versão impressa ISSN 1413-8123versão On-line ISSN 1678-4561
Ciênc. saúde coletiva vol.23 no.3 Rio de Janeiro mar. 2018
http://dx.doi.org/10.1590/1413-81232018233.03722016
O diabetes em idosos está associado a maiores taxas de morte prematura, incapacidade funcional e doenças coexistentes, tais como hipertensão, doença coronariana e acidente vascular cerebral. Além disso, contribui para as chamadas síndromes geriátricas caracterizadas pela polifarmácia, disfunção cognitiva, incontinência urinária, quedas e dor persistente1,2.
Para o controle metabólico e prevenção das complicações do diabetes é necessária uma rotina de autocuidado que envolve o uso de medicação e a adoção de hábitos de vida saudáveis (alimentação equilibrada, prática regular de atividade física, moderação no uso de álcool e abandono do tabagismo)1,3. No entanto, as mudanças de comportamentos são desafiadoras para os idosos com diabetes e serviços de saúde, resultando na não adesão em mais de 80% dos indivíduos com a doença e predispondo à ocorrência de incapacidades que impactam negativamente na sua qualidade de vida4.
A adesão é um fenômeno multidimensional5 e, segundo Leite e Vasconcelos6, corresponde à concordância entre a prescrição médica e a conduta do próprio paciente. Porém, são muitos os fatores que contribuem para a falta de adesão entre os idosos, tais como o acesso aos medicamentos, características da doença e do tratamento, apoio social, relação profissional de saúde-paciente, idade avançada, baixo poder aquisitivo, analfabetismo, depressão, ansiedade, negação ou medo da doença e as crenças relativas à saúde7.
Diante da variedade e a complexidade dos fatores que concorrem para a não adesão ao tratamento, é necessária uma abordagem individualizada do profissional responsável pela assistência, contemplando as singularidades de cada situação7,8. Desse modo, estudos que identifiquem as prevalências de adesão às diferentes modalidades de tratamento para o controle glicêmico e os fatores associados são importantes para direcionar ações individuais e coletivas de atenção à saúde ao segmento mais envelhecido da sociedade. Neste contexto, este estudo buscou investigar os fatores associados à adesão terapêutica em idosos diabéticos assistidos na atenção primária de saúde.
Estudo observacional-seccional, desenvolvido no Núcleo de Atenção ao Idoso (NAI) da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), serviço gerontogeriátrico de natureza ambulatorial. A amostra foi do tipo conveniência, constituída por 244 idosos diabéticos, de ambos os sexos, que ingressaram no serviço no período de janeiro de 2006 a dezembro de 2010. Comprometimento de comunicação e/ou cognição registrado no prontuário, idosos com dificuldade ou impossibilidade de locomoção, devido à fraqueza muscular, problemas articulares, dores ou condições neurológicas que restringisse o acesso ao ambulatório foram adotados como critérios de exclusão.
As perdas registradas em decorrência de óbito (15), recusa em participar do estudo (21) e registro incorreto do endereço e/ou número do telefone no prontuário (58) contribuíram para a composição final da amostra equivalente a 150 idosos diabéticos.
A coleta de dados ocorreu nos meses de fevereiro a setembro de 2011, por meio de roteiro estruturado com questões fechadas, sendo as entrevistas realizadas por acadêmicos dos cursos de fisioterapia e enfermagem, que receberam treinamento para a aplicação do instrumento e foram avaliados e reciclados durante todo o período da pesquisa.
A variável dependente correspondeu à adesão terapêutica referida, a qual corrobora com as Diretrizes para o Tratamento e Acompanhamento do Diabetes Mellitus9. Neste estudo, a adesão integral correspondeu à resposta positiva nas perguntas relacionadas ao uso de medicamentos (hipoglicemiantes orais e/ou insulina), conforme prescrição médica (exceto os que não possuíam medicação prescrita para o diabetes), prática regular de exercício físico aeróbico e/ou de resistência, frequência mínima de três vezes na semana e duração mínima de 30 minutos por sessão ou 150 minutos/semana contínuos, conforme recomendações das Diretrizes da Sociedade Brasileira de Diabetes9 e controle alimentar. Os idosos que referissem não ter medicação prescrita para o diabetes, a adesão integral foi considerada quanto à prática regular de atividade física e controle alimentar. A adesão parcial foi definida por resposta positiva em uma das perguntas (uso de medicamentos, atividade física regular e controle alimentar) e não adesão definida por resposta negativa nas três perguntas.
