versão impressa ISSN 1679-4508versão On-line ISSN 2317-6385
Einstein (São Paulo) vol.14 no.4 São Paulo out./dez. 2016
http://dx.doi.org/10.1590/s1679-45082016ao3673
A fibrilação atrial (FA) é uma arritmia supraventricular caracterizada por atividade atrial caótica e de alta frequência, cujo registro eletrocardiográfico evidencia ondas f na linha de base, que variam em sua forma e amplitude.(1) É uma das arritmias mais comuns no pós-operatório de cirurgia cardíaca, cujo pico de incidência ocorre até o terceiro dia de pós-operatório.(2)
Estudos mostram que a incidência de FA no pós-operatório (FAPO) de cirurgia cardíaca varia de 10 a 60%. A literatura sugere que pacientes submetidos exclusivamente à cirurgia de revascularização do miocárdio (CRM) apresentam menor incidência de FAPO (15 a 40%) comparados àqueles que fazem essa cirurgia combinada à de troca valvar (62%).(3) Embora o tipo de cirurgia possa influenciar na ocorrência da FAPO, não se observou diferença na incidência da arritmia em pacientes que realizaram cirurgia com e sem circulação extracorpórea (CEC).(3,4)
Até recentemente, a FAPO era reconhecida como uma complicação benigna. Entretanto, uma revisão sistemática com metanálise mostrou que essa arritmia está associada a maiores taxas de mortalidade a curto e longo prazo. Os pacientes que desenvolveram FAPO apresentaram maior prevalência de complicações pós-operatórias, dentre as quais acidente vascular encefálico, pneumonia e insuficiência respiratória, além de maior tempo de hospitalização.(5)
O reconhecimento dos fatores associados à arritmia é fundamental para reforçar a vigilância e para monitorar os pacientes em risco, bem como para instituir medidas profiláticas, com vistas a evitar os efeitos deletérios da instalação da FAPO. Modelos de predição têm sido testados para estimar o risco de desenvolvimento de FAPO após cirurgia cardíaca.(6-8) Vários desses modelos foram propostos com base apenas em dados do pré, intra ou do pós-operatório isoladamente, e utilizaram modelos de predição de acidente vascular encefálico em pacientes com FA para predizer a FAPO ou analisaram pacientes que realizaram cirurgias cardíacas combinadas (revascularização associada à cirurgia valvar).(9-11) Ademais, os estudos que avaliam fatores preditivos de FAPO em população brasileira são escassos. Nesse contexto, faz-se relevante conhecer a contribuição de variáveis perioperatórias, analisadas conjuntamente, para o desenvolvimento da FAPO em pacientes brasileiros que realizaram CRM exclusiva.
Analisar as variáveis demográficas e perioperatórias preditivas de fibrilação atrial no pós-operatório em pacientes brasileiros submetidos exclusivamente à cirurgia de revascularização do miocárdio.
Trata-se de uma coorte retrospectiva, realizada em um único centro brasileiro. Este estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da instituição proponente (protocolo número 995.451, número de CAAE: 42471715.7.0000.5392). Todas as recomendações éticas foram respeitadas pelos pesquisadores. Por se tratar de um estudo retrospectivo, os pesquisadores foram dispensados de aplicar o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido aos pacientes cujos prontuários foram consultados.
A amostra foi constituída por 105 prontuários, selecionados aleatoriamente por sorteio. O cálculo amostral foi realizado considerando a prevalência de FAPO na CRM e o número médio de cirurgias realizadas por mês no período analisado. Para serem incluídos no sorteio, os prontuários deveriam pertencer a pacientes brasileiros, com 18 anos ou mais, de ambos os sexos, submetidos exclusivamente à CRM, entre os meses de janeiro a julho de 2014, em um hospital público especializado em cardiologia na cidade de São Paulo (SP). Foram excluídos os prontuários de pacientes com diagnóstico de FA préoperatória.
Para a realização do sorteio, foram obtidas as listas cirúrgicas mensais do período de interesse. Os pacientes com indicação de realização de CRM isolada foram identificados e receberam um código numérico. Fichas contendo os mesmos códigos numéricos foram inseridas em envelope pardo para se proceder ao sorteio. Com a finalidade de se evitarem efeitos da sazonalidade, foram sorteados 15 prontuários em cada mês.
