versão On-line ISSN 2317-1782
CoDAS vol.29 no.2 São Paulo 2017 Epub 30-Mar-2017
http://dx.doi.org/10.1590/2317-1782/20172016017
Ao adentrar o processo de alfabetização, espera-se que as crianças apresentem um domínio mínimo das habilidades de linguagem oral. Quando elas são capazes de lidar com a linguagem como função comunicativa, estima-se que sejam capazes de utilizá-la como uma função metalinguística, ou seja, usar a linguagem para refletir sobre ela mesma(1).
Ao aprender os princípios de um sistema alfabético, como é o caso do Português Brasileiro, a criança deve ser instruída a perceber que a fala é composta por unidades que podem ser segmentadas e manipuladas. Este processo exige tanto o envolvimento de habilidades como consciência fonológica e memória de curto prazo fonológica, como uma instrução formal sobre as relações entre fonemas e grafemas(2,3).
A consciência fonológica, componente do processamento fonológico, está relacionada à habilidade de refletir e manipular os segmentos da fala. Seu domínio ocorre paulatinamente e parte de uma sensibilidade superficial para uma mais profunda, ou seja, inicialmente há a percepção dos segmentos maiores da fala – palavras e sílabas – e, posteriormente, é possível lidar com os menores segmentos da fala: os fonemas. Dentro desta perspectiva é possível compreender o resultado de pesquisas que apontam para o melhor desempenho das crianças em atividades de consciência silábica do que em atividades de consciência fonêmica(1,4).
As habilidades de aliteração e rima, componentes da consciência silábica, são arduamente exercitadas no ambiente escolar, o que otimiza o contato das crianças com elas(5). A aliteração é trabalhada anteriormente à rima, pois, no processo de alfabetização, há extenuante relação entre palavras que começam igual, que começam com uma determinada letra, com a letra do nome da criança, dos colegas, dentre outras estimulações. Já as atividades de rima são realizadas no ambiente escolar desde a pré-escola de forma implícita – com o uso de músicas, parlendas – mas as atividades explícitas que as envolvem são iniciadas posteriormente às de aliteração(6). Deste modo, alguns estudos apontam que as atividades de aliteração são realizadas com mais facilidade do que as de rima(7,8).
Conforme as crianças são expostas a diferentes situações linguísticas – seja no ambiente familiar e/ou no escolar - elas aumentam seus domínios de diferentes aspectos das palavras, como os aspectos semânticos. Desta forma, gradualmente tendem a atentar para outras características da palavra, como os traços fonológicos. Estudos apontam que as crianças modificam as estratégias que utilizam para organizar seu léxico e isto pode influenciar o modo como solucionam atividades de consciência fonológica(9,10).
Inicialmente, elas atentam mais para os estímulos de uma forma global, levando em conta todos os aspectos das palavras e não apenas sua fonologia, o que as leva a optar por distratores semânticos, quando estes estão presentes no processo de avaliação(11). Conforme há a expansão vocabular, as crianças atingem certo domínio das habilidades semânticas e, ao mesmo tempo, aprimoram suas habilidades com a linguagem escrita e a relação fonema-grafema, o que as torna capazes de atentar mais especificamente para outros aspectos das palavras, como o fonológico, possibilitando uma análise mais segmental dos itens e aumentando a tendência de optarem por distratores fonológicos(10). Deste modo, apesar de continuarem a perceber todas as características das palavras, são capazes de ampliar ou especificar sua análise de acordo com a demanda da tarefa(5,12).
Crianças diagnosticadas com distúrbio específico de linguagem (DEL) possuem alterações significativas no processo de aquisição e desenvolvimento da linguagem apresentando, dentre outras manifestações clínicas, dificuldade em adquirir novas palavras, defasagem na memória operacional e de curto prazo fonológica, presença de processos fonológicos comuns e idiossincráticos, estruturação gramatical simplificada e pouco variada e ordenação atípica de palavras(3,13-15).
A intrínseca relação entre a linguagem oral e escrita nos leva a compreender que as múltiplas alterações na linguagem oral de crianças com DEL, inclusive na representação fonológica, fazem com que estas sejam mais propensas a manifestar alterações no processamento fonológico e nas habilidades de leitura e escrita(7,16,17).
Deste modo, o presente estudo buscou investigar e comparar o desempenho de escolares com distúrbio específico de linguagem (DEL) e em desenvolvimento típico de linguagem em atividades de identificação de aliteração e rima e verificar, em ambas as tarefas, a influência dos distratores semânticos e fonológicos.
