Compartilhar

Health-related quality of life after stroke

Health-related quality of life after stroke

Autores:

Mary Ângela de Oliveira Canuto,
Lídya Tolstenko Nogueira,
Telma Maria Evangelista de Araújo

ARTIGO ORIGINAL

Acta Paulista de Enfermagem

On-line version ISSN 1982-0194

Acta paul. enferm. vol.29 no.3 São Paulo mai./June 2016

http://dx.doi.org/10.1590/1982-0194201600035

Introdução

O acidente vascular cerebral destaca-se como a segunda causa de morte no mundo. Projeções mostram que uma em cada seis pessoas terá um acidente vascular cerebral na vida; 15 milhões de pessoas sofrem acidente vascular cerebral por ano e 6 milhões não sobrevivem; dentre os que sobrevivem, a maioria apresenta deficiências residuais.(1)

Tais sequelas tornam o indivíduo parcial ou totalmente incapaz, com graves implicações para sua qualidade de vida, em virtude dos anos de vida produtiva perdidos, além dos altos custos financeiros envolvidos.(2)

O termo “qualidade de vida relacionada à saúde” é bastante utilizado com objetivos semelhantes à conceituação mais geral de qualidade de vida. Porém, qualidade de vida possui uma definição mais ampla, influenciada por estudos sociológicos, sem aludir a doenças e agravos, enquanto que qualidade de vida relacionada à saúde parece fazer referência aos aspectos mais diretamente relacionados às doenças ou às intervenções em saúde.(3) Pesquisas demonstram piora nos domínios e na qualidade de vida relacionada à saúde pós-acidente vascular cerebral.(4-6)

Com base no exposto, o objetivo deste estudo foi avaliar qualidade de vida relacionada à saúde de pessoas que sofreram acidente vascular cerebral e associar esse evento às características desses indivíduos.

Métodos

Estudo transversal realizado de fevereiro a agosto de 2014, no Centro Integrado de Reabilitação de Teresina, no Estado do Piauí, Região Nordeste do Brasil. Trata-se de uma instituição sem fins lucrativos, de reabilitação de pessoas portadoras de deficiências.

A população foi constituída por 255 pacientes que buscaram reabilitação pós-acidente vascular cerebral em 2014. Utilizou-se amostragem aleatória simples, e o cálculo amostral levou em consideração erro tolerável de 6%, com nível de significância de 95%, obtendo-se 132 participantes.

Aplicando-se os critérios de inclusão (idade ≥18 anos e diagnóstico de acidente vascular cerebral confirmado) e exclusão (comorbidade neurológica e limitações de linguagem que impediam as respostas aos questionamentos), a amostra foi composta por 104 pacientes. O Miniexame do Estado Mental (MEEM) foi utilizado para rastreio cognitivo, visando avaliar se o indivíduo apresentava compreensão para responder as questões dos demais instrumentos, com perda amostral de 27 participantes, que não apresentaram essa condição (Figura 1).

MEEM - Miniexame do Estado Mental

Figura 1 Fluxograma de seleção de participantes do estudo 

Os instrumentos de pesquisa foram: MEEM, para avaliar a função cognitiva e selecionar os indivíduos aptos a responderem os outros instrumentos; roteiro estruturado para obter dados sociodemográficos, econômicos, arranjo familiar e relacionados à saúde; e a Stroke Specific Quality of Life Scale (SS-QOL).

O MEEM é uma das escalas mais comumente utilizadas para avaliação cognitiva. Ele avalia domínios de orientação temporal, espacial, memória imediata e de evocação, cálculo, linguagem-nomeação, repetição, compreensão, escrita e cópia de desenho.(7) Sua pontuação varia de zero (maior grau de comprometimento cognitivo) a 30 pontos (melhor capacidade), e as notas de corte são ajustadas segundo a escolaridade: 13 pontos para analfabetos, 18 para baixa (1 a 4 anos incompletos) e média escolaridades (4 a 8 anos incompletos), e 26 para alta (8 ou mais anos) − recomendações estas adotadas neste estudo.(8)

