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Hospitalização no segundo ano de vida em crianças consideradas de risco ao nascimento

Hospitalização no segundo ano de vida em crianças consideradas de risco ao nascimento

Autores:

Mayckel da Silva Barreto,
Sonia Silva Marcon

ARTIGO ORIGINAL

Escola Anna Nery

versão impressa ISSN 1414-8145

Esc. Anna Nery vol.18 no.2 Rio de Janeiro abr./jun. 2014

http://dx.doi.org/10.5935/1414-8145.20140033

RESUMEN

Objetivo:

Identificar los factores asociados a la hospitalización de los niños considerados de riesgo al nacel segundo año de sus vidas.

Métodos:

Estudio transversal, realizado en Maringá, Paraná. Los datos fueron recogidos entre noviembre de 2010 y febrero de 2011, con madres de 248 niños nacidos en 2008.

Resultados:

Del total de niños estudiados, 50 (20,1%) necesitaron hospitalización entre los 12 y 24 meses. Los factores asociados fueron: baja educación materna; falta de lactancia materna exclusiva hasta los seis meses; morbilidad en el último año; hospitalización en el primer año de vida; baja renta familiar; elevado número de miembros en la familia.

Conclusión:

Los resultados refuerzan que los niños en situación de riesgo al nacer deben contar con asistencia diferenciada por los servicios básicos de salud, especialmente los de menor nivel socioeconómico, previamente hospitalizados y que no recibieron lactancia materna exclusiva hasta los seis meses.

Palabras-clave: Niño Hospitalizado; Morbilidad; Hospitalización; Factores de Riesgo; Enfermería

INTRODUÇÃO

Crianças classificadas como de risco ao nascimento estão sob maior risco de adoecer e morrer logo após o parto e também no decorrer dos primeiros anos de vida, o que pode acarretar problemas de crescimento, desenvolvimento e saúde na infância, adolescência e até mesmo na vida adulta1. De fato, os recém-nascidos (RN) de risco apresentam elevadas taxas de hospitalização, que, além de causarem um sofrimento familiar importante2, são eventos de custo elevado e, muitas vezes, podem ser prevenidas com ações no nível primário da assistência3.

De modo geral, vários são os fatores de risco mencionados na literatura associados à hospitalização de crianças na primeira infância, como, por exemplo: sexo masculino; baixo nível socioeconômico; elevados número de crianças menores de cinco anos morando no mesmo domicílio; residência na zona urbana; exposição ao fumo, frio e umidade; desnutrição; desmame precoce; baixa idade da mãe; menor grau de instrução materna; e maior densidade domiciliar. Outros fatores de risco também associados ao desfecho de interesse são as condições de saúde da criança por ocasião do nascimento, como o baixo peso ao nascer e o baixo índice de Apgar4-7.

Os estudos de morbidade são de grande importância no controle das doenças e no planejamento de ações em saúde tanto hospitalares quanto ambulatoriais, voltadas à população infantil. Normalmente, estes estudos avaliam a severidade das doenças que as acometem e permitem evidenciar aspectos do processo saúde-doença que escapam das estatísticas de mortalidade. Sendo assim, as frequências de internação e reinternação e os fatores associados à sua causa são considerados importantes indicadores para a avaliação dos serviços de atenção primária à saúde3.

Nesta perspectiva, estudos para identificar os fatores de risco associados à internação hospitalar de crianças na primeira infância tem possibilitado o incremento de ações capazes de reduzir esse evento traumático para a criança e sua família. Diversas investigações têm sido realizadas acerca da hospitalização de crianças menores de cinco anos3,4,8. No entanto, até onde se sabe, estudos que abordam especificamente crianças após os 12 meses de vida e que, por ocasião do nascimento, foram classificadas como RN de risco são escassos9.

Diante da relevância do assunto e da escassez de trabalhos que versem sobre a temática, o presente estudo teve como objetivo verificar os fatores associados à hospitalização de crianças consideradas de risco ao nascimento, durante o segundo ano de vida.

MÉTODOS

Estudo descritivo de corte transversal com abordagem quantitativa, realizado com 248 crianças, filhos de mães residentes em Maringá-PR, nascidas no período de primeiro de janeiro a 31de dezembro de 2008 e que foram incluídas no Programa de Vigilância do Recém-Nascido de Risco (PVRNR) do município.

Este programa foi implementado em Maringá no ano de 2000 e tem como propósito acompanhar todos os RN considerados de risco. O monitoramento é realizado pela Equipe de Vigilância Epidemiológica municipal, que visita todos os hospitais diariamente para coleta de dados dos nascidos vivos e preenchimento das fichas do SINASC. Quando é identificado o nascimento de uma criança que se enquadra em um dos critérios de risco adotados pelo município, ela é incluída no programa ainda durante a internação hospitalar.

