versão impressa ISSN 0066-782X
Arq. Bras. Cardiol. vol.102 no.5 São Paulo maio 2014 Epub 09-Maio-2014
https://doi.org/10.5935/abc.20140054
O nível de metilação global do ADN de leucócitos no sangue tem sido associado ao risco de doença arterial coronariana (DAC), com resultados inconsistentes em diferentes populações. Faltam dados semelhantes da população chinesa, onde diferentes fatores genéticos, de estilo de vida e ambientais podem afetar a metilação do ADN e sua relação com o risco de DCC.
Analisar se a metilação global está associada ao risco de doença coronariana na população chinesa.
Foram incluídos um total de 334 casos de DCC e 788 controles saudáveis. A metilação global do ADN de leucócitos de sangue foi estimada por meio da análise das repetições do LINE-1 usando pirosequenciamento de bissulfito.
Em uma análise inicial restrita aos controles o nível do LINE-1 diminui significativamente com a idade avançada, colesterol total elevado, e diagnóstico de diabetes. Na análise de caso-controle, a redução da metilação do LINE-1 foi associada ao aumento do risco de DCC, tendo a análise por quartil revelado uma odds ratio (IC 95%) de 0,9 (0,6-1,4), 1,9 (1,3-2,9) e 2,3 (1,6 3.5) para o terceiro, segundo e primeiro (o mais baixo) quartil (P da tendência < 0,001), respectivamente, em comparação com o quarto (o mais alto) quartil. A metilação inferior (< mediana) do LINE-1 esteve associada a 2,2 vezes (IC 95% = 1,7-3,0) o aumento de risco de doença coronariana. As estimativas de risco de DCC menores relacionadas com o LINE-1 tenderam a ser mais fortes entre os indivíduos com maior tercil de homocisteína (P interação = 0,042) e naqueles com diagnóstico de hipertensão arterial (P interação = 0,012).
A hipometilação do LINE-1 está associada ao risco de doença coronariana na população chinesa. Fatores de risco de DCC potenciais tais como a idade avançada, colesterol total elevado, e diagnóstico de diabetes podem ter impacto na metilação global do ADN, exercendo, portanto, o seu efeito sobre o risco de doença coronariana.
Palavras-Chave: Epigenética, doença cardíaca coronária; metilação global; LINE-1; DNA de leucócitos do sangue
Global methylation level in blood leukocyte DNA has been associated with the risk of coronary heart disease (CHD), with inconsistent results in various populations. Similar data are lacking in Chinese population where different genetic, lifestyle and environmental factors may affect DNA methylation and its risk relationship with CHD.
To examine whether global methylation is associated with the risk of CHD in Chinese population.
A total of 334 cases with CHD and 788 healthy controls were included. Global methylation in blood leukocyte DNA was estimated by analyzing LINE-1 repeats using bisulfite pyrosequencing.
In an initial analysis restricted to control subjects, LINE-1 level reduced significantly with aging, elevated total cholesterol, and diagnosis of diabetes. In the case-control analysis, reduced LINE-1 methylation was associated with increased risk of CHD; analysis by quartile revealed odds ratios (95%CI) of 0.9 (0.6-1.4), 1.9 (1.3-2.9) and 2.3 (1.6-3.5) for the third, second and first (lowest) quartile (Ptrend < 0.001), respectively, compared to the fourth (highest) quartile. Lower (<median) LINE-1 methylation was associated with a 2.2-fold (95%CI = 1.7-3.0) increased risk of CHD. The lower LINE-1-related CHD risk estimates tended to be stronger among subjects with the highest tertile of homocysteine (Pinteraction = 0.042) and those with diagnosis of hypertension (Pinteraction = 0.012).
LINE-1 hypomethylation is associated with the risk of CHD in Chinese population. Potential CHD risk factors such as older age, elevated total cholesterol, and diagnosis of diabetes may have impact on global DNA methylation, whereby exerting their effect on CHD risk.
