versão impressa ISSN 1414-8145versão On-line ISSN 2177-9465
Esc. Anna Nery vol.21 no.3 Rio de Janeiro 2017 Epub 01-Jun-2017
http://dx.doi.org/10.1590/2177-9465-ean-2016-0094
O transtorno mental comum (TMC) ocasiona implicações e variações multifatoriais, nas dimensões biopsicossociais, em que os sintomas advindos dessa classificação nosográfica elevam a incapacidade funcional dos indivíduos.1
Tais modificações envolvem alterações dos pensamentos, sentimentos, comportamento e de relacionamento interpessoal. O TMC refere-se a um grupo de doenças mentais, formado por depressão, transtorno de ansiedade generalizada, transtorno do pânico, fobias, transtorno de ansiedade social, transtorno obsessivo-compulsivo e transtorno de estresse pós-traumático.1
A prevalência mundial de TMC na população geral é de 29,2%,2 com maior prevalência no sexo feminino,2 justificada por mudanças do papel da mulher na sociedade que lhe implicam atribuições que se sobrepõem, como atividades domésticas e familiares e, práticas de trabalho para a manutenção financeira da família.3 Associado a estas questões sociais, está o fato de a mulher também ser mais vulneráveis aos TMC, que constituem um grupo de transtornos em que os dados epidemiológicos apontam prevalência mais elevada para o sexo feminino, como a ansiedade e os transtornos do humor.4
Nesse ínterim, têm-se determinadas fases da vida feminina que podem agregar fatores que reforçam a maior predisposição ao TMC, em especial o período gestacional, em que a mulher vivencia mudanças físicas, psíquicas, sociais, culturais.5 Como exemplo, observam-se as alterações hormonais e autônomas, que podem intensificar os sinais e os sintomas de depressão e ansiedade. Assim, o TMC na gestação é uma realidade a ser admitida e, associa-se com maiores chances às variáveis de baixa idade e escolaridade, renda socioeconômica desfavorável, situação conjugal e desemprego.3,6,7
Outros fatores também associados são viver sem companheiro, gravidez planejada, idade gestacional e intercorrências na gestação.3,5,6,8 Este estudo se justifica ao considerar a probabilidade de TMC nesta fase especial da mulher. Nesta perspectiva, o objetivo deste estudo foi estimar a prevalência de probabilidade de transtorno mental comum em gestantes e os fatores associados.
Estudo de transversal, quantitativo e descritivo realizado em um serviço de saúde especializado no atendimento ginecológico e obstétrico, localizado na região Central do Brasil em um município de médio porte e de relevância econômica regional. Os dados foram coletados de junho de 2014 a abril de 2015.
O tamanho da amostra foi estimado a partir da população de 566 gestantes cadastradas no Centro de Atenção à Saúde da Mulher e prevalência antecipada de 18,28% de abuso de álcool e drogas no período gestacional;9 do efeito de desenho de 1,0; do nível de significância de 95%; e do intervalo de confiança de 99%. Ao valor gerado, agregaram-se 20% para perdas amostrais, resultando em 361 mulheres entrevistadas.
Os critérios de inclusão foram gestantes cadastradas no referido serviço, independente do período de gestação e de sua idade (se menores de idades, acompanhadas pelo responsável), e que estavam no local para realizar as consultas de pré-natal. Foram excluídas as gestantes com diagnóstico de Transtorno Mental Grave e Persistente (transtornos psicóticos e transtorno afetivo bipolar) e as menores de idades desacompanhadas.
As participantes foram convidadas e orientadas quanto à pesquisa e assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido ou Termo de Assentimento (para menores de 18 anos). Os dados foram obtidos a partir de entrevista face a face com a gestante em local privativo no próprio serviço, enquanto aguardavam a consulta pré-natal, ou na Unidade Básica de Saúde próxima à sua residência.
Aplicou-se questionário sobre as características sociodemográficas e da gestação e, por fim, o Self-Report Questionnaire 20 (SRQ-20). O teste piloto foi realizado com seis gestantes somente para adequação dos instrumentos, as quais não fizeram parte da amostra final. Os pesquisadores de campo foram alunos do curso de enfermagem, capacitados em 12 horas de treinamento e supervisionados durante todo o processo de coleta de dados por docentes enfermeiros e um psicólogo.
