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Fatores relacionados com uma menor duração total do aleitamento materno

Fatores relacionados com uma menor duração total do aleitamento materno

Autores:

Sara Cavalcanti Mendes,
Ianna Karolina Véras Lobo,
Sarah Queiroga de Sousa,
Rodrigo Pinheiro de Toledo Vianna

ARTIGO ORIGINAL

Ciência & Saúde Coletiva

versão impressa ISSN 1413-8123versão On-line ISSN 1678-4561

Ciênc. saúde coletiva vol.24 no.5 Rio de Janeiro maio 2019 Epub 30-Maio-2019

http://dx.doi.org/10.1590/1413-81232018245.13772017

Introdução

O aleitamento materno é a mais importante e eficaz estratégia para a saúde da criança, reforçando vínculo, afeto e proteção, além de garantir a nutrição adequada. Constitui a maior e mais econômica intervenção para redução da morbimortalidade infantil. Permite ainda um grandioso impacto na promoção da saúde integral da mãe e do bebê, repercutindo nos indicadores de saúde de toda a sociedade1,2. Assim como a manutenção do aleitamento materno é vital, a introdução de alimentos seguros, acessíveis e culturalmente aceitos na dieta da criança, em época oportuna e de forma adequada, torna-se indispensável na promoção do desenvolvimento saudável e prevenção de distúrbios nutricionais de grande impacto na Saúde Pública3,4.

Os dados nacionais disponíveis mostram que a duração mediana do aleitamento materno exclusivo (AME) era 54,1 dias no ano de 2008. Com relação ao Aleitamento Materno Total (AMT) foi observada uma duração mediana 341,6 dias5. Estes valores ainda são bastante inferiores às recomendações, embora tenha sido verificado um aumento significativo desta prática desde a década de 1970, fruto de ações multisetoriais bem coordenadas envolvendo a sociedade civil, o governo, os pesquisadores e os profissionais da área da saúde6.

Mesmo sendo um processo fisiológico natural, o aleitamento materno é diretamente influenciado pela cultura e por fatores socioeconômicos e demográficos. Importantes estudos verificaram fatores associados à interrupção precoce do AME, como escolaridade materna, mães primíparas, tipo de parto, baixo peso ao nascer7, uso de chupeta8, participação do companheiro, orientação durante pré-natal, nascer em hospital amigo da criança9, entre outros, sendo possível ter uma visão ampla da complexa rede de relações que afetam esta prática10. A facilidade de realização de estudos de acompanhamento do nascimento até os seis meses de idade, somado à iniciativa de diagnóstico das práticas alimentares de menores de um ano durante as campanhas nacionais de vacinação ajudou a enriquecer as evidencias sobre os fatores relacionados ao AME11.

Considerando a duração do AMT, o número de estudos sobre seus fatores de risco e proteção é reduzido, especialmente considerando estudos longitudinais sobre o tema, persistindo ainda lacunas importantes que atrapalham o processo de elaboração de programas e ações de promoção desta prática. O presente estudo acompanhou uma coorte de nascimentos na cidade de João Pessoa, região Nordeste do Brasil com a finalidade de identificar os fatores relacionados com o sucesso da amamentação até o segundo ano de vida.

Métodos

Trata-se de um estudo caso-controle aninhado em uma coorte de binômios mãe-filhos acompanhados do nascimento até o segundo ano de vida do lactente de junho de 2013 até novembro de 2015. As mães foram identificadas no momento da internação para o parto nas duas maiores maternidades públicas de João Pessoa-PB, Instituto Cândida Vargas, unidade de Referência Norte-Nordeste e Maternidade Frei Damião, Referência Estadual. Todas as parturientes eram elegíveis para ingressar na coorte com exceção das mães portadoras de HIV, doenças raras, partos gemelares, nascimentos prematuros, recém-nascidos (RN) com malformações congênitas ou com doenças metabólicas graves. Estas apresentavam estes agravos importantes que poderiam influenciar diretamente nas práticas alimentares dos neonatos.

Foram testadas, para verificar possível associação com a maior duração do aleitamento materno, as características socioeconômicas maternas, características da mãe, gestação e parto e a introdução precoce de alimentação complementar. Estas informações foram coletadas através de entrevista direta na maternidade logo após o parto e em uma visita domiciliar em torno de quatro meses após o nascimento do bebe, realizada por entrevistadores previamente treinados para cada etapa.