Este projeto foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da instituição na qual o estudo foi desenvolvido sob número 330/13. Os pais ou responsáveis assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido e os escolares participantes assinaram o Termo de Assentimento.
A amostra foi composta por 60 sujeitos, sendo 12 com DEL (GP) e 48 em desenvolvimento típico de linguagem (GC) com idade variando entre 7 anos e 9 anos e 11 meses. Todas os escolares cursavam o 2º ano ou 3º ano do ensino fundamental de escolas estaduais da zona oeste da cidade de São Paulo e encontravam-se em processo de alfabetização.
Como escolares sem queixa e/ou diagnóstico de alterações de linguagem oral e/ou escrita podem apresentar grande variabilidade de desempenho nos primeiros anos escolares(18), foi adotada a proporção 1:4 (GP:GC) entre os sujeitos. Assim, para cada escolar com DEL, havia quatro escolares sem alteração de linguagem.
Os critérios de inclusão para o GP foram: ter o Português como língua nativa; inteligência não verbal compatível com a normalidade; ter produção de fala inteligível; possuir diagnóstico confirmado de DEL e estar em terapia fonoaudiológica.
Vale ressaltar que, para ser considerado um quadro de DEL, a criança, na ocasião da avaliação diagnóstica, apresentou resultados abaixo do esperado em pelo menos dois testes padronizados de linguagem dentre os seguintes: vocabulário expressivo(19), fonologia(20), pragmática(21) e extensão média do enunciado(22), e respeitou os critérios de exclusão para o quadro, a saber: ausência de comprometimento neurológico, intelectual não verbal, psiquiátrico e/ou sensorial(13).
Os escolares com DEL estavam em terapia nesta instituição há pelo menos seis meses, sendo a média equivalente a três anos. Considerando que os quadros de DEL se manifestam nas fases iniciais de aquisição da linguagem, estar em atendimento fonoaudiológico é uma condição essencial para que eles possam desenvolver minimamente as habilidades metafonológicas abordadas neste estudo. Os sujeitos que haviam iniciado terapia há menos tempo consistem exatamente nos sujeitos mais jovens e permaneceram em fila de espera para atendimento por queixas da linguagem oral.
Para o GC, os critérios de inclusão foram: ter o Português como língua nativa; limiares auditivos e inteligência não verbal compatíveis com a normalidade; vocabulário receptivo(23) compatível com o esperado para a escolaridade e ausência de processos fonológicos produtivos(20).
Portanto, a seleção destes sujeitos envolveu triagem auditiva; aplicação do teste de quociente de inteligência não verbal Raven(24) por psicóloga habilitada; avaliação do vocabulário receptivo pelo teste de vocabulário por figuras (TVFUSP)(23) e da fonologia pelas tarefas de imitação e nomeação do ABFW(20).
Assim, para compor o GC, foram triados inicialmente 88 sujeitos, porém 40 (45,4%) foram excluídos pelos seguintes motivos: 21 (52,5%) falharam na triagem auditiva, 18 (45,0%) falharam na triagem de linguagem e 1 (2,5%) falhou no teste de quociente de inteligência não verbal. Todos que falharam em alguma etapa foram encaminhados para avaliação complementar em serviço público.
A coleta de dados aconteceu no local de terapia fonoaudiológica para o GP enquanto para o GC aconteceu na escola estadual em que estudavam, localizada na zona oeste da cidade de São Paulo. Cada sujeito foi avaliado individualmente e em sala previamente preparada.
Para responder aos objetivos do estudo foram utilizados os subtestes de identificação de aliteração igual e de rima igual do teste de sensibilidade fonológica visual(25).
Cada subteste envolve a apresentação de 15 itens, sendo os três primeiros exemplos para garantir a compreensão da criança. Cada item é composto por quatro estímulos, a saber: o alvo, a resposta correta e dois distratores. Os estímulos distratores podem ser de natureza semântica ou fonológica, ou ainda podem ser neutros. Os semânticos são caracterizados pela inclusão de uma palavra semanticamente relacionada ao alvo, mas que não é a resposta correta. Os fonológicos funcionam de forma diversa para os subtestes: no subteste de aliteração, o estímulo distrator é uma palavra que rima com o estímulo-alvo (exemplo: para o alvo “chave”, o distrator fonológico é “nave”), enquanto no subteste de rima, o distrator é uma aliteração com o estímulo-alvo (exemplo, para o alvo “faca” o distrator fonológico é “fada”). Em ambos os subtestes há itens com distratores apenas semânticos ou fonológicos, mas também há itens simultaneamente com os dois distratores (semântico-fonológico) e itens apenas com distratores neutros.
