versão impressa ISSN 0066-782Xversão On-line ISSN 1678-4170
Arq. Bras. Cardiol. vol.108 no.5 São Paulo maio 2017 Epub 04-Maio-2017
https://doi.org/10.5935/abc.20170049
Angiografia coronariana por tomografia computadorizada (ACTC) permite fenotipagem não invasiva da doença arterial coronariana (DAC). Fatores relacionados à progressão da DAC têm valor epidemiológico.
Identificar os fatores associados com a progressão da DAC em pacientes submetidos à avaliação sequencial por ACTC.
Nós analisamos retrospectivamente 384 pacientes consecutivos que apresentavam pelo menos duas avaliações por ACTC entre dezembro de 2005 e março de 2013. Devido às limitações na quantificação da progressão da DAC, os pacientes que haviam sido submetidos previamente à revascularização cirúrgica ou intervenção coronariana percutânea (ICP) entre as avaliações foram excluídos. A progressão da DAC foi definida como qualquer aumento no escore adaptado de estenose segmentar (calculado com utilização do número de segmentos afetados e gravidade da estenose) em todos os segmentos coronarianos sem stent (restenose intra-stent foi excluída da análise). Regressão logística stepwise foi utilizada para avaliar as variáveis associadas com a progressão da DAC.
De uma população final de 234 pacientes, um total de 117 (50%) pacientes apresentaram progressão da DAC. Em um modelo considerando os principais fatores de risco para DAC e outras características basais, apenas a idade (odds ratio [OR] 1,04, intervalo de confiança de 95% [IC95%] 1,01-1,07), intervalo entre avaliações (OR 1,03, IC95% 1,01-1,04) e ICP prévia (OR 3,66, IC95% 1,77-7,55) mostraram uma relação independente com a progressão da DAC.
Uma história de ICP com implante de stent esteve independentemente associada a um aumento de 3,7 vezes na chance de progressão da DAC, excluindo a restenose intra-stent. Idade e intervalo entre avaliações também foram preditores independentes de progressão.
Palavras-chave: Doença da Artéria Coronária/fisiopatologia; Angiografia Coronária; Tomografia Computadorizada por Raios X; Intervenção Coronária Percutânea
Coronary computed tomography angiography (CCTA) allows for noninvasive coronary artery disease (CAD) phenotyping. Factors related to CAD progression are epidemiologically valuable.
To identify factors associated with CAD progression in patients undergoing sequential CCTA testing.
We retrospectively analyzed 384 consecutive patients who had at least two CCTA studies between December 2005 and March 2013. Due to limitations in the quantification of CAD progression, we excluded patients who had undergone surgical revascularization previously or percutaneous coronary intervention (PCI) between studies. CAD progression was defined as any increase in the adapted segment stenosis score (calculated using the number of diseased segments and stenosis severity) in all coronary segments without stent (in-stent restenosis was excluded from the analysis). Stepwise logistic regression was used to assess variables associated with CAD progression.
From a final population of 234 patients, a total of 117 (50%) had CAD progression. In a model accounting for major CAD risk factors and other baseline characteristics, only age (odds ratio [OR] 1.04, 95% confidence interval [95%CI] 1.01-1.07), interstudy interval (OR 1.03, 95%CI 1.01-1.04), and past PCI (OR 3.66, 95%CI 1.77-7.55) showed an independent relationship with CAD progression.
A history of PCI with stent placement was independently associated with a 3.7-fold increase in the odds of CAD progression, excluding in-stent restenosis. Age and interstudy interval were also independent predictors of progression.