Na maternidade foram coletadas informações de antecedentes gestacionais (primípara vs multípara), características do parto (normal vs cesáreo), idade da mãe, sexo do bebe e o número de consultas pré-natal (até seis consultas vs seis consultas ou mais). Nos domicílios foram registradas as características socioeconômicas: tipo de domicílio (alvenaria vs outros), acesso a água encanada (sim vs não), acesso a esgotamento sanitário (sim vs não), pessoa de referência na família, ocupação materna, renda familiar per capita, escolaridade materna, licença maternidade (sim vs não) e a introdução de outros alimentos além do leite materno. Foi investigada a introdução de água, chá, suco, leite e fórmula infantil e nos casos positivos foi referida, pela mãe, a idade da criança no momento da introdução de cada alimento. Posteriormente estas variáveis foram dicotomizadas com base no tempo mediano estimado do aleitamento materno exclusivo de todas as crianças do estudo. Ao final do primeiro ano de vida do bebe as mães receberam uma ligação telefônica para perguntar se ainda estavam amamentando seus filhos e em caso negativo até quando haviam amamentado. Aquelas que ainda amamentavam ao final do primeiro ano receberam outra ligação ao final do segundo ano do bebe para a mesma investigação.

Para a formação dos grupos de casos e de controles, estavam disponíveis informações completas de 103 binômios mãe-filhos que foram classificados em função da duração mediana do aleitamento materno. Mães com duração total menor ou igual que a mediana, 15 meses, foram classificadas como casos (n = 55) e aquelas com duração maior que a mediana foram classificadas como controles (n = 48).

As análises foram feitas utilizando o programa estatístico StataSE, versão 14. Foi efetuada análise descritiva de todas as variáveis e as inconsistências observadas foram corrigidas observando o questionário original ou buscando a informação junto à mãe entrevistada. Em casos onde nenhuma destas ações foi possível, o dado foi considerado perdido.

Para as variáveis categóricas foi feita a distribuição de frequência e para as contínuas foram calculados os valores de média e intervalo de confiança 95%. A duração do aleitamento materno foi calculada por análise de sobrevivência, utilizando a técnica de Kaplan-Meyer, calculando tempo mediano de aleitamento materno exclusivo e do tempo total de aleitamento materno.

Para verificar a associação dos diversos fatores de exposição com os casos e os controles foi aplicado o teste Qui-Quadrado, selecionando as variáveis que apresentaram p-valores menores que 20% no referido teste para compor um modelo de regressão logística binária múltiplo. As variáveis foram incluídas progressivamente no modelo de acordo com a estatística Wald e aquelas que apresentaram significância estatística (p-valor < 0,05) permaneceram no modelo final.

O projeto aprovado ao Comitê de Ética do Centro de Ciências da Saúde – UFPB. Todos os procedimentos foram adotados de acordo com a Resolução CNS nº 466 que regulamenta pesquisas envolvendo seres humanos. Todas as mães receberam e assinaram TCLE no momento do recrutamento na maternidade.

Resultados

O grupo dos controles, mães que amamentaram por mais de 15 meses, foi formado por 48 mulheres com idade média de 26,3 anos e o grupo dos casos, mães que amamentaram até 15 meses, com 55 mulheres com idade média de 25,4 anos, sem diferença estatística entre eles. Praticamente a totalidade dos binômios mãe/filho residia em moradias com água encanada (98,1%), esgotamento sanitário adequado (93,1%), seja rede pública de esgoto ou fossa séptica, e construídas em alvenaria (95,1%). A renda familiar per capita média foi de R$ 352,00 (IC 95%: R$ 302,73 – R$ 401,24), o que representava menos de meio salário mínimo per capita na época da entrevista domiciliar (Salário mínimo no ano de 2015 era igual a R$ 788,00). As características socioeconômicas maternas são mostradas na Tabela 1.

Tabela 1 Características maternas e sócio econômicas. João Pessoa, 2015. 

Variáveis Casos - até mediana (15 meses) Controles - mais que a mediana (15 meses)
n % n % Total % do Total
Chefe do domicílio
Própria mãe 5 62,5 3 37,5 8 7,8
Avós ou outros 20 57,1 15 42,9 35 34,3
Pai 29 49,2 30 50,8 59 57,8
Ocupação materna
Do lar, desempregada ou estudante 34 55,7 27 44,3 61 59,2
Trabalhadora 21 50,0 21 50,0 42 40,8
Renda familiar per capita
Menor que a mediana 24 50,0 24 50,0 48 47,5
Igual ou maior que a mediana 30 56,6 23 43,4 53 52,5
Escolaridade materna*
Fundamental 9 37,5 15 62,5 24 23,5
Medio 36 56,3 28 43,8 64 62,7
Superior 10 71,4 4 28,6 14 13,7
Licença maternidade
Não 40 50,6 39 49,4 79 0,8
Sim 15 62,5 9 37,5 24 0,2

* p-valor < 0,20.