A SS-QOL é um instrumento específico para avaliação da qualidade de vida relacionada à saúde de pessoas acometidas por acidente vascular cerebral, validado e adaptado transculturalmente no Brasil.(9,10) Apresenta 49 itens em 12 domínios, com escore de 49 a 245 pontos, e respostas variando de 1 a 5 pontos; valores mais altos indicam melhor qualidade de vida relacionada à saúde.(6,9)

Foram utilizadas técnicas de estatística descritiva e inferencial, com utilização do software Statistical Package for the Social Science, versão 18.0. Para variáveis categóricas, foram apuradas frequências absolutas e porcentuais, e para numéricas, médias e desvio padrão. Para associação de médias entre o escore de qualidade de vida relacionada à saúde e grupos categorizados em variáveis qualitativas, foram utilizados os testes t de Student de duas amostras independentes (variáveis dicotômicas) e Análise de Variância (ANOVA, para variáveis com mais de duas categorias com o teste post hoc, correção de Tukey).

Para testar a correlação entre variáveis quantitativas contínuas, utilizou-se o coeficiente de correlação de Pearson para variáveis de distribuição normal e seu correspondente não paramétrico, correlação de Spearman, para dados com distribuição nãonormal. Convencionou-se o nível de significância de alfa de 0,05 para todas as análises realizadas (p≤0,05).

O estudo foi registrado na Plataforma Brasil sob o numero do Certificado de Apresentação para Apreciação Ética (CAAE) 21885513.4.0000.5214.

Resultados

Inicialmente, foi aplicado o MEEM (n=104), obtendo-se média de 23,1 pontos (±5,54). Considerando os pontos de corte ajustados com base na escolaridade, 26% da amostra apresentou défice cognitivo e, por esse motivo, não prosseguiu nas demais etapas.

Dentre as pessoas sem défice cognitivo (n=77), a média no MEEM foi 24,9 (±4,3), 51,9% eram homens, a média da idade foi 57,3 anos (±17,2), a maioria era casada (48,1%), com 8 anos ou mais de estudo (50,7%) e baixa renda (Tabela 1).

Tabela 1 Características das pessoas acometidas por acidente vascular cerebral (AVC) (n=77) 

Características Média±DP n(%)
Escore do MEEM 24,9 (4,3)
Sexo
Masculino 40(51,9)
Feminino 37(48,1)
Idade (anos) 57,3(17,2)
Cor da pele
Branca 19(24,7)
Preta 13(16,9)
Parda 44(57,1)
Amarela 1(1,3)
Situação conjugal
Solteiro 19(24,7)
Casado 37(48,1)
Divorciado/separado 8(10,4)
Viúvo 5(6,5)
União estável 8(10,4)
Escolaridade
Analfabeto 11(14,3)
1 a 8 anos incompletos 27(35)
8 ou mais anos 39(50,7)
Renda individual (SM)* 1.333,0(1.616,3)
≤1 42(54,4)
Maior que 1 até 2 21(27,3)
>2 14(18,3)
Possui cuidador
Sim 54(70,1)
Não 23(29,9)
Quem é o cuidador
Cônjuge 19(35,2)
Filho(a) 16(29,6)
Outro 19(35,2)
Tipo de AVC
Isquêmico 49(63,6)
Hemorrágico 22(28,6)
Sem resposta 6(7,8)
Apresentou AVC anteriormente
Sim 15(19,5)
Não 62(80,5)
Internação hospitalar (dias) 20,42(25,42)
Não houve 2(2,6)
1 3(3,8)
2-7 21(27,3)
8-15 24(31,2)
>15 25(32,5)
Sem resposta 2(2,6)
Fatores de risco
Hipertensão arterial sistêmica 56(72,7)
Diabetes 12(15,6)
Cardiopatias 16(20,8)
Dislipidemia 37(48,1)
Sedentarismo 56(72,7)
Tabagismo 25(32,5)
Uso frequente de bebida alcoólica 28 36,4)
Sequelas
Hemiparesia esquerda 30(39)
Hemiparesia direita 32(41,6)
Hemiplegia direita 6(7,8)
Dificuldade visual 9(11,7)
Dificuldade de fala 22(28,6)

*À época de realização do estudo, o SM em vigor era: R$724,00; DP - Desvio Padrão; MEEM - Miniexame do Estado Mental; SM - Salário Mínimo

Todas as dimensões avaliadas pela SS-QOL apresentaram declínio. Os domínios mais comprometidos foram relações sociais (2,1) e familiares (2,4); os menos foram visão (4,3) e linguagem (3,8) (Tabela 2).

