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Furoato de mometasona no tratamento de rinite alérgica persistente leve, moderada ou grave: estudo de não inferioridade (PUMA)

Furoato de mometasona no tratamento de rinite alérgica persistente leve, moderada ou grave: estudo de não inferioridade (PUMA)

Autores:

Martti Anton Antila,
Fabio Morato Castro,
Flavio Sano,
Adelmir Machado,
Fatima Fernandes,
Nelson Augusto Rosário Filho,
Rafael Stelmach

ARTIGO ORIGINAL

Brazilian Journal of Otorhinolaryngology

versão impressa ISSN 1808-8694versão On-line ISSN 1808-8686

Braz. j. otorhinolaryngol. vol.82 no.5 São Paulo set./out. 2016

http://dx.doi.org/10.1016/j.bjorl.2015.11.009

Introdução

A rinite alérgica é uma doença caracterizada por inflamação crônica da mucosa do trato respiratório. Seus principais sintomas são congestão nasal, espirros, rinorreia anterior e posterior, prurido nasal, prurido ocular e palatino, hiperemia conjuntival e lacrimejamento.1,2

Considerada como a doença respiratória mais prevalente no Brasil e no mundo, estimativas recentes indicam que aproximadamente 500 milhões de pessoas sofrem de rinite alérgica.1,3 Nos Estados Unidos, acredita-se que 10-30% dos adultos e 40% das crianças sejam afetados pela doença.4 No Brasil, estima-se uma prevalência média em adolescentes e em crianças em idade escolar de 29,6 e 25,7%, respectivamente.3,5

As manifestações clínicas da rinite alérgica ocorrem após a interação entre um alérgeno específico e o sistema imune de um indivíduo previamente sensibilizado. A hipersensibilidade imediata é uma reação rápida, com participação da IgE e dos mastócitos, seguida por inflamação.6 Outras doenças alérgicas podem estar associadas à rinite, por exemplo, asma e dermatite atópica.7

Em 1999, o grupo de trabalho Allergic Rhinitis and its Impact on Asthma (ARIA),1,8 em colaboração com a Organização Mundial da Saúde (OMS), proporcionou uma base de evidências para facilitar o diagnóstico e o tratamento da doença. O grupo recomendou que a rinite alérgica fosse classificada de acordo com a duração (intermitente ou persistente) e intensidade dos sintomas (leve ou moderada/grave).9

Embora seja benigna, a rinite alérgica exerce impacto significativo na qualidade de vida, afetando a vida social, o sono e também o desempenho na escola e no trabalho.1,8 O principal objetivo do tratamento da rinite alérgica é prevenir ou aliviar os sintomas com máxima segurança/eficácia. Idealmente, ele deve ter como meta principal atuar nas células e nos mediadores inflamatórios para, com isso, minimizar os sintomas da doença. Há diversas classes farmacológicas empregadas no tratamento, como, por exemplo, anti-histamínicos orais ou tópicos, descongestionantes intranasais, antagonistas do receptor de leucotrieno e corticosteroides intranasais tópicos. Esses últimos agentes são considerados medicação de primeira escolha no tratamento anti-inflamatório de doenças alérgicas moderadas a graves.1,8,10,11

O mecanismo de ação dos corticosteroides envolve mediadores químicos e as células comprometidas no processo inflamatório alérgico que estabelece a rinite. As formulações intranasais têm a vantagem da administração local, com um início de ação mais rápido, em comparação com as terapias sistêmicas. Além disso, existem evidências de que os corticosteroides auxiliam no controle das comorbidades da rinite, como a conjuntivite alérgica e a asma.10,12

O furoato de mometasona é um glicocorticoide sintético para uso intranasal tópico,13 capaz de inibir a formação, liberação e atividade de mediadores químicos endógenos, e que também limita a fase celular da inflamação alérgica. Sua aplicação intranasal controla tanto a resposta alérgicas inicial como a tardia.14

Diante da eficácia do furoato de mometasona no tratamento da rinite alérgica - fato já previamente demonstrado - o presente estudo foi planejado para testar a não inferioridade da nova formulação, em comparação com o produto de controle. O objetivo primário foi comparar a eficácia desses dois agentes farmacológicos no tratamento da rinite alérgica persistente após um período de quatro semanas.

