Print version ISSN 0102-6720On-line version ISSN 2317-6326
ABCD, arq. bras. cir. dig. vol.29 no.3 São Paulo July/Sept. 2016
https://doi.org/10.1590/0102-6720201600030003
Apesar dos avanços recentes nos métodos diagnósticos e tratamento, o câncer de esôfago mantém alta mortalidade. Fatores prognósticos associados ao paciente e ao câncer propriamente dito são pouco conhecidos.
Investigar variáveis prognósticas no câncer esofágico.
Pacientes diagnosticados entre 2009 e 2012 foram analisados e subdivididos de acordo com tipo histológico (444 carcinomas espinocelulares e 105 adenocarcinomas), e então características demográficas, anatomopatológicas e clínicas foram analisadas.
Não houve diferença entre os dois tipos histológicos na sobrevida global. Carcinoma espinocelular apresentou sobrevida de 22,8% em 5 anos, contra 20,2% de adenocarcinoma. Quando considerado somente os tratados com operação com intenção curativa, sobrevida em cinco anos foi de 56,6% para espinocelular e 58% para adenocarcinoma. Para o subtipo espinocelular, tumores pouco diferenciados e extensão tumoral mostraram associação com pior estadiamento oncológico, o que não foi verificado para adenocarcinoma.
Perda de peso, variação de IMC e porcentagem de perda de peso foram fatores associados ao pior estadiamento oncológico para espinocelular, o que não se confirmou para adenocarcinoma.
DESCRITORES: Neoplasia de esôfago; Adenocarcinoma; Carcinoma espinocelular.
Despite recent advances in diagnosis and treatment, esophageal cancer still has high mortality. Prognostic factors associated with patient and with disease itself are multiple and poorly explored.
Assess prognostic variables in esophageal cancer patients.
Retrospective review of all patients with esophageal cancer in an oncology referral center. They were divided according to histological diagnosis (444 squamous cell carcinoma patients and 105 adenocarcinoma), and their demographic, pathological and clinical characteristics were analyzed and compared to clinical stage and overall survival.
No difference was noted between squamous cell carcinoma and esophageal adenocarcinoma overall survival curves. Squamous cell carcinoma presented 22.8% survival after five years against 20.2% for adenocarcinoma. When considering only patients treated with curative intent resection, after five years squamous cell carcinoma survival rate was 56.6 and adenocarcinoma, 58%. In patients with squamous cell carcinoma, poor differentiation histology and tumor size were associated with worse oncology stage, but this was not evidenced in adenocarcinoma.
Weight loss (kg), BMI variation (kg/m²) and percentage of weight loss are factors that predict worse stage at diagnosis in the squamous cell carcinoma. In adenocarcinoma, these findings were not statistically significant.
HEADINGS: Esophageal neoplasm; Adenocarcinoma; Squamous cell carcinoma.
Apesar dos avanços recentes nos exames diagnósticos e nos métodos terapêuticos, câncer de esôfago permanece sendo doença de alta mortalidade. A sobrevida média para carcinoma espinocelular (CEC) é 13,95±11,2 meses e para adenocarcinoma (AE) de 13,22±10,23 meses4,11,13.
Fatores prognósticos associados ao paciente e ao câncer esofágico propriamente dito são múltiplos e pouco estudados. O conhecimento de tais parâmetros pode auxiliar na estratificação e melhor condução terapêutica2,3.
O objetivo deste estudo foi avaliar variáveis demográficas, clínicas e patológicas e suas implicações no prognóstico e sobrevida global.
Este estudo retrospectivo revisou todos pacientes diagnosticados com câncer esofágico entre 2009 e 2012 em um centro oncológico especializado. A população estudada foi composta por 565 indivíduos, dos quais 444 CEC e 105 AE. O restante era composto por tipos histológicos pouco frequentes, como tumores neuroendócrinos.
As variáveis analisadas foram idade, gênero, performance status, antecedentes oncológicos pessoais e familiares, extensão tumoral, perda de peso, IMC, topografia do tumor, grau de diferenciação celular, estadiamento oncológico, qualidade de linfadenectomia e realização ou não de operação com intenção curativa.
Características demográficas, patológicas e clínicas foram analisadas frente a estadiamento oncológico e sobrevida global em 60 meses. O seguimento médio dos pacientes foi de 19,8 meses.
Para comparação de médias foi utilizado teste de ANOVA. Para análise de curva de Kaplan-Meier foi utilizado testes de Log-Rank e Wilcoxon. A influência de variáveis prognósticas foi analisada por regressão de Cox. Foi admitido nível de significância de 0,05.
Não houve diferença entre curvas de sobrevida entre CEC e AE. Sobrevida em cinco anos foi de 22,81% para CEC e de 20,19% para AE (Figura 1).
FIGURA 1 Curvas de Kaplan-Meier para sobrevida AE e CEC mostrando que não houve diferença estatisticamente significante entre as curvas (p=0,473 para Log-Rank; p=0,098para Wilcoxon)
Dos pacientes com AE, 30,4% foi submetido à operação com intenção curativa. Esta proporção foi de 20% nos pacientes com CEC (p=0,114 para Log-Rank e para Wilcoxon p=0,042). A sobrevida em cinco anos para AE foi de 58% e para CEC 56,6%. Por análise univariada, ressecção com intensão curativa foi claramente associada a melhor sobrevida (p<0,001). As Figuras 2 e 3 representam sobrevida global de acordo com estadiamento oncológico.