Esta inclusão ocorre com o preenchimento da ficha de admissão em duas vias e com a orientação da mãe sobre a importância do acompanhamento do RN nas Unidades Básicas de Saúde (UBS) ou pelo médico particular. Uma das cópias da ficha de admissão é encaminhada para a UBS de referência, de acordo com o endereço da família, e a outra permanece arquivada no Setor de Vigilância Epidemiológica, de acordo com o mês de nascimento.

A partir das fichas arquivadas mensalmente foi possível a inclusão dos RN na pesquisa. No período em estudo, foram incluídos no PVRNR de Maringá 802 crianças, mas apenas 248 (30,9%) fizeram parte da pesquisa, visto que em 340 casos (42,4%) os familiares não foram encontrados; em 128 (16,0%), a família mudou de residência, sem deixar novo endereço com os vizinhos; em 45 (5,6%), houve recusa por parte das mães em participar do estudo, em seis (0,7%) a criança foi entregue para a adoção; em 34 (4,3%), a criança foi a óbito antes de completar um ano de vida; e em 1 caso (0,1%), a criança foi a óbito após completar um ano de idade.

Primeiramente foi realizado um contato telefônico com as mães para que a visita fosse agendada de acordo com sua disponibilidade. Quando não foi possível estabelecer este contato foi efetuada uma busca ativa nos endereços que constavam na ficha de admissão no PVRNR. Com o intuito de diminuir as perdas, famílias foram procuradas inclusive na UBS de referência, a partir do cadastro do prontuário eletrônico da mãe. Foi considerada perda a família que foi visitada três vezes em dias e horários diferentes e não teve nenhum de seus membros que pudesse participar da entrevista.

A coleta de dados ocorreu no período de novembro de 2010 a fevereiro de 2011. Cada entrevista teve duração média de uma hora, sendo a maioria realizada com as mães das crianças. O roteiro estruturado para coleta dos dados era composto de sete partes, que contemplavam a identificação e caracterização socioeconômica da criança e sua família; o acesso ao atendimento à saúde; e o histórico de saúde-doença, alimentação, nutrição, crescimento e desenvolvimento infantil.

As informações referentes à morbidade e hospitalização da criança durante o segundo ano de vida foram coletadas por meio do relato do entrevistado, sendo consideradas as hospitalizações ocorridas no período dos 12 aos 24 meses e os casos nos quais a criança tenha permanecido, no mínimo, 24 horas em unidade de internamento, independentemente do motivo.

Os dados quantitativos foram arquivados em planilhas. Para a tabulação e processamento das informações foi utilizado o programa Excel for Windows® 2007 e para a análise estatística utilizou-se o Software Statistica versão 7.0®. Os testes de normalidade Shapiro-Wilk e Lilliefors evidenciaram distribuição não normal dos dados, por esta razão foram empregados testes não paramétricos de associação, como o Qui-quadrado de Pearson para as variáveis dicotômicas e o Mann Whitney para as variáveis contínuas, adotando-se um nível de significância de 5%. Para as variáveis associadas ao desfecho de interesse calcula-se o Odds Ratio (OR) com o intuito de se verificar a medida da associação.

O estudo foi desenvolvido em consonância com as diretrizes disciplinadas pela Resolução 196/96 Conselho Nacional de Saúde/Ministério da Saúde, e o projeto foi aprovado pelo Comitê Permanente de Ética em Pesquisas com Seres Humanos da Universidade Estadual de Maringá (Parecer nº 309/2010). As mãe que concordaram em participar do estudo assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) em duas vias.

RESULTADOS

Participaram do estudo 248 crianças com idades que variavam de 24 a 38 meses, e mediana de 30 meses de vida. Houve leve predominância do sexo feminino (52,0%). Em relação ao local de nascimento evidenciou-se que 247 (99,5%) partos ocorreram em unidade hospitalar, dos quais 179 (72,1%) foram cesáreas. Moravam com os pais 166 (67,5%) crianças, as demais residiam apenas com a mãe (54, 21,9%), o pai (21,8,6%) terceiros (5, 2,0%).

O critério de risco responsável pela inclusão das crianças no PVRNR que mais prevaleceu foi a prematuridade (137, 55,2%), seguida pelo baixo peso ao nascer (115, 46,4%); idade materna menor ou igual a 17 anos (68, 27,4%); APGAR menor que sete no quinto minuto de vida (21, 8,4%), e presença de anomalia congênita (13, 5,2%). A concomitância entre dois ou mais critérios ocorreu em 92 crianças (37,1%), sendo que o baixo peso ao nascer e a prematuridade foram os dois fatores de risco que mais estiveram presentes de forma associada, em 74 RN (80,4%).