Método

Trata-se de um estudo nacional multicêntrico (sete centros) aberto de fase III, randomizado, de não inferioridade, com o objetivo de comparar a nova formulação experimental de furoato de mometasona (Eurofarma) com a medicação de controle (Nasonex(r), Schering-Plough Pharmaceuticals Ltda.) administrada na dose diária total de 200 mg (dois sprays de 100 mg em cada narina, uma vez ao dia).

O estudo foi aprovado pelos comitês de ética na pesquisa das instituições envolvidas, sob o número CE nº 106/2012 (publicado em 17 de maio de 2012) e todos os participantes no estudo assinaram um termo de consentimento informado (CI). O estudo foi patrocinado pela Eurofarma Laboratórios S.A. Foram incluídos pacientes com rinite alérgica persistente leve, moderada ou grave, em conformidade com os critérios do ARIA,1,8 com valor ≥ 4 para o total do escore do índice nasal (EIN) na consulta de triagem em pelo menos quatro dos sete dias que a precederam. Os pacientes também deviam ter mais de 12 anos e exibir sintomas de rinite alérgica durante pelo menos dois anos (confirmado por um teste cutâneo positivo a pelo menos um aeroalérgeno relevante, realizado nos últimos 90 dias); além disso, também deviam apresentar indicação e prescrição atual para uso de corticosteroide nasal. Ademais, os pacientes deveriam passar por um período de suspensão da medicação de 14 ± 5 dias entre a consulta de triagem (CT) e a consulta de randomização (CR) - isto é, sem uso de qualquer corticosteroide nasal, oral ou parenteral (inclusive anti-histamínicos; vasoconstritores nasais orais ou tópicos; e corticosteroides por qualquer via de administração - exceto cutânea). Se o participante na pesquisa necessitasse de alguma outra medicação, seria excluído do estudo, devendo dar continuidade ao tratamento em conformidade com a prática corrente local.

Este foi um estudo aberto, sem ocultação das intervenções (metodologia cega). Essa ocultação evita possíveis vieses nos estudos clínicos; mas, em alguns casos tal metodologia não pode ser aplicada. Optamos por um estudo aberto porque os agentes farmacológicos estudados são de aspecto muito diferente, o que tornaria inexequível o ocultamento. Não obstante, o diário dos sintomas e os exames adicionais evitaram a ocorrência de qualquer viés na avaliação dos pesquisadores.

Pacientes com comorbidades graves (de acordo com os critérios dos investigadores); com asma persistente moderada a grave; com história de infecção do trato respiratório no período de 30 dias anteriores ao ingresso no estudo; alterações estruturais causadoras de obstrução nasal (desvio de septo expressivo, pólipos nasais ou qualquer tipo de malformação nasal); e também pacientes necessitando de outras medicações para tratamento de rinite alérgica; gestantes ou mulheres em lactação; fumantes ativos nos últimos três meses antes do recrutamento no estudo; e indivíduos que haviam participado de outro estudo clínico nos 12 meses precedentes foram excluídos do estudo.

Em seguida à estratificação conforme o centro de pesquisa e a intensidade da rinite alérgica (leve vs. moderada ou grave), os pacientes foram randomizados em uma relação de 1:1 para receber um dos tratamentos do estudo. Os participantes foram submetidos a processo de randomização central, de acordo com a lista criada por um programa para geração de sequências aleatórias. A randomização e alocação do tratamento foram realizadas por meio eletrônico, com a ajuda de um arquivo eletrônico de relato de caso (ARC). O tratamento foi automaticamente registrado no campo apropriado, nos prontuários clínicos do estudo. Todos os pacientes randomizados receberam pelo menos uma dose da medicação em estudo e não foram medicados com remédios diferentes daqueles para os quais estavam randomizados. O período de seguimento para cada paciente foi de 14 semanas e a duração estabelecida para o tratamento ativo foi de 12 semanas.