As variáveis independentes selecionadas para análise foram: características sociodemográficas (sexo, idade, escolaridade, situação conjugal, arranjo familiar, situação previdenciária, renda mensal do idoso, contribuição para o sustento da casa); condições de saúde e fatores relacionados ao tratamento (autopercepção de saúde, tempo de diagnóstico do diabetes, tempo de tratamento, medicamentos prescritos pelo médico utilizados para o diabetes, meio de aquisição da medicação, presença de efeito colateral, percepção quanto ao uso diário dos medicamentos, uso de chás antidiabéticos em substituição aos medicamentos); percepção da doença (conhecimento sobre a doença, tipos de tratamento - categorizado em nenhum, básico [medicação ou dieta ou exercício físico], moderado [medicação e dieta ou medicação e exercício físico ou dieta e exercício físico], avançado [medicação, dieta e exercício físico], percepção sobre a ocorrência de complicações, crenças no uso dos medicamentos, seguimento da dieta e prática de atividade física para o controle da doença, crenças na mensuração do nível glicêmico e mudanças na rotina de vida com o tratamento); suporte social (apoio social avaliado através do APGAR da Família10, cuja denominação representa um acrônimo em inglês, derivado dos domínios: Adaptation [adaptação], Partnership [companheirismo], Growth [desenvolvimento], Affection [afetividade] e Resolve [capacidade resolutiva], relação profissional/equipe de saúde-paciente investigada por meio da confiança no médico e na equipe multiprofissional, entendimento das explicações sobre o diabetes, esclarecimento de dúvidas sobre o tratamento no momento da consulta, profissional responsável pelas orientações sobre o tratamento e participação em grupos educativos para diabetes).
Para a análise dos dados, foi utilizado o programa Statistical Package for Social Sciences (SPSS) for Windows, versão 17.0. A associação entre as variáveis independentes e a adesão terapêutica foi examinada através da análise bivariada pelos testes Qui-Quadrado de Independência de Pearson ou o teste Exato de Fisher, este último, quando os resultados não atendiam aos requisitos para a aplicação do primeiro teste, ambos com nível de significância de 5% e intervalos de 95% de confiança.
Na análise multivariada foi utilizado o modelo de regressão multinomial com a inclusão de todas variáveis com p < 0,20 e permaneceram no modelo final as variáveis com p < 0,05. Os resultados foram interpretados em termos de Razão de Chances (Odds Ratio) e respectivos Intervalos de Confiança (IC), calculados para cada variável estatisticamente significativa (p ≤ 0,05).
O protocolo de pesquisa foi aprovado pelo Comitê de Ética e Pesquisa do Centro de Ciências da Saúde da Universidade Federal de Pernambuco. Os entrevistados realizaram a assinatura ou impressão digital do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, no qual eram explicados os objetivos da pesquisa e as informações solicitadas, garantida a confidencialidade das informações obtidas.
Dos 150 idosos diabéticos entrevistados, 73,3% eram do sexo feminino, 54,7% estavam na faixa de 60 a 69 e apenas 10,6% tinham acima de 80 anos. Verificou-se que 51,3% viviam com companheiro e 60,0% com cônjuge e familiares. No que se refere à escolaridade, 58,7% possuíam até 8 anos de estudo. Foi visto que 73,3% eram aposentados, 52,7% recebiam de 1 a 2 salários-mínimos e 66,0% contribuíam totalmente para o sustento da casa (Tabela 1).
Tabela 1 Adesão terapêutica segundo fatores socioeconômicos e demográficos de idosos diabéticos na atenção primária de saúde. Recife, PE, 2011.