Tabela 2 Escores da Stroke Specific Quality of Life Scale (SS-QOL) aplicada a pessoas acometidas por acidente vascular cerebral (n=77) 

Qualidade de vida relacionada à saúde – SS-QOL Média ± DP Escore total por domínio Média ± DP Escore por resposta
Domínio cuidados pessoais 17,0(5,2) 3,4(1,1)
Domínio visão 12,8(2,6) 4,3(0,9)
Domínio linguagem 18,8(5,5) 3,8(1,1)
Domínio mobilidade 17,79(7,5) 3,3(1,0)
Domínio trabalho/produtividade 8,6(3,5) 2,9(1,2)
Domínio função do membro superior 14,9(5,4) 3,0(1,1)
Domínio modo de pensar 9,0(3,6) 3,0(1,2)
Domínio comportamento 7,7(4,3) 2,6(1,4)
Domínio ânimo 14,2(5,5) 2,8(1,1)
Domínio relações familiares 7,3(3,7) 2,4(1,2)
Domínio relações sociais 10,6(5,3) 2,1(1,1)
Domínio energia 8,1(4,2) 2,7(1,4)
Escore total de QVRS 146,8(36,3) 3,1(0,8)

DP – Desvio Padrão; QVRS - Qualidade de Vida Relacionada à Saúde

Houve associação moderada positiva entre os escores no MEEM e a qualidade de vida relacionada à saúde. Já as variáveis escolaridade, dislipidemia, hemiplegia esquerda e dificuldade de fala interferiram negativamente na qualidade de vida relacionada à saúde (Tabela 3).

Tabela 3 Associação entre as características das pessoas acometidas por acidente vascular cerebral (AVC) e o escore de qualidade de vida relacionada à saúde (QVRS) (n=77) 

Variáveis n QVRS** Estatística p-value
Escore do MEEM 77 0,4* 0,0
Sexo -0,3† 0,8
Feminino 37 145,7(39,6)
Masculino 40 147,9(33,5)
Idade -0,2‡ 0,1
Cor da pele 1,2‡ 0,3
Branca 19 157,7(43,6)
Preta 13 148,4(31,3)
Parda 44 142,2(34,3)
Situação conjugal 1,1† 0,3
Casado 37 152,3(40,7)
Não casado 40 143,0(32,8)
Escolaridade 6,4§ 0,0
Analfabeto 11 131,3(24,3)
1 a 8 anos incompletos 27 133,5(29,5)
8 oumais anos 39 160,5(38,7)
Renda individual mensal (SM)¶ 0,1* 0,3
≤1 42 144,2(36,6)
>1 até 2 21 139,3(36,5) 2,1§ 0,1
>2 9 158,6(31,6)
Tipo de AVC -1,3† 0,2
Isquêmico 49 142,2(34,2)
Hemorrágico 22 154,9(42,2)
Apresentou AVC anteriormente -0,8† 0,4
Sim 15 140,2(38,8)
Não 62 148,5(35,8) continua
Dias de internação hospitalar continuação 0,1† 0,5
Sequelas
Hemiparesia esquerda -0,5† 0,6
Sim 30 144,1(37,8)
Não 47 148,6(35,7)
Hemiparesia direita 2,0† 0,0
Sim 32 156,4 (35,3)
Não 45 140,0 (35,8)
Hemiplegia esquerda -2,1† 0,0
Sim 6 118,2(26,5)
Não 71 149,27(36,1)
Dificuldade visual -0,6† 0,1
Sim 9 140,0(28,1)
Não 68 147,8(37,3)
Dificuldade de fala -2,2† 0,0
Sim 22 134,7(26,7)
Não 55 151,7(38,7)
Outras sequelas -1,3† 0,2
Sim 13 135,2(36,1)
Não 64 149,2(36,2)
Fatores de risco
Hipertensão arterial sistêmica -1,6† 0,1
Sim 56 142,8(34,2)
Não 21 157,8(40,2)
Diabetes -0,9† 0,4
Sim 12 140,0(25,0)
Não 65 148,1(38,0)
Cardiopatias -0,2† 0,8
Sim 16 145,2(33,4)
Não 61 147,3(37,3)
Dislipidemia -2,2† 0,0
Sim 37 137,7(31,4)
Não 40 155,4(38,8)
Sedentarismo -0,6† 0,6
Sim 56 145,4(37,1)
Não 21 150,6(34,7)
Tabagismo -0,4† 0,7
Sim 25 144,7(38,9)
Não 52 147,9(35,4)
Uso frequente de bebida alcoólica -0,6† 0,6
Sim 28 143,5(40,4)
Não 49 148,8(34,0)