Em seguida à CR, os pacientes foram avaliados em quatro consultas (V1, V2, V3 e CF). Durante o estudo, os pacientes preencheram um diário que continha informações sobre os sintomas da rinite alérgica, obstrução nasal, rinorréia, espirros e prurido nasal, além do escore para prurido, lacrimejamento e hiperemia conjuntival depois de 4 e 12 semanas de tratamento; fidelidade à medicação; e uso de medicações de resgate. Em cada consulta, os sintomas foram classificados em uma escala de 0 a 3, e os pontos foram somados para que constituíssem a nota final do escore EIN no período do estudo.

O ponto final primário foi a identificação do percentual de pacientes com redução de pelo menos 0,55 pontos no escore EIN depois de quatro semanas de tratamento, em comparação com o escore EIN basal, com o uso dos dados registrados no diário. O limite foi definido com base no estudo realizado por Barnes et al.,15 no qual os autores determinaram que uma redução de 0,55 pontos em outro escore combinado, o escore total de sintomas nasais (Total Nasal Symptom Score), ou ETSN, seria a mínima diferença de relevância clínica (MDCI); assim, poderia ser considerado clinicamente significativo para pacientes tratados com corticosteroides intranasais. De forma parecida com o escore EIN, o ETSN é o somatório dos escores para um grupo de sintomas, cada qual medido em uma escala ordinal de 0, 1, 2 ou 3 representando ausência de sintomas e sintomas leves, moderados ou graves, respectivamente. Em vez de três, o ETSN combina o escore de quatro sintomas (rinorréia, obstrução e prurido nasal, e espirros). Assim, esse escore pode variar de 0 a 12. Como tais dados inexistiam na MDCI para o escore EIN, e visto que em ambos os escores os sintomas são individualmente pontuados de 0 a 3 e contribuem igualmente para o somatório total (não há atribuição de pesos diferentes a diferentes sintomas), assumimos que, se uma redução de 0,55 é clinicamente significativa em uma escala de 0 a 12, seria também significativa em uma escala de 0 a 9. Se fosse realizada uma extrapolação proporcional do limite, uma redução de 0,55 na escala de 0 a 12 pontos (ETSN) representaria uma redução de 0,41 no escore EIN, de 0 a 9. Portanto, pode-se considerar como conservadora uma abordagem que lance mão do limite de 0,55 no escore EIN para a definição do benefício clínico.

Os desfechos secundários foram: valor do escore EIN depois de 4 e 14 semanas de tratamento; avaliação dos escores individuais e globais para sintomas de obstrução nasal, rinorreia e espirros com o uso do escore EIN; avaliação dos escores de prurido nasal e prurido, lacrimejamento e hiperemia conjuntival realizada pelo investigador em cada visita ao centro de pesquisa; e a frequência de eventos adversos.

Métodos estatísticos

Para o cálculo do escore EIN no início do estudo, foram utilizados os valores médios das medições válidas do escore para cada paciente nos sete dias precedentes à CT. Para o cálculo do escore EIN depois de quatro semanas, foram utilizados os valores médios da 4ª semana de tratamento, considerando os dados registrados no diário dos pacientes.