O instrumento SRQ-20 é breve e autoaplicável, indicado para Atenção Primária, cuja finalidade rastreia a possibilidade de TMC (não psicóticos) como episódios de alteração do humor, transtornos de humor, transtornos somatoformes e ansiedade. As respostas são referentes aos últimos 30 dias, dicotomizadas em sim ou não, e o escore final é obtido pela somatória das respostas afirmativas, em que cada questão recebe 1 ponto. Os escores obtidos variam de zero (nenhuma probabilidade) a 20 (extrema probabilidade). Validado no Brasil, a pontuação de corte para TMC para ambos os sexos é sete ou mais respostas afirmativas.10
A variável desfecho do estudo foi a probabilidade de TMC, indicada pelo escore ≥7 pelo SRQ-20. As variáveis de predição foram: idade, categorizada em >24 anos e ≤24 anos; anos de estudo, indicados por ≥10 anos e <10 anos; estado civil, sinalizado por "vive com companheiro" (casadas, vive com alguém ou união estável) ou "vive sem companheiro" (solteiras, viúvas, separadas ou divorciadas); renda familiar (≤R$1.581,09 e >R$1.581,09); número de pessoas que residem na casa (>3 ou ≤3); antecedentes familiares psiquiátricos identificados por alguém que a gestante considere como familiar; se já fez ou faz tratamento na área de saúde mental (psiquiatria); gravidez planejada (informação obtida pela pergunta direta); idade gestacional (<23 semanas ou ≥23 semanas pela caderneta da gestante); primigesta ou não; e episódio de sangramentos na gestação atual (dado fornecido diretamente pela gestante).
Os dados foram analisados no Stata Software Package (STATA), versão 10.0. A prevalência para probabilidade de TMC foi calculada com intervalo de confiança de 95% (IC95%). Realizou-se análise univariada pela medida de efeito de Razão de Prevalência (RP) que verifica a diferença entre as prevalências entre o desfecho e das variáveis preditoras; após isso, as variáveis com p<0,10 foram submetidas à análise multivariada por meio da regressão de Poisson. O teste qui quadrado foi aplicado para verificar diferenças entre as proporções. Valores de p<0,05 foram considerados estatisticamente significantes.
O projeto de pesquisa foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Federal de Goiás, protocolo 523.834/14, orientado pela Resolução nº466/2012, que regulamenta e dispõe sobre os princípios éticos em pesquisa que envolve seres humanos no país.
Pelo cálculo amostral, houve perda de 31 mulheres (saída espontânea de gestantes no transcorrer da coleta de dados), totalizando 330 gestantes. Dentre as entrevistadas, a média de idade foi de 24,33 anos (±5,9), idade gestacional média de 22 semanas (±11,3) e média de escore para TMC de 7,74 (±4,00). Para efeito de análise, foram considerados 229 indivíduos, correspondentes a respostas válidas para as questões; destas, 188 (57,1%; IC95% 51,7-62,6) apresentaram escore ≥7 para o instrumento SRQ-20, representando a prevalência para probabilidade de TMC. Na tabela 1 apresenta-se a prevalência de TMC e fatores associados estimados na amostra.
Tabela 1 Prevalência de probabilidade de transtorno mental comum (TMC) em gestantes e fatores associados, Brasil Central, 2014-2015
TMC | RP bruta | RP ajustada† | ||||
---|---|---|---|---|---|---|
Variável | n/total* | % | (IC95%) | Valor de p | (IC 95%) | Valor de p |
Idade, anos | ||||||
>24 | 97/166 | 58,4 | 1,0 | |||