Valores expressos em números, média ± desvio padrão, e valores de testes estatísticos; * Correlação de Spearman;† teste t de Student de duas amostras independentes; ‡ correlação de Pearson; § Análise de Variância; intervalo de confiança de 95%; α=0,05; ¶ à época de realização do estudo, o SM em vigor era: R$724,00; SM - Salário Mínimo; **QVRS - Qualidade de Vida Relacionada à Saúde

Discussão

Entre as limitações deste estudo, destacam-se o delineamento transversal da pesquisa, que não permitiu estabelecimento de uma relação de causa e efeito, e a elevada perda amostral por défice cognitivo, o que dificultou a generalização dos resultados encontrados.

A enfermagem tem impacto significativo na recuperação após o acidente vascular cerebral. No local de coleta de dados, sequelas da doença são as maiores causas de reabilitação, de modo que avaliar a qualidade de vida relacionada à saúde pode prover perfil global das condições funcionais, psicossociais e da percepção da vida pelo sujeito, direcionando a reabilitação, colaborando para melhoria desse processo e da percepção da qualidade de vida relacionada à saúde, e permitindo a formação de subsídios e políticas para melhoria da qualidade da atenção em saúde.

A avaliação da qualidade de vida relacionada à saúde de pessoas com as mais variadas doenças tem sido frequente em pesquisas, mas a evolução alcançada para maior sobrevida não tem sido proporcional à manutenção da qualidade de vida anterior ao adoecimento. Um dos eventos que pode comprometer de forma significativa o cotidiano das pessoas é a ocorrência do acidente vascular cerebral, por ter potencial limitante nos aspectos físicos e emocionais.(6)

O acidente vascular cerebral é um dos principais determinantes do declínio cognitivo. Nesta pesquisa, a média encontrada no MEEM entre os 104 participantes iniciais foi de 23,1 pontos (±5,54), valor divergente de outro estudo, que encontrou média inferior.(11) Na amostra, 26% apresentou défice cognitivo, valor menor que a prevalência de 45% de pacientes com este tipo de défice encontrada na literatura.(12) Tais resultados podem ser atribuídos ao fato de os participantes apresentarem maior escolaridade do que em pesquisas semelhantes, o que influencia no aumento do escore.

A doença acomete mais frequentemente homens, de pele negra e idade avançada, sendo mais comum acima de 65 anos.(4-6,13,14) Neste estudo, o predomínio foi de pardos, e a média de idade foi inferior (57,3 anos), o que pode ser reflexo das características populacionais da região.(15)

A presença da família e a existência de um companheiro são essenciais para o compartilhamento do enorme impacto negativo do acidente vascular cerebral na vida dos sobreviventes e para auxílio nas demandas de cuidados. Neste estudo, predominaram os casados (48,1%), assim como em estudos similares.(4,16)

Em outras pesquisas com sobreviventes, geralmente a escolaridade é baixa ou nenhuma.(17,18)A baixa escolaridade e a falta de informações sobre a doença constituem fatores de risco para sua ocorrência.(18) Nesta pesquisa, de forma discordante, 50,7% da amostra apresentava 8 anos ou mais de estudo.

A ocorrência do acidente vascular cerebral é influenciada pelas condições sociais e econômicas. A carência de acesso a informações e aos serviços de saúde pode gerar aumento na chance de adoecimento. Desse modo, estudos encontraram, entre os sobreviventes, renda menor ou igual a um salário mínimo.(6,18) Do mesmo modo, a maior parte dos participantes desta pesquisa apresentava baixa renda, compatível com o fato do local da coleta dos dados ser referência exclusiva para usuários do Sistema Único de Saúde.