No presente estudo, a medida de eficácia primária foi o escore EIN, um escore combinado calculado pelo somatório dos escores individuais de três sintomas nasais (congestão/obstrução nasal, rinorréia e espirros). Cada sintoma foi classificado individualmente de 0 (sem sintomas) a 3 (sintomas graves), e o escore EIN total pôde variar de 0 a 9. Embora o escore ETSN seja o mais frequentemente utilizado, o EIN é uma escala válida, que tem sido empregada em vários estudos na avaliação da eficácia dos corticosteroides intranasais em casos de rinite sazonal e persistente.16-19

Para a população por protocolo (PP), os resultados obtidos para congestão (obstrução) e rinorréia e espirros estão exibidos como sintomas individuais e também como escore combinado (EIN). Além desses sintomas que constituem o escore EIN, os pacientes deviam classificar, em seus diários, outros dois s (1 - prurido nasal e 2 - prurido, lacrimejamento e rubor ocular), que foram individualmente analisados.

Os dados perdidos não foram imputados. As variáveis contínuas foram sumariadas por meio da variação (mínimo e máximo), média, desvio padrão (DP), mediana e intervalo interquartis (IIQ, 25º e 75º percentis). As variáveis categóricas foram descritas por meio de frequências relativas.

Na comparação dos dois grupos, foram empregados métodos paramétricos ou não paramétricos, de acordo com o padrão de distribuição das variáveis de desfecho. Empregamos o teste de Kolmogorov-Smirnov com correção de Lilliefors na avaliação da distribuição das variáveis de desfecho na amostra.

As variáveis contínuas com distribuição normal foram comparadas com o uso de testes t; e as variáveis que não são normalmente distribuídas foram comparadas por meio do teste não paramétrico de Mann-Whitney. As variáveis categóricas foram comparadas com o uso do teste do Qui-quadrado ou exato de Fisher, dependendo do número de indivíduos. Para a análise multivariada das proporções de pacientes com redução ≥ 0,55 no escore total do escore EIN com o passar do tempo, nos dois grupos, utilizamos o teste ANOVA com medidas repetidas e correção de Greenhouse-Geisser.

Foram empregados níveis de significância bicaudais de 5% como indicativos de diferenças estatísticas entre os grupos. Para a declaração de não inferioridade do agente sob investigação, em comparação com a medicação de controle, o limite superior do intervalo de confiança (IC) de 95% para a diferença entre os percentuais de pacientes nos dois grupos com redução ≥ 0,55 no escore total EIN (medicação de controle menos agente sob investigação) depois de quatro semanas de tratamento deveria ser de até 13,7% em valores absolutos. Se houvesse demonstração de não inferioridade, seria realizado um teste de superioridade com um nível bicaudal de 5% como indicativo de diferença significativa entre os grupos.

As análises foram realizadas com uso do programa Microsoft Excel (2007, Microsoft Office) para as análises descritivas; além disso, utilizamos os softwares estatísticos R (versão 2.13.1) e MedCalc (versão 11.3.3.0, Mariakerke, Bélgica) para as análises inferenciais.

Determinação do tamanho da amostra

Com base na literatura, a determinação do tamanho da amostra no modelo de não inferioridade do estudo considerou o escore EIN depois de quatro semanas de tratamento igual nos dois grupos. Considerando um erro alfa unicaudal de 13,7% ou menor entre os grupos de estudo e experimental (limite de não inferioridade), 164 pacientes seriam incluídos em cada grupo do estudo. Assumindo que haveria uma perda para o acompanhamento de aproximadamente 15%, o estudo deveria incluir 193 pacientes em cada grupo, ou seja, um total de 386 pacientes.

Foi determinada uma margem de não inferioridade (M) de 13,7%. A determinação da margem de não inferioridade foi fundamentada na diferença máxima aceitável entre os grupos experimental e de controle, conforme avaliação dos especialistas, e para que ficasse assegurada ao grupo experimental a retenção de um mínimo do efeito benéfico do tratamento em relação ao placebo, ou à ausência de medicação. Além disso, a margem de não inferioridade escolhida para esse estudo está de acordo com as orientações da European Medicines Agency e com outras publicações que recomendam o uso de margens entre 10 e 20%, dependendo do campo terapêutico.