Key words: Epigenetics; Coronary heart disease; Global methylation; LINE-1; Blood leukocyte DNA
A doença arterial coronariana (DAC) constitui 90-95% de todos os casos de doenças cardiovasculares, sendo a principal causa de morte no mundo1 , 2. A idade, o sexo, a dieta, tabagismo, a hipertensão, a diabetes, a dislipidemia, a homocisteína, a obesidade, a história familiar de DCC e fatores genéticos têm demonstrado desempenhar um papel importante na etiologia da DCC2 - 4.
A modificação epigenética, especialmente um padrão aberrante de metilação global do ADN, é cada vez mais reconhecido como um fator chave para o desenvolvimento de doença arterial coronariana. A hipometilação do ADN global pode induzir instabilidade genômica e desregular a transcrição do gene, contribuindo assim para o desenvolvimento de várias doenças humanas, incluindo DCC5. Em modelos animais, a hipometilação global do ADN tem sido associada ao depósito de lipídios na aorta, um preditor de futura aterosclerose6 , 7. Além disso, uma associação entre hipometilação de ADN global e susceptibilidade à aterosclerose subclínica tem sido relatada em adultos jovens8. Também, em indivíduos saudáveis, o nível de metilação global, medido em ADN de leucócitos no sangue tem sido associado a fatores de risco de doença arterial coronariana, tais como a idade avançada, tabagismo, deficiência de folato, hiperhomocisteína, maiores níveis de lipoproteína de baixa densidade e menores níveis de lipoproteína de alta densidade9 - 14. Vários estudos epidemiológicos têm relatado que o nível de metilação global poderia ser um fator de risco determinante de DCC, mas os resultados foram inconsistentes em várias populações15 - 17. Dados semelhantes faltam na população chinesa, onde diferentes fatores genéticos, de estilo de vida e ambientais podem afetar a metilação do ADN e sua relação com o risco de DCC18 , 19.
Cerca de 55% do genoma humano é constituído por elementos repetitivos20, incluindo aproximadamente 500.000 repetições do LINE-1 o que representa aproximadamente 17% do genoma humano21. Por causa da alta representação em todo o genoma e a forte metilação em tecido normal, o LINE-1 tem sido utilizado como um marcador substituto para a estimativa dos níveis de metilação do ADN global22 , 23.
No presente estudo, investigamos a relação entre a metilação do LINE-1 e o risco de DCC em uma população chinesa. Também examinamos a associação entre a metilação do LINE-1 e os potenciais fatores de risco de doença coronariana, incluindo idade, sexo, índice de massa corporal (IMC), colesterol total, triglicérides, homocisteína, tabagismo, hipertensão e diabetes, bem como o seu efeito modificador na estimativa de risco de DCC relacionado com o LINE-1.
Este estudo de caso-controle incluiu 334 pacientes com DAC e 788 indivíduos controle do Fourth Affiliated Hospital, Harbin Medical University, Harbin, China desde março de 2007 a setembro de 2010. Todos os participantes eram indivíduos não aparentados da população chinesa da etnia Han, e os controles foram pareados por frequência com os casos por idade (± 5 anos) e sexo. O diagnóstico de doença arterial coronariana foi estabelecido pela evidência angiográfica de ≥ 70% de estenose de uma grande artéria coronária, ou ≥ 50% da principal artéria coronária esquerda. Os controles tinham um questionário de saúde regular e seu exame detalhado pela análise do histórico, exame físico, eletrocardiograma e ecocardiograma revelaram ausência de doença arterial coronariana ou outras doenças cardíacas. Para ambos os grupos de DCC e de controle, foram excluídos os doentes com angina pectoris espástica, doença arterial periférica, e qualquer tipo de doença auto-imune ou câncer. As informações sobre idade, sexo, altura, peso, tabagismo e diagnóstico de hipertensão e diabetes foram obtidas utilizando um questionário estruturado por meio de entrevistas pessoais. Fumante ocasional foi definido como um fumante de pelo menos 1 cigarro por dia durante pelo menos 6 meses. O IMC foi calculado pela fórmula: peso em quilogramas dividido pelo quadrado da altura do corpo em metros (kg/m2). Informações sobre colesterol total em soro, triglicéridos e homocisteína em plasma foram coletadas com base em prontuários médicos. Consentimento informado por escrito foi obtido de cada participante. O protocolo do estudo foi aprovado pelo comitê de revisão ética do Conselho de Revisão Institucional do hospital participante.