Variável | Adesão terapêutica | p - valor | ||||||
---|---|---|---|---|---|---|---|---|
| ||||||||
Total (n = 150) | Integral (n = 41; 27,3%) | Parcial (n = 100; 66,7%) | Não adesão (n = 9; 6,0%) | |||||
| ||||||||
n (%) | n | % | n | % | n | % | ||
Sexo | ||||||||
Masculino | 40 (26,7) | 10 | 25,0 | 26 | 65,0 | 4 | 10,0 | 0,453* |
Feminino | 110 (73,3) | 31 | 28,2 | 74 | 67,3 | 5 | 4,5 | |
Faixa etária (anos) | ||||||||
60 a 69 | 82 (54,7) | 27 | 32,9 | 51 | 62,2 | 4 | 4,9 | 0,364** |
70 a 79 | 52 (34,7) | 11 | 21,2 | 38 | 73,1 | 3 | 5,8 | |
80 ou mais | 16 (10,6) | 3 | 18,8 | 11 | 68,8 | 2 | 12,5 | |
Situação conjugal | ||||||||
Com companheiro | 77 (51,3) | 17 | 22,1 | 55 | 71,4 | 5 | 6,5 | 0,484** |
Sem companheiro | 73 (48,7) | 24 | 32,9 | 45 | 61,6 | 4 | 5,5 | |
Arranjo familiar | ||||||||
Mora sozinho(a) | 27(18,0) | 11 | 40,7 | 15 | 55,6 | 1 | 3,7 | 0,197** |
Somente com cônjuge | 33(22,0) | 9 | 27,3 | 20 | 60,6 | 4 | 12,1 | |
Cônjuge + familiares | 90(60,0) | 21 | 23,3 | 65 | 72,2 | 4 | 4,4 | |
Ano de estudo | ||||||||
≤ 8 anos | 88 (58,7) | 20 | 22,7 | 64 | 72,8 | 4 | 4,5 | 0,696** |
> 8 anos | 62 (41,3) | 21 | 33,9 | 36 | 58,0 | 5 | 8,1 | |
Situação previdenciária | ||||||||
Aposentado (a) | 110 (73,3) | 28 | 25,4 | 75 | 68,2 | 7 | 6,4 | 0,869** |
Não é aposentado (a)a | 40 (26,7) | 13 | 32,5 | 25 | 62,5 | 2 | 5,0 | |
Renda mensal idoso (SM)b | ||||||||
< 1 | 18 (12,0) | 5 | 27,8 | 12 | 66,7 | 1 | 5,6 | 0,805(2) |
1 - 2 | 79 (52,7) | 20 | 25,3 | 55 | 69,6 | 4 | 5,1 | |
2 - 4 | 29 (19,3) | 10 | 24,5 | 18 | 62,1 | 1 | 3,4 | |
≥ 4 | 24 (16,0) | 6 | 25,0 | 15 | 62,5 | 3 | 12,5 | |
Contribuição no sustento da casa | ||||||||
Sim, totalmente | 99 (66,0) | 29 | 29,3 | 63 | 63,6 | 7 | 7,1 | 0,841** |
Sim, parcialmente | 39 (26,0) | 10 | 25,6 | 27 | 69,2 | 2 | 5,1 | |
Não | 12 (8,0) | 2 | 16,7 | 10 | 83,3 | - | - |
a Pensionista e não aposentado; b SM (salário-mínimo) vigente à época da pesquisa (em reais) = R$ 545,00. * Teste Qui-quadrado de Pearson. ** Teste Exato de Fisher.
Analisando-se a adesão referida tem-se que 78,7% faziam uso regular de medicamentos para diabetes, seguidos de 16,0% que não tinham indicação para medicação. Apenas 38,7% praticavam atividade física regularmente e 60,0% seguiam recomendações nutricionais prescritas por médico ou nutricionista. Avaliando-se o seguimento terapêutico referido dos idosos diabéticos, a adesão parcial foi predominante (66,7% dos participantes), seguido de 27,3% de adeptos integrais e 6,0% restante de não adeptos (Tabela 1).