No processo do adoecimento, é fundamental o envolvimento familiar e, nesta pesquisa, evidenciou-se que a maioria dos sobreviventes contava com um cuidador (70,1%), que, muitas vezes, era seu cônjuge (35,2%). Nesse sentido, cuidados informais aos pacientes no domicílio são realizados geralmente pelos próprios familiares.(6)

O acidente vascular cerebral isquêmico ocorre em cerca de 85% dos casos e os hemorrágicos representam 15% do total.(2) Neste estudo, predominou hemorrágico, o que pode estar relacionado ao fato de osparticipantesse encontraremem tratamento de reabilitação após serem acometidos por esse tipo de acidente vascular cerebral, frequentemente responsável por sequelas e mortes.

Os fatores de risco aumentam a probabilidade de ocorrência da doença. Os participantes deste estudo apresentaram diversos fatores de risco prévios à ocorrência do acidente vascular cerebral, especialmente hipertensão arterial, dislipidemia e sedentarismo, correspondentes aos encontrados na literatura.(2)

Expressivo porcentual de sobreviventes apresentou alguma incapacidade após o primeiro episódio da doença, sendo causa de insatisfação com a vida e de variadas limitações funcionais. As sequelas mais comuns, neste estudo, foram hemiparesia direita (41,6%), hemiparesia esquerda (39%) e dificuldade de fala (28,6%). Outras pesquisas encontraram, semelhantemente, entre as sequelas mais frequentes, as motoras e na fala.(4,6,19)

No que se refere àqualidade de vida relacionada à saúde,o escore totalobtido na SS-QOL teve média de 146,84 (±36,3). Estudo alemão determinou como baixa qualidade de vida os escores inferiores a 60% (<147 pontos), critério adotado neste estudo.(20) Dessa forma, a qualidade de vida relacionada à saúde encontrava-se comprometida. No caso de doenças crônicas e suas sequelas, a qualidade de vida relacionada à saúde geralmente é afetada e tende se comprometer.(6) Já pesquisa realizada em outro Estado da Região Nordeste do Brasil encontrou média um pouco superior à deste estudo (171,4±35,5).(21)

Em relação à média dos escores das respostas obtidas na qualidade de vida relacionada à saúde geral, este estudo corrobora os resultados de outros, evidenciando o prejuízo ocasionado pelo acidente vascular cerebral.(4,19) No entanto, ,diferentemente, estudos longitudinais americanos obtiveram médias maiores.(22,23)

Os domínios mais afetados de qualidade de vida relacionada à saúde foram relações sociais (2,1) e relações familiares (2,4); e os menos afetados foram visão (4,3) e linguagem (3,8) − dimensões do SS-QOL que estavam entre os domínios mais e menos comprometidos, convergindo com resultados observados na literatura.(4,6,19,24)

O acidente vascular cerebral e suas sequelas prejudicam ou impossibilitam o retorno pleno ao trabalho e às suas atividades sociais, justificandoo dano ao domínio relações sociais. Após a ocorrência da doença, a pessoa muitas vezes fica em situação de incapacidade e dependência, necessitando de um cuidador, que é, frequentemente, um familiar. Tal fato, acrescido ao possível abandono do mercado de trabalho e do exercício das atividades diárias, e a consequente diminuição da renda podem explicar o prejuízo no domínio relações familiares.

Na associação entre o escore do MEEM e a qualidade de vida relacionada à saúde, observou-se que maiores escores daquele estavam associados a maiores escores desta. O défice cognitivo é uma das sequelas importantes no acidente vascular cerebral, que pode ocasionar impactos na qualidade de vida dos acometidos,(25) um melhor estado cognitivo contribui positivamente para uma melhor qualidade de vida.

Já na associação dos dados sociodemográficos e econômicos e a qualidade de vida relacionada à saúde, verificou-se que escolaridade baixa influencia negativamente na qualidade de vida. Pessoas menos escolarizadas geralmente detêm menos informações sobre a doença, a rede de saúde existente para sua assistência e reabilitação, e, por consequência, seu acesso é prejudicado a esses serviços, o que repercute negativamente nas oportunidades de emprego e renda, fatos que podem justificar sua menor qualidade de vida relacionada à saúde.

