual a 60 anos ou mais residentes na cidade foram vacinadas em 2006 8.
Apesar da pequena diferença entre as estimativas, observa-se que ambas as medidas indicam o alcance da meta proposta (acima de 70%) pelo Ministério da Saúde para o período 17. Tal diferença pode, em parte, ser devida à forma como se calculou as estimativas. No presente estudo, coletou-se o autorrelato de uma amostra representativa de idosos; a estimativa da SMS-SP baseia-se em informações administrativas sobre a quantidade de doses distribuídas e efetivamente aplicadas. O esquema de vacinação consistiu na aplicação de uma dose por pessoa com idade igual ou acima de 60 anos, institucionalizada (asilos, casas de repouso) ou não 18. Isso também pode ter influenciado na pequena diferença entre as estimativas, pois, no presente estudo, participaram apenas idosos (60 anos ou mais) não institucionalizados.
Dentre os idosos que não foram vacinados, uma elevada proporção não respondeu à pergunta sobre os motivos ou não sabia justificar essa opção. Os motivos que foram mencionados com maior frequência são análogos aos que foram relatados em estudos realizados no Brasil 12,19 e em outros países, como o Reino Unido20 e a Itália 21.
A percepção negativa sobre a vacina influenza, como a crença de que ela provocaria a gripe, foi um dos motivos relatados para justificar a não adesão à medida. Essa crença foi apontada como sendo mais prevalente entre os não vacinados 12,22. Dip & Cabrera 9 também estudaram os motivos da não adesão de idosos à vacinação e apontaram que 83,2% dos idosos não vacinados expressaram o desejo de não serem vacinados por motivos como o medo de eventos adversos e desconfiança quanto à eficácia da vacina.
No que se refere à idade, observou-se que a cobertura vacinal foi significantemente menos elevada no grupo etário dos idosos mais jovens (60-69 anos) que nos demais (70-79 anos e 80 anos ou mais). No Brasil, outros estudos encontraram resultados semelhantes 9,10,11,12,13, assim como em outros países 23,24,25. Estudos anteriores procuraram associar essa observação à melhor autopercepção de saúde que teriam os idosos mais jovens 20,26. A menor cobertura vacinal tem sido registrada nos idosos mais jovens desde os primeiros anos de campanha contra a influenza em diversos países, confirmando que a probabilidade de ser vacinado aumenta com a idade 27,28,29.
No tocante à associação entre a vacinação e o número de doenças crônicas, os achados são conflitantes 9,10,11,12,13,30. Diferente dos resultados encontrados no presente estudo, outros estudos não encontraram associação entre vacinação contra a influenza e a presença de hipertensão arterial, diabetes, doença pulmonar crônica e doença cardiovascular 9, nem com número de doenças crônicas 13. No entanto, corroborando os resultados deste estudo, pesquisas realizadas no Reino Unido 31 e nos Estados Unidos 32 revelaram que idosos com uma ou mais doenças crônicas apresentaram maior prevalência de vacinação. Além disso, estudos realizados na Coreia do Sul 24, Suécia27 e outras pesquisas multicêntricas realizadas em países europeus 33,34 verificaram que idosos com comorbidades têm maior probabilidade de receber a vacinação, aumentando significantemente as taxas de cobertura vacinal contra a influenza. Estudos realizados no Brasil identificaram associação entre vacinação anti-influenza e autorrelato de doenças crônicas 10,11,12 como hipertensão arterial e diabetes.
Uma das possíveis explicações para essa associação está no fato de que a hipertensão arterial e diabetes são condições de alta prevalência nos idosos e, possivelmente, levam-nos com maior frequência aos serviços de saúde para controle dessas doenças, para realizar consultas e receber medicamentos. Com isso, os portadores de doenças crônicas poderiam ter mais acesso às informações sobre as campanhas de vacinação em idosos e comparecer com maior frequência a elas. De acordo com a literatura, a adesão à vacinação contra a influenza em idosos está relacionada à recomendação de um profissional de saúde, além da facilidade de acesso aos serviços de saúde10,30,31,34,35. Na Espanha, Jiménes-García et al. 36 apontaram maior prevalência de vacinação contra influenza nos idosos com doença pulmonar obstrutiva crônica que consultaram o médico no ano anterior, devido à maior chance de ter recebido recomendações para se vacinarem. No Brasil, Araújo et al. 4 verificaram que idosos com comorbidades (hipertensão e diabetes) frequentaram mais os serviços de saúde e receberam mais orientações dos profissionais da atenção primária, principalmente, do enfermeiro, o que teria levado a uma maior adesão à vacinação.
Estudo realizado no Estado de São Paulo 30 demonstrou maior taxa de vacinação entre idosos com autorrelato de doenças crônicas (hipertensão arterial, diabetes e doença crônica de pulmão), residentes em municípios menos populosos. De acordo com os autores, nesses municípios, os idosos seriam mais dependentes do SUS, especialmente para a distribuição de medicamentos. Desse modo, os idosos com doenças crônicas estariam mais vinculados às unidades básicas de saúde (UBS) ou às unidades de saúde da família (USF). Com isso, estariam também mais suscetíveis a receber as recomendações dos profissionais de saúde sobre a vacinação. No entanto, vale ressaltar que, no presente estudo, não houve associação entre a cobertura vacinal e o local do último atendimento à saúde, não havendo diferenças entre atendimentos no setor público ou privado.