≤24 | 91/163 | 55,8 | 0,98 (0,91-1,05) | 0,63 | ||
Anos de estudo | ||||||
> 10 | 125/226* | 55,3 | 1,0 | |||
≤ 10 | 56/ 93* | 60,2 | 0,96 (0,89-1,04) | 0,41 | ||
Estado civil | ||||||
Vive com companheiro | 138/256 | 53,9 | 1,0 | 1,0 | ||
Vive sem companheiro | 50/ 73 | 68,4 | 1,09 (1,01– 1,17) | 0,01 | 1,09 (1,02- 1,18) | 0,01 |
Renda familiar, R$ | ||||||
≤1.581,09 | 130/ 207 * | 62,8 | 1,0 | 1,0 | ||
>1.581,09 | 57/ 113 * | 50,4 | 0,92 (0,85-0,90) | 0,03 | 0,95 (0,89-1,03) | 0,27 |
Quantas pessoas reside na casa | ||||||
> 3 | 122/ 191 | 62,8 | 1,0 | 1,0 | ||
≤ 3 | 66/ 138 | 47,8 | 0,90 (0,84-0, 96) | <0,00 | 0,95 (0,88-1,03) | 0,24 |
Antecedentes familiares psiquiátricos | ||||||
Não | 146/ 264 | 55,3 | 1,0 | |||
Sim | 42/ 65 | 64,6 | 1,05 (0,97-1,14) | 0,15 | ||
Gravidez planejada | ||||||
Sim | 64/133 | 48,1 | 1,0 | 1,0 | ||
Não | 124/196 | 63,2 | 1,10 (1,02-1,18) | <0,00 | 1,08 (1,00-1,16) | 0,02 |
Idade gestacional, semana | ||||||
<23 | 74/148 | 50,0 | 1,0 | 1,0 | ||
≥23 | 114/180 | 63,3 | 1,08 (1,01-1,16) | 0,01 | 1,08 (1,01-1,16) | 0,01 |
Primigesta | ||||||
Não | 118/189 | 62,4 | 1,0 | 1,0 | ||
Sim | 70/140 | 50,0 | 0,92 (0,86-0,99) | 0,02 | 0,94 (0,87-1,01) | 0,12 |
Sangramento | ||||||
Não | 148/269 | 55,0 | 1,0 | 1,0 | ||
Sim | 40/60 | 66,6 | 1,07 (0,99-1,16) | 0,08 | 1,10 (1,01-1,19) | 0,01 |
*Denominador reflete o número de respostas válidas;
†multivariada: a variável desfecho foi ajustada para o modelo: estado civil, renda familiar, quantas pessoas residem na casa, gravidez planejada, idade gestacional, primigesta, sangramento. RP: razão de prevalência; IC95%: intervalo de confiança de 95%.
Na análise múltipla, foram associadas à variável desfecho as seguintes variáveis preditoras: estado civil (p=0,01; RP=1,09; IC95% 1,02-1,18), gravidez planejada (p=0,02; RP=1,08; IC95% 1,00-1,16), idade gestacional (p=0,01; RP=1,08; IC95% 1,01-1,16) e sangramentos (p=0,01; RP=1,10; IC95% 1,01- 1,19). Na figura 1 apresentação a prevalência das respostas SIM para as questões do SRQ-20.
Figura 1 Prevalência e Intervalo de Confiança (IC95%) das respostas SIM para os últimos 30 dias às questões do Self-Reporting Questionnaire 20. Brasil Central. 2014-2015. (1) Tem dores de cabeça frequente (44,1%); (2) tem falta de apetite (31,6%); (3) dorme mal (45,0 %); (4) assusta-se com facilidade (54,4 %); (5) tem tremores nas mãos (21,9 %); (6) sente-se nervosa, tensa ou preocupada (73,9 %); (7) tem má digestão (32,5 %); (8) tem dificuldade para pensar com clareza (30,7%); (9) tem se sentindo triste ultimamente (43,5%); (10) tem chorado mais do que de costume (52,3%); (11) encontra dificuldade para realizar com satisfação suas atividades diárias (43,2%); (12) tem dificuldade para tomar decisões (27,7 %); (13) tem dificuldade no serviço (27,7%); (14) é incapaz de desempenhar um papel útil em sua vida (10,6%); (15) tem perdido o interesse pelas coisas (29,2 %); (16) sente-se uma pessoa inútil (12,2%); (17) tem tido ideias de acabar com a vida (9,4 %); (18) sente-se cansado o tempo todo (52,3%); (19) cansa-se com facilidade (62,3%); (20) tem sensações desagradável no estômago (57,4%). Min: mínimo.
A média do escore das respostas do SRQ-20 foi de 7,74. As respostas "sim" para as questões de SRQ-20 com maior prevalência nesse estudo foram "sente-se nervoso, tenso ou preocupada" (73,9%) seguidas por "cansa-se com facilidade" (62,3%).