As variáveis préoperatórias analisadas foram: idade, sexo, comorbidades, medicamentos em uso no domicílio, resultados de exames laboratoriais e do ecocardiograma. As variáveis relacionadas ao procedimento cirúrgico foram: tipo de cirurgia (eletiva ou de emergência), utilização de CEC, tempo de cirurgia e quantidade de enxertos. No pós-operatório imediato, foram obtidos os resultados dos exames laboratoriais e uso de fármacos vasoativos. A ocorrência de FAPO foi avaliada desde o pós-operatório imediato até o terceiro dia após a cirurgia, pois esse é o período de maior incidência da arritmia.(2) O diagnóstico de FAPO foi considerado quando existisse diagnóstico médico documentado no prontuário por escrito de episódio novo de FA, isto é, ocorrida no pós-operatório, e instituição de medida terapêutica para o tratamento da arritmia.
Estatísticas descritiva e inferencial foram utilizadas para a análise dos dados. Para comparar os grupos com e sem FAPO com relação às variáveis categóricas foram utilizados o teste exato de Fisher e o teste χ2; para comparação das médias, foi utilizado o teste de Mann-Whitney, após teste de normalidade de Kolmogorov-Smirnov.
Para identificar os fatores preditivos de FAPO, utilizou-se um modelo de árvore de decisão com algoritmo Classification and Regression Trees (CART), no qual todas as variáveis perioperatórias foram incluídas. O modelo foi ajustado com todas as variáveis para predizer a FA.
Em cada nó da árvore, as variáveis são inspecionadas, para encontrar os pontos de corte que homogeneízem os grupos do desfecho (FAPO). No caso de valores faltantes na variável de separação, o segundo melhor preditor é utilizado como variável substituta naquele caso. Utilizou-se a validação cruzada, para possibilitar a generalização dos resultados da árvore para a população. Para aumentar a sensibilidade do modelo, utilizou-se custo da classificação errônea de dois para os casos de FA, isto é, para as estimativas da árvore de regressão, foi considerado que seria duas vezes pior classificar um paciente com FAPO como sem FAPO do que o contrário. O parâmetro de complexidade foi utilizado como critério de parada da árvore de decisão. Foram calculados os valores de sensibilidade, especificidade e precisão da árvore. O nível de significância adotado para todos os testes foi de 5%.
A incidência de FAPO foi de 19,0% (n=20). A tabela 1 mostra a comparação dos pacientes com e sem FAPO, em relação às variáveis demográficas e clínicas analisadas no préoperatório.
Tabela 1 Características demográficas e clínicas préoperatórias descritas nos prontuários analisados
Variáveis | Com FAPO (n=20) | Sem FAPO (n=85) | Valor de p |
---|---|---|---|
Idade, anos | 67,7 (7,4) | 62,1 (9,4) | 0,013* |
Sexo masculino | 17 (85,0) | 64 (75,3) | 0,554† |
Cor branca | 19 (95,0) | 73 (85,9) | 0,454† |
Hipertensão arterial | 15 (75,0) | 77 (90,6) | 0,123† |
Dislipidemia | 15 (75,0) | 64 (75,3) | 1,000† |
Diabetes mellitus | 5 (25,0) | 44 (51,8) | 0,031‡ |
Infarto do miocárdio prévio | 4 (20,0) | 25 (29,4) | 0,397‡ |
Tabagismo | 3 (15,0) | 13 (15,3) | 1,000† |
Insuficiência cardíaca | 3 (15,0) | 11 (12,9) | 0,738† |
Doença renal crônica | 1 (5,0) | 6 (7,1) | 1,000† |
Doença pulmonar obstrutiva crônica | 0 (0,0) | 1 (1,2) | 1,000† |
Fração de ejeção do ventrículo esquerdo | 58,5 (10,9) | 57,7 (11,4) | 0,784* |
Tamanho do átrio esquerdo (mm) | 41,8 (4,8) | 38,8 (5,2) | 0,020* |
Índice de massa (g/m2) | 99,9 (26,3) | 97,4 (23,6) | 0,567* |
*Teste de Mann-Whitney; †teste exato de Fisher; ‡teste χ2. Resultados apresentados em média (desvio padrão).
FAPO: fibrilação atrial no pós-operatório.