Na comparação das características clínicas e o escore total de qualidade de vida relacionada à saúde, observou-se diferença estaticamente significativa em relação às variáveis dislipidemia, hemiplegia esquerda, hemiplegia direita e dificuldade de fala.

A pessoa dislipidêmica apresenta maior risco de desenvolver aterosclerose,(26) que, por sua vez, é fator de risco para outras comorbidades. Outras comorbidades e a necessidade de maior acompanhamento médico, além da realização de dietas mais restritivas e utilização de maior número de medicamentos, aliadas à baixa renda, podem explicar menor qualidade de vida relacionada à saúde em pessoas com esse fator de risco.

Dentre as consequências do acidente vascular cerebral, estão alterações de mobilidade. A capacidade da pessoa se deslocar pelo ambiente é pré-requisito para executar atividades da vida diária e manter a independência.(27) Dessa forma, a presença de hemiplegia esquerda implica em diminuição da qualidade de vida relacionada à saúde. Por outro lado, um achado contraditório e novo deste estudo foi que os hemiplégicos do hemicorpo direito apresentaram melhor qualidade de vida relacionada à saúde em relação àqueles sem essa sequela.

As lesões cerebrais ocasionadas pelo acidente vascular cerebral podem também determinar sequelas relativas à linguagem oral e escrita, que, por sua vez, podem acarretar para a pessoa dificuldade de comunicação, ocasionando isolamento social o qual desencadeia ou agrava quadros de depressão e, assim, interfere na qualidade de vida.(28)

Conclusão

A qualidade de vida relacionada à saúde específica de pessoas acometidas por acidente vascular cerebral se encontra diminuída após sua ocorrência e está associada a algumas características. Menor escolaridade, presença de dislipidemia, presença de hemiplegia esquerda e dificuldade de fala contribuíram para seu comprometimento, já maiores escores no Miniexame do Estado Mental estiveram associados a melhores escores de qualidade de vida.