O desempenho dos sujeitos é obtido pelo número de acertos em cada subteste. Cada resposta compatível com o item correto obteve 1 ponto e cada resposta compatível com um distrator não obteve pontuação. A pontuação máxima em cada subteste era de 12 pontos. O tipo de distrator ocorrido foi registrado para análise do tipo de erro.
A aplicação dos subtestes ocorreu em notebook utilizando o software E-prime, a fim de tornar a atividade mais dinâmica e diminuir os efeitos da perda de foco. Para garantir nitidez e qualidade dos estímulos visuais apresentados, foi necessário que as figuras do teste fossem redesenhadas, de acordo com o modelo padronizado pelo teste, pois apenas assim o arquivo digital era compatível com os requisitos do software em questão. Da mesma forma, as instruções de cada item foram gravadas digitalmente por um falante nativo do Português Brasileiro em ambiente tratado acusticamente. Tais procedimentos permitiram padronização na apresentação dos estímulos, além de otimizar o registro do desempenho dos sujeitos.
Durante a aplicação, todos os escolares iniciaram a sessão com a identificação de aliteração igual e, posteriormente, realizaram a identificação de rima igual. A apresentação dos estímulos visuais ocorreu concomitantemente à apresentação do estímulo auditivo, por exemplo, na tela do computador, apareceram as seguintes imagens: bolo, boné, porta e sino. Ao mesmo tempo, a ordem digitalizada foi ouvida pela criança através de fones de ouvido: “Qual começa igual a bolo: boné, porta, sino?” ou: “Qual termina igual a vinho: faca, tênis, ninho?”.
Vale salientar que os subtestes de aliteração e de rima não foram aplicados sequencialmente para evitar confusão na resposta dos escolares, visto que tais tarefas são de natureza semelhante. Entre estas tarefas os escolares realizaram duas atividades de linguagem, que não são tema deste estudo.
Depois da coleta de dados, o total de acertos foi utilizado para comparação entre os grupos, em cada tarefa. Como se tratava de dois subtestes com a mesma pontuação máxima, não foi necessário realizar transformação nos dados. Além dos acertos, os erros foram quantificados e qualificados em: erro por distrator semântico, erro por distrator fonológico e outros (que ocorria quando a criança optava pelo distrator neutro).
Os dados coletados foram submetidos à análise estatística no software SPSS versão 22. A mediana e o intervalo interquartil foram utilizados para a descrição dos dados. O teste não paramétrico de Mann-Whitney foi utilizado para comparar os grupos e o teste não paramétrico de Wilcoxon foi utilizado para comparar o desempenho nas diferentes tarefas em cada grupo. O nível de significância adotado foi de 5% e os resultados significantes foram assinalados com asterisco.
A análise intragrupo revelou que, tanto no GC (p<0,001) quanto no GP (p=0,001), os escolares obtiveram desempenho superior na aliteração do que na rima (Figura 1).
* diferença estatística p<0,05 – Teste não paramétrico de Wilcoxon
Figura 1 Comparação entre o desempenho nas tarefas de aliteração e nas de rima em cada grupo
O GP apresentou desempenho inferior nas tarefas de aliteração (p=0,001) e rima (p=0,009) quando comparado ao GC (Tabela 1).
Tabela 1 Comparação entre o desempenho dos grupos nas tarefas de aliteração e rima
TSF | Grupo | n | Mediana | Intervalo interquartil | U | Z | p | |
---|---|---|---|---|---|---|---|---|
Aliteração | Controle | 48 | 12,0 | 11,0 | 12,0 | 132,5 | -3,228 | 0,001* |
Pesquisa | 12 | 8,5 | 6,5 | 12,0 | ||||
Rima | Controle | 48 | 9,0 | 7,0 | 10,0 | 147,0 | -2,629 | 0,009* |
Pesquisa | 12 | 5,5 | 4,0 | 8,0 |
*diferença estatística p<0,05 – Teste não paramétrico de Mann-Whitney
Legenda: TSF – teste de sensibilidade fonológica, n – número de sujeitos, U – valor do teste de Mann-Whitney, Z – z escore, p – nível de significância estatística
Ao comparar os grupos com relação à tipologia dos erros, observou-se que na tarefa de aliteração o GP cometeu mais erros nas categorias semântico (p=0,004) e outros (p<0,001), mas não houve diferença em relação aos erros fonológicos (p=0,163), conforme Tabela 2.