Quanto ao atendimento à saúde no ano antecedente à aplicação do questionário, maior prevalência de vacinação contra a influenza foi constatada entre os idosos que receberam tal assistência. Resultados semelhantes foram encontrados em outros estudos realizados no Brasil 9,13. Supõe-se que os indivíduos mais preocupados com sua saúde ou que possuem mais acesso à informação poderiam procurar mais tanto por atendimento profissional como por outros recursos, como as vacinas. De modo complementar, os idosos que mantêm relação mais próxima com os serviços de saúde têm mais chance de obter mais informações e estímulos para a vacinação12. A análise da literatura demonstra que a prática da assistência médica favorece a adesão à vacina influenza 23, e a vacinação está associada, respectivamente, à existência de um médico de referência 37 ou à recomendação da vacina por um profissional de saúde 31e a confiança nos serviços de saúde 38. A adesão à vacinação é incentivada pelo contato entre os idosos e os profissionais de saúde: consulta ao médico várias vezes ou no último ano, ser examinado por um profissional de saúde, frequentar serviços de saúde regurlamente13,22,25,39.
Outros autores confirmaram que a recomendação da vacina por médicos e enfermeiros é fator importante para promover a adesão 20,21. Burns et al.40 observaram que a adesão à vacina era maior entre os que haviam recebido orientação por parte de médicos e enfermeiros quanto à sua importância e possíveis eventos adversos.
Em relação à internação no ano anterior à aplicação do questionário, diversos estudos vêm sinalizando que a hospitalização poderia ser uma oportunidade para aplicação da vacina influenza e da pneumocócica, além de os pacientes receberem recomendação médica sobre os benefícios dessas vacinas para a prevenção da gripe severa, pneumonias, exacerbação de condições crônicas e óbitos 37,41,42. A internação hospitalar representa mais uma forma de interação com os serviços de saúde, porém observou-se associação negativa com a vacinação, corroborando os achados da literatura12. Essa relação é compatível com a hipótese de que a não adesão pode ser maior tanto entre os que acreditam poder prescindir da medida quanto entre os que receiam estar frágeis demais para recebê-la 3. Além disso, parte das hospitalizações de idosos é devida às pneumonias e a outras complicações de infecções respiratórias 41,42. Contudo, a relação entre internação hospitalar e adesão à vacina anti-influenza não foi confirmada por outros estudos diferentes realizados no país 9,10,11,13,30.
A principal limitação do presente estudo é ter se baseado exclusivamente no autorrelato dos idosos sobre sua condição vacinal. Os participantes foram interrogados se haviam sido vacinados em 2006; essa informação não foi conferida com a carteira de vacinação ou outros registros médicos e administrativos. Essa estratégia não é isenta de viés de memória; no entanto, observamos que a pergunta sobre a vacinação foi feita no mesmo ano de referência, e estudos prévios avaliaram favoravelmente a validade da informação autorreferida sobre vacinação de idosos43,44. Tendo seguido plano amostral probabilístico, os resultados podem ser considerados representativos para os idosos vivendo na comunidade, na cidade de São Paulo. No entanto, o presente estudo não pode ser generalizado para outras cidades, para idosos vivendo em instituições de longa permanência ou para outras vacinas de interesse para o grupo etário.
O presente estudo verificou que a cobertura vacinal contra a influenza em idosos residentes no Município de São Paulo, em 2006, atingiu a meta estipulada pelo Ministério da Saúde para o período, sendo que a crença de que a vacina não seria eficaz ou necessária foi o motivo mais citado para a não adesão pelos indivíduos entrevistados. A partir dos achados relativos aos fatores associados, pode-se concluir que a falta de relação entre a adesão e as variáveis socioeconômicas demonstra que não há desigualdades quanto ao acesso à vacina anti-influenza no Município de São Paulo. Além disso, o aumento da prevalência de vacinação com o aumento da idade e número de doenças indica uma adequação dos serviços para a atenção de grupos de maior risco, porém, esses resultados demonstram que o serviço de saúde ainda é mais resolutivo para a inclusão e o tratamento dos doentes ou de grupos de maior risco.
Dessa forma, o planejamento de novas campanhas deve estar atento ao desenvolvimento de estratégias que visem à inclusão de idosos mais jovens e saudáveis. Também é importante sublinhar que estudos prévios já haviam constatado ser maior a adesão à vacina entre idosos com maior interação com os serviços de saúde e entre os que utilizaram a rede pública de saúde. Para o sistema de saúde, essa constatação implica a necessidade de continuar divulgando as vantagens da vacina anti-influenza para os idosos. De modo complementar, sublinha-se a importância de procurar meios de comunicação com os idosos que, por algum motivo, não fizeram uso recente de serviços de saúde para incentivar sua adesão ao Programa Nacional de Imunizações.