Resultados

População em estudo

Entre maio e setembro de 2012, 568 indivíduos com rinite alérgica persistente leve, moderada ou grave, classificados de acordo com os critérios do ARIA, foram incluídos no estudo, e 387 deles foram randomizados para receber um dos agentes em estudo. A tabela 1 lista as razões para erro de randomização.

Tabela 1 Razões para insucesso na randomização 

Razão n (%)
Problema de qualificação 105 (58,2)
Perdido para seguimento 4 (2,2)
Retirada de consentimento 9 (4,8)
Não fidelidade ao protocolo 6 (3,3)
Uso de medicamentos não autorizados no estudo 11 (6,1)
Fim da posição em um dos estratos no estudo 46 (25,4)

Todos os indivíduos recrutados receberam pelo menos uma dose da medicação em estudo e nenhum deles recebeu qualquer agente farmacológico além do estabelecido. A figura 1 ilustra o fluxo de pacientes no estudo, de acordo com os grupos de tratamento.

Figura 1 Fluxo de pacientes no estudo (IDT, população com intenção de tratar; PP, população por protocolo; CR, consulta de randomização). 

Todos os 387 pacientes randomizados receberam pelo menos uma dose da medicação em estudo e foram acolhidos na amostra de segurança. Um indivíduo randomizado violou um critério de qualificação, e o seu estudo foi descontinuado na ocasião em que foi descoberta a violação. Assim, esse indivíduo foi excluído dos subgrupos de intenção de tratar (IDT) e por protocolo (PP).

Ao todo, 40 dos 386 indivíduos na população IDT não ingressaram na população PP em decorrência de falta de dados para avaliação do ponto final primário (n = 23), uso de medicação não permitida no estudo (n = 10) ou uso de doses mais altas da medicação de resgate entre as semanas 1 e 4 do estudo (n = 7). Portanto, as populações IDT, PP e de segurança ficaram compostas por 386, 346 e 386 pacientes, respectivamente.

Também, 77 dos 386 pacientes randomizados foram prematuramente descontinuados do estudo em decorrência da presença de doença simultânea (n = 4), não fidelidade ao protocolo ou tratamento (n = 19), perda para o seguimento (n = 24), retirada do consentimento (n = 3), toxicidade ou eventos adversos (n = 2) ou uso de medicações não permitidas no protocolo durante o estudo (n = 24).

A tabela 2 lista as características demográficas dos pacientes.

Tabela 2 Características demográficas dos subgrupos IDT e PP 

Característica População com IDT (n = 386) População PP (n = 346)
Agente sob investigação (n = 191) Medicação de controle (n = 195) Agente sob investigação (n = 171) Medicação de controle (n = 175)
Gênero, n (%)
Mulheres 119 (62,30) 117 (60,00) 107 (62,57) 108 (61,71)
Homens 72 (37,70) 78 (40,00) 64 (37,43) 67 (38,29)
Idade, anos (média ± DP) 27,74 ± 12,51 31,04 ± 14,41 28,04 ± 12,81 31,15 ± 14,42
Variação 12,19-70,38 12,01-67,54 12,19-70,38 12,00-67,54
Mediana (IIQ) 25,12 (17,60-34,39) 28,79 (18,68-41,35) 25,39 (17,69-34,94) 28,79 (19,01-41,40)
Etnia; n (%)
Caucasiana 112 (58,64) 120 (61,54) 99 (57,89) 109 (62,29)
Mulata 32 (16,75) 33 (16,92) 28 (16,37) 27 (15,43)
Afroamericana 42 (21,99) 37 (18,97) 39 (22,81) 34 (19,43)
Oriental 5 (2,62) 5 (2,56) 5 (2,92) 5 (2,86)
IMC, kg/m 2 (média ± DP) 24,96 ± 5,39 25,02 ± 5,07 24,65 ± 5,36 25,03 ± 4,84
Variação 15,27-44,31 15,27 a 45,92 15,27-44,31 15,27-39,81
Mediana (IIQ) 24,13 (20,76-28,41) 24,61 (21,90-27,29) 23,72 (20,55-28,13) 24,64 (21,95-27,36)
História de tabagismo; n (%)
Não fumantes 177 (92,67) 181 (92,82) 158 (92,40) 162 (92,57)
Ex-fumantesa 14 (7,33) 14 (7,18) 13 (7,60) 13 (7,43)