As 103 crianças do estudo tiveram distribuição semelhante com relação ao sexo, bem como o numero de mães primíparas foi próximo do número daquelas com mais de um filho. Já com relação aos partos, observou-se 63,2% realizado dos cirurgicamente, ou partos cesarianos. O número recomendado de consultas de pré-natal, seis ou mais, foi realizado para 69,9% das mulheres (Tabela 2).

Tabela 2 Características da mãe e do nascimento. João Pessoa, 2015. 

Variáveis Casos - até mediana (15 meses) Controles - mais que a mediana (15 meses)
n % n % Total % do Total
Primiparidade
Outro filho 30 52,6 27 47,4 57 55,3
Sim 25 54,3 21 45,7 46 44,7
Idade materna
Menos que 25 anos 24 52,2 22 47,8 46 44,7
25 anos ou mais 31 54,4 26 45,6 57 55,3
Tipo de parto
Cesarea 38 56,7 29 43,3 67 65,0
Normal 17 47,2 19 52,8 36 35,0
Sexo do bebe
Feminino 32 57,1 24 42,9 56 54,4
Masculino 23 48,9 24 51,1 47 45,6
Pré-natal **
Menos que 6 consultas 21 67,7 10 32,3 31 30,1
6 consultas ou mais 34 47,2 38 52,8 72 69,9

** p-valor < 0,05.

A frequência de crianças que ainda estavam sendo amamentadas no momento da última entrevista telefônica foi 22,3%. A mediana do tempo de aleitamento materno exclusivo foi de 60 dias (IC 95%: 46,7 – 73,3 dias) e o tempo total de aleitamento materno foi igual à 15 meses (IC 95%: 10,7 – 19,2 meses), tempo utilizado para a classificação dos casos e dos controles.

Na Tabela 3 são mostrados os principais alimentos que são iniciados na alimentação infantil e sua frequência de introdução até o final do segundo mês de vida do bebe, período que corresponde ao tempo mediano de aleitamento materno exclusivo. Até este momento o item mais introduzido é a água (45,6%), seguido do leite de vaca e da fórmula infantil (ambos em torno de 30,0%). Ao quarto mês de vida das crianças, período da entrevista domiciliar, somente 17,5% delas ainda permaneciam amamentando exclusivamente.

Tabela 3 Alimentos já introduzidos na dieta do recém nascido até os primeiros 60 dias de vida. João Pessoa, 2015. 

Introdução de alimentos nos primeiros 60 dias Casos - até mediana (15 meses) Controles - mais que a mediana (15 meses)
n % n % Total % do Total
Água*
Sim 28 59,6 19 40,4 47 45,6
Não 27 48,2 29 51,8 56 54,4
Chá**
Sim 13 81,3 3 18,8 16 15,5
Não 42 48,3 45 51,7 87 84,5
Leite**
Sim 24 70,6 10 29,4 34 33,0
Não 31 44,9 38 55,1 69 67,0
Fórmula**
Sim 24 75,0 8 25,0 32 31,1
Não 31 43,7 40 56,3 71 68,9
Suco**
Sim 18 72,0 7 28,0 25 24,3
Não 37 47,4 41 52,6 78 75,7

* p-valor < 0,20; ** p-valor < 0,05.

O modelo de regressão logística binária teve a inclusão de três variáveis em três etapas consecutivas, entrando no modelo a variável introdução precoce de fórmula infantil, em seguida a introdução precoce de outro leite e por último a realização de menos de seis consultas de pré-natal. Os valores de OR, brutos e ajustados, são apresentados na Tabela 4, mostrando o efeito independente de cada um destes fatores de risco para um menor tempo de aleitamento materno, tendo, no caso destas análises, a mediana do tempo total de aleitamento materno como referência. Realizar menos que seis consultas de pré-natal, comparado com as mães que realizaram seis ou mais consultas aumenta 2,76 vexes a chance de amamentar por menos tempo. A introdução precoce, antes do segundo mês de vida do bebe, de outro leite ou fórmula infantil, além da interrupção precoce do aleitamento materno exclusivo, aumentam em 3,25 e 4,71 vezes, respectivamente, a chance de realizar o aleitamento materno por um tempo menor.