Keywords: Coronary Artery Disease/physiopathology; Coronary Amgiography; Tomography, X-Ray Computed; Percutaneous Coronary Intervention
A doença arterial coronariana (DAC) é a principal causa de morte em todo o mundo.1 A abordagem clínica e com revascularização têm demonstrado capacidade de reduzir a morbidade e a mortalidade por DAC crônica. Apesar do tratamento, o curso clínico da DAC crônica geralmente consiste na progressão da aterosclerose pontuada por episódios de eventos clínicos imprevisíveis.2,3 Em uma metanálise, Cannon et al.4 demonstraram que pacientes com DAC prévia documentada sob profilaxia secundária com altas doses de estatinas além de manejo clínico contemporâneo ainda têm uma chance de 7% de incidência de eventos compostos e mortalidade de 2% ao ano.4 Embora a DAC seja um distúrbio inflamatório e degenerativo progressivo,5,6 alguns estudos têm demonstrado viabilidade de interrupção ou mesmo regressão da progressão da aterosclerose, medida por técnicas invasivas como ultrassonografia intravascular7,8 e tomografia de coerência óptica.9 Estudos prévios identificaram marcadores de progressão anatômica da aterosclerose, mas tais estudos foram restritos a pacientes submetidos à intervenção coronariana percutânea (ICP) e que realizaram repetição da angiografia coronariana invasiva (ACI) como parte do protocolo de estudo.10-12
A angiografia coronariana por tomografia computadorizada (ACTC) é capaz de fenotipar de forma não invasiva a DAC em uma gama mais ampla de cenários clínicos e proporcionar um bom desempenho diagnóstico para detecção de DAC obstrutiva e forte informação prognóstica.13-15 Uma metanálise recente demonstrou uma alta correlação entre a ACTC e medidas de extensão da placa e gravidade da estenose derivadas por ultrassonografia intracoronariana.16 Capaz de detectar doença mesmo com mínimo estreitamento luminal, a ACTC oferece uma oportunidade para identificar a DAC incipiente e a estenose coronariana obstrutiva.
No presente estudo, procuramos identificar as variáveis associadas com a progressão da DAC em avaliações sequenciais por ACTC em pacientes com e sem tratamento prévio com ICP.
De 5055 ACTCs com indicação clínica realizadas em 4607 pacientes em nossa instituição entre dezembro de 2005 e março de 2013, identificamos 382 indivíduos que realizaram as avaliações sequencialmente com pelo menos 90 dias de intervalo. Um total de 72 pacientes que haviam sido submetidos à revascularização cirúrgica foram excluídos, pois a progressão da DAC nestes casos pode ter sido associada a um desvio do fluxo pelas pontes e não necessariamente à fisiopatologia habitual da aterosclerose.17 Além disso, 76 pacientes que haviam sido submetidos à ICP entre avaliações por ACTC também foram excluídos, já que a quantificação da progressão da doença em vaso nativo sofreria um viés pela melhoria artificial do segmento tratado. Os 234 pacientes restantes constituíram a amostra do estudo. Antes de cada avaliação, informações sobre o uso de medicamentos e fatores de risco para DAC, além de eventos coronarianos prévios e resultados de testes de esforço foram obtidos durante entrevista com um médico. As características basais foram estabelecidas para cada sujeito no momento da primeira avaliação por ACTC.
Cada paciente assinou um termo de consentimento para a inclusão de suas informações em nosso banco de dados, incluindo os dados clínicos e os resultados dos testes, que foram gravados pessoalmente pelo médico responsável pela entrevista pré-teste e por outro responsável pelo relatório dos estudos, respectivamente. Para este estudo, como em todos os outros envolvendo esta fonte de dados, o acesso à base de dados pelo grupo de investigação poderia apenas ser realizado por uma consulta que retorna uma planilha numerada, preenchida com os dados solicitados, excluindo informações de identificação tais como o nome e número de registro do paciente. Uma vez que nenhuma informação pessoal foi divulgada, não foi solicitada aprovação do conselho de revisão institucional para este estudo. Nenhum dos autores deste artigo foi responsável pelo tratamento dos pacientes incluídos na presente análise ou no banco de dados em geral.
Estudos de ACTC foram realizados em um tomógrafo de 256 canais (Brilliance iCT, Philips Healthcare, Cleveland, Ohio, EUA) ou em um de dois tomógrafos de 64 canais (Brilliance 64, Philips Healthcare, Cleveland, Ohio, EUA e Somatom Sensation 64, Siemens Healthcare, Erlangen, Alemanha) durante injeção do contraste, utilizando uma técnica de rastreamento de bolus, visando a aquisição de imagens no pico de opacificação coronariana. Aquisição prospectiva foi fortemente encorajada em exames realizados em tomógrafos com este recurso. Quando não disponível ou não recomendado (i.e., frequência cardíaca [FC] irregular), a aquisição retrospectiva foi utilizada.
Todos os pacientes com uma FC basal acima de 60 bpm receberam metoprolol oral (100 mg) e/ou endovenoso (5-20 mg) para alcançar uma FC pré-avaliação de 60 bpm ou menos. Dinitrato de isossorbida sublingual 0,4 mg foi administrado 3-5 minutos antes da aquisição de imagens contrastadas, a menos que contraindicado.