Tabela 2 Comparação entre os grupos do tipo de erros na tarefa de aliteração
Aliteração | Grupo | n | Mediana | Intervalo interquartil | U | Z | p | |
---|---|---|---|---|---|---|---|---|
Erro semântico | Controle | 48 | 0,0 | 0,0 | 0,0 | 175,5 | -2,898 | 0,004* |
Pesquisa | 12 | 0,5 | 0,0 | 1,8 | ||||
Erro fonológico | Controle | 48 | 0,0 | 0,0 | 0,0 | 243,5 | -1,395 | 0,163 |
Pesquisa | 12 | 0,0 | 0,0 | 0,8 | ||||
Outros erros | Controle | 48 | 0,0 | 0,0 | 0,0 | 121,0 | -3,894 | <0,001* |
Pesquisa | 12 | 2,0 | 0,0 | 2,8 |
*diferença estatística p<0,05 – Teste não paramétrico de Mann-Whitney
Legenda: n – número de sujeitos, U – valor do teste de Mann-Whitney, Z – z escore, p – nível de significância estatística
Na tarefa de rima, o GP apresentou mais erros nas tipologias fonológico (p=0,048) e outros (p=0,031), mas não houve diferença em relação aos erros semânticos (p=0,367), conforme Tabela 3.
Tabela 3 Comparação entre os grupos do tipo de erros na tarefa de rima
Rima | Grupo | n | Mediana | Intervalo interquartil | U | Z | p | |
---|---|---|---|---|---|---|---|---|
Erro semântico | Controle | 48 | 1,0 | 0,0 | 1,0 | 243,0 | -0,901 | 0,367 |
Pesquisa | 12 | 1,0 | 0,0 | 2,0 | ||||
Erro fonológico | Controle | 48 | 2,0 | 1,0 | 3,0 | 183,5 | -1,980 | 0,048* |
Pesquisa | 12 | 3,5 | 1,3 | 4,0 | ||||
Outros erros | Controle | 48 | 1,0 | 0,0 | 1,0 | 178,5 | -2,162 | 0,031* |
Pesquisa | 12 | 2,0 | 0,0 | 3,0 |
*diferença estatística p<0,05 – Teste não paramétrico de Mann-Whitney
Legenda: n – número de sujeitos, U – valor do teste de Mann-Whitney, Z – z escore, p – nível de significância estatística
Os objetivos do presente estudo foram avaliar o desempenho de escolares com distúrbio específico de linguagem (DEL) e em desenvolvimento típico de linguagem em atividades de aliteração e rima, caracterizando o desempenho de cada grupo nas provas e, posteriormente, comparar o desempenho entre os grupos, levando em consideração a influência dos distratores semânticos e fonológicos.
Através dos dados obtidos, nota-se que o GP apresentou desempenho significativamente inferior nas atividades de aliteração e rima quando comparado ao GC, e estes resultados corroboram os achados de outras pesquisas(7,26).
Isto demonstra que os escolares com DEL que cursam o 2º ou 3º ano do ensino fundamental I ainda apresentam dificuldade significativa em lidar com tarefas de consciência fonológica silábica, que são consideradas relativamente simples(1,4). Para eles, a percepção de que as palavras são compostas por unidades menores que podem ser segmentadas e manipuladas ainda não está totalmente estabelecida, o que pode impactar o desenvolvimento de outras habilidades de consciência silábica e fonêmica e as habilidades de leitura e escrita(1,27).
Outro dado encontrado neste estudo aponta que ambos os grupos apresentaram desempenho superior na atividade de aliteração do que na de rima, o que vai ao encontro dos achados de outras pesquisas(6,28).
Além do fato do processamento de atividades de rima ser adquirido e aprimorado gradualmente, este também exige a segmentação da palavra-alvo, a detecção de seu segmento final e a retenção desta informação na memória. Na sequência, é necessário realizar uma análise semelhante com cada palavra proposta na atividade e acumular essas informações na memória até que seja encontrado um segmento final igual ao do estímulo-alvo. Já, na tarefa de aliteração, a demanda é diminuída, já que não é necessária a análise da palavra toda, apenas a atenção e retenção dos segmentos iniciais(9).
Desta forma, quando pensamos no período de aquisição e na demanda do processamento de atividades de aliteração e rima, podemos compreender o porquê destas serem mais complexas do que aquelas(5,9,29).
Em relação aos distratores, vemos que na aliteração o GP apresentou mais erros relacionados aos distratores semânticos do que fonológicos.
A preferência pelos distratores semânticos pode ser justificada, pois o distrator fonológico na prova de aliteração é uma rima (exemplo: para o item alvo “chave”, o distrator fonológico é “nave”), que exige uma análise mais segmental para que seja identificada, além de exigir a retenção e manipulação fonológica dos segmentos das palavras até a sílaba final(9,29).