O ADN genómico foi extraído de leucócitos de sangue utilizando o kit de extração de ADN de sangue QIAamp (Qiagen, Xangai, China), e em seguida modificado por meio do tratamento com bissulfito de sódio, utilizando o kit de metilação de ADN Zymo EZ (Zymo, CA, EUA), seguindo o protocolo do fabricante. Um método modificado de pirosequenciamento baseado em PCR originalmente descrito por Yang e cols.22 foi realizado para quantificar a metilação dos elementos repetitivos do LINE-1. Resumidamente, a PCR foi realizada num volume de reação de 50 ul contendo 25 ul de GoTaq Green Master Mix (Promega, WI, EUA), 1 pmol de forward primer (TGA TTT GTT AGG TGT GGG ATA TA), 1 pmol de biotina reverse primer (biotina-AAA AAA AAA ATC TTC CCT TTC), e 50 ng de ADN genómico tratados com bissulfito. As condições cíclicas de PCR foram 95°C durante 30 s, 50°C durante/ 30 s e 72 °C durante 30 s para 40 ciclos. O produto da PCR foi ligado a esferas de sefarose estreptavidina (Amersham Biosciences, Uppsala, Suécia). Estas esferas de sefarose contendo o produto de PCR ligado foram purificadas, lavadas, desnaturadas e novamente lavadas. Em seguida, 0,3 mM de primer de pirosequenciamento (AGT TAG GTG TGG GAT ATA GT) foi recozido ao produto purificado de cadeia única da PCR. O pirosequenciamento foi realizado utilizando o Sistema de Pirosequenciamento PSQ HS 96. Para todos os ensaios foram utilizados controles internos para verificar a conversão de bissulfito. Cada amostra foi analisada em duplicado e a sua média foi utilizada na análise final. O grau de metilação do LINE-1 foi expresso em % de 5-Metilcitosina (%5 mC) sobre o total de citosinas (metiladas+ não metiladas).
Foi utilizado o teste do qui-quadrado para analisar as diferenças entre as distribuições das variáveis categóricas e o teste t de Student para as diferenças nas médias das variáveis contínuas entre os casos de DCC e controles. Foram utilizados modelos de regressão linear para avaliar as diferenças no LINE-1 entre os controles em relação à idade, sexo, IMC, colesterol total, triglicérides, homocisteína, tabagismo, hipertensão e diabetes. Foi utilizada a regressão logística não condicional para estimar a odds ratio (OR) para DCC e o intervalo de confiança de 95% (IC). Os pontos de corte quartil e a mediana se basearam nas distribuições do LINE-1 entre os controles. Todos os modelos foram ajustados para idade (como uma variável contínua), sexo e tabagismo (não-fumante: sim vs não). Ajustes adicionais por outras potenciais variáveis de confusão, incluindo IMC, colesterol total, triglicérides, homocisteína, hipertensão e diabetes, não alteraram materialmente as estimativas de risco. Portanto, estas variáveis não foram incluídas nos modelos finais. A modificação do efeito por co-variáveis individuais foi avaliada por meio de testes de razão de verossimilhança. Todos os testes foram bidirecionais e um valor de p < 0,05 foi considerado significativo. As análises estatísticas foram realizadas utilizando o Stata 10.1 (Stata Corporation, College Station, TX).