Todos os exames foram analisados cegamente por um único especialista em imagens cardíacas (I.G.). A árvore arterial coronariana foi dividida em 15 segmentos18 e a aterosclerose coronariana foi definida como uma estrutura tecidual de pelo menos 1 mm2 que pudesse ser individualizada dentro ou adjacente ao lúmen e diferenciada do tecido pericárdico e epicárdico, como descrito anteriormente.18 A extensão e a gravidade da DAC foram avaliadas com utilização de uma versão adaptada do escore de estenose segmentar (EES), previamente descrito e validado como um forte marcador prognóstico.15 Resumidamente, cada um dos 15 segmentos coronarianos recebeu um escore de 0 a 4 baseado na presença de aterosclerose e grau de estreitamento luminal: 0 (sem aterosclerose), 1 (1-29%), 2 (30-49%), 3 (50-69%) e 4 (70-100%). Os escores de cada segmento foram adicionados para fornecer um escore final entre 0 a 60. Uma lesão progressiva visualizada pela ACTC está apresentada na Figura 1.
Figura 1 Progressão da doença arterial coronariana (DAC) à angiografia coronariana por tomografia computadorizada (ACTC) em um paciente masculino de 58 anos de idade apresentando DAC muito leve no segmento proximal da artéria coronária descendente anterior esquerda no momento basal (A). Progressão evidente da lesão é vista aos 13 meses no mesmo local, com moderada estenose luminal (B) melhor visualizada no plano transversal do vaso (seta).
O EES da primeira e segunda avaliação por ACTC foi calculado e a progressão da doença foi definida como qualquer aumento no EES entre o momento basal e o seguimento com ACTC. Por outro lado, foi definida como regressão qualquer diminuição do EES entre o momento basal e o seguimento com ACTC. Segmentos com stent foram excluídos dos cálculos de progressão ou regressão da doença. Para ajustes multivariados de gravidade da DAC no momento basal, cada segmento com stent foi classificado como apresentando estenose de 70-100%, visando superestimar a gravidade da DAC no momento basal em pacientes com stents. Essa superestimação do momento basal em pacientes com stent foi realizada com o objetivo de aumentar a gravidade da doença, já que o EES no momento basal foi incluído no modelo multivariado, e para minimizar o impacto do stent agindo como um marcador de apresentação mais "agressiva" de DAC.
As variáveis contínuas são apresentadas como média ± desvio padrão (DP) ou mediana (intervalo interquartil [IIQ]), conforme apropriado. As variáveis categóricas são apresentadas como frequências e percentagens. Comparações intergrupos foram analisadas com o teste t de Student não pareado ou teste U de Mann-Whitney para as variáveis contínuas, conforme adequado, e o teste do qui-quadrado para variáveis categóricas. Regressão logística univariada e multivariada (método stepwise backward) foi utilizada para avaliar preditores individuais de progressão de DAC. Uma segunda análise multivariada foi realizada em pacientes com evidência de aterosclerose no momento basal para identificar preditores independentes de regressão da DAC. Significância estatística foi definida como um valor de p bicaudal < 0,05. Todas as análises foram realizadas com o programa SPSS 19.0 (SPSS Inc., Chicago, Illinois, EUA).
O estudo incluiu 234 pacientes com média de idade de 60 ± 11 anos, 79% dos quais eram do sexo masculino. O fluxograma na Figura 2 mostra a seleção da população. Um total de 8% dos pacientes apresentava história prévia de infarto do miocárdio e 11% deles apresentavam um resultado positivo recente (menos de 30 dias antes do estudo índice) de um teste de estresse. Uma ICP anterior havia sido realizada em 50 (21%) indivíduos, que apresentavam um total de 83 segmentos com stent (média de 1,7 por sujeito). Outras características basais estão resumidas na Tabela 1.
Figura 2 Fluxograma de seleção dos pacientes. A população final do estudo foi composta por indivíduos com angiografia coronariana por tomografia computadorizada (ACTC) sequencial realizada com pelo menos 90 dias de intervalo e sem intervenção coronariana percutânea (ICP) entre as avaliações ou cirurgia de revascularização coronariana prévia.