Do total de crianças em estudo, 50 (20,1%) foram hospitalizadas durante o segundo ano de vida, das quais 28 (56,0%) eram do sexo feminino, porém não foi encontrada diferença estatisticamente significativa entre hospitalização e sexo (p = 0,52). Pode-se verificar, ainda, que o fato de a mãe trabalhar fora (p = 0,78), os cuidados a serem providos por outras pessoas que não a mãe (p = 0,77) e a criança permanecer, no mínimo, meio período em instituições educativas (p = 0,21) também não se apresentaram como fatores de risco associados a hospitalização infantil (Tabela 1).

Tabela 1 Distribuição dos fatores associados à hospitalização de crianças consideradas de risco ao nascimento, durante o segundo ano de vida. Maringá - PR, 2011 

Variáveis Hospitalizados Não hospitalizados Total p
n % n % n %
Sexo
Masculino 22 44,0 97 49,0 119 48,0 0,52
Feminino 28 56,0 101 51,0 129 52,0
Escolaridade materna
< 8 anos 15 30,0 25 12,6 40 16,1 0,00*
≥ 8 anos 35 70,0 173 87,4 208 83,9
Ocupação materna
Sim 22 44,0 82 41,3 104 42,3 0,78
Não 28 56,0 114 58,7 142 57,7
Cuidador principal
Mãe 34 68,0 138 70,0 172 69,6 0,77
Outro 16 32,0 59 30,0 75 30,4
Local de permanência
Casa 16 32,0 82 41,6 98 39,7 0,21
Instituição educativa 34 68,0 115 58,4 149 60,3
AME**
≤ 6 meses 40 80,0 126 64,3 166 66,9 0,02*
> 6 meses 10 20,0 72 36,7 82 33,1
Doente no último ano
Sim 41 82,0 134 67,7 175 72,2 0,04*
Não 09 18,0 64 32,3 73 27,8
Hospitalização no 1º ano de vida
Sim 25 50,0 67 33,8 92 37,1 0,03*
Não 25 50,0 131 66,2 156 62,9

*Valor de p significativo para o teste de Qui-quadrado de Pearson;

**Aleitamento materno exclusivo.

No que tange à escolaridade materna, verificou-se que 15 (30,0%) crianças hospitalizadas eram filhos de mães com menos de oito anos de estudo, enquanto, entre as não hospitalizadas, este número era de apenas 25 (12,6%) crianças, apresentando diferença estatisticamente significativa (p = 0,00) entre os grupos. O cálculo do OR revelou que as crianças de risco, filhas de mães com menos de oito anos de estudo tiveram 2,5 vezes mais chance de serem hospitalizadas durante o segundo ano de vida, quando comparadas com filhos de mães com mais de oito anos de estudo.

Em relação ao tipo de alimentação, observou-se que, das 50 crianças hospitalizadas, 40 (80,0%) não receberam Aleitamento Materno Exclusivo (AME) durante os seis primeiros meses de vida, enquanto, entre as 198 não hospitalizadas, 126 (64,3%) não receberam o AME, apresentando uma diferença estatisticamente significativa (p = 0,02) entre os dois grupos. O cálculo do OR revelou que as crianças que não receberam AME até os seis meses de idade tiveram 2,3 vezes mais chance de serem hospitalizadas durante o segundo ano de vida quando comparadas com as crianças que receberam o AME.

Do total de crianças hospitalizadas durante o segundo ano de vida, 41 (82,0%) apresentaram algum episódio de morbidade nos últimos doze meses que antecederam a visita, enquanto, das 198 criança não hospitalizadas, 134 (67,7%) ficaram doentes, com diferença estatisticamente significativa entre os dois grupos (p = 0,04). O cálculo do OR demonstrou que as crianças que apresentaram episódios de morbidade no último ano tiveram 2,2 vezes mais chances de serem hospitalizadas.

Evidenciou-se ainda que, das 50 crianças hospitalizadas, 25 (50,0%) também necessitaram de hospitalização no primeiro ano de vida, enquanto 67 (33,8%) crianças foram hospitalizadas no primeiro ano de vida, porém foram no segundo ano, com diferença estatisticamente significativa entre os dois grupos (p = 0,03). O cálculo do OR demonstrou que as crianças que foram hospitalizadas no primeiro ano de vida tiveram 2,0 vezes chance de serem novamente hospitalizadas no decorrer do segundo ano.

A renda familiar e o número de moradores no mesmo domicílio foram características socioeconômicas significativamente associadas ao desfecho de interesse. Por outro lado, a idade materna e as características básicas do estado geral de saúde de um RN como a pontuação de Apgar (p = 0,24); o peso ao nascer (p = 0,84 a idade gestacional (p = 0,69) não apresentaram diferença estatisticamente significativa entre o grupo de crianças hospitalizadas ou não (Tabela 2).