Os fatores de risco potencial dos indivíduos do estudo caso e controle são apresentados na Tabela 1. Não foram encontradas diferenças significativas entre os casos de DCC e os controles nas distribuições de idade, sexo, IMC, ou triglicerídeos. Quando comparados com os controles, os casos de DCC apresentaram maior número/ de fumantes ocasionais, e tenderam a ter níveis mais elevados de colesterol total e de homocisteína. Os casos também apresentaram diagnóstico de hipertensão e diabetes. Os efeitos do nível de metilação do LINE-1 nos potenciais fatores de risco entre os indivíduos do grupo controle são apresentados na Tabela 2. Como era esperado, o nível do LINE-1 reduziu-se significativamente com o aumento da idade (p = 0,016). Observamos também que o colesterol total (p < 0,001) e o diagnóstico de diabetes (p < 0,001) estiveram inversamente associados aos níveis de metilação do LINE-1. Não foram observadas relações estatisticamente significativas entre o nível de metilação do LINE-1 e o sexo, tabagismo, IMC, triglicéridos, homocisteína, ou diagnóstico de hipertensão.
Tabela 1 Fatores potenciais de risco dos sujeitos do estudo
Fatores potenciais de risco | Casos, n (%) | Controles, n (%) | valor de p* |
---|---|---|---|
Idade (tercil), anos | |||
< 59 | 96 (28,7) | 266 (33,8) | |
60-65 | 119 (35,6) | 236 (29,9) | |
> 65 | 119 (35,6) | 286 (36,3) | 0,12 |
Sexo | |||
Feminino | 66 (19,8) | 150 (19,0) | |
Masculino | 268 (80,2) | 638 (81,0) | 0,78 |
Fumante ocasional | |||
Não | 156 (47,4) | 590 (75,4) | |
Sim | 173 (52,6) | 193 (24,6) | < 0,001 |
Índice de massa corporal (tercil), kg/m2 | |||
< 22,0 | 97 (29,1) | 262 (33,2) | |
22,0-25,4 | 122 (36,5) | 264 (33,6) | |
25,4 | 115 (34,4) | 262 (33,2) | 0,36 |
Colesterol total (tercil), mmol/L | |||
< 2,9 | 57 (17,1) | 262 (33,2) | |
2,9-4,8 | 123 (36,8) | 263 (33,4) | |
> 4,8 | 154 (46,1) | 263 (33,4) | < 0,001 |
Triglicéridos (tercil), mmol/L | |||
< 1,1 | 113 (33,8) | 265 (33,7) | |
1,1-1,6 | 111 (33,2) | 258 (32,8) | |
> 1,6 | 110 (33,0) | 263 (33,5) | 0,98 |
Homocisteina (tercil), μmol/L | |||
< 9 | 70 (21,6) | 241 (32,3) | |
9-11 | 106 (32,7) | 252 (33,7) | |
> 11 | 148 (45,7) | 254 (34,0) | < 0,001 |
Hipertensão | |||
Não | 128 (38,3) | 520 (66,0) | |
Sim | 206 (61,7) | 268 (34,0) | < 0,001 |
Diabetes | |||
Não | 212 (63,5) | 638 (81,0) | |
Sim | 122 (36,5) | 150 (19,0) | < 0,001 |
LINE-1 Média (DP) | 80,96 (2,40) | 81,67 (2,46) | < 0,001† |
DP: desvio padrão.
*Valor de P obtido a partir de um teste x2 comparando casos e controles.
†Valor de P obtido de um teste t de Student comparando casos e controles.