REFERÊNCIAS

1. World Stroke Organization. World Stroke Campaign. 1 in 6 people worldwide will have a stroke in their lifetime. Campaign Resources. 2012 [cited 2015 Oct 14]. Available from: .
2. Smeltzer SC, Bare BG, Hinkle JL, Cheever KH. Brunner e Suddarth: tratado de enfermagem médico-cirúrgica. 12a ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 2011.
3. Seild EM, Zannon CM. Qualidade de vida e saúde: aspectos conceituais e metodológicos. Cad Saúde Pública. 2004; 20(2):580-8.
4. Lima ML, Santos JL, Sawada NO, Lima LA. Qualidade de vida de indivíduos com acidente vascular encefálico e de seus cuidadores de um município do Triângulo Mineiro. Rev Bras Epidemiol [Internet]. 2014 [citado 2015 Oct 2];453-64. Disponível em: .
5. Froes KS, Valdes MT, Lopes DP, Silva CE. Factors associated with health-related quality of life for adults with stroke sequelae. Arq Neuro-Psiquiatr. 2011; 69(2-B): 371-6.
6. Rangel ES, Belasco AG, Diccini S. Qualidade de vida de pacientes com acidente vascular cerebral em reabilitação. Acta Paul Enferm. 2013; 26(2):205-12.
7. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. Envelhecimento e saúde da pessoa idosa [Internet]. Brasília (DF): Ministério da Saúde; 2007 [cited 2015 Oct 2]. Disponível em: .
8. Bertolucci PH, Brucki SM, Campacci SR, Juliano Y. O Mini-Exame do Estado Mental em uma população geral: impacto da escolaridade. Arq Neuro-Psiquiatr. 1994; 52(1):1-7.
9. Lima RC, Teixeira-Salmela LF, Magalhães LC, Gomes-Neto M. Propriedades psicométricas da versão brasileira da escala de qualidade de vida específica para acidente vascular encefálico: aplicação do modelo Rasch. Rev Bras Fisioter. 2008; 12(2):149-56.
10. Oliveira MR, Orsini M. Escalas de avaliação da qualidade de vida em pacientes brasileiros após acidente vascular encefálico. Rev Neurocienc. 2009; 17(3):255-62.
11. Costa FA, Silva DL, Rocha VM. Estado neurológico e cognição de pacientes pós-acidente vascular cerebral. Rev Esc Enferm USP. 2011; 45(5):1083-8.
12. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Ações Programáticas Estratégicas. Diretrizes de atenção à reabilitação da pessoa com acidente vascular cerebral. Brasília (DF): Ministério da Saúde; 2013.
13. Canuto MA, Nogueira LT. Acidente vascular cerebral e qualidade de vida: uma revisão integrativa. Rev Pesq Cuid Fundam. 2015; 7(2):2561-8.
14. Hunger M, Sabariego C, Stollenwerk B, Cieza A, Leidl R. Validity, reliability and responsiveness of the EQ-5D in German stroke patients undergoing rehabilitation. Qual Life Res. 2012; 21(7):1205-16.
15. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Censo Demográfico 2010: Teresina [Internet]. 2010 [citado 2015 Out 2]. Disponível em: .
16. Delboni MC, Malengo PC, Schimidt EP. Relação entre os aspectos das alterações funcionais e seu impacto na qualidade de vida das pessoas com sequelas de acidente vascular encefálico (AVE). Mundo Saúde. 2010; 34 (2):165-75.
17. Moreira NR, Andrade AS, Ribeiro KS Nascimento JA, Brito GE. Quality of life of individuals affected by stroke. Rev Neurocienc. 2015; 23(4):530-7.
18. Leite HR, Nunes AP, Corrêa CL. Perfil epidemiológico e qualidade de vida dos pacientes acometidos por acidente vascular encefálico. Arq Ciênc Saúde UNIPAR. 2011; 15(1):15-21.
19. Chou C. Determinants of the health-related quality of life for stroke survivors. J Stroke Cerebrovasc Dis. 2015; 24(3):1-8.
20. Gorenstein C, Andrade LH. Beck depression inventory: psychometric properties of the portuguese version. Rev Psiquiatr Clin (São Paulo). 1998; 25(5): 45-50.
21. Monteiro RB, Laurentino GE, Melo PG, Cabral DL, Correa JC, Teixeira-Salmela LF, et al. Medo de cair e sua relação com a medida da independência funcional e a qualidade de vida em indivíduos após Acidente Vascular Encefálico. Ciênc Saúde Coletiva. 2013; 18(7):2017-27.
22. Gillard PJ, Sucharew H, Kleindorfer D, Belagaje S, Varon S, Alwell K, et al. The negative impact of spasticity on the health-related quality of life of stroke survivors: a longitudinal cohort study. Health Qual Life Outcomes. 2015; 13:159.
23. Wulsin L, Alwell K, Moomaw CJ, Lindsell CJ, Kleindorfer DO, Woo D, et al. Comparison of two depression measures for predicting stroke outcomes. J Psychosom Res. 2012; 72(3):175-9.
24. Cordini KL, Oda EY, Furlanetto LM. Qualidade de vida de pacientes com história prévia de acidente vascular encefálico: observação de casos. J Bras Psiquiatr. 2005; 54(4):312-7.
25. Mendes LM, Neves RF, Ribeiro KS, Brito GE, Lucena EM, Batista HR, et al. Estado cognitivo dos usuários com AVE na atenção primária à saúde em João Pessoa-PB. Acta Fisiatr. 2011; 18(4):169-74.
26. Fernandes RA, Christofaro DG, Casonatto J, Codogno JS, Rodrigues E, Cardoso M, et al. Prevalência de dislipidemia em indivíduos fisicamente ativos durante a infância, adolescência e idade adulta. Arq Bras Cardiol. 2011; 97(4):317-23.
27. Moreira RP, Araujo TL, Pagliuca LM. Limitação da mobilidade física em pacientes após o acidente vascular encefálico no domicílio: proposta de um conceito. Rev Rene. 2013; 14(5):920-8.
28. Chaves DB, Costa AG, Oliveira AR, Silva VM, Araujo TL, Lopes MV. Comunicação verbal prejudicada - investigação no período pós-acidente vascular encefálico. Rev Rene. 2013; 14(5):877-85.