Os pacientes que desenvolveram FAPO eram mais velhos e tinham menor prevalência de diabetes mellitus. A fração de ejeção do ventrículo esquerdo estava dentro dos limites de normalidade para os pacientes de ambos os grupos, porém o tamanho do átrio esquerdo foi significativamente maior naqueles que desenvolveram a arritmia no pós-operatório.
Estatina foi prescrita para os pacientes sem e com FAPO (81,2% versus 70,0%, respectivamente; p=0,358), além inibidores da enzima de cardioversão da angiotensina (64,7% versus 45,0%; p=0,104) e de antiarrítmicos (65,9 versus 60,0%; p=0,620). Os resultados dos exames laboratoriais préoperatórios não mostraram diferenças entre os pacientes com e sem FAPO (Tabela 2).
Tabela 2 Resultados dos exames laboratoriais préoperatórios descritos nos prontuários analisados
Variáveis | Com FAPO (n=20) | Sem FAPO (n=85) | Valor de p* |
---|---|---|---|
Magnésio, mEq/L | 1,8 (0,2) | 1,7 (0,2) | 0,913 |
Sódio, mEq/L | 137,7 (3,8) | 139,1 (3,1) | 0,099 |
Potássio, mEq/L | 4,32 (0,5) | 4,3 (0,4) | 0,914 |
Cálcio, mg/dL | 1,2 (0,1) | 1,3 (0,6) | 0,351 |
PCR, mg/dL | 12,9 (19,7) | 9,0 (13,5) | 0,129 |
Creatinina, mg/dL | 1,4 (1,4) | 1,6 (1,9) | 0,645 |
Ureia, mg/dL | 44,9 (30,4) | 44,0 (24,3) | 0,819 |
*Teste de Mann-Whitney. Resultados apresentados em média (desvio padrão).
FAPO: fibrilação atrial no pós-operatório; PCR: proteína C-reativa.
As cirurgias foram, em sua maioria, eletivas (n=95; 90,4%). Não foi observada diferença estatística entre os grupos sem e com FAPO em relação ao tipo de cirurgia (cirurgia eletiva: 92,9% versus 80,0%; p=0,094) e o número médio de enxertos realizados (2,7±0,7 versus 2,5±1,0; p=0,194). Não houve diferença entre os grupos com e sem FAPO na utilização ou não de CEC (60,0% versus 65,8%; p=0,620), tempo de CEC (47,2±41,7 minutos versus 58,6±47,8 minutos; p=0,289), tempo de anóxia (58,8±14,8 minutos versus 65,2±65,2 minutos, p=0,447) e tempo total de cirurgia (416,2±69,2 minutos versus 435,6±92,5 minutos; p=0,543).
No pós-operatório imediato, todos os pacientes estavam em uso de, pelo menos, um fármaco vasoativo, predominantemente a dobutamina, em ambos os grupos. Os resultados dos exames laboratoriais estão descritos na tabela 3.
Tabela 3 Valores mínimos, máximos e médios dos resultados dos exames laboratoriais do pós-operatório imediato
Variáveis | Mínimo | Valor de p* | Máximo | Valor de p* | Média | Valor de p* |
---|---|---|---|---|---|---|
Magnésio, mEq/L | ||||||
Com FAPO | 1,5 (0,2) | 0,079 | 1,9 (0,3) | 0,170 | 1,7 (0,2) | 0,051 |
Sem FAPO | 1,5 (0,3) | 1,8 (0,3) | 1,8 (0,3) | |||
Sódio, mEq/L | ||||||
Com FAPO | 135,6 (3,3) | 0,931 | 138,7 (3,2) | 0,343 | 137,1 (3,0) | 0,483 |
Sem FAPO | 132,7 (19,8) | 139,3 (3,5) | 136,8 (5,8) | |||
Potássio, mEq/L | ||||||
Com FAPO | 3,8 (0,4) | 0,783 | 4,5 (0,4) | 0,563 | 4,1 (0,3) | 0,903 |
Sem FAPO | 3,8 (0,4) | 4,5 (0,6) | 4,1 (0,5) | |||
Cálcio ionizado, mg/dL | ||||||
Com FAPO | 1,12 (0,03) | 0,018 | 1,21 (0,08) | 0,467 | 1,16 (0,04) | 0,245 |
Sem FAPO | 1,14 (0,05) | 1,22 (0,08) | 1,18 (0,06) | |||
PCR, mg/dL | ||||||
Com FAPO | 57,8 (73,9) | 0,451 | 65,0 (71,9) | 0,761 | 64,1 (73,0) | 0,680 |
Sem FAPO | 39,7 (31,0) | 54,8 (32,1) | 47,0 (26,9) | |||
Creatinina, mg/dL | ||||||
Com FAPO | 2,5 (3,0) | 0,074 | 2,2 (2,7) | 0,161 | 2,2 (2,7) | 0,129 |
Sem FAPO | 1,7 (2,2) | 2,3 (4,9) | 2,0 (3,1) | |||
Ureia, mg/dL | ||||||
Com FAPO | 45,6 (38,5) | 0,699 | 46,1 (38,4) | 0,537 | 45,8 (38,5) | 0,613 |
Sem FAPO | 46,4 (28,5) | 47,8 (29,8) | 47,1 (29,1) |
*Teste de Mann-Whitney. Resultados apresentados em média (desvio padrão).