Tabela 2 Relação de potenciais fatores de risco para DCC com os níveis de metilação do LINE-1 entre os indivíduos do grupo controle
Potenciais fatores de risco | n | LINE-1 média (95% IC)* | valor de p* |
---|---|---|---|
Idade (tercil), anos † | |||
< 59 | 266 | 81,58 (81,33-81,83) | |
60-65 | 236 | 81,47 (81,22-81,72) | |
> 65 | 286 | 81,21 (80,97-81,45) | 0,016 |
Sexo ‡ | |||
Feminino | 150 | 81,47 (81,14-81,81) | |
Masculino | 638 | 81,40 (81,24-81,56) | 0,46 |
Fumante ocasional § | |||
Não | 590 | 81,59 (81,41-81,76) | |
Sim | 193 | 81,05 (80,80-81,31) | 0,35 |
Índice de massa corporal (tercil), kg/m2 | |||
< 22,0 | 262 | 81,41 (81,16-81,66) | |
22,0-25,4 | 264 | 81,24 (80,99-81,48) | |
> 25,4 | 262 | 81,58 (81,34-81,83) | 0,54 |
Colesterol total (tercil), mmol/L | |||
< 2,9 | 262 | 81,83 (81,57-82,10) | |
2,9-4,8 | 263 | 81,57 (81,34-81,81) | |
> 4,8 | 263 | 80,95 (80,72-81,18) | < 0,001 |
Triglicéridos (tercil), mmol/L | |||
< 1,1 | 265 | 81,39 (81,15-81,64) | |
1,1-1,6 | 258 | 81,43 (81,18-81,68) | |
> 1,6 | 263 | 81,42 (81,18-81,67) | 0,42 |
Homocisteina (tercil), μmol/L | |||
< 9 | 241 | 81,53 (81,26-81,80) | |
9-11 | 252 | 81,37 (81,12-81,63) | |
> 11 | 254 | 81,41 (81,17-81,65) | 0,91 |
Hipertensão | |||
Não | 520 | 81,53 (81,34-81,72) | |
Sim | 268 | 81,25 (81,03-81,47) | 0,59 |
Diabetes | |||
Não | 638 | 81,59 (81,43-81,75) | |
Sim | 150 | 80,85 (80,56-81,14) | < 0,001 |
DCC: Doença cardíaca coronária, IC: Intervalo de confiança. Ajustado para idade, sexo e tabagismo.
†Apenas ajustado para sexo e tabagismo.
‡Apenas ajustado para idade e tabagismo.
§Apenas ajustado para idade e sexo.
Os casos de DCC apresentaram redução significativa do nível de metilação do LINE-1 comparando com os controles (média (desvio padrão, DP): 80,96 (2,40) vs 81,67 (2,46), p < 0,001) (Tabela 1). As análises de LINE-1 em quartis, com base na distribuição dos controles, mostram que o nível de metilação LINE-1 esteve inversamente relacionado com o risco de doença coronária (Tabela 3). Em relação aos sujeitos no quarto (o mais alto) quartil de metilação do LINE-1, as ODs (odds ratio) para DCC foram de 0,9 (95% IC, 0,6-1,4), 1,9 (95% IC, 1,3-2,9) e 2,3 (IC 95%, 1,6-3.5) para os indivíduos com metilação do terceiro, segundo e primeiro (o mais baixo) quartil (P tendência < 0,001), respectivamente. Ao utilizar o ponto de corte alternativo com base na mediana, os indivíduos com mais baixa (metilação < mediana) do LINE-1 apresentaramtiveram 2.2-vezes (95% IC, 1.7-3.0) maior risco de doença arterial coronariana em comparação com indivíduos com maior (> mediana) metilação do LINE-1.
Tabela 3 Níveis de metilação do LINE-1 em relação ao risco de CHD
LINE-1 (%5mC) | Casos, n (%) | Controles, n (%) | OR (95% IC)* |
---|---|---|---|
Quartil † | |||
Q4 (> 82,73) | 55 (16,5) | 197 (25,0) | 1,0 (referência) |
Q3 (81,52-82,72) | 49 (14,7) | 194 (24,6) | 0,9 (0,6-1,4) |
Q2 (80,17-81,51) | 101 (30,2) | 199 (25,3) | 1,9 (1,3-2,9) |
Q1 (< 80,16) | 129 (38,6) | 198 (25,1) | 2,3 (1,6-3,5) |
Ptendência< 0,001 | |||
Mediana † | |||
Alta (≥ 81,52) | 104 (31,1) | 391 (49,6) | 1,0 (referência) |
Baixa (< 81,52) | 230 (68,9) | 397 (50,4) | 2,2 (1,7-3,0) |
%5 mC: % de 5-metilcitosinadas; DCC: Doença cardíaca coronária; IC: Intervalo de confiança, ou, odds ratio.
*Ajustado para à idade, sexo e tabagismo.
†Os quartis e a mediana das medidas LINE-1 foram baseadas em valores entre os indivíduos do grupo controle.