Na análise bivariada, as variáveis associadas à adesão terapêutica referida foram: autopercepção da saúde (p = 0,038), crenças no uso dos remédios para controlar o diabetes (p = 0,001), entendimento das explicações sobre o diabetes (p = 0,005) e profissional responsável pelas orientações sobre o tratamento (p = 0,028) (Tabelas 2, 3 e 4).
Tabela 2 Adesão terapêutica segundo as condições de saúde e fatores relacionados ao tratamento de idosos diabéticos na atenção primária de saúde. Recife, PE, 2011.
Variável | n (%) | Adesão terapêutica | p valor | |||||
---|---|---|---|---|---|---|---|---|
| ||||||||
Integral | Parcial | Não adesão | ||||||
| ||||||||
n | % | n | % | n | % | |||
Autopercepção da saúde | ||||||||
Excelente a boa | 39 (26,0) | 15 | 38,5 | 21 | 53,8 | 3 | 7,7 | 0,038* |
Regular | 93 (62,0) | 24 | 25,8 | 66 | 71,0 | 3 | 3,2 | |
Ruim | 18 (12,0) | 2 | 11,1 | 13 | 72,2 | 3 | 16,7 | |
Tempo de diagnóstico | ||||||||
≤ 5 anos | 50 (33,3) | 15 | 30,0 | 30 | 60,0 | 5 | 10,0 | 0,524* |
6 a 10 anos | 35 (23,3) | 10 | 28,6 | 23 | 65,7 | 2 | 5,7 | |
≥ 11 anos | 65 (43,3) | 16 | 24,6 | 47 | 72,3 | 2 | 3,1 | |
Tempo de tratamento farmacológico | ||||||||
< 5 anos | 44 (34,9) | 12 | 27,3 | 30 | 68,2 | 2 | 4,5 | 0,676* |
5 -10 anos | 33 (26,2) | 9 | 27,3 | 23 | 69,7 | 1 | 3,0 | |
≥ 10 anos | 49 (38,9) | 12 | 24,5 | 37 | 75,5 | - | - | |
Tempo de tratamento não farmacológicob | ||||||||
< 5 anos | 54 (48,2) | 22 | 40,7 | 32 | 59,3 | - | - | 0,654** |
5 - 10 anos | 26 (23,2) | 8 | 30,8 | 18 | 69,2 | - | - | |
≥ 10 anos | 32 (28,6) | 11 | 34,4 | 21 | 65,6 | - | - | |
Medicamento para Diabetesc | ||||||||
Hipoglicemiante oral | 107 (84,9) | 26 | 24,3 | 78 | 72,9 | 3 | 2,8 | 0,471* |
Insulina | 9 (7,1) | 2 | 22,2 | 7 | 77,8 | - | - | |
Hipoglicemiante oral e insulina | 10 (7,9) | 5 | 50,0 | 5 | 50,0 | - | - | |
Aquisição de medicamento para Diabetesc | ||||||||
Totalmente pelo SUS | 67 (53,2) | 18 | 26,9 | 46 | 68,7 | 3 | 4,5 | 0,448* |
Parcialmente pelo SUS | 23 (18,2) | 8 | 34,8 | 15 | 65,2 | - | - | |
Recursos próprios | 36 (28,6) | 7 | 19,4 | 29 | 80,6 | - | - | |
Relato de efeito colateralc | ||||||||
Sim | 29 (23,0) | 5 | 17,2 | 22 | 75,9 | 2 | 6,9 | 0,097* |
Não | 97 (77,0) | 28 | 28,9 | 68 | 70,1 | 1 | 1,0 | |
Percepção quanto ao uso dos medicamentos todos os dias?c | ||||||||
Bom | 61 (48,4) | 18 | 29,5 | 42 | 68,9 | 1 | 1,6 | 0,841* |
Indiferente | 38 (30,2) | 8 | 21,1 | 29 | 76,3 | 1 | 2,6 | |
Ruim/Péssimo | 27 (21,4) | 7 | 25,9 | 19 | 70,4 | 1 | 3,7 | |
Uso de chás antidiabéticos em substituição aos medicamentosc | ||||||||
Sim | 5 (4,0) | 1 | 20,0 | 4 | 80,0 | - | - | 1,000* |
Não | 121 (96,0) | 32 | 26,4 | 86 | 71,1 | 3 | 2,5 |
* Teste Exato de Fisher. ** Teste Qui-quadrado de Pearson. b Ajustado para indivíduos que auto-relataram prática de atividade física e/ou seguimento nutricional. c Ajustado para indivíduos que tinham medicação prescrita para diabetes.