FAPO: fibrilação atrial no pós-operatório; PCR: proteína C-reativa.
Embora os eletrólitos séricos estivessem dentro dos limites de normalidade, os pacientes que desenvolveram FAPO apresentaram o valor mínimo de cálcio sérico significativamente menor que aqueles que não desenvolveram FAPO.
Todos os pacientes apresentaram balanço hídrico positivo no pós-operatório imediato e não houve diferença entre os grupos no que se referiu a esta variável (2.691,6±724,5mL versus 2.404,2±1.293,9mL para pacientes com e sem FAPO, respectivamente; p=0,328).
A figura 1 mostra as variáveis preditivas de FAPO nesta amostra. Observa-se que o tamanho do átrio esquerdo foi a variável que melhor discriminou os pacientes com e sem FAPO. De acordo com a árvore de decisão, pacientes com átrio esquerdo ≥40,5mm e idade ≥64,5 anos tiveram mais chance de desenvolver a arritmia no pós-operatório. A sensibilidade desse modelo de predição foi de 65% e a especificidade, de 88,2%; os valores preditivo positivo e negativo, respectivamente, foram 56,5% e 91,5%; e a precisão foi de 83,8%.
HAS: hipertensão arterial sistêmica; FAPO: fibrilação atrial no pós-operatório.
Figura 1 Fatores preditivos para o desenvolvimento de fibrilação atrial no pós-operatório (FAPO) de cirurgia de revascularização do miocárdio. Nó 1: o tamanho do átrio esquerdo (40,5mm) foi a variável que melhor discriminou os pacientes que desenvolveram FAPO. Nó 2: o diagnóstico de hipertensão arterial discriminou os pacientes com e sem FAPO quando o tamanho do átrio esquerdo foi menor que 40,5mm. Nó 5: a idade discriminou os pacientes que desenvolveram FAPO quando o tamanho do átrio esquerdo foi >40,5mm
O presente estudo permitiu explorar conjuntamente a contribuição de variáveis perioperatórias na predição de FAPO em pacientes brasileiros submetidos exclusivamente à CRM. Ademais, por serem procedimentos cirúrgicos realizados no último ano, esses resultados levam em conta a utilização de técnicas cirúrgicas atuais, o que poderia influenciar no desfecho de interesse. Embora a amostra analisada seja pequena, os resultados apresentados fornecem subsídios para avançar na proposição de escores que estimam o risco de desenvolver a arritmia.