Tabela 1 Características basais dos pacientes
Pacientes, n | 234 |
---|---|
Idade (anos), média ± DP | 59,8 ± 10,7 |
Sexo masculino n (%) | 186 (79) |
IMC (kg/m2), média ± DP | 27,7 ± 3,9 |
Intervalo entre avaliações (meses), mediana (IIQ) | 32,4 (19,2 - 49,7) |
EES basal, mediana (IIQ) | 6 (2 - 11) |
Fatores de risco clínicos | |
Hipertensão, n (%) | 117 (50) |
Diabetes, n (%) | 30 (13) |
Dislipidemia, n (%) | 125 (53) |
História familiar de DAC, n (%) | 99 (42) |
Intolerância à glicose, n (%) | 10 (4) |
Tabagismo atual, n (%) | 25 (11) |
Tabagismo anterior, n (%) | 55 (24) |
Teste de esforço positivo, n (%) | 26 (11) |
IAM anterior, n (%) | 18 (8) |
ICP prévia, n (%) | 50 (21) |
Uso de medicamentos | |
Betabloqueadores, n (%) | 35 (15) |
IECA/BRA, n (%) | 45 (19) |
Antiagregantes plaquetários, n (%) | 46 (20) |
Estatina, n (%) | 59 (25) |
DP: desvio padrão; IMC: índice de massa corporal; EES: escore de estenose segmentar; IIQ: intervalo interquartil; DAC: doença arterial coronariana; IAM: infarto do miocárdio; ICP: intervenção coronariana percutânea; IECA: inibidor da enzima conversora da angiotensina; BRA: bloqueador do receptor da angiotensina.
Durante a aquisição da ACTC, a FC média dos sujeitos foi de 54 ± 7 bpm. A mediana da exposição à radiação foi de 4,7 mSv (4-6,4 mSv) e uma aquisição prospectiva foi realizada em 79% de todos os estudos. De todas as avaliações, 35 (0,01%) segmentos foram considerados não avaliáveis e foram excluídos da análise em ambos os estudos.
Na ACTC basal, 41 (17%) pacientes não apresentavam evidência de aterosclerose coronariana, enquanto a gravidade da DAC foi considerada muito leve (1-29%) em 60 (26%), leve (30-49%) em 65 (28%), moderada (50-69%) em 37 (16%) e grave (≥ 70%) em 31 (13%) dos casos. O EES basal foi 0 em 41 (17%) indivíduos, entre 1 e 5 em 76 (32%) indivíduos, entre 6 e 10 em 55 (24%) indivíduos, entre 11 e 15 em 25 (11%) sujeitos e 16 ou mais em 37 (16%) indivíduos.
O seguimento do estudo foi realizado por uma mediana de 32 meses (19-50 meses), quando 117 (50%) pacientes apresentaram progressão da DAC.
Regressão logística univariada incluindo todas as características basais revelou que a idade, o intervalo entre avaliações, EES basal e ICP anterior foram preditores de progressão da DAC. A Tabela 2 lista as características dos pacientes de acordo com o estado de progressão da DAC. Após ajuste multivariado, a idade, intervalo entre avaliações e ICP anterior emergiram como preditores independentes de progressão. Um aumento independente de 3,7 vezes na chance de progressão esteve associado a uma história de stent coronariano, como mostra a Tabela 3.