Tabela 3 Adesão terapêutica segundo a percepção da doença de idosos diabéticos na atenção primária de saúde. Recife, PE, 2011.
Variável | Adesão terapêutica | p - valor | ||||||
---|---|---|---|---|---|---|---|---|
| ||||||||
n (%) | Integral | Parcial | Não adesão | |||||
| ||||||||
n | % | n | % | n | % | |||
O Diabetes é uma doença que tem cura? | ||||||||
Sim | 22(14,7) | 8 | 36,4 | 12 | 54,5 | 2 | 9,1 | 0,417* |
Não | 128(85,3) | 33 | 25,8 | 88 | 68,8 | 7 | 5,5 | |
Conhece os tipos de tratamento? | ||||||||
Nenhum | 28 (18,7) | 5 | 17,9 | 21 | 75,0 | 2 | 7,1 | 0,292** |
Básico | 25 (16,7) | 5 | 20,0 | 19 | 76,0 | 1 | 4,0 | |
Moderado | 48 (32,0) | 11 | 22,9 | 34 | 70,8 | 3 | 6,3 | |
Avançado | 49 (32,7) | 20 | 40,8 | 26 | 53,1 | 3 | 6,1 | |
Acha que traz complicações | ||||||||
Sim | 146(97,3) | 40 | 27,4 | 97 | 66,4 | 9 | 6,2 | 1,000** |
Não | 4(2,7) | 1 | 25,0 | 3 | 75,0 | - | - | |
Conhece dois órgãos que podem ser atingidos | ||||||||
Sim | 82 (54,7) | 24 | 29,3 | 53 | 64,6 | 5 | 6,1 | 0,888** |
Não | 68 (45,3) | 17 | 25,0 | 47 | 69,1 | 4 | 5,9 | |
Crença nos medicamentos para controlar o Diabetes? | ||||||||
Usa e acredita nos medicamentos | 125(83,3) | 33 | 26,4 | 89 | 71,2 | 3 | 2,4 | 0,001** |
Usa e não acredita nos medicamentos | 7 (4,7) | 3 | 42,9 | 3 | 42,9 | 1 | 14,3 | |
Não faz uso de medicamento | 18 (12,0) | 5 | 27,8 | 8 | 44,4 | 5 | 27,8 | |
Crença na dieta e atividade física para controlar o Diabetes? | ||||||||
Sim | 144(96,0) | 41 | 28,5 | 95 | 66,0 | 8 | 5,6 | 0,171** |
Não | 6 (4,0) | - | - | 5 | 83,3 | 1 | 16,7 | |
Preocupação em verificar o nível de glicose no sangue | ||||||||
Sim | 104(69,3) | 29 | 27,9 | 71 | 68,3 | 4 | 3,8 | 0,248* |
Não | 46 (30,7) | 12 | 26,1 | 29 | 63,0 | 5 | 10,9 | |
Mudanças na rotina com o tratamento | ||||||||
Sim | 76 (50,7) | 23 | 30,3 | 50 | 65,8 | 3 | 3,9 | 0,453** |
Não | 74 (49,3) | 18 | 24,3 | 50 | 67,6 | 6 | 8,1 |
* Teste Qui-quadrado de Pearson. ** Teste Exato de Fisher.
Tabela 4 Adesão terapêutica segundo o suporte social de idosos diabéticos na atenção primária de saúde. Recife, PE, 2011.
