versão impressa ISSN 0066-782Xversão On-line ISSN 1678-4170
Arq. Bras. Cardiol. vol.113 no.6 São Paulo dez. 2019 Epub 03-Out-2019
https://doi.org/10.5935/abc.20190197
A contínua habilidade na conduta das cardiopatias congênitas complexas (CCC) tem permitido o alcance da idade fértil. Contudo, a heterogeneidade das lesões cardíacas na idade adulta limita a estimativa do prognóstico da gravidez.
Estudar a evolução materno-fetal das gestantes portadoras de CCC e analisar as variáveis presumíveis de prognóstico.
No período de 10 anos, 435 gestantes portadoras de cardiopatias congênitas foram consecutivamente incluídas no Registro do Instituto do Coração (Registro-InCor). Dentre elas, foram selecionadas 42 gestações em 40 mulheres com CCC (24,5 ± 3,4 anos) que haviam sido desaconselhadas a engravidar. As cardiopatias de base distribuíram-se em: transposição das grandes artérias, atresia pulmonar, atresia tricúspide, ventrículo único, dupla via de saída de ventrículo direito, dupla via de entrada de ventrículo esquerdo e outras lesões estruturais. As cirurgias realizadas foram Rastelli, Fontan, Jatene, Senning, Mustard e outros procedimentos combinados, como tunelização, Blalock Taussing e Glenn. Oito pacientes (20%) não haviam sido operadas, e 19 (47,5%) apresentavam hipoxemia. O protocolo de atendimento incluiu: registro da saturação de oxigênio, hemoglobina sérica, hematócrito, ajuste das medicações, anticoagulação individualizada e hospitalização a partir de 28 semanas de gestação, em face da gravidade do quadro clínico e obstétrico. Na análise estatística, o nível de significância adotado foi de 0,05.
Somente 17 gestações (40,5%) não tiveram complicações maternas nem fetais. Houve 13 problemas maternos (30,9%) e 2 mortes (4,7%) causadas por hemorragia pós-parto e pré-eclâmpsia grave, ambas em pacientes que apresentavam hipoxemia. Houve 7 perdas fetais (16,6%), 17 bebês prematuros (40,5%) e 2 recém-nascidos (4,7%) com cardiopatia congênita. As complicações materno-fetais foram significativamente maiores em pacientes que apresentavam hipoxemia (p < 0,05).
O alcance da idade reprodutiva em pacientes com CCC é crescente; contudo, a má evolução materno-fetal desaconselha a gravidez, particularmente nas pacientes que apresentam hipoxemia.
Palavras-chaves: Gravidez; Cardiopatias Congênitas/complicações; Mortalidade Materna; Mortalidade Fetal; Resultados Materno-fetais
The improvement in surgical techniques has contributed to an increasing number of childbearing women with complex congenital heart disease (CCC). However, adequate counseling about pregnancy in this situation is uncertain, due to a wide variety of residual cardiac lesions.
To evaluate fetal and maternal outcomes in pregnant women with CCC and to analyze the predictive variables of prognosis.
During 10 years we followed 435 consecutive pregnancies in patients (pts) with congenital heart disease. Among of them, we selected 42 pregnancies in 40 (mean age of 25.5 ± 4.5 years) pts with CCC, who had been advised against pregnancy. The distribution of underlying cardiac lesions were: D-Transposition of the great arteries, pulmonary atresia, tricuspid atresia, single ventricle, double-outlet ventricle and truncus arteriosus. The surgical procedures performed before gestation were: Fontan, Jatene, Rastelli, Senning, Mustard and other surgical techniques, including Blalock, Taussing, and Glenn. Eight (20,0%) pts did not have previous surgery. Nineteen 19 (47.5%) pts had hypoxemia. The clinical follow-up protocol included oxygen saturation recording, hemoglobin and hematocrit values; medication adjustment to pregnancy, anticoagulation use, when necessary, and hospitalization from 28 weeks, in severe cases. The statistical significance level considered was p < 0.05.
Only seventeen (40.5%) pregnancies had maternal and fetal uneventful courses. There were 13 (30.9%) maternal complications, two (4.7%) maternal deaths due to hemorrhage pos-partum and severe pre-eclampsia, both of them in women with hypoxemia. There were 7 (16.6%) stillbirths and 17 (40.5%) premature babies. Congenital heart disease was identified in two (4.1%) infants. Maternal and fetal complications were higher (p < 0.05) in women with hypoxemia.
Pregnancy in women with CCC was associated to high maternal and offspring risks. Hypoxemia was a predictive variable of poor maternal and fetal outcomes. Women with CCC should be advised against pregnancy, even when treated in specialized care centers.