Tabela 2 Características basais dos pacientes de acordo com o estado da progressão
Todos os indivíduos | |||
---|---|---|---|
Sem progressão | Progressão | Valor de p | |
Pacientes, n | 117 | 117 | |
Idade (anos), média ± DP | 58,3 ± 10,7 | 61,3 ± 10,8 | 0,03 |
Sexo masculino n (%) | 90 (77) | 96 (82) | 0,42 |
IMC (kg/m2), média ± DP | 27,2 ± 3,9 | 28,0 ± 4,0 | 0,11 |
Intervalo entre avaliações (meses), mediana (IIQ) | 29,8 (18,8 - 42,8) | 34,1 (20,4 - 55,2) | 0,05 |
EES basal, mediana (IIQ) | 5 (1-9) | 8 (2-14) | 0,01 |
Fatores de risco clínicos | |||
Hipertensão, n (%) | 58 (50) | 59 (50) | 1,00 |
Diabetes, n (%) | 15 (13) | 15 (13) | 1,00 |
Dislipidemia, n (%) | 65 (56) | 60 (51) | 0,60 |
História familiar de DAC, n (%) | 54 (46) | 45 (38) | 0,29 |
Intolerância à glicose, n (%) | 3 (3) | 7 (6) | 0,33 |
Tabagismo atual, n (%) | 16 (14) | 9 (8) | 0,20 |
Tabagismo anterior, n (%) | 23 (20) | 32 (27) | 0,22 |
Teste de esforço positivo, n (%) | 14 (12) | 12 (10) | 0,84 |
História de IAM, n (%) | 6 (5) | 12 (10) | 0,22 |
ICP anterior, n (%) | 15 (13) | 35 (30) | 0,002 |
Uso de medicamentos | |||
Betabloqueadores, n (%) | 18 (15) | 17 (15) | 1,00 |
IECA/BRA, n (%) | 21 (18) | 24 (21) | 0,74 |
Antiagregantes plaquetários, n (%) | 18 (15) | 28 (24) | 0,14 |
Estatina, n (%) | 31 (26) | 28 (24) | 0,76 |
DP: desvio padrão; IMC: índice de massa corporal; EES: escore de estenose segmentar; IIQ: intervalo interquartil; DAC: doença arterial coronariana; IAM: infarto do miocárdio; ICP: intervenção coronariana percutânea; IECA: inibidor da enzima conversora da angiotensina; BRA: bloqueador do receptor da angiotensina.
Tabela 3 Preditores de progressão da doença arterial coronariana (DAC)
Análise univariada | Análise multivariada | |||||
---|---|---|---|---|---|---|
Odds Ratio | IC95% | Valor de p | Odds Ratio | IC95% | Valor de p | |
Idade (anos) | 1,03 | 1,00 - 1,05 | 0,03 | 1,04 | 1,01 - 1,07 | 0,01 |
Sexo masculino | 1,37 | 0,72 - 2,60 | 0,33 | 1,92 | 0,92 - 3,98 | 0,08 |
IMC (kg/m2) | 1,06 | 0,99 - 1,13 | 0,12 | 1,07 | 0,99 - 1,15 | 0,08 |
Intervalo entre avaliações (meses) | 1,01 | 1,00 - 1,03 | 0,02 | 1,03 | 1,01 - 1,04 | < 0,001 |
EES basal | 1,04 | 1,01 - 1,09 | 0,02 | |||
Fatores de risco clínicos | ||||||
Hipertensão | 0,97 | 0,58 - 1,61 | 0,90 | |||
Diabetes | 1,00 | 0,46 - 2,15 | 1,00 | |||
Dislipidemia | 1,19 | 0,71 - 1,99 | 0,51 | |||
História familiar de DAC | 1,37 | 0,82 - 2,31 | 0,23 | |||
Intolerância à glicose | 0,41 | 0,10 - 1,64 | 0,21 | |||
Tabagismo atual | 1,90 | 0,80 - 4,49 | 0,14 | |||
Tabagismo anterior | 0,65 | 0,35 - 1,20 | 0,17 | |||
Teste de esforço positivo | 1,19 | 0,53 - 2,69 | 0,68 | |||
IAM prévio | 0,47 | 0,17 - 1,31 | 0,15 | |||
ICP anterior | 2,90 | 1,48 - 5,68 | < 0,001 | 3,66 | 1,77 - 7,55 | < 0,001 |
Uso de medicamentos | ||||||
Betabloqueadores | 1,07 | 0,52 - 2,19 | 0,85 | |||
IECA/BRA | 0,85 | 0,44 - 1,63 | 0,62 | |||
Antiagregantes plaquetários | 0,58 | 0,30 - 1,12 | 0,10 | |||
Estatina | 1,15 | 0,63 - 2,07 | 0,65 |
IC95%: intervalo de confiança de 95%; DP: desvio padrão; IMC: índice de massa corporal; EES: escore de estenose segmentar; IIQ: faixa interquartil; DAC: doença arterial coronariana; IAM: infarto do miocárdio; ICP: intervenção coronariana percutânea; IECA: inibidor da enzima conversora da angiotensina; BRA: bloqueador do receptor da angiotensina.
De uma maneira geral, 70% dos pacientes com ICP prévia apresentaram progressão da DAC, comparados a 47% daqueles com DAC basal mas sem stent (p = 0,003) e 38% sem qualquer DAC no momento basal (p = 0,002). Esta maior taxa de progressão entre pacientes com ICP permaneceu em toda a gama de aumentos no EES, como mostra a Figura 3. Diferenças nas características basais entre pacientes com e sem stents estão mostradas na Tabela 4.