Tabela 4 Modelo final com os valores de Odds Ratio, bruto e ajustado, dos fatores de risco para a diminuição do tempo de aleitamento materno. João Pessoa, 2015. (n = 102) 

Variável ORbruto IC95% p-valor0 ORajustado IC95% p-valor
Fórmula Infantil* 3,87 1,53 – 9,79 0,002 4,71 1,76 – 12,63 0,0002
Outro leite* 2,94 1,22 – 7,07 0,012 3,25 1,27 – 8,31 0,014
Pré-Natal** 2,35 0,97 – 5,68 0,044 2,76 1,04 – 7,07 0,041

* Introdução precoce do referido alimento. ** Até seis consultas. 0 O Poder do Teste para as estimativas de ORbruto foram 59,2% para fórmula infantil, 46,2% para outro leite e 32,6% para pré-natal.

Discussão

A duração do AMT observada neste grupo de mães foi bastante inferior às recomendações da Organização Mundial de Saúde, porém, segue a tendência nacional registrada na última pesquisa das Capitais, de 20085. Comparando com os dados estaduais, pesquisa realizada em 14 municípios da Paraíba verificou prevalência de aleitamento materno em lactentes de seis a 12 meses de idade próxima a 50%12.

Uma das limitações de estudos que avaliam os fatores relacionados com a duração total do aleitamento materno é a dificuldade de acompanhar mães durante dois anos ou mais, período recomendado para a prática da amamentação, desta forma os estudos caso-controle são uma alternativa metodológica viável. Mesmo sem ter representatividade populacional, os resultados das análises possibilitam obter conclusões importantes dos fatores que podem vir a afetar um determinado desfecho, no caso deste trabalho uma maior ou menor duração de aleitamento materno. A diferença das frequências dos fatores de exposição de cada grupo ocorridos previamente é forte evidencia de eventos causais dos desfechos estudados13.

As informações analisadas dos fatores de exposição foram coletadas por entrevista face-face na maternidade ou durante uma visita domiciliar. Para aquelas mães que ainda amamentavam durante a visita domiciliar, a duração do aleitamento materno foi calculada pela resposta das mães a uma breve entrevista telefônica. O método de entrevista por telefone tem se mostrado uma alternativa barata, eficiente e confiável, sendo utilizada em diversos inquéritos epidemiológicos14-16.

No caso deste estudo os fatores de risco para menor tempo de aleitamento materno foram as mães que realizaram menos que seis consultas pré-natal17 e interromper o aleitamento materno exclusivo precocemente, antes do segundo mês de vida do bebe, com a introdução de outro leite ou fórmula infantil. Este resultado é especialmente importante, pois identifica um evento que pode ser monitorado durante o puerpério que é a introdução precoce de outro leite ou fórmula infantil. Este fato pode ser um preditor de menores tempos de aleitamento materno e as mães que optaram por iniciar com substitutos do leite materno nos primeiros meses de vida do bebe necessitam de apoio e orientação oportuna para manter o aleitamento materno até o segundo ano de vida dos seus filhos ou mais.

Estudo realizado em Porto Alegre, acompanhando uma coorte de 151 crianças durante seus cinco primeiros anos de vida, identificou que os fatores que favorecem a duração do AMT por dois anos ou mais são: mãe permanecer com seus filhos durante os seis primeiros meses de vida, não dar chupeta ao bebê, não conviver com o pai ou companheiro e adiar a oferta de água e chá, bem como de outros leites18. Estes últimos resultados corroboram os achados do presente estudo com relação à introdução precoce de leite, embora o efeito observado pela água e chá não tenha sido observado no presente estudo. Os demais fatores descritos no estudo de Porto Alegre não foram investigados neste trabalho.

As diferenças de cada alimento introduzido na dieta do lactente necessita ser estudada mais detalhadamente, pois os resultados observados neste estudo mostram que as fórmulas infantis ou outros leites competem diretamente com a duração total do aleitamento materno e este comportamento, entretanto, não foi observado para os demais produtos como água, talvez por ter a função exclusiva de saciar a sede e não de alimentar, ou dos chás, quase sempre com finalidades terapêuticas. Assim o impacto e as consequências da introdução precoce dos alimentos na duração total do aleitamento materno dependeriam do tipo de alimento. Esta discussão, claro, não se aplica ao aleitamento materno exclusivo que é interrompido precocemente sempre que qualquer outro alimento é introduzido na dieta da criança antes dela completar seis meses de idade.