Keywords Pregnancy; Heart Defects; Congenital/complications Maternal Mortality; Fetal Mortality; Maternal and Fetal Outcomes
Nas últimas décadas, a contínua e progressiva habilidade no tratamento cirúrgico e a condução do pós-operatório imediato e tardio têm possibilitado que crianças portadoras de CCC alcancem a idade reprodutiva. O Registro de 1.000 casos de gestantes acompanhadas no InCor1 entre 1989 e 1999 mostrou que naqueles 10 anos as cardiopatias congênitas corresponderam a 19,2% dos casos, ocupando o segundo lugar como lesão cardíaca estrutural, ressaltando-se que menos de 1% era de lesões complexas.
Contudo, atualmente, a experiência brasileira vivencia uma tendência expressiva ao aumento do percentual de CCC durante a gravidez, outrora relatada em países europeus, como mostra o Registro Europeu de Cardiopatias e Gravidez (ROPAC), em que 20% dos 66% de casos de cardiopatias congênitas eram complexas.2 Esse cenário exigiu a elaboração de um escore de riscos para as mulheres com cardiopatias congênitas de modo geral, a fim de que houvesse orientação à concepção. A classificação idealizada pela Organização Mundial da Saúde (OMS) 3,4 é o modelo de estratificação de risco mais bem aceito para a gravidez em portadoras de cardiopatias congênitas e considera as CCC como risco III, o que significa desaconselhamento à gestação.
Apesar dessa orientação, tanto a gravidez desejada como a não planejada vem gradativamente crescendo, o que aumenta, portanto, o número de gestantes portadoras de CCC. A escassez de publicações sobre a evolução da gestação nessas mulheres motivou tal estudo.
Avaliar a evolução de portadoras de CCC durante a gravidez e identificar variáveis relacionadas ao pior desfecho materno-fetal.
Foram consecutivamente incluídas no Registro-InCor de Cardiopatia e Gravidez, no período de 10 anos (2007 a 2017), 435 gestantes com cardiopatias congênitas. Destas, foram selecionadas para este estudo 42 gestações em 40 portadoras de cardiopatias congênitas classificadas como complexas pela conferência de Bethesda5,6 (Tabela 1) e incluídas na categoria III de risco pela OMS3,4 (Tabela 2). Portanto, trata-se de um estudo observacional, retrospectivo, realizado em um único Centro de Cardiologia e Obstetrícia.
Tabela 1 Cardiopatias congênitas complexas no adulto segundo a Conferência de Bethesda
Conduíte valvulado ou não valvulado |
Cardiopatia congênita cianótica |
Dupla via de saída de ventrículo |
Síndrome de Eisenmenger |
Procedimento de Fontan |
Atresia mitral; atresia tricúspide; atresia pulmonar |
Ventrículo único (dupla entrada ou saída, comum ou primitiva) |
Doença obstrutiva vascular pulmonar |
Transposição das grandes artérias |
Truncus arteriosus ou hemitruncus |
Outras anormalidades de conexão atrioventricular ou ventrículo atrial (crisscross cardíaco, isomerismo, síndromes heterotáxicas, inversão ventricular) |
Bethesda Conference, JACC 37 2001:1161
Tabela 2 Classificação da Organização Mundial de Saúde modificada (mOMS) de risco à gravidez para cardiopatias congênitas
OMS I | Risco não aumentado de morte e baixa morbidade: lesões estruturais não complicadas, leves ou discretas (estenose pulmonar, defeitos do septo atrial ou ventricular, canal arterial patente); lesões não complexas corrigidas com sucesso (defeito do septo atrial "ostio secundum", defeito do septo ventricular; canal arterial persistente, drenagem anômala das veias pulmonares); |
OMS II | Risco pequeno de mortalidade e morbidade materna: defeito do septo atrial ou ventricular, Tetralogia de Fallot operada; |
OMS III | Risco significativo de mortalidade e morbidade materna: ventrículo direito sistêmico (e.x transposição congenitamente corrigida das grandes artérias, transposição das arteriais após procedimentos de Mustard ou Senning); circulação de Fontan, cardiopatia congênita cianogênica; outras cardiopatias complexas; |
OMS IV | Risco muito elevado de mortalidade e alta morbidade materna: hipertensão arterial pulmonar de qualquer causa; disfunção ventricular grave; insuficiência cardíaca com FEVE < 30%; lesões obstrutivas graves do coração esquerdo, coartação de aorta grave |
FEVE: fração de ejeção do ventrículo esquerdo
Na primeira consulta do pré-natal, todas as pacientes tiveram diagnóstico anatômico e funcional definido pela Unidade de Cardiopatias Congênitas do InCor e iniciaram o acompanhamento periódico quinzenal até o segundo trimestre da gestação. Depois, durante o terceiro trimestre, isso se tornou semanal, sempre com a mesma equipe de cardiologistas e obedecendo ao protocolo estabelecido pelo Setor de Cardiopatia e Gravidez do InCor, que incluiu:
Orientação quanto às medidas higienodietéticas (repouso, restrição de atividades físicas, controle de anemia e infecção, ajuste de dose ou substituição da terapêutica prévia para o atual estado gravídico)
Avaliação periódica de saturação de oxigênio, hematócrito e hemoglobina materna
Atualização do ecodopplercardiograma bidimensional pela equipe de especialistas em cardiopatias congênitas do InCor
Seguimento em conjunto com os obstetras
Hospitalização eletiva após 28 semanas em pacientes de alto risco (hipoxemia, hipertensão pulmonar, lesões obstrutivas graves e disfunção ventricular importante)
Parto de indicação obstétrica
Profilaxia da endocardite infecciosa na ocasião do parto, com ampicilina 2,0 g por via intravenosa associada a gentamicina 1,5 g/kg/peso por via intramuscular, aplicadas 1 hora antes do parto
Consulta no pós-parto para exame clínico e coleta de informações sobre o parto, fundamentadas no resumo clínico da alta da maternidade, e sobre intercorrências maternas e do recém-nascido.
