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Fragilidade em idosos: perspectivas para a pesquisa e a prática em Saúde Coletiva

Fragilidade em idosos: perspectivas para a pesquisa e a prática em Saúde Coletiva

Autores:

Edison Iglesias de Oliveira Vidal

ARTIGO ORIGINAL

Cadernos de Saúde Pública

versão impressa ISSN 0102-311X

Cad. Saúde Pública vol.30 no.6 Rio de Janeiro jun. 2014

http://dx.doi.org/10.1590/0102-311XED010614

A revisão sistemática de Mello et al. (p. 1143) documenta a consistência da associação entre fragilidade física e importantes fatores sociais como renda e escolaridade, remetendo-nos à questão da influência dos determinantes sociais sobre a forma como as populações envelhecem. Apenas recentemente, representantes de diversas entidades dedicadas ao estudo do envelhecimento chegaram a um consenso acerca do conceito de fragilidade física em idosos como “uma síndrome médica com múltiplas causas e fatores contribuintes caracterizada pela diminuição de força, resistência e funções fisiológicas reduzidas que aumentam a vulnerabilidade de um indivíduo desenvolver dependência funcional e/ou morrer” (Morley et al. J Am Med Dir Assoc 2013; 14:392-7).

Mas qual a importância desse conceito para a Saúde Coletiva? Minha perspectiva é a de que a ideia de fragilidade física nos ajuda a pensar melhor o envelhecimento para além da simples idade cronológica. Envelhecimento é heterogeneidade. Nenhuma outra faixa etária possui uma variabilidade tão grande entre seus membros em termos de capacidade funcional, presença de comorbidades e outras particularidades como a dos idosos. Antes do conceito de fragilidade pensava-se essa heterogeneidade predominantemente em termos de dependência funcional e comorbidades, desconsiderando toda a parte submersa do iceberg onde se ocultam alterações fisiológicas subclínicas acompanhadas de redução da capacidade de manter a homeostase frente a diferentes fatores estressores. De fato, tal deterioração das reservas fisiológicas é a grande marca do envelhecimento biológico. Como corolário podemos pensar fragilidade física como um marcador clínico de idade biológica. Esse ponto de vista em si inaugura novas possibilidades. Inicialmente porque ele ameniza a inexorabilidade do envelhecimento cronológico e compartilha com os sujeitos e a sociedade ao menos parte das rédeas do envelhecimento biológico. Prevenir ou reverter o desenvolvimento de fragilidade física por meio da prática de exercício físico e hábitos de vida saudáveis seria equivalente a manter-se jovem biologicamente. Essa ideia é consistente com resultados de pesquisa recente, que demonstrou que intervenções amplas sobre hábitos de vida são capazes de alongar telômeros (Ornish et al. Lancet Oncol 2013; 14:1112-20) – outro marcador de envelhecimento biológico – o que seria equivalente a “dar corda” no relógio biológico das pessoas. Adicionalmente, esse pode ser um argumento potente para influenciar positivamente mudanças de estilo de vida. Por exemplo, há evidências de que informar fumantes acerca de sua “idade pulmonar” pode dobrar a proporção de pacientes abandonando o tabagismo (Parkes et al. BMJ 2008; 336:598-600). Finalmente, a noção de fragilidade física amplia as possibilidades de desenvolvimento de estratégias de prevenção, com vistas a alcançarmos enquanto sociedade a tão almejada “compressão de morbidade”, em que o aumento da longevidade populacional é acompanhado por reduções na frequência ou adiamento na ocorrência de incapacidade funcional (Fries et al. J Aging Res 2011; 2011:261702).

Refletir sobre a fragilidade física na perspectiva de seus determinantes sociais, como indica a revisão de Mello et al., reforça o debate sobre a necessidade de políticas públicas voltadas à diminuição das iniquidades sociais como forma de promover o envelhecimento saudável e ativo em termos populacionais. Futuras revisões sobre este tema devem construir sínteses quantitativas sobre a força das associações entre determinantes sociais e fragilidade física, além de englobar outras formas de diagnóstico desta síndrome. Finalmente, cabe ainda ressaltar que os conceitos de fragilidade psicológica e social permanecem inacabados, como lacunas de conhecimento férteis para investigações e abordagens futuras em Saúde Coletiva.