Tabela 2 Distribuição das variáveis contínuas associadas à hospitalização de crianças consideradas de risco ao nascimento, durante o segundo ano de vida. Maringá - PR, 2011 

Variáveis Hospitalizados (n = 50) Não hospitalizados (n = 198) p
Mínimo Máximo Mediana Mínimo Máximo Mediana
Idade materna 15 42 25 14 44 24 0,65
Renda familiar 100,00 7.000,00 1.500,00 500,00 10.000,00 2.000,00 0,00*
Nº de moradores no domicílio 03 09 05 02 08 04 0,02*
Apgar no 5º 04 10 09 05 10 10 0,24
Peso ao nascer 770 3.660 2.487 660 4.080 2.660 0,84
Idade gestacional 26 41 36 26 41 36 0,69

*Valor de p significativo no teste de Mann-Whitiney.

DISCUSSÃO

Os resultados deste estudo evidenciaram um predomínio de crianças do sexo feminino, o que é semelhante ao encontrado em um estudo do tipo coorte realizado em Maringá (PR), com 247 RN de risco, no qual 52,7% das crianças acompanhadas também eram do sexo feminino10. Apesar de frequentemente ser relatado na literatura que o sexo masculino constitui fator de risco para hospitalização em crianças menores de cinco anos3,8, na presente investigação não foram encontradas diferenças estatisticamente significativas na hospitalização entre os sexos.

O critério de risco responsável pela inclusão das crianças no PVRNR mais prevalente foi a prematuridade, seguida pelo baixo peso ao nascer e idade materna menor ou igual a 17 anos, resultados que corroboram o encontrado em um estudo realizado em Londrina (PR), no qual também foi verificado principais critérios que ocasionaram a inclusão dos RN no PVRNR: baixo peso ao nascer; idade materna menor ou igual a 17 anos; e prematuridade11.

A concomitância entre baixo peso ao nascer e prematuridade, que ocorreu em 29,8% das crianças, pode ser entendida como uma situação esperada porque o parto pré-termo acarreta o nascimento de uma criança sem o peso corpóreo adequado, o que acontece em torno de 10% das gestações, dependendo da população estudada8. A prematuridade e o baixo peso ao nascer são fatores determinantes para a mortalidade neonatal, desenvolvimento de infecções, maiores taxas de hospitalização, déficit neuropsicológico pós-natal e baixo desempenho escolar12.

No que tange à internação hospitalar, evidenciou-se que o percentual de crianças hospitalizadas durante o segundo ano de vida (20,1%) pode ser considerado baixo, se comparado com os resultados de um estudo do tipo coorte, realizado pela Fundação Oswaldo Cruz, com 86 crianças nascidas com muito baixo peso, no qual foi verificado uma taxa de hospitalização de 56,3% durante o segundo ano de vida, por causas respiratórias9. Considerou-se que este elevado percentual de internação hospitalar estava relacionado ao fato de as crianças terem nascido com muito baixo peso (< 1.500g), prematuras (< 34 semanas), e terem sido hospitalizadas previamente em Unidade de Terapia Intensiva (UTI) Neonatal9. Tratava-se, portanto, de crianças que apresentavam notadamente maiores condições de fragilidade, as quais propiciam a internação nos primeiros anos de vida.

Em virtude da maior fragilidade, o Ministério da Saúde reitera que as crianças de risco devem ser priorizadas pelas equipes da Estratégia Saúde da Família (ESF) tanto no desenvolvimento das ações de vigilância à saúde como na captação precoce e busca ativa para a manutenção do calendário de atenção à saúde infantil, bem como para o cumprimento da proposta de acompanhamento do seu crescimento e desenvolvimento13.

Na prática, observa-se que o afastamento da criança das rotinas da UBS está intimamente correlacionado a fatores socioeconômico de vulnerabilidade, sendo que na presente investigação foi verificada associação estatisticamente significativa entre a hospitalização das crianças e o baixo nível educacional materno. Não obstante, o papel dos fatores socioeconômicos sobre a morbimortalidade na infância há tempos vem sendo descrito na literatura4,5,9,14, demonstrando que a maior escolaridade materna propicia um conjunto de a ações relacionadas ao cuidado mais adequado da criança, maior adesão aos serviços de atendimento à saúde e ao conhecimento de medidas preventivas de cuidados, as quais reduzem a morbidade5,9.

Uma pesquisa realizada em Pelotas (RS) com 757 crianças menores de um ano, das quais 625 eram de internação por doença respiratória aguda e 152 eram controles, demonstrou que filhos de mães com ausência ou baixa escolaridade tiveram 12,5 vezes mais chances de serem hospitalizados por doença respiratória aguda, quando comparados com o grupo-controle5.

Assim, a educação da mãe tem se apresentado como um forte preditor da saúde infantil, o que reforça a ideia de que esse fator seja o mais importante determinante socioeconômico das condições gerais de saúde e doença da criança14.

Não somente a baixa escolaridade se