Variável | Adesão terapêutica | p - valor | ||||||
---|---|---|---|---|---|---|---|---|
| ||||||||
n (%) | Integral | Parcial | Não adesão | |||||
| ||||||||
n | % | n | % | n | % | |||
APGAR da família | ||||||||
Elevada disfunção familiar | 17(11,3) | 2 | 11,8 | 13 | 76,5 | 2 | 11,8 | 0,177* |
Moderada disfunção familiar | 21(14,0) | 8 | 38,1 | 11 | 52,4 | 2 | 9,5 | |
Boa funcionalidade familiar | 112(74,7) | 31 | 27,7 | 76 | 67,9 | 5 | 4,5 | |
Confiança no médico | ||||||||
Sim | 44(96,0) | 39 | 27,1 | 96 | 66,7 | 9 | 6,3 | 1,000* |
Não | 6 (4,0) | 2 | 33,3 | 4 | 66,7 | - | - | |
Confiança na equipe de profissionais | ||||||||
Sim | 146(97,3) | 39 | 26,7 | 98 | 67,1 | 9 | 6,2 | 0,673* |
Não | 4 (2,7) | 2 | 50,0 | 2 | 50,0 | - | - | |
Entendimento das explicações sobre o Diabetes | ||||||||
Sim | 117(78,0) | 36 | 30,8 | 78 | 66,7 | 3 | 2,6 | 0,005* |
Não | 18 (12,0) | 2 | 11,1 | 14 | 77,8 | 2 | 11,1 | |
Não recebe explicações | 15(10,0) | 3 | 20,0 | 8 | 53,3 | 4 | 26,7 | |
Esclarecimento de dúvidas sobre o tratamento durante a consulta | ||||||||
Sim | 131(87,3) | 37 | 28,2 | 87 | 66,4 | 7 | 5,3 | 0,587** |
Não | 19 (12,7) | 4 | 21,1 | 13 | 68,4 | 2 | 10,5 | |
Profissional que orienta sobre o tratamento | ||||||||
Médico | 122(81,3) | 33 | 27,0 | 85 | 69,7 | 4 | 3,3 | 0,028* |
Enfermeiro | 1 (0,7) | - | - | 1 | 100,0 | - | - | |
Nutricionista | 10 (6,7) | 4 | 40,0 | 6 | 60,0 | - | - | |
Agente Comunitário de Saúde | 5 (3,3) | 1 | 20,0 | 3 | 60,0 | 1 | 20,0 | |
Médico e nutricionista | 3 (2,0) | 1 | 33,3 | 1 | 33,3 | 1 | 33,3 | |
Não recebe orientações sobre o tratamento | 9 (6,0) | 2 | 22,2 | 4 | 44,4 | 3 | 33,3 | |
Participação em grupos educativos para o Diabetes | ||||||||
Nunca participou | 120(80,0) | 30 | 25,0 | 82 | 68,3 | 8 | 6,7 | 0,389* |
Participou | 30(20,0) | 11 | 36,7 | 18 | 60,0 | 1 | 3,3 |
* Teste Qui-quadrado de Pearson. ** Teste Exato de Fisher.
Na análise multinomial, a variável “Crença nos medicamentos para controlar o diabetes” foi significativa ao comparar a não adesão com adesão integral (OR = 9,65; IC95% 1,6;56,6), e não adesão com adesão parcial (OR = 18,15; IC95% 3,5;95,4), no ajuste do modelo final. Assim, o idoso diabético que toma e acredita que os medicamentos controlam o diabetes tem 9,65 vezes a mais de chances em atingir uma adesão integral ao tratamento quando comparado ao idoso que não faz uso de medicamentos e não adere ao tratamento. Em contrapartida, o idoso diabético que toma e acredita que os medicamentos controlam a doença, tem 18,15 vezes a mais de chances em atingir uma adesão parcial ao tratamento quando comparado ao idoso que não adere. O teste da razão da verossimilhança foi significativo (p = 0,003) indicando que o modelo proposto pode ser utilizado (Tabela 5).
Tabela 5 Fatores associados à adesão terapêutica de idosos diabéticos segundo modelo de regressão logística multinomial na atenção primária de saúde. Recife, PE, 2011.