Outro estudo realizado em Belo Horizonte comparou fatores relacionados ao desmame em cinco coortes históricas desde o ano de 1980 até 2004, período no qual a duração mediana do aleitamento materno passou de cinco para 11 meses. Em todos os momentos investigados, o reconhecimento da mãe de que o tempo de aleitamento materno exclusivo deveria ser menor que seis meses foi fator de risco para o desmame. Outros fatores estiveram relacionados especialmente com problemas no inicio da amamentação e, somente no estudo de 2004, a opinião desfavorável do pai influenciou negativamente na manutenção da amamentação19, tal como foi observado no estudo de Martins e Giugliani18, talvez pelo fato da duração total do aleitamento haver atingido períodos maiores. Entretanto os resultados destas coortes confirmam que a interrupção precoce do aleitamento materno exclusivo, seja pelo julgamento materno ou pela prática realizada pelas mães, independente do tipo de alimento introduzido, é fator de risco para menores tempos de amamentação.

As evidencias somadas do presente trabalho e estes dois estudos de seguimento indicam que não atender a recomendação de aleitamento materno exclusivo por seis meses, ou a introdução precoce de alimentação complementar, está relacionado com uma tendência de amamentar por tempos menores. Assim seria possível utilizar o tempo de aleitamento materno exclusivo como um importante indicador para o cuidado materno-infantil no sentido de estimular ações de promoção e acompanhamento oportunas para a manutenção do aleitamento até dois anos ou mais.

Entretanto, mais específico do que a observação simples do aleitamento materno exclusivo para prever a duração total do aleitamento materno, o monitoramento da introdução de fórmula infantil ou outros leites, que segundo os achados deste trabalho aumentam o risco de diminuição do tempo de aleitamento materno em 4,7 vezes e 3,2 vezes respectivamente, pode ser mais efetivo. Desta forma, a mensagem de que “o único leite que deve ser oferecido à criança até o seu segundo ano de vida ou mais deve ser o leite materno” pode vir a trazer melhores resultados quando se deseja alcançar a duração do aleitamento materno recomendada pela OMS.

Esta mesma recomendação já foi proposta em um estudo de seguimento conduzido na Alemanha entre os anos de 2008 a 2012, onde a introdução precoce de alimentos foi um preditor do desmame precoce e, portanto, recomendou-se que os profissionais de saúde necessitavam promover a continuidade do aleitamento materno nestes casos20. Outro estudo, analisando os dados de dois ensaios clínicos randomizados conduzidos na Islândia, concluiu que as mães que amamentaram exclusivamente por seis meses, comparada com as que introduziram outros alimentos aos quatro meses de idade da criança, foram aquelas que tiveram maior tempo total de aleitamento materno, independente dos serviços de saúde e do apoio ao aleitamento materno oferecido, sendo elas as únicas que chegaram a atingir a recomendação de aleitamento materno da OMS21.

São bem conhecidos os efeitos positivos do aleitamento materno exclusivo protegendo os recém nascidos dos riscos de diferentes morbidades bem como de óbito, porém menos se sabe dos benefícios da amamentação prolongada, para além do primeiro ou segundo ano de vida, em comparação com períodos menores de aleitamento materno22. Sabe-se que maior tempo de aleitamento materno aumenta o desenvolvimento cognitivo de crianças em torno dos seis anos de idade23 e diminui o risco de sobrepeso e obesidade24, porém mais estudos necessitam ser realizados, tanto na busca de intervenções bem sucedidas como para conhecimento das suas consequências para a saúde infantil e adulta.

O Brasil tem uma história exemplar na condução de políticas públicas de promoção, proteção e apoio ao aleitamento materno25,26 e continua inovando com a incorporação das unidades de atenção básica realizando ações de apoio e acompanhamento dos binômios mãe-filho27. Os resultados desta pesquisa podem ajudar na elaboração de recomendações e cuidados efetivos para o prolongamento do aleitamento materno observando os fatores de risco identificados neste trabalho.

Figura 1 Função sobrevivência do tempo de aleitamento materno exclusivo (85 eventos e 18 censuras) e do tempo total de aleitamento materno (80 evento e 23 censuras). João Pessoa, 2015. 

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