Para este estudo, foram consideradas as seguintes variáveis maternas: idade, cardiopatia de base; cirurgia cardíaca prévia; hipoxemia (saturação < 92% em repouso, medida pelo oxímetro digital e/ou por sinais clínicos de cianose periférica) ; hematócrito e hemoglobina maternos; disfunção ventricular (fração de ejeção [FE] ventricular ≤ 50%) ; ocorrência de complicações cardíacas e obstétricas ou morte materna.
Quanto aos recém-nascidos, as variáveis consideradas foram: idade gestacional do parto; perdas fetais, como aborto (< 20 semanas), natimorto (entre 20 e 36 semanas) e neomorto (até 30 dias após o parto) ; e malformações relacionadas à cardiopatia materna.
As condições de hipoxemia, cirurgia cardíaca prévia e anatomia univentricular foram as variáveis estudadas como presumíveis de prognóstico materno e fetal.
Foram consideradas as variáveis categóricas em tabelas contendo frequências absoluta (n) e relativa (%). A associação dos dados categóricos foi avaliada pelo método do qui-quadrado, e, quando necessário, utilizou-se o teste exato de Fisher. A distribuição das variáveis quantitativas quanto à normalidade foi avaliada com o teste de Kolmogorov-Smirnov. As variáveis com distribuição normal foram apresentadas com média e desvio padrão e comparadas com o teste t de Student para amostras independentes. As variáveis não paramétricas foram apresentadas com mediana e intervalo interquartílico e comparadas com o teste de Mann-Whitney. Os valores de p < 0,05 foram considerados significativos. O software SPSS versão 18.0 foi utilizado para o cálculo estatístico.
Esta pesquisa foi aprovada pela Comissão de Ética em Pesquisa do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de São Paulo - protocolo 4563/17/063.
As características básicas das 40 pacientes no início da gestação estão expostas na Tabela 3. As lesões cardíacas estruturais de base, a cirurgia corretiva prévia ou não e os resultados obstétricos e fetais das 42 gestações estão apresentados na Tabela 4.
Tabela 3 Características das pacientes do estudo no início da gestação. n = 40 mulheres
Estado clínico | |
---|---|
Idade em anos, média ± dp | 16 a 41 (média 24,5 ± 3,4) |
Saturação periférica de O2 (%) | 76 a 99 (média 88,5) |
Hemoglobina (mg/dL) | 10,5 a 22,0 (média 14,8) |
Hematócrito (%) | 32 a 69 (média 47) |
Classe funcional (NYHA) (%) | I e II: 35 pacientes (79%) |
III: 9 pacientes (21%) | |
IV: 0 paciente (0%) | |
Submetidas a cirurgia corretiva/paliativa | 34 pacientes (77,3%) |
Não operadas | 8 pacientes (20%) |
Hipoxemia (StO2 < 92%) | 19 (47,5%) |
Dp: desvio padrão; NYHA: New York Heart Association; StO2: saturação de oxigênio (medida pela oxímetro digital)
Tabela 4 Descrição da casuística e dos resultados obstétrico e fetal em 42 gestações.