DP, desvio padrão; IMC, índice de massa corporal; EIN, escore do índice nasal; IIQ, intervalo interquartis; IDT, população com intenção de tratar; PP, população por protocolo.

a Parou de fumar três meses antes do ingresso no estudo.

Ponto final de eficácia

Os sintomas de rinite alérgica foram avaliados pelo escore EIN, consistindo na avaliação dos sintomas individuais, como congestão/obstrução e rinorréia, e espirros. Além desses sintomas, os pacientes deviam classificar, em seus diários, outros sintomas: prurido nasal e prurido, lacrimejamento e hiperemia conjuntival, que foram analisados individualmente. Não foi observada diferença significante entre os dois grupos, exceto para obstrução nasal: de acordo com os dados registrados no diário, o escore para obstrução nasal no início do estudo foi significantemente mais alto no grupo sob investigação vs. grupo de controle (fig. 2).

Figura 2 Escore para os sintomas. 

A análise de eficácia primária foi realizada mediante a avaliação da não inferioridade do agente sob investigação, em comparação com a medicação de controle. A tabela 3 lista a comparação entre os percentuais de sucesso nos dois grupos de tratamento na população PP. Pode-se observar que 76,6% dos pacientes no grupo experimental e 80% no grupo de controle tiveram uma redução de pelo menos 0,55 no escore EIN depois de quatro semanas de tratamento, e que não houve diferença estatisticamente significante entre os dois grupos (p = 0,586).

Tabela 3 Comparação dos percentuais de pacientes com redução de pelo menos 0,55 no escore EIN após quatro semanas de tratamento nos dois grupos, população PP (n = 346) 

Redução de pelo menos 0,55 no escore EIN após quatro semanas de tratamento Agente sob investigação (%) (n = 171) Medicação de controle, n (%) (n = 175) p a
Sim 131 (76,6) 140 (80,0) 0,586
Não 40 (23,4) 35 (20,0)

PP, população por protocolo; EIN, escore do índice nasal.

a Teste de Mann-Whitney.

O IC de 95% para a diferença entre os percentuais de sucesso (agente sob investigação e medicação de controle) depois de quatro semanas de tratamento, obtido pelo teste de equivalência de proporções com correção da continuidade, foi de -5,87 a 12,65. A figura 3 ilustra graficamente os resultados, com o limite superior do IC (12,7%) situado abaixo da margem de não inferioridade (M = 13,7%). Assim, ficou demonstrada a não inferioridade do agente experimental, em comparação com a medicação de controle.

Figura 3 Análise de eficácia primária na população PP (n = 346).  

Conforme foi observado na população PP, houve um efeito significativo do tempo de tratamento nos valores do escore EIN (p < 0,0001) e ausência de diferença significante entre grupos (p = 0,624) na população IDT. Os valores do escore EIN no grupo experimental foram 5,61 ± 1,52; 3,34 ± 2,06; e 2,34 ± 1,91 antes do tratamento e depois de 4 e 12 semanas de tratamento, respectivamente. O grupo tratado com a medicação de controle demonstrou um escore EIN de 5,51 ± 1,36; 3,24 ± 2,07; e 2,34 ± 1,91 antes do tratamento e depois de 4 e 12 semanas de tratamento, respectivamente (fig. 4).

Figura 4 Escore EIN total ao longo do tempo, com base nos diários dos pacientes, população PP (n = 308). 

Uso de medicação de resgate

Depois de iniciado o tratamento, 54,3% dos pacientes que receberam a medicação de controle e 45,71% daqueles que receberam o agente experimental usaram ebastina durante o tratamento em estudo. Não foi observada diferença significante entre os grupos.