Figura 3 Prevalência e gravidade do aumento do escore de estenose segmentar (EES) por subgrupo. *p < 0,05 entre doença arterial coronariana (DAC) + intervenção coronariana percutânea (ICP) e sem DAC; †p < 0,05 entre DAC + ICP e DAC sem ICP.
Tabela 4 Características basais dos pacientes de acordo com história de intervenção coronariana percutânea (ICP)
Pacientes, n | Sem ICP | ICP | ||
---|---|---|---|---|
184 | 50 | Valor de p | ||
Idade (anos), média ± DP | 58,9 ± 11,1 | 63,4 ± 9,1 | 0,01 | |
Sexo masculino, n (%) | 149 (81) | 42 (74) | 0,35 | |
IMC (kg/m2), média ± DP | 27,7 ± 3,8 | 27,4 ± 4,4 | 0,56 | |
Intervalo entre avaliações (meses), mediana (IIQ) | 33,4 (22,0 - 53,1) | 26,9 (15,0 - 37,2) | < 0,01 | |
EES basal, mediana (IIQ) | 4 (1 - 8) | 16 (10 - 21) | < 0,001 | |
Fatores de risco clínicos | ||||
Hipertensão, n (%) | 91 (49) | 26 (52) | 0,87 | |
Diabetes, n (%) | 20 (11) | 10 (20) | 0,10 | |
Dislipidemia, n (%) | 89 (48) | 36 (72) | <0,01 | |
História familiar de DAC, n (%) | 79 (43) | 20 (40) | 0,75 | |
Intolerância à glicose, n (%) | 6 (3) | 4 (8) | 0,23 | |
Tabagismo atual, n (%) | 22 (12) | 3 (6) | 0,31 | |
Tabagismo anterior, n (%) | 39 (21) | 16 (32) | 0,13 | |
Teste de esforço positivo, n (%) | 18 (10) | 8 (16) | 0,21 | |
História de IAM, n (%) | 2 (1) | 16 (32) | < 0,001 | |
Progressão da DAC, n (%) | 82 (45) | 35 (70) | < 0,001 | |
Uso de medicamentos | ||||
Betabloqueadores, n (%) | 21 (11) | 14 (28) | 0,01 | |
IECA/BRA, n (%) | 31 (17) | 14 (28) | 0,10 | |
Antiagregantes plaquetários, n (%) | 18 (10) | 28 (56) | < 0,001 | |
Estatina, n (%) | 38 (21) | 21 (42) | < 0,01 |
DP: desvio padrão; IMC: índice de massa corporal; EES: escore de estenose segmentar; IIQ: intervalo interquartil; DAC: doença arterial coronariana; IAM: infarto do miocárdio; ICP: intervenção coronariana percutânea; IECA: inibidor da enzima conversora da angiotensina; BRA: bloqueador do receptor da angiotensina.
Em uma análise secundária considerando apenas os indivíduos com evidência de DAC na ACTC basal (n = 193), a regressão da doença se mostrou independentemente relacionada apenas com uma história de ICP com stent (OR 0,28, intervalo de confiança de 95% [IC95%] 0,10-0,77, p = 0,01), EES basal (OR 1.10, IC95% 1,04-1,16, p = 0,01) e intervalo entre avaliações (OR 0,98, IC95% 0,96-0,99, p = 0,02) no modelo de regressão logística multivariada.
Apesar dos tratamentos clínico e invasivo, a DAC continua sendo uma doença progressiva. Vários estudos revelam uma alta incidência de eventos entre pacientes submetidos a terapias otimizadas baseadas em diretrizes, apontando as limitações das abordagens terapêuticas disponíveis atualmente.19-21 A progressão angiográfica da DAC pode identificar os indivíduos de maior risco para eventos cardiovasculares, uma vez que o crescimento da placa implica em atividade inflamatória e aumento no risco de ruptura.22 A identificação de preditores de progressão da DAC é epidemiologicamente importante e permite uma melhor compreensão da fisiopatologia da DAC.