Caso | Idade | Diagnóstico de base | Cirurgia prévia | SatO2 | Hb/Ht (%) | Tipo de parto/IG (sem)/peso (g) |
---|---|---|---|---|---|---|
1 | 18 | TGA | Senning | 99% | 13,5/39 | PV/37/2.150 |
2 | 20 | AP + CIV | Fontan | 80% | 19,7/62 | PC/29/1.950 |
3 | 21 | AP + CIV + CSP | não operada | 80% | 15/44 | PC/27/1.750 |
4 | 18 | Truncus tipo II | Rastelli | 99% | 12,5/38 | PC/40/3.360 |
5 | 20 | AP + CIV + PCA | Rastelli | 98% | 11,6/35 | PC/33/1.860 |
6 | 19 | TGA | Jatene | 96% | 11,2/33 | PV/37/2.230 |
7 | 33 | DVSVD + EPIV | Conduto VE-Ao + VD-TP | 98% | 12,8/35 | PC/38/2.850 |
8 | 27 | DVEVE + Discordância AV | não operada | 93% | 15,9/47 | PV/37/2.630 |
9 | 18 | TGA + CIV + EP supravalvar | Jatene | 98% | 12,1/36 | PV/38/3.886 |
10 | 32 | TGA + EPIV + CIV | BT + Rastelli | 98% | 10,5/32 | PV/38/3.210 |
11 | 24 | DVSVD + TGA + AP+ CIV | Conduto VE-AO + Rastelli | 99% | 11,5/36 | PV/37/2.250 |
12 | 19 | TGA+CIA+CIV+ EPV + DexCar | Não operada | 80% | 17,0/54 | Aborto |
13 | 32 | AP | BT + Glenn | 76% | 17,5/50 | PC/36/1.980 |
14 | 23 | TGA +CIV | Jatene | 87% | 12,5/40 | PC/34/2.130 |
15 | 21 | Ventrículo único | Glenn+ Fontan | 92% | 13,5/42 | PC/31/1.400 |
16 | 29 | DVSVD | BT + Glenn | 78% | 13,8/49 | PC/29/1.250 |
17 | 38 | Ventrículo único | Fontan | 82% | 16,8/50 | Aborto |
18 | 27 | Ventrículo único | Fontan | 83% | 16,9/50 | PC/28/850 |
19 | 19 | AT + CIV + EP | BT + Glenn +Fontan | 87% | 15,0/47 | PV/37/2.030 |
20 | 29 | AP + CIV | Rastelli + conduto VD-TP | 90% | 13,0/42 | PC/37/2.350 |
21 | 32 | AT+CIA+ CIV + EP | Fontan | 94% | 10,4/32 | PC/35/1.800 |
22 | 34 | Ventrículo único | Não operada | 89% | 22,0/69 | Aborto |
23 | 29 | TGA | Senning | 93% | 11,9/40 | PV/39/2.720 |
24 | 30 | DVEVE + CIV | Bandagem do tronco pulmonar | 89% | 17/49 | PC/35/1.750 |
25 | 16 | TGA | Jatene | 96% | 12,5/40 | PC/38/3.420 |
26 | 22 | AT | Não operada | 85% | 13,7/40 | PC/32/1.150 |
27 | 29 | TGA | Jatene | 93% | 12,2/39 | PC/38/2.460 |
28 | 32 | DVSVD+TGA+EPIV | Mustard | 93% | 12,5/45 | PC/36/2.240 |
29 | 40 | TGA | Jatene | 95% | 12,3/42 | PC/37/2.570 |
30 | 17 | DVEV único, tipo E, CIA+CIV +EP | Não | 93% | 15,9/47 | PV/39/2.720 |
31 | 22 | DVEV único, tipo E | Não | 94% | 12,8/45 | PV /37/2.630 |
32 | 24 | Tronco arterioso comum | Conduto valvulado | 93% | 12,5/42 | PC/38/3.270 |
33 | 32 | TGA+ CIA + CIV+ EPIV | Fontan | 91% | 13,0/43 | PV/33/1.510 |
34 | 26 | AP + CIV | Não | 87% | 21,0/67 | PV/30/1.120 |
35 | 18 | TGA, CIA, CIV, EP. | Senning | 90% | 11,8/42 | PV/38/2.770 |
36 | 19 | TGA + CIV +CIA+ AP+ dextrocar | Conduto VE-TP + plastia AV | 93% | 11,8/42 | PC/37/2.410 |
37 | 20 | TGA | Jatene | 95% | 11,9/40 | PC/38/3.220 |
38 | 41 | AP +CIV+PCA | BT + ligadura de colaterais | 87% | 15,4/45 | PC/28/500 |
39 | 31 | DVSVD + CIV + átrio único | Rastelli + conduto VE-AO | 96% | 13,4/40,2 | PV/36/2.480 |
40 | 1 | TGA +CIV+EPVI | Rastelli+ conduto Ve-Ao | 90% | 11,5/40 | PV/38/3.500 |
41 | 27 | AT + CIV + EP | BT+ Glenn + Fontan | 93% | 13,8/40,0 | PC/34/1.750 |
42 | 24 | Truncus arteriosus | Plastia da aorta+ rafia CIV Homoenxerto pulmonar | 94% | 11,5/40 | PC/37/2.168 |
AT: atresia tricúspide; CIA: comunicação interatrial; CIV: comunicação interventricular; EP: estenose pulmonar; TGA: transposição das grandes artérias; DVEVE: dupla via de entrada do ventriculo esquerdo; DVSVD: dupla via de saída do ventriculo direito; discord VA: discordância ventrículo-atrial; EPIV: estenose infundíbulo-valvar; AP: atresia pulmonar; CSP: colateral sistêmico pulmonar; PCA: persistencia do canal arterial; dext: dextrocardia; Hb: hemoglobina g/dl; HT: % hematócrito; PV: parto vaginal; PC: parto cesárea.