FIGURA 2 Adenocarcinoma de esôfago: sobrevida global de acordo com estadiamento oncológico3
FIGURA 3 Carcinoma espinocelular de esôfago: sobrevida global de acordo com estadiamento oncológico3
Extensão tumoral ao diagnóstico foi comparada ao estadiamento oncológico, também ao diagnóstico pelo teste Chi-quadrado, mostrando relação de extensão tumoral com pior prognóstico no CEC (p=0,00), mas não no AE (p=0.173). Por regressão de Cox, somente no CEC a extensão tumoral teve relação com sobrevida (p=0,001).
O grau de diferenciação tumoral demonstrou relação com pior estadiamento ao diagnóstico no CEC (p=0.00), mas não no AE (p=0.242).
Perda de peso (kg), variação de IMC (kg/m²) e porcentagem de perda de peso do início dos sintomas até diagnóstico são fatores que predisseram pior estadiamento oncológico ao diagnóstico no CEC. No AE, este achado não foi estatisticamente significante. Por regressão logística, IMC menor que 20 kg∕m² foi preditor de menor sobrevida (Tabelas 1 e 2).
TABELA 1 Fatores prognósticos no adenocarcinoma de esôfago: análise uni e multivariada
†=impossível estimar; ‡=no momento do diagnóstico; §=tempo entre início dos sintomas e diagnóstico; ¶=tempo entre diagnóstico e início dos sintomas; HR=hazard ratio; ECOG=Eastern Cooperative Oncology Group performance status; KPS=Karnofsky performance status
TABELA 2 Fatores prognósticos no carcinoma espinocelular de esôfago: análise uni e multivariada
‡=no momento do diagnóstico; §=tempo entre início dos sintomas e diagnóstico; ¶=tempo entre diagnóstico e início dos sintomas; HR=hazard ratio; ECOG=Eastern Cooperative Oncology Group performance status; KPS=Karnofsky performance status
Considerando somente pacientes submetidos à operação com intenção curativa, linfadenectomia de mais de 23 linfonodos não demonstrou relação com maior sobrevida por análise univariada (p=0,678 no AE e p=0,493 no CEC).
Por análise uni e multivariada (Tabela 1 e 2), variáveis associadas à pior sobrevida no AE foi perda de peso, baixo performance status e tumores de localização distal; e no CEC foi gênero masculino, perda de peso, performance status, antecedente pessoal de malignidade e demora ao se iniciar tratamento. Para ambos os tipos histológicos, operação com intenção curativa foi associada com maior sobrevida.
Vários fatores têm sido relacionados ao prognóstico no carcinoma de esôfago1,6,12.
O presente trabalho analisou fatores prognósticos associados ao paciente (idade, gênero, performance status, antecedentes pessoal e familiar oncológicos, perda de peso e IMC); fatores associados à neoplasia em si (extensão tumoral, topografia do tumor, grau de diferenciação celular, estadiamento oncológico) e fatores associados ao tratamento (qualidade de linfadenectomia, operação com intenção curativa).
Idade tem associação com pior prognóstico somente no CEC. Eloubeidi et al. também notarasm associação de idade avançada com pior sobrevida5. Outros trabalhos demonstraram também que história familiar de câncer de esôfago pode predizer pior prognóstico12. Este achado não está de acordo com estes resultados.
Tumores com maior extensão tumoral ou estadiamento oncológico avançado tiveram pior sobrevida. Estas conclusões vão de acordo com outras publicações5,10.
Este trabalho demonstra associação no CEC de tumores pouco diferenciados com tumores de pior estadiamento ao diagnóstico. Tachibanaet al.10 também demonstraram associação do grau de diferenciação com prognóstico.
Apesar de não demonstrar-se aqui relação de sobrevida com número de linfonodos dissecados, outros estudos salientam a importância desta variável.
O número de linfonodos positivos (mais contra menos que cinco) tem associação com maior mortalidade (razão de risco 1,29; intervalo de confiança de 95% 1,06-1,56) segundo Eloubeidi et al.5 Rizk et al.9 demonstraram que pacientes com mais de quatro linfonodos acometidos teriam sobrevida similar com paciente metastáticos. Consequentemente, a qualidade da linfadenectomia seria um fator independente de prognóstico. Para Peyre et al.7, um mínimo de 23 linfonodos regionais deveria ser ressecado.
Neste trabalho, o aumento de sobrevida em pacientes submetidos à esofagectomia oncológica deve ser visto com ressalva, uma vez a seleção dos pacientes (tumores não-avançados) pode influenciar no desfecho.
Carcinoma esofágico é doença de prognóstico ruim com sobrevida global em torno de 20% em cinco anos. Perda de peso, variação de IMC e porcentagem de perda de peso foram fatores associados ao pior estadiamento oncológico para espinocelular, o que não se confirmou para adenocarcinoma.