Variáveis | Não Adesão x Adesão Integral | |||
---|---|---|---|---|
| ||||
Modelo Bruto | Modelo Ajustado* | |||
| ||||
OR (IC95%) | p-valor | OR (IC95%) | p-valor | |
Crença nos medicamentos para controlar o Diabetes | ||||
Usa e acredita nos medicamentos | 11,00 (2,0-61,0) | 0,006 | 9,65 (1,6-56,6) | 0,012 |
Usa e não acredita nos medicamentos | 3,00 (0,2-39,6) | 0,834 | 2,83 (0,2-41,2) | 0,444 |
Não faz uso de medicamentosa | 1,00 | - | 1,00 | - |
| ||||
Variáveis | Não Adesão x Adesão Parcial | |||
| ||||
Modelo Bruto | Modelo Ajustado* | |||
| ||||
OR (IC95%) | p-valor | OR (IC95%) | p-valor | |
| ||||
Crença nos medicamentos para controlar o Diabetes | ||||
Usa e acredita nos medicamentos | 18,54 (3,7-92,1) | < 0,001 | 18,15 (3,5-95,4) | 0,001 |
Usa e não acredita nos medicamentos | 1,88 (0,2-23,4) | 0,488 | 1,89 (0,1-25,4) | 0,630 |
Não faz uso de medicamentosa | 1,00 | - | 1,00 | - |
*Modelo ajustado para as variáveis: autopercepção da saúde, entendimento das explicações sobre o diabetes e profissional que orienta sobre o tratamento; a Categoria de Referência da variável; Teste da razão de verossimilhança (p - valor = 0,003); Poder de predição = 68,7%.
A adesão integral à terapêutica para o diabetes foi baixa entre os idosos diabéticos entrevistados. Resultado semelhante também foi observado em estudo realizado com pessoas com diabetes tipo 2 no sudeste do Brasil11 e na zona urbana e rural dos sete estados da República mexicana12.
Apesar de prevalente, a adesão terapêutica medicamentosa mostrou-se abaixo do recomendado de 80%6. Revisão sistemática destaca que o baixo seguimento à terapêutica medicamentosa em idosos é decorrente da complexidade dos esquemas medicamentosos, atrelada à falta de entendimento, esquecimento, diminuição da acuidade visual e destreza manual13. Resultado consonante também foi encontrado na cidade de Bagé/RS, em que a baixa adesão esteve associada à idade, ausência de plano de saúde, compra de medicamentos, uso de mais de três medicamentos e incapacidade instrumental para a vida diária14.
A prática regular de atividade física e o seguimento nutricional também não se mostraram adequados. A mudança no estilo de vida faz parte do tratamento para as doenças crônicas, porém os hábitos são comportamentos sociais e culturalmente construídos ao longo da vida, envoltos em aspectos simbólicos que materializam a tradição na forma de ritos e tabus, sendo de difícil modificação.
Franchi et al.15 comparando a prática de atividade física em 88 idosos diabéticos e não-diabéticos, observaram que aproximadamente metade dos participantes dos dois grupos não praticava nenhuma atividade física, dados estes que corroboram com o encontrado neste estudo. Diversas barreiras contribuem para a inatividade física entre os idosos, com destaque para os problemas de saúde e os compromissos familiares16. Contudo, sabe-se que a redução progressiva da aptidão física e da força muscular contribui para a perda da autonomia e capacidade funcional nessa fase da vida, tornando-se prevenível com a prática regular de atividade física17. Desse modo, é necessária a adoção de programas públicos de incentivo a prática de atividade física, que considerem os espaços comunitários, as possibilidades e limitações do idoso ao tipo de exercício, além do esclarecimento acerca das contribuições da atividade física para a saúde biopsicossocial do idoso16,18.
Além da prática de atividade física, o seguimento de um plano alimentar é de extrema importância para o controle glicêmico1,3. Na avaliação do seguimento nutricional no diabetes, Broadbent et al.19 identificaram que a adesão esteve associada à menor ocorrência de complicações, maior controle pessoal e do tratamento, menos sintomas e transtornos emocionais. Nesse sentido, as orientações dietoterápicas devem ser individualizadas, com base nas preferências, cultura, tradições e metas metabólicas, com ênfase em escolhas alimentares saudáveis20.