Resultados de segurança

A tabela 4 ilustra o nível sérico de cortisol no início do estudo (CT) e depois de quatro semanas (CF) nos dois grupos de tratamento, considerando a população de segurança. A comparação das medianas não revelou diferença significante entre os grupos, tanto no início como no fim do tratamento.

Tabela 4 Nível sérico de cortisol em CT e CF (mg/dL) na população de segurança (n = 387) 

Cortisol Agente sob investigação Medicação de controle p a
CT, mg/dL n = 191 n = 196
Variação 0,29-40,11 2,26-38,51
Média ± DP 11,97 ± 7,27 11,91 ± 6,52
Mediana (IIQ) 10,30 (6,70-15,40) 10,44 (7,34-15,20) 0,736
CF, mg/dL n = 168 n = 171
Variação 2,90-37,87 1,0-39,48
Média ± DP 13,64 ± 7,05 13,17 ± 6,60
Mediana (IIQ) 12,10 (8,84-17,01) 11,90 (8,70-15,91) 0,747

DP, desvio padrão; IIQ, intervalo interquartis; CT, consulta de triagem; CF, consulta final.

a Teste de Mann-Whitney.

Na população de segurança, 235 pacientes apresentaram eventos adversos não graves durante o estudo. No grupo de controle, 119 de 191 pacientes (62,30%) sofreram um evento adverso; e, no grupo investigacional, 116 de 196 pacientes (59,2%) apresentaram um evento adverso (p = 0,530). Com exceção de epistaxe e mialgia, mais frequentes no grupo de controle, e do eletrocardiograma anormal, mais frequente no grupo experimental, não foi observada diferença significante entre grupos na frequência dos eventos adversos. Os eventos adversos mais comuns nos dois grupos foram dor nas costas, tosse, dismenorreia, cefaleia e nasofaringite.

Houve relato de um evento adverso grave durante o estudo, classificado como abscesso perianal, que ocorreu no grupo de controle e que foi considerado como não relacionado à medicação em estudo. Não houve relatos de morte durante o estudo.

Discussão

Rinite alérgica é uma doença inflamatória da mucosa nasal com grande prevalência em todo o mundo - e que vem aumentando nos últimos anos -, o que promoveu grande interesse das diferentes áreas da Medicina e de saúde pública com relação a esse tópico.

Em casos de rinite persistente, com frequência, a obstrução é o sintoma predominante. Nesses casos, os corticosteroides são os medicamentos de primeira escolha, podendo ou não estar associados a um anti-histamínico/descongestionante,20 constituindo a única classe farmacológica capaz de promover melhora significativa de todos os sintomas, como prurido, espirros, rinorréia e congestão nasal.8

A atualização das recomendações clínicas do ARIA,1 em seguimento à abordagem assumida pelo GRADE (Grading of Recommendations Assessment, Development and Evaluation), sugere o uso de corticosteroides intranasais para o tratamento da rinite alérgica em adultos, bem como em crianças. Essa decisão indica o elevado valor da eficácia dos corticosteroides intranasais e o baixo valor de seus possíveis eventos adversos.8

O furoato de mometasona é um corticosteroide potente, fato demonstrado pela alta afinidade dos receptores, e apresenta menor biodisponibilidade, em comparação com outras formulações.21 Elevada potência e baixa disponibilidade conferem eficácia e segurança ao furoato de mometasona.22

A análise de eficácia primária, realizada levando em consideração o ponto final primário na população PP, demonstrou a não inferioridade da rinite alérgica persistente de qualquer intensidade, visto que o limite superior do IC de 95% para a diferença entre os percentuais de sucesso depois de quatro semanas de tratamento (12,7%) se situou abaixo da margem definida para não inferioridade (13,7%).