A incidência de FAPO foi de 19,0% (n=20), o que está de acordo com a literatura.(2-4,12) A média de idade dos pacientes que desenvolveram FAPO foi significativamente maior do que a dos pacientes que não apresentaram arritmia. De fato, alterações anatômicas e funcionais relacionadas ao envelhecimento e ao agravamento das condições clínicas podem ter contribuído para esse achado. A idade avançada é um fator que tem sido descrito em diferentes estudos como de risco para o desenvolvimento de FAPO de cirurgias cardíacas.(3,8,13,14)
Estudo com o objetivo de identificar características préoperatórias preditivas de FAPO de CRM identificou que a idade foi o fator preditivo isolado mais importante de FAPO (OR=1,059/ano; intervalo de confiança de 95% − IC95%: 1,055-1,063).(13) Em outro estudo, que avaliou os fatores que influenciaram na ocorrência de FA após CRM endoscópica, verificou-se que a idade e o peso corporal foram os únicos fatores preditivos.(14)
Os pacientes que desenvolveram FAPO apresentaram prevalência significativamente menor de diabetes. De acordo com a árvore de decisão, no entanto, o diagnóstico de diabetes não foi uma variável preditiva de FAPO. Embora alguns estudos apontem a influência do diabetes na incidência de FA, os resultados ainda são controversos.(15,16)
Não se observou associação das demais variáveis demográficas e comorbidades com o desenvolvimento de FAPO. Diferentemente, resultados do estudo de Framingham sugerem a associação entre sexo, hipertensão arterial e insuficiência cardíaca com o desenvolvimento de FA em pacientes comunitários.(17) Ainda, há evidências de que a raça branca é um fator de risco independente de FAPO na CRM isolada.(18)
Com relação aos dados ecocardiográficos préoperatórios, observou-se que os pacientes que desenvolveram a arritmia após a CRM tinham o átrio esquerdo maior do que aqueles que não desenvolveram FAPO. Ademais, o tamanho do átrio esquerdo foi a variável que melhor discriminou os pacientes que desenvolveram FAPO. Os mecanismos fisiopatológicos da FAPO não estão totalmente esclarecidos. Reconhece-se, no entanto, que fatores estruturais do coração parecem estar relacionados à maior vulnerabilidade para desenvolver a arritmia no pós-operatório, como o aumento do tamanho do átrio.(3) A literatura registra que pacientes que desenvolveram FA após CRM tinham maior área atrial comparados aos que não desenvolveram a arritmia.(19)
Não se verificou associação das variáveis intraoperatórias com o desenvolvimento de FAPO. Em relação ao tipo de cirurgia, outros autores obtiveram resultados semelhantes aos do presente estudo.(8) Quanto à utilização da CEC, pesquisadores concluíram que a CRM sem CEC não reduziu a incidência de FAPO.(4) Medidas que refletem o tempo intraoperatório de isquemia miocárdica, como o tempo de pinçamento aórtico, têm sido relatadas como fatores de risco de FAPO, embora a literatura ainda seja controversa a esse respeito.(3,20)
Os desequilíbrios eletrolíticos têm sido associados à ocorrência de FAPO na CRM.(3) Verificou-se, no presente estudo, que níveis séricos mais baixos de cálcio no pós-operatório imediato se associaram com o desenvolvimento de FA, mas isso não discriminou, no modelo de árvore de decisão, os pacientes com e sem FAPO. De fato, tal resultado deve ser confirmado em estudos futuros, pois evidências sugerem que a sobrecarga de cálcio resultante da reperfusão de áreas isquêmicas é um dos mecanismos arritmogênicos subjacentes às arritmias no pós-operatório de cirurgias cardíacas.(21) Ademais, o uso de bloqueadores de canais de cálcio na profilaxia de FAPO é controverso.(22,23)
Ainda que a associação entre proteína C-reativa com o desenvolvimento de FAPO não tenha sido observada no presente estudo, vale destacar que a literatura sugere a participação de um componente inflamatório no desenvolvimento da FAPO na CRM, o que é sustentado por evidências de que o uso de fármacos anti-inflamatórios, incluindo as estatinas, reduzem a incidência dessa arritmia.(3)
Este estudo teve limitações. O delineamento retrospectivo, a amostra de conveniência e a coleta de dados realizada em um único centro podem comprometer a generalização dos resultados. A coleta de dados a partir do prontuário pode ter comprometido os resultados, pois a qualidade da documentação dos registros em saúde é afetada por diferentes fatores, incluindo sua completude. Outra limitação que deve ser levada em conta é a definição adotada de FAPO, isto é, o episódio de arritmia documentado em prontuário pelo médico e que necessitou do uso de antiarrítmico; episódios transitórios não foram considerados. A restrição do tempo de observação até o terceiro dia de pós-operatório contribuiu para limitar o número de casos tardios de FAPO, incluindo aqueles que se desenvolvem após a alta hospitalar. Por fim, não se pode descartar o efeito de variáveis confundidoras, as quais não foram avaliadas, como, por exemplo, a técnica cirúrgica empregada, além do tipo e da dose de fármacos vasoativos.
O aumento do tamanho do átrio esquerdo e a idade avançada foram fatores preditivos de fibrilação atrial no pós-operatório em pacientes submetidos exclusivamente à cirurgia de revascularização do miocárdio.