A análise da lesão cardíaca estrutural ou funcional registrada no início da gestação (Tabela 4) mostrou: ventrículo direito hipoplásico nos casos 2, 16, 20, 23 e 26; disfunção ventricular esquerda (FE < 50%) nos casos 11 e 20; estenose valvar, infundibular ou supravalvar com gradiente acima de 50 mmHg nos casos 14, 20, 24, 25, 26, 30, 31, 35 e 37; insuficiência valvar importante nos casos 17, 19, 27, 28 e 32. Oito pacientes (20,0%) não haviam sido operadas, e a análise anatomofuncional mostrou que 16 (40%) foram consideradas com um coração com função univentricular.
Considerou-se sucesso materno-fetal em 17 casos (40,5%), quando a mãe e o recém-nascido saudável obtiveram alta hospitalar após o parto sem complicações. A Figura 1 mostra a evolução e as complicações materno-fetais. Insuficiência cardíaca ocorreu nos casos 5, 6, 15, 24 e 41 (Tabela 4) e foi tratada com hospitalização, rigor nas medidas higienodietéticas, furosemida, carvedilol ou metoprolol associado ou não ao digital, quando indicados. Houve necessidade da cardioversão elétrica no tratamento do flütter atrial no caso 21 (Tabela 4). O tempo de internação hospitalar para o tratamento das complicações ou para o planejamento do parto variou entre 21 e 68 dias (média de 45 dias). Houve duas mortes maternas (4,7%) devido a causas obstétricas como hemorragia após o parto e pré-eclâmpsia, respectivamente casos 34 e 38 (Tabela 4).
Figura 1 Resultado materno-fetal das 42 gestações. RN: recém-nascidos saudáveis; IC: insuficiência cardíaca; DPP: descolamento prematuro de placenta; plac: placentário; CC: cardiopatia congênita
As complicações obstétricas estão apresentadas na Figura 1. As perdas fetais corresponderam a: abortos (casos 12, 17 e 34), natimorto (caso 34) e neomortos (casos 14, 16, 35) dois dos quais prematuros (Tabela 4). A idade gestacional do parto foi, em média, 37 semanas; 24 (54,5%) foram cesáreas por indicação obstétrica ou em função da piora progressiva do quadro clínico materno. Dentre os recém-nascidos vivos, houve dois casos de cardiopatia congênita (4,7%) : um deles com recorrência da cardiopatia materna (caso 25) e o outro de tetralogia de Fallot (caso 32). Nenhum deles foi prematuro.
Dentre as variáveis de presunção da evolução materno-fetal, a hipoxemia teve significativa correlação ao maior insucesso da gravidez, enquanto a cirurgia prévia (ser ou não operada) e a função univentricular não tiveram relação com a evolução materna nem com a fetal, como mostra a Tabela 5.
Tabela 5 Análise Comparativa das Variáveis de Presunção da Evolução Materno-fetal
Variáveis estudadas N° de casos | Hipoxêmicas n = 19 | Não hipoxêmicas n = 23 | Valor de p | Univentricular n = 16 | Biventricular (n = 26) | Valor de p | Operadas n = 34 | Não Operadas n = 8 | Valor de p |
---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|
Sucesso materno-fetal n = 17 | 3 (15,7%) | 14 (60,8%) | < 0,05 | 4 (25%) | 13 (50%) | 0,20 | 14 (41,2%) | 3 (37,5%) | 1,0 |
Complicações maternas n = 13 | 9 (47,4%) | 4 (17,4%) | < 0,05 | 7 (43,7%) | 6 (23,1%) | 0,18 | 10 (29,4%) | 3 (37,5%) | 0,68 |
Morte materna n = 2 | 2 (10,5%) | 0 | 0,19 | 0 | 2 (7,7%) | 0,51 | 1 (2,9%) | 1 (12,5%) | 0,34 |
Complicações fetais n= 23 | 18 (94,7%) | 5 (21,7%) | < 0,05 | 12 (75%) | 11 (42,3%) | 0,06 | 18 (52,9%) | 5 (62,5%) | 0,70 |
Perdas fetais n = 7 | 7 (36,8%) | 0 | < 0,05 | 4 (25%) | 3 (11,5%) | 0,39 | 3 (8,8%) | 4 (50%) | < 0,05 |
Prematuridade n = 17 | 12 (63,1%) | 5 (21,7%) | < 0,05 | 10 (62,5%) | 7 (26,9%) | < 0,05 | 14 (41,2%) | 3 (37,5%) | 1,0 |
Peso dos RN (g) | ± 600 | ± 527 | < 0,05 | 1841 ± 454 | 2531 ± 496 | < 0,05 | 2246 ± 660 | 2296 ± 749 | 0,76 |
RN: recém-nascidos saudáveis.