A alta prevalência da probabilidade de TMC em mulheres grávidas (57,1%) mostrou-se superior ao que apontou estudo de revisão sistemática e metanálise referente à população geral de 63 países, ao revelar porcentagem inferior (29,2%) de TMC entre os 829.673 indivíduos analisados.2 Ao mesmo tempo, as mulheres vivenciam maiores prevalência de transtornos no escopo do TMC, quando comparadas aos homens, em relação ao estado de humor, depressão, ansiedade e somatoformes.11
Por conseguinte, o período gestacional agrava-se em relação a tais prevalências, por todas as alterações corporais e de hábitos de vida, tornando-se estressante para a experiência feminina7 Isso foi comprovado em pesquisa prévia, com 1.180 gestantes, ao revelar que sintomas de ansiedade (76,7%) e depressão (78,2%) são mais prevalentes em mulheres jovens, com idade entre 17 e 29 anos, e casadas.12
Particularmente acerca dos sintomas de depressão, referir estado civil solteira foi associado ao maior risco de desenvolvimento de depressão no estado gravídico,6 corroborando este estudo, em que mulheres vivendo sem o companheiro apresentaram mais chances de TMC.
Por outro lado, mulheres casadas têm revelado maiores inclinações a apresentarem TMC. Em um estudo de base populacional realizado na Hungria, aplicaram-se o Short húngaro, versão Beck Depression Inventory, e o Spielberger State-Trait Anxiety Inventory (STAI-T) em 503 gestantes de idade entre 15 e 47 anos. A maioria das casadas (60%) revelou capacidade em relatar ou apresentar possibilidade para TMC com sintomas depressivos (16,1% leves, 2,4% moderados e 1,4% graves) e para ansiedade (39,46%). Mulheres abaixo de 20 anos de idade apresentaram maior nível de depressão do que as mais velhas (20 a 35 anos e acima de 35), além de gestantes com a menor condição socioeconômica e desempregadas associarem-se a elevado nível de depressão e de ansiedade (p < 0,01).7
A pior condição socioeconômica está presente em outros estudos, sempre com apontamentos de risco para o desenvolvimento de TMC.3,6,7,13 No entanto, neste estudo, na análise RP bruta as mulheres com maior poder aquisitivo associaram-se negativamente à possibilidade de TMC, o que não se repetiu na RP ajustada.
Quanto à gravidez planejada, investigação de base populacional nos Estados Unidos, que aplicou o Alcohol Use Disorder and Associated Disabilities Interview Schedule IV version (AUDADIS-IV) em gestantes que planejaram ter um filho e que aceitavam a gestação, mostrou que as mulheres estavam resguardadas quanto ao surgimento da sintomatologia de TMC. Esse resultado pode ser explicado, segundo o estudo, pela interação e pelo entusiasmo da mãe com novo bebê, bem como o aumento do apoio social, que, muitas vezes, acontece em decorrência de uma nova criança no espaço familiar.5
A chegada de um novo membro no ambiente familiar nem sempre está associada a sentimentos positivos. Como exemplo, na Jordânia, estudo prospectivo com 353 mulheres no último trimestre gestacional na faixa etária entre 18 a 45 anos revelou prevalência significativa de sintomas depressivos (19%) no pré-natal, aumentando substancialmente quando essa gestação não fora planejada (59%). Essa ocorrência pode se relacionar, em parte, às normas culturais do País, e ao papel doméstico e materno da mulher, sendo atribuída mais valia à gestação de crianças do sexo masculino.14
Por outro lado, em estudo transversal na Coreia, o estado gravídico de mulheres com idade média de 30,6 (±4,0 anos) que planejaram a gravidez (83,3%) não demonstrou associação da gestação com a depressão.15
Em relação à idade gestacional, estudo de coorte e de base populacional no norte do Vietnã aplicou a Escala de Depressão Pós-Parto de Edimburgo (EPDS-V) em dois grupos de mulheres gestantes. Em um grupo, as gestantes tinham de 12 a 20 semanas e, no outro, pelo menos 28 semanas de gestação. No que tange à prevalência de TMC, a porcentagem de relatos de algum sintoma relacionado aos transtornos em qualquer fase do período gestacional foi superior (39,9%) no primeiro grupo em relação ao segundo (28,2%). A maior prevalência foi associada à preferência pelo sexo do bebê, à violência por parte do cônjuge e a dificuldades financeiras. No segundo grupo, os sintomas foram menos prevalentes, mas, quando ocorreram, associaram-se à adversidade econômica e à violência do parceiro.3
A persistência de sintomas de TMC durante todo o ciclo gravídico foi associada a comportamentos agressivos no arranjo familiar, companheiro com histórico prévio e atual de relações extraconjugais, ou que faziam uso abusivo de bebidas alcoólicas.3
Sumariamente, a preocupação com a saúde, bem-estar e/ou desenvolvimento de seus filhos, o histórico pessoal de abortos ou natimortos, o abuso na infância, a adversidade da vida, a violência do parceiro e as dificuldades econômicas são situações que predispõem ao TMC durante a gestação.3 Vale ressaltar que, embora o presente estudo não tenha investigado a violência, há evidências científicas que apontam este fenômeno como associação ao TMC, sobretudo a violência conjugal.3,16-18
Em Gana, na Costa do Marfim, estudo de coorte prospectivo com 1.030 mulheres, no terceiro trimestre de gestação, nas mais variadas faixas etárias, revelou porcentagens altas de depressão (28,9%) e ansiedade (14,2%). A ansiedade esteve diretamente relacionada com a idade, sendo as mulheres com mais de 30 anos as mais suscetíveis (30,6±5,5). O mesmo estudo referiu que gestantes descreveram episódios de sangramentos durante o primeiro e segundo trimestre, ao qual se associou a sinais e sintomas que indicam depressão e ansiedade.8
Resultado de pesquisa realizada com gestantes adolescentes revelou associação entre depressão e episódio de sangramento. As adolescentes que passaram por essa complicação tiveram 6,7 vezes mais riscos de apresentarem depressão,17 evidência que corrobora os resultados estimados neste estudo.