Quando são estratificadas por potenciais fatores de risco, as estimativas de risco de DCC relacionadas com LINE-1 mais baixas tendem a ser mais elevadas entre os indivíduos com maior tercil de homocisteína (OR = 3.2, 95% IC, 3,2-5,2) e naqueles com diagnóstico de hipertensão arterial (OR = 3.1, 95% IC, 2,1-4,8) (Tabela 4). Foram observadas interações estatisticamente significativas em relação ao risco de doença coronariana entre metilação do LINE-1 e o nível de homocisteína (P interação = 0,042), e entre metilação do LINE-1 e hipertensão (P interação = 0,012). A estratificação por outros fatores de risco potenciais, incluindo a idade (tercil), sexo (feminino, masculino) tabagismo (fumante ocasional: não, sim), IMC (tercil), colesterol total (tercil), triglicéridos (tercil) e diagnóstico de diabetes (não, sim), produziu estimativas de risco comparáveis (dados não mostrados). As interações entre metilação do LINE-1 e estes fatores sobre o risco de DCC não foram estatisticamente significativas (dados não mostrados).
Tabela 4 Nível do LINE-1 em relação ao risco de DCC, por nível de homocisteína e diagnóstico de hipertensão
Fatores potenciais de risco | LINE-1* | Casos, n (%) | Controles, n (%) | OR (95% IC) † |
---|---|---|---|---|
Homocisteina, μmol/L | ||||
< 9 | Alta | 24 (34,3) | 126 (52,3) | 1,0 (referência) |
Baixa | 46 (65,7) | 115 (47,7) | 2,2 (1,2-4,0) | |
9-11 | Alta | 41 (38,7) | 115 (45,6) | 1,0 (referência) |
Baixa | 65 (61,3) | 137 (54,4) | 1,4 (0,9-2,3) | |
> 11 | Alta | 36 (24,3) | 135 (53,1) | 1,0 (referência) |
Baixa | 112 (75,7) | 119 (46,9) | 3,2 (2,0-5,2) | |
Hipertensão | ||||
Não | Alta | 51 (39,8) | 251 (48,3) | 1,0 (referência) |
Baixa | 77 (60,2) | 269 (51,7) | 1,5 (1,0-2,3) | |
Sim | Alta | 53 (25,7) | 140 (52,2) | 1,0 (referência) |
Baixa | 153 (74,3) | 128 (47,8) | 3,1 (2,1-4,8) |
DCC: Doença cardíaca coronária; IC: Intervalo de confiança, ou, odds ratio.
*A média de LINE-1 foi medida com base em valores entre os indivíduos do grupo controle. Alta: ≥ 81,52 (% 5 mC); Baixa: < 81,52 (% 5mC).
†Ajustado para à idade, sexo e tabagismo.
No presente estudo demonstramos uma relação inversa estatisticamente significativa entre o nível de metilação do LINE-1 e o risco de doença coronariana na população chinesa. O nível de homocisteína e o diagnóstico de hipertensão modificaram esta relação inversa. Considerando-se que a DCC é uma das doenças mais comuns, juntamente com a sua severidade24, o fator de risco de hipometilação global pode ter um impacto considerável na saúde pública. Já que a metilação do DNA é um mecanismo epigenético reversível, este marcador com base no sangue poderia oferecer novas e excitantes oportunidades para a prevenção de base populacional da doença coronariana, asim como para a avaliação de risco25.