Nossa coorte consistiu de pacientes em um "contexto real", com e sem evidências prévias de DAC, incluindo aqueles com história de ICP. Indivíduos com procedimentos de ICP entre avaliações de ACTC foram excluídos do estudo a fim de evitar o viés de diminuição da estenose devido à implantação de stent. Da mesma forma, segmentos coronarianos com stent implantados previamente foram excluídos da análise da progressão para que a restenose não contaminasse os resultados. Nestas circunstâncias, encontramos uma taxa de 50% de progressão de DAC em vasos nativos (sem stent) durante um seguimento mediano de 32 meses, o que se encontra na faixa superior em relação a estudos prévios com utilização de ACI.23-29 Este pode ter sido um resultado da utilização da ACTC, que é capaz de representar a parede coronariana em três dimensões e não é, portanto, restrita a uma projeção bidimensional.
Na análise multivariada, idade, intervalo entre avaliações e ICP prévia emergiram como preditores independentes de progressão da DAC. Especificamente, ICP prévia com implante de stent, uma característica potencialmente modificável relacionada ao paciente, esteve associada a um aumento de 3,7 vezes na chance de progressão da doença. Causalidade absoluta entre a colocação de stent e a progressão não pode ser feita devido à natureza observacional e retrospectiva do presente estudo, porém até onde sabemos, este é o primeiro estudo com esta tecnologia a apresentar esse achado. Um potencial viés poderia ser que os stents seriam apenas um marcador de uma biologia associada a progressão mais rápida da aterosclerose. Nós tentamos vigorosamente minimizar esse viés ajustando os resultados à DAC basal e outros fatores de risco importantes e infarto do miocárdio prévio, superestimando o impacto da DAC nos segmentos com stent na ACTC basal. É interessante observar que a história de ICP não foi apenas independentemente relacionada ao aumento na chance de progressão da doença, mas também a uma redução de 72% na chance de regressão.
As pesquisas anteriores sobre a progressão da aterosclerose coronariana, em sua maioria, foram focadas em pacientes submetidos à ACI em preparação à ICP, mas estiveram também sujeitas a viés.10,20,21 Sem comparar a progressão da DAC entre pacientes com e sem ICP, efeitos potenciais do tratamento invasivo na evolução da doença não podem ser derivados. No entanto, mesmo neste cenário, dois estudos anteriores com indivíduos submetidos à ICP relataram que a história de ICP antes da inclusão no estudo foi um preditor significativo e independente de pior evolução.10,30
Borges et al.26 relataram resultados de um estudo comparando indivíduos submetidos exclusivamente a tratamento clínico versus ICP no que diz respeito à progressão da DAC em vaso nativo com utilização da ACI.26 Os autores encontraram que pacientes com ICP anterior apresentaram um aumento independente de 2,1 vezes na progressão da DAC em 5 anos quando comparados com aqueles sem ICP prévia.
Uma vez que este foi um estudo retrospectivo e observacional, não podemos estabelecer com certeza uma causalidade entre a ICP e a progressão da DAC, embora tenhamos tentado cuidadosamente ajustar o modelo para potenciais confundidores. Apesar dos vieses e dada a escassez de pesquisas sobre este assunto, este estudo gera questões que precisam ser respondidas por estudos maiores prospectivos e randomizados.
Para determinar a ocorrência de progressão da DAC, utilizamos os resultados da ACTC, que tem menor resolução espacial e temporal que a ACI.31 Este fato pode resultar em artefatos que dificultam a quantificação da DAC. Apesar de algumas imprecisões poderem acontecer com este método, principalmente relacionadas com a superestimação da estenose, todos os pacientes foram igualmente sujeitos aos mesmos erros. Apesar desta limitação, o uso da ACTC pode oferecer algumas vantagens na visualização da placa coronariana excêntrica e de leve estreitamento luminal.
Devido ao número limitado de participantes em nosso estudo, algumas questões devem ser respondidas por futuras investigações, tais como o impacto do gênero e da raça sobre a progressão da DAC, a relevância do número de segmentos com stent, diferenças na progressão entre stent não farmacológico e farmacológico e, o mais importante de todos, se esta progressão observada pode se traduzir em eventos futuros.
Em uma população de "contexto real" encaminhada para avaliação sequencial com ACTC, a idade e história de stent coronariano foram preditores independentes de progressão da DAC em vasos nativos, enquanto o grau de DAC no momento basal avaliado por EES não esteve independentemente associado com este desfecho.