Compartilhar

Histiocitoma fibroso benigno de osso temporal: comprometimento das mastóides em tempos diferentes

Histiocitoma fibroso benigno de osso temporal: comprometimento das mastóides em tempos diferentes

Autores:

Lidio Granato,
José Donato de Próspero,
Wilson Luiz Sanvito,
Lucas Bevilacqua Alves da Costa,
Alessandro Murano Ferré Fernandes

ARTIGO ORIGINAL

Brazilian Journal of Otorhinolaryngology

versão impressa ISSN 1808-8694

Braz. j. otorhinolaryngol. vol.80 no.3 São Paulo maio/jun. 2014

http://dx.doi.org/10.1016/j.bjorl.2013.02.001

Introdução

O fibrohistiocitoma benigno é uma entidade clínica descrita pela primeira vez por Stout,1 em 1967. Afeta frequentemente a pele exposta ao sol, porém pode ocorrer em outros órgãos, incluindo lesões intraósseas.2 Nestes casos, a manifestação clínica é a dor e o aumento de volume do osso afetado.

Apresentamos um caso de fibrohistiocitoma benigno na mastoide esquerda que surgiu há dois anos, cujo anatomopatológico mostrou tratar-se de tumor da mesma natureza que a paciente apresentou há 15 anos no ouvido oposto.

Na literatura, a descrição deste tumor acometendo a mastoide é rara, e não encontramos descrição semelhante com acometimento bilateral e com tempo de aparecimento diferente entre os lados.

Apresentação do caso

Paciente feminina, 56 anos, com dores na região retroauricular esquerda há um mês, e que irradiavam para cabeça e face deste mesmo lado. Apresentava dor à palpação na região mastoidea esquerda, com otoscopia e avaliação auditiva normal bilateralmente. Referia ter sido operada para retirada de um tumor no ouvido oposto há 15 anos, com diagnóstico de fibrohisticitoma benigno.

A tomografia computadorizada evidenciava sinais de mastoidectomia à direita e lesão lítica com material de densidade de partes moles em cavidade mastoidea à esquerda. Ambas as orelhas médias estavam normais.

A ressonância magnética mostrava conteúdo de alto sinal em T2 ocupando as células mastoideas esquerdas, com espessamento meníngeo na tenda cerebelar e na fossa craniana média ipsilateral, que tiveram realce com o gadolíneo (fig.1).

Figura 1 A, Corte axial de ressonância magnética de crânio mostrando conteúdo de alto sinal em T2 ocupando as células da mastoide esquerda. B, Corte coronal de ressonância magnética de crânio exibindo realce da tenda do cerebelo e do plano leptomeníngeo da fossa média ipsilateral após injeção de gadolíneo. 

A paciente foi submetida à mastoidectomia esquerda com remoção da parede posterior do conduto auditivo externo. A lesão ficava restrita à cavidade mastoidea, respeitava a membrana timpânica, orelha média e o tégmen mastoideo. O estudo histológico comprovou tratar-se do fibrohistiocitoma benigno.

A cavidade cirúrgica, após três meses de pós-operatório, apresentou boa cicatrização, porém a paciente referia agravamento da cefaleia e dor facial que se situava na projeção da arcada dentária superior esquerda. Foi encaminhada para o grupo de dor e tratada clinicamente, tendo ficado assintomática somente dois anos após a cirurgia.

Discussão

O fibrohistiocitoma é uma afecção rara que ocorre numa larga faixa etária, entre cinco e 75 anos. Compreende em torno de 1% de todos os tumores ósseos,3 sendo mais comum nos ossos dos membros inferiores e com predisposição para a recidiva.4 Há poucos relatos mostrando acomentimento do osso temporal, sendo a maior parte constituída por tumores malignos. O diagnóstico diferencial pode ser feito com processo inflamatório agudo, lesão tumoral benigna (tumor gigantocelular e o fibroma ossificante) ou lesão maligna (fibrossarcoma e osteossarcoma). A ressonância magnética afastou a possibilidade de processo inflamatório, mostrando tratar-se de tumor sólido. Revelou a presença de paquimeninge extensa, com espessamento de provável natureza inflamatória da meninge na área paratrigeminal. Embora a cirugia tenha removido a lesão, o provável o envolvimento ósseo e meníngeo por contiguidade pode explicar a cefaleia e a otalgia referidas pela paciente no pós-operatório, já que não foi detectada comunicação com a fossa média.5 , 6 Este envolvimento também pode justificar a recidiva destes tumores, o que torna difícil apontar a cura e mostra a necessidade de acompanhamento por longos períodos. Devido à raridade, as taxas de recidivas são variáveis e de difícil determinação.

Não encontramos na literatura comprometimento semelhante ao exibido neste relato, com o envolvimento bilateral dos ossos temporais, extensão meníngea, características histológicas semelhantes e aparecimento tanto tempo depois da lesão inicial.

Comentários finais

Embora raro, o fibrohistiocitoma benigno de osso temporal é uma afecção que pode ser encontrada e deve ser lembrada como diagnóstico diferencial dos tumores do ouvido. As características clínicas e radiológicas devem atentar o médico assistente para uma maior investigação, mesmo em casos de bilateralidade, como o exibido neste relato.

REFERÊNCIAS

1. Stout AP, Lattes R. Tumors of soft tissue: Atlas of tumors pathology. Washigton DC: Armed Forces Institute of Pathology. 1967. p. 38-52.
2. Barney PL. Atypical histiocytoma (fibroxanthoma) of the temporal bone. Trans Am Acad Ophthalmol Otolaryngol. 1971;76:1392-3.
3. Rico-Martinez G, Linares-Gonzalez LM, Delgado Cedillo EA, Estrada-Villas Senior EG, Méndez-Vasquez TE. Unconventional hip arthroplasty for a 15-year-old benign bone fibrous histiocytoma in a pediatric patient. Acta Ortop Mex. 2010;24:371-5.
4. Dahlin DC. Benign and atypical fibrous histiocytoma. Bone tumors. Sprinfield, Charles Thomas. 1978. p.116.
5. Sanvito WL. Síndromes Neurológicas. São Paulo: Atheneu; 2008.
6. Ideguchi M, Kajiwara K, Yoshicawa K, Kato S, Fujisawa H, Suzuki M. Benign fibrous histiocytomaof the skull with increased intracranial pressure caused by cerebral venous sinus occlusion. J Neurosurg. 2009;111:504-8.