A autopercepção da saúde atual esteve associada à adesão terapêutica nessa investigação, concordando com estudo realizado no sudeste do Brasil21. Esta variável representa a forma como o indivíduo vê seu estado e compreende sua enfermidade, sendo considerado marcador de risco de mortalidade. Segundo Fonseca et al.22, ao definir sua saúde como boa ou razoável, o idoso não se caracteriza como pessoa livre de doenças, mas como sujeito autônomo e capaz de agir sobre o ambiente. Neste estudo, o idoso que autopercebe a sua saúde como regular desempenha uma maior rotina de cuidados com a doença em relação ao que a autoavalia como ruim. Resultado semelhante também foi encontrado por Luz et al.23 ao identificar que a prevalência de não adesão esteve associada à pior autopercepção de saúde.
As informações recebidas e o entendimento das explicações sobre o diabetes influenciam o comportamento dos indivíduos ao decidirem em seguir ou não à terapêutica prescrita para o diabetes24. A falta de conhecimento sobre a doença e a inadequada capacitação e integração dos profissionais de saúde estão associadas a não adesão ao tratamento, sendo necessária a incorporação de novas tecnologias nos serviços de saúde, a fim de instrumentalizar e motivar os indivíduos com o diabetes para a mudança comportamental25.
O médico foi o profissional responsável pelas orientações sobre o tratamento do diabetes por meio de consultas individuais, porém a adesão parcial foi predominante entre os entrevistados. Leite e Vasconcelos6 afirmam que a adesão ao tratamento não é determinada exclusivamente pelo poder do médico de fazer o cliente seguir a prescrição. Porém, certas atitudes do prescritor, tais como: linguagem, tempo dispensado para a consulta, respeito aos questionamentos e motivação para o cumprimento da terapia podem interferir na adesão terapêutica. Contudo, no presente estudo, não foi avaliado como os profissionais de saúde passavam a informação aos idosos, sendo esse um dos fatores limitantes.
A crença do idoso sobre a utilização do medicamento para o controle do diabetes apresentou associação positiva tanto no modelo bivariado como multivariado, corroborando aos resultados encontrados por outros autores5,7. A adesão medicamentosa para o controle glicêmico envolve crenças comportamentais, normativas e de controle que devem ser consideradas na avaliação dos determinantes do comportamento26.
Estudo de Coorte conduzido com indivíduos diabéticos tipo 2 na cidade de Boston, Estados Unidos, concluiu que a crença nos medicamentos para a melhora dos sintomas e proteção para a saúde no futuro esteve associada a maiores taxas de adesão ao medicamento, quando comparado àqueles indivíduos descrentes27. Desse modo, destaca-se a importância de considerar os conceitos, convicções e atitudes dos idosos relacionadas à saúde e às práticas de cuidado.
Como limitações do estudo, encontra-se o uso de roteiro estruturado, sujeito a distorções e tendenciosidades do entrevistador; análise da adesão ter sido realizada apenas sob o ponto de vista do relato do idoso diabético quanto à terapêutica prescrita, o que difere de outros estudos que avaliaram a adesão por meio do controle glicêmico12,15; uso da medida de associação Odds Ratio, considerando que os estudos transversais utilizam a medida razão de prevalência, porém a aferição da adesão sob os três aspectos (integral, parcial e não adesão) só foi possível utilizando o Modelo Multinomial, optando-se por trabalhar com o Odds Ratio apesar do risco da sobrestimação; escassez de estudos internacionais e nacionais relacionados a adesão em idosos diabéticos sob os três aspectos estudados, dificultando a comparação com outros achados voltados a este segmento, comprovando a necessidade de outros estudos nessa temática com o público mais envelhecido.
Os achados apontam a necessidade de ações que incentivem a mudança comportamental, para a adoção de estilos de vida saudáveis e o desenvolvimento de estudos adicionais, para melhor definir o papel das crenças em saúde e as práticas de cuidados nesta população. Além disso, infere-se que o desenho de práticas educativas com metodologias ativas baseadas na reflexão e respeito à autonomia e individualidade dos idosos diabéticos possibilite a promoção das atividades de autocuidado para o controle glicêmico.