A presente investigação revelou um escore de 7,74 do SRQ-20 entre as gestantes entrevistadas. Esse resultado é superior ao encontrado em estudos prévios, que tiveram como sujeitos a população da comunidade em geral (5,59 e 5,35 pontos),10,19 As maiores prevalências de respostas "sim" foram para fatores que reforçaram as chances de sintomas de TMC, como os agrupados no fator I, referentes à ansiedade, à depressão e à disforia, expressas pelas questões "sente-se nervosa, tensa e preocupada" e "tem chorado mais do que o costume".1 Já "cansar-se com facilidade" também se articula com sintomas de depressão.20
Para o fator III, para depressão e ansiedade, sugerem-se as respostas para "assusta-se com facilidade". O fator VI conjuga "tem sensações desagradáveis no estômago", o que implica sintomas de transtornos somáticos. No fator VII, "cansa-se com facilidade" e "sente-se cansado o tempo todo" indicam transtornos de neuroses.1,20
No entanto, outro estudo que também se preocupou com a categorização das questões do SRQ-20 com gestantes revelou maior frequência das respostas "sim" para "tem dores de cabeça frequente", "tem sentido triste ultimamente" e "perdi o interesse pelas coisas".21 Nesse sentido, os fatores mais evidentes foram os mesmos os referentes à depressão e à ansiedade.20
A prevalência de mulheres grávidas com probabilidade de transtorno mental comum e a média do escore do Self-Reporting Questionnaire 20 estimados nesta pesquisa foram superiores às encontradas em estudos com amostras de população geral. Ademais, quando comparadas às estimativas de transtorno mental comum entre gestantes, encontrou-se uma variação de porcentagem superior às de pesquisas prévias, com a ressalva de que os instrumentos não foram os mesmos utilizados neste estudo e que as questões do Self-Reporting Questionnaire 20 referem-se a sintomas percebidos nos últimos 30 dias.
Com respeito às variáveis associadas, sugere-se atenção para o estado civil, o planejamento da gestação, a idade gestacional e o aparecimento da intercorrência sangramento, como contribuições para o pré-natal e preparo de profissionais que atuam no campo da triagem, promoção, diagnósticos e tratamento na área da saúde.
Tais contribuições podem agregar sensibilidade às questões de saúde mental no momento do acolhimento e da consulta de enfermagem durante o pré-natal. Olhar para a mulher e identificar os fatores que aumentam suas chances para o transtorno mental comum, ampliarão a capacidade do profissional para o diagnóstico de enfermagem e, consequentemente, devem tornar mais assertivas as demais fases do processo de assistência de enfermagem.
Como limitação do estudo, considera-se o método empregado, que não permite a estimativa de incidências, relação à causa e efeito. Outro fator é a amostra por conveniência, que representa um determinado local, limitando as generalizações. Mesmo assim, o resultado dessa investigação se aproximou de outros estudos e demonstrou que o instrumento Self-Reporting Questionnaire 20, embora não tenha concluído o diagnóstico de transtorno mental comum, representa vantagens na busca ativa das questões de saúde mental em gestante, a saber: aplicação de baixo custo, fácil manejo (com opção de autoaplicável) e amplamente indicado na atenção primária à saúde.