Este estudo corresponde a uma das maiores séries de gestação em portadora de CCC acompanhada sob protocolo multiprofissional em centro de referência em cardiopatia e gravidez - Instituto do Coração e Maternidade do Hospital das Clínicas da FMUSP. Representou 9,6% das 435 gestações em mulheres com cardiopatias congênitas do Registro-InCor da última década. Diante disso, é indiscutível que a maior sobrevida pós-operatória tardia dessas pacientes resultará em número crescente de gestações no futuro próximo.
As CCC consideradas na casuística estão classificadas pela OMS na categoria de risco III,3,4 o que significa desaconselhamento à gravidez, justificada pelos índices de 25,5% de complicações maternas e de 70% de insucesso para o concepto. Essas considerações estão de acordo com os resultados do estudo, que registrou somente 40% de gestações bem-sucedidas, ou seja, mães e recém-nascidos saudáveis e sem complicações. As altas taxas de problemas maternos (36%) e fetais (43%) fundamentam a orientação da OMS que desaconselha a gravidez nesse grupo de pacientes.
Entretanto, a experiência mundial frente a essa situação clínica é crescente e se deve a mulheres que engravidam sem orientação prévia ou àquelas que desejam a gravidez a despeito dos esclarecimentos no planejamento familiar.7 A diversidade do quadro anatômico e funcional dos problemas cardíacos nas CCC restringem a elaboração de protocolos para o tratamento de eventuais complicações que possam ocorrer durante a gravidez, o parto e o puerpério. Além disso, a maioria dos casos não permite propostas eficazes ou de intervenções factíveis no tratamento das lesões cardíacas residuais.7
No entanto, o conhecimento das complicações mais frequentes que ocorrem no pós-operatório tardio das CCC auxilia nas estratégias para preveni-las durante a gravidez. Nesse sentido, um estudo sobre as causas de morte em pacientes com CCC mostrou que insuficiência cardíaca, morte súbita, doença cardíaca isquêmica e endocardite infecciosa foram as mais frequentes. Ademais, entre as lesões anatômicas, excluindo-se a síndrome de Eisenmenger, a transposição das grandes artérias e a circulação de Fontan foram as mais importantes.8
O artigo sobre 120 necropsias em portadoras de cardiopatias congênitas no InCor9 corroborou a insuficiência cardíaca como principal causa de morte, uma vez que o remodelamento ventricular em resposta à sobrecarga volumétrica e pressórica ao longo da vida favorece a fibrose e a hipertrofia e redução do número de capilares intersticiais do miocárdio. O tromboembolismo, segunda causa de morte, foi significativamente associado a sinais histológicos de hipertensão pulmonar e também detectado na hipoxemia crônica. A terceira causa de morte registrada no estudo foi a endocardite infecciosa, o que reforçou a recomendação, em nosso protocolo, da antibioticoprofilaxia por ocasião do parto.
A hospitalização eletiva como rotina a partir da 28ª semana de gestação para as pacientes em situação de presumível risco mais elevado, independentemente do quadro funcional, fundamentou-se no fato de que o terceiro trimestre é crítico, tanto para a mãe, devido à sobrecarga hemodinâmica e à atividade pró-trombótica (que alcançam os limites máximos), como para o feto, pela prematuridade e restrição de crescimento intrauterino, que são apanágio das CCC.
A hospitalização eletiva auxiliou no refinamento do monitoramento materno-fetal, na oxigenoterapia intermitente, na anticoagulação individualizada, na otimização da terapêutica para as possíveis complicações e no planejamento do parto.
O estudo também mostrou similaridade na incidência das complicações cardíacas (14,2%) e obstétricas (16,6%), sendo que, em ambas, as mortes maternas foram decorrentes de causas obstétricas (pré-eclâmpsia e hemorragia pós-parto). Isso permite considerar que a reserva cardíaca extremamente limitada dessas pacientes não suporta as intercorrências inerentes ao ciclo gravídico-puerperal.
A pré-eclâmpsia, uma das causas de óbito neste estudo, é responsável por 15% das mortes maternas no Brasil, com incidência próxima a 10% na população em geral.10 Por isso, um diagnóstico precoce e um pré-natal efetivo, embora não a evitem, podem mudar o quadro em mulheres saudáveis. Contudo, nas portadoras de cardiopatias complexas, o prognóstico é reservado devido à enigmática disfunção endotelial sistêmica, característica da doença, e à sobrecarga circulatória determinada pela hipertensão arterial.
A hemorragia pós-parto, razão do segundo óbito em nossa casuística, é considerada importante causa obstétrica de morte materna em mulheres cardiopatas, e particularmente expressiva nas pacientes hipoxêmicas. Esse fato foi documentado no relato de 366 parturientes nulíparas portadoras de cardiopatias congênitas, o qual registrou o percentual de 21% de hemorragia obstétrica e identificou a cesárea prematura, a anestesia geral e o uso de heparina profilática como variáveis de maior correlação com sangramento no pós-parto. Além disso, entre as cardiopatias congênitas, a circulação de Fontan foi a situação clínica de maior risco.11
Em nosso estudo, a associação de hipoxemia e hemorragia pós-parto cesáreo ocorreu em um caso, que resultou na segunda morte materna. Na verdade, a maior morbidade materno-fetal associada à cesárea prematura se deve aos casos de instabilidade clínica materna e de restrição ao crescimento intrauterino, situações habituais nestes casos graves.
Um breve destaque deve ser dado às cardiopatias mais frequentes em nosso estudo, como a transposição das grandes artérias e a circulação de Fontan. A evolução promissora do pós-operatório tardio da correção da transposição das grandes artérias, seja a nível atrial (técnicas de Senning ou Mustard) seja a nível arterial (técnica de Jatene), tem possibilitado o desenvolvimento de gravidez.12,13 Entretanto, existem eventos previstos no pós-operatório tardio que devem ser desfavoráveis durante a gestação. Assim, na correção de Mustard ou Senning, estima-se que 40% das pacientes apresentam arritmias supraventriculares e disfunção ventricular na idade adulta, enquanto, na técnica de Jatene, a insuficiência da valva neoaórtica está presente em 1 a 2% dos casos, e as complicações coronarianas ocorrem em 3 a 11% entre os eventos tardios. Com respeito à cirurgia de Rastelli, a evolução tardia depende do tipo de tecido utilizado na confecção do conduto, que pode determinar diferentes graus de calcificação e a oclusão progressiva desse enxerto.14
Com base nessas considerações, por ocasião da gravidez, é preciso estar preparado para o tratamento da insuficiência cardíaca e de arritmias quando há: disfunção ventricular direita e insuficiência tricúspide após as técnicas de Mustard e Senning; insuficiência cardíaca e baixo débito frente aos condutos calcificados após o procedimento de Rastelli; disfunções valvares quando tiver sido usada a técnica de Jatene.14
O estudo mostrou ainda que, à exceção de uma paciente não operada que evoluiu para aborto espontâneo (caso 12), as demais 14 gestantes com transposição dos grandes vasos da base apresentaram evolução favorável materno-fetal, independentemente do tipo de correção cirúrgica. Vale ressaltar que as complicações previstas foram muito bem controladas com hospitalização e monitoramento constante da mãe e do feto.
A técnica de Fontan tem proporcionado a sobrevida de 70% das pacientes com cardiopatia univentricular até a idade fértil.15 Entretanto, no pós-operatório tardio, são esperadas complicações como: taquicardia atrial, tromboembolismo (estase hepática e do sistema venoso) , insuficiência cardíaca, falência hepática e enteropatia perdedora de proteína. A conexão anormal (veia cava e circulação pulmonar), apesar de corrigir a cianose, minimizar a sobrecarga ventricular e ajustar a circulação pulmonar, pode estar prejudicada pelas variações da pressão venosa central e pela pressão negativa intratorácica induzida por hiperventilação e oscilações do débito cardíaco durante a gravidez.
A incapacidade de adaptação das pacientes com circulação de Fontan à fisiologia do ciclo gravídico-puerperal foi documentada em nosso estudo, que mostrou piora da classe funcional em todas as pacientes. A insuficiência cardíaca ocorre porque o ventrículo anatômico e funcional anormal é incapaz de se ajustar ao débito cardíaco aumentado. Contudo, não houve morte materna face às saudáveis, porque foram obtidas boas respostas ao tratamento clínico com uso de diurético e betabloqueador nas pacientes que desenvolveram insuficiência cardíaca (casos 15 e 41) e à cardioversão elétrica no caso do flutter atrial (caso 21).
A evolução desfavorável para o feto foi documentada em seis casos de Fontan, resultando em um aborto espontâneo e cinco partos prematuros. Uma revisão da literatura que incluiu seis estudos com 255 gestações em 133 mulheres mostrou 137 perdas fetais (69%), e dentre os 115 recém-nascidos vivos, 68 (59%) foram prematuros e 6 (5,2%) evoluíram para óbito neonatal. As causas da prematuridade não foram detalhadas, particularmente naquelas induzidas pela antecipação do parto devido a razões maternas. Todavia, a rotura prematura da bolsa amniótica e o descolamento prematuro de placenta foram as intercorrências associadas em 6,2% e 10,9%, respectivamente.16
O mau prognóstico fetal foi corroborado pelo estudo multicêntrico do Reino Unido, que incluiu 50 mulheres e 124 gestações. Ele mostrou incidência de 68 abortos espontâneos (54,8%) ; dentre os 56 recém-nascidos vivos (45,2%), quatro morreram devido a prematuridade extrema (parto com idade gestacional abaixo de 32 semanas). Por outro lado, as complicações maternas, como insuficiência cardíaca em 13,5%, arritmias em 11,3% e tromboembolismo pulmonar em 1,19% dos casos, não acarretaram morte da mãe.17
A conduta de anticoagulação plena em pacientes com circulação de Fontan considerou o risco alto de tromboembolismo peculiar a essa técnica e o estado de hipercoagulabilidade da gravidez e do puerpério. No entanto, não se pode desconsiderar o estudo com 59 gestações em 37 pacientes, o qual destacou que a anticoagulação plena foi associada a pior evolução neonatal. Contudo, houve três casos de tromboembolismo materno, dois deles em pacientes não anticoaguladas.
Diante dos dilemas da conduta durante a gravidez de pacientes submetidas à cirurgia de Fontan, a maioria dos especialistas considera que função ventricular deprimida, cianose, insuficiência valvar mitral importante ou enteropatia perdedora de proteína são fatores que desaconselham a gravidez.15-17
Ao analisar as variáveis presumíveis de prognóstico materno e fetal, o presente estudo destacou a pior evolução em pacientes hipoxêmicas. O fato de o inusitado resultado das variáveis, univentricular e cirurgia prévia, não terem demonstrado diferenças na evolução da gravidez, possivelmente se deve ao pequeno número da casuística e à anatomia da lesão cardíaca, que foi favorável à sobrevida durante a idade reprodutiva. Nesse sentido, o estudo que analisou 102 necrópsias de portadores de cardiopatias congênitas verificou que a média de idade dos casos não operados era maior quando comparada à dos operados, além de essas pacientes apresentarem problemas anatômicos menos graves.9
Outro destaque do estudo desenvolvido é o registro de dois casos (5%) de cardiopatia congênita no neonato, o que corresponde a seis vezes mais que os 0,8% estimados para a população geral. Esse percentual é ainda superior ao do relato de Oliveira et al., que identificaram três casos (3,2%) de malformações cardíacas em filhos de 100 gestantes portadoras de cardiopatia congênita acompanhadas no InCor.19 A recorrência de cardiopatia nos bebês de mães com cardiopatias congênitas deve ser considerada no planejamento familiar, em resposta aos questionamentos sobre a herança familiar, e na indicação de ecocardiograma fetal de rotina para o rastreamento intrauterino durante a gestação nessas pacientes.
O número pequeno e a heterogeneidade dos defeitos anatômicos limitam a análise estatística acurada. Contudo, há de se considerar que a amostra de pacientes foi exclusiva ao grupo de alto risco, no qual a gravidez é desaconselhada, e constitui o grande dilema de orientação no planejamento familiar. O caráter do estudo - retrospectivo e observacional, restrito a um único centro - pode também influenciar as conclusões adequadas.
As cardiopatias congênitas afetam aproximadamente 0,8% de todos os recém-nascidos vivos, e as taxas de sobrevida de 86% são destaques nos registros internacionais. Estima-se que, atualmente, existam mais adultos com cardiopatias congênitas do que crianças, o que, naturalmente, proporciona um número considerável de mulheres em idade reprodutiva.
A capacitação da equipe multiprofissional é fundamental no planejamento familiar da jovem cardiopata, sobretudo no aconselhamento à gravidez, como as alternativas à anticoncepção segura e efetiva. Apesar da estratificação do risco da OMS, que permite desaconselhar a gravidez, deve-se considerar o que consta na legislação brasileira:
“Ademais há de se considerar o artigo 226: Fundado nos princípios da dignidade da pessoa humana e da paternidade responsável, o planejamento familiar é livre decisão do casal, competindo ao Estado propiciar recursos educacionais e científicos para o exercício desse direito, vedada qualquer forma coercitiva por parte de instituições oficiais ou privadas” (grifo dos autores).
Essa norma remete a outros institutos: o da dignidade da pessoa humana (artigo 1º, III) e o do direito à liberdade (artigo 5°, caput).20 )
O rígido protocolo de atendimento durante a gravidez, o parto e o puerpério não evitou mortes maternas, prematuridade e perdas fetais em portadoras de CCC. A hipoxemia foi um fator de mau prognóstico, e se a evolução materna foi insatisfatória, pior foi a parte reservada ao concepto. Embora a autonomia da intenção à concepção precise ser respeitada, a gravidez ainda deve ser desaconselhada em mulheres com CCC.