Níveis de metilação de DNA globais, avaliados em regiões repetidas de DNA derivado de leucócitos, foram relatados como associados ao risco de doença coronariana em populações norte-americanas, de Singapura e da Índia, com observações inconsistentes15 - 17. Em uma coorte de 712 idosos da população norte-americana, a hipometilação do LINE-1 foi associada ao aumento do risco de cardiopatia isquêmica, tanto na análise transversal como longitudinal15. Isto é consistente com os achados do presente estudo. No entanto, em nossos dados, também houve relações significativas entre as mulheres, assim como em diferentes faixas etárias entre metilação do LINE-1 e o risco de doença coronariana, que aportam mais dados ao que foi anteriormente observado na população americana15. Por outro lado, em uma população de Singapura, níveis mais elevados de metilação de Alu/Sat2 repetidos foram relatados em homens com história de infarto do miocárdio ou acidente vascular cerebral (n = 8) do que nos homens controle (n = 121)16; Em uma população da Índia, em casos com doença arterial coronariana (n = 137) foram relatados níveis mais elevados de metilação de seqüências CCGG do que nos controles (n = 150)17. O estilo de vida diferente, as exposições ambientais, as origens genéticas entre as populações , e as diferenças de tamanho da amostra e elementos repetitivos de DNA alvo de medição dos níveis de hipometilação globais26 - 28, podem ter contribuído para os diferentes resultados entre estes estudos.
O efeito modificador da idade nos níveis de metilação do DNA global, de acordo com os dados anteriores29, pode refletir os efeitos cumulativos que a exposição ambiental pode ter nos fatores de risco de DCC. A hipometilação global en DNA de leucócitos tem sido associada à exposição a vários tipos de poluentes ambientais como os hidrocarbonetos aromáticos policíclicos, a poluição atmosférica, o carbono negro e os sulfatos30 - 32. O presente estudo também mostrou que dois fatores de risco de DCC reconhecidos, o colesterol total elevado e o diagnóstico de diabetes, estiveram relacionados com a redução de níveis de metilação do LINE-1, apoiando ainda mais o papel de hipometilação do DNA no desenvolvimento da doença coronária.
Em nossos dados, /não foi registrada associação entre a metilação do LINE-1 e o nível de homocisteína ou diagnóstico de hipertensão, o que difere de alguma forma do que foi observado anteriormente10 , 33. No entanto, observou-se que tanto o nível de homocisteína quanto o diagnóstico de hipertensão modificaram a relação inversa entre metilação do LINE-1 e o risco de doença coronariana. Mais estudos são necessários para replicar estas descobertas e elucidar o mecanismo subjacente do nível de homocisteína e o diagnóstico de hipertensão em seu papel modificador na associação entre a hipometilação global e o risco de doença coronariana.
Nosso estudo teve as vantagens de se basear em uma amostra relativamente grande de amostra, diagnosticar a doença arterial coronariana por evidência angiográfica e efetuar uma análise quantitativa precisa, utilizando a metodologia de pirosequenciamento, o que é adequado para aferir as mudanças sutis na metilação do DNA. A principal limitação do presente estudo foi a natureza retrospectiva do desenho do estudo, ou seja, a coleta de amostras de sangue de pacientes com doença coronariana ocorreu após o diagnóstico de DCC. Se o diagnóstico de doença arterial coronariana tivesse tido qualquer impacto directo ou indirecto na metilação global do DNA através da mudança de estilo de vida ou da exposição ambiental do sujeito, poderíamos ter observado uma associação confusa ou enviesada entre a metilação do LINE-1 e o risco de doença coronariana. No entanto, observaram-se estimativas de risco semelhantes, quando a análise de regressão logística foi restrita restringida a 212 casos de DCC recém-diagnosticados, em comparação com os controles (dados não mostrados). Além disso, nossos achados de que os níveis de metilação do LINE-1 eram reduzidos em indivíduos controle com fatores de risco de DCC, tais como a idade avançada, colesterol total elevado, e diagnóstico de diabetes, indicam que a metilação reduzida do LINE-1 nos sujeitos controle de alto risco pode resultar de condições relacionadas com o risco de doença coronariana. Além disso, nas análises longitudinais do estudo de Baccarelli e cols.31, tem-se observado um menor aumento do risco aumentado de cardiopatia isquêmica relacionado ao LINE-1.
Os resultados do presente estudo corroboram que a hipometilação do DNA global medido em LINE-1 repetido está associada ao risco de doença coronariana na população chinesa. Fatores potenciais de risco de DCC tais como a idade avançada, o colesterol total elevado e o diagnóstico de diabetes podem ter impacto na metilação global do DNA, exercendo através deles o seu efeito sobre o risco de doença coronariana.