Vimos, por meio dos dados deste estudo, que o GP apresentou desempenho inferior na atividade de rima do que na de aliteração e, portanto, é compreensível que este grupo não tenha optado pelos distratores fonológicos, que eram rimas.
Além disso, os escolares com DEL apresentam prejuízo na memória(3,30) e usualmente realizam uma análise mais global da palavra, não atentando para seus segmentos de forma detalhada, o que também pode ter contribuído para que tenham ignorado com maior facilidade os distratores fonológicos(11).
A preferência pelos distratores semânticos também pode ser justificada, pois os sujeitos que compõem o grupo DEL já se encontram em terapia fonoaudiológica, o que pode ter facilitado a relação entre o estímulo-alvo e o distrator semântico, uma vez que as palavras do teste são relativamente simples e possivelmente já presentes em seu vocabulário.
Na avaliação da rima, os escolares com DEL apresentaram maior número de erros em relação aos distratores fonológicos do que aos semânticos, lembrando que na prova de rima, o distrator fonológico é uma aliteração, por exemplo: para o item alvo “faca” o distrator fonológico é “fada”.
Este dado aponta que os sujeitos com DEL compreenderam a demanda da tarefa que exigia uma análise mais fonológica dos itens, já que houve menos incidência de erros semânticos. No entanto, não foram capazes de lidar com a demanda mais complexa exigida pela tarefa de rima, optando então pelo distrator fonológico que era mais simples, pois era uma aliteração.
Todas as dificuldades vivenciadas por estes sujeitos e tratadas nesta e em outras pesquisas reforçam a necessidade da implantação e divulgação de programas de diagnóstico e intervenção precoce, a fim de que as alterações dos sujeitos sejam abordadas por profissionais capacitados tão logo se manifestem.
A intervenção da linguagem escrita no DEL deve ocorrer concomitantemente à abordagem da oralidade(16,17) e os aspectos do processamento fonológico, inclusive os representados nesta pesquisa – aliteração e rima – também devem ocupar o espaço terapêutico.
Como usualmente as questões de linguagem oral no DEL são abrangentes e persistentes, torna-se inviável aguardar que estas sejam completamente superadas para somente então abordar a estimulação das habilidades de processamento fonológico, leitura e escrita. Deste modo, estes sujeitos se beneficiariam de uma intervenção precoce nas duas modalidades linguísticas, uma vez que apresentam risco para apresentar dificuldades no processo de alfabetização como consequência do prejuízo na linguagem oral.
Vale salientar que o presente estudo apresentou limitações em sua execução, sendo a principal delas o número de sujeitos do GP. A estimativa inicial do estudo era a de que o GP contaria com 20 sujeitos, sendo este o número de escolares que se encontrava em atendimento no laboratório e que respeitavam os critérios de inclusão. No entanto, alguns sujeitos abandonaram o tratamento enquanto outros foram desligados por falta de assiduidade, e como o serviço funciona por demanda espontânea, não houve ingresso de escolares que se enquadrassem nos critérios desta pesquisa.
Outra limitação que poderia ser mencionada se refere ao fato de os sujeitos já estarem em intervenção fonoaudiológica, porém, considerando que o DEL se manifesta na linguagem oral durante o período pré-escolar, não é desejável que qualquer criança chegue ao período escolar sem intervenção. Todavia, seria interessante verificar o desempenho de escolares com DEL em idade pré-escolar nessas mesmas habilidades.
Em suma, esta pesquisa contribuiu fornecendo dados quantitativos e qualitativos que ajudam a compreender melhor o desempenho de escolares com DEL em habilidades de processamento fonológico e de escrita. Também acrescenta informações sobre o tema no âmbito da ciência nacional, que conta com poucas pesquisas nesta temática quando analisamos o cenário internacional.
Os escolares com DEL obtiveram desempenho inferior ao de seus pares nas tarefas de aliteração e rima, o que demonstra a discrepância que possuem no domínio de tarefas de processamento fonológico em relação a escolares sem alteração de linguagem.
Além disso, os escolares com DEL evidenciaram uma análise mais global dos estímulos, desprezando aspectos relevantes para a tarefa que poderiam ser obtidos através de um processamento mais analítico das informações.
Deste modo, é importante que as habilidades de consciência fonológica, inclusive as relativamente mais simples e silábicas como a aliteração e a rima, sejam abordadas concomitantemente às de linguagem oral no processo terapêutico dos quadros de DEL.