Quase todos os estudos sobre corticosteroides intranasais em pacientes com rinite alérgica persistente leve a moderada identificados na literatura avaliam os sintomas nasais com o uso da escala ETSN, que compreende obstrução nasal, espirros, rinorréia e prurido. Esses sintomas são individualmente classificados de 0 (ausência de sintomas) até 3 (sintomas graves); portanto, o escore total varia de 0 a 12. Uma queda de pelo menos 0,55 nesse escore pode ser considerada como sendo clinicamente significativa. O presente estudo empregou uma escala que abrange apenas a obstrução nasal, rinorreia e espirros como sintomas, também classificados de 0 (ausência de sintomas) a 3 (sintomas graves), variando de 0 a 9. Assim, o uso do valor de 0,55 no presente estudo pode ser considerado conservador.

Os indivíduos com rinite alérgica, em sua quase totalidade, exibem sintomas oculares - cerca de dois terços dos pacientes asmáticos têm sintomas de rinoconjuntivite alérgica.23 No entanto, o diagnóstico de conjuntivite alérgica é subestimado pelos médicos. Os sintomas oculares associados à rinite alérgica são causados pelo contato direto do alérgeno com a mucosa da conjuntiva, e os reflexos naso-oculares constituiriam uma via indireta, dependente da liberação de histamina, visto que esse agente pode ser bloqueado por anti-histamínicos intranasais tópicos. Pesquisas clínicas baseadas em evidências demonstram que os corticosteroides intranasais promovem alívio dos sintomas nasais e oculares, mas ainda permanece desconhecido o mecanismo pelo qual os corticosteroides intranasais melhoram os sintomas oculares. As orientações do ARIA recomendam o uso de corticosteroides intranasais para o tratamento da rinoconjuntivite alérgica.8,24

Com relação à segurança, foram observadas poucas diferenças numéricas entre grupos em algumas das análises e, aparentemente, não existe um padrão que nos permita ter certeza de qual é o tratamento menos tóxico. Alguns eventos adversos foram registrados em apenas um dos grupos de estudo. Nos casos de eventos adversos registrados nos dois grupos que poderiam ser comparados com relação à frequência, não foram observadas diferenças estatisticamente significantes entre tratamentos, exceto para epistaxe e mialgia - mais frequente no grupo de controle - e eletrocardiograma anormal - mais comum no grupo sob investigação. Mas é importante ter em mente que os eventos adversos não estavam relacionados aos agentes avaliados neste estudo. São raros os eventos adversos importantes dos corticosteroides intranasais, mesmo em casos de uso prolongado.22

A determinação do cortisol plasmático matinal é teste sensível o suficiente para determinar a atividade sistêmica de corticosteroides na glândula adrenal, embora outros testes possam ser empregados com maior precisão para essa finalidade.21 Uma revisão recente, que consistiu em mais de 20 estudos e 6 mil pacientes tratados com furoato de mometasona, não conseguiu observar efeito no eixo hipotalâmico-hipofisário.25 Ademais, o uso do furoato de mometasona durante 12 meses não causou atrofia e nem metaplasia da mucosa nasal -outra evidência de sua segurança, mesmo em casos de uso prolongado.26

Embora frequentemente considerado como enfermidade trivial, passageira ou menor, a rinite alérgica pode comprometer significativamente a qualidade de vida dos pacientes, afetando o rendimento escolar e a produtividade no trabalho.27,28 Isso ocorre porque sintomas como surtos de espirros, prurido nasal e congestão nasal podem resultar em fadiga, dificuldade de concentração e aprendizado, cefaleia e, em alguns casos, transtornos do sono incluindo a apneia.29-31

Conclusão

Furoato de mometasona é um agente farmacológico seguro e efetivo para o tratamento de rinite alérgica persistente. O estudo demonstrou não inferioridade em eficácia e segurança do agente sob investigação, em comparação com a medicação de controle, o que validou o desenvolvimento proposto como uma opção para o tratamento de pacientes com rinite alérgica persistente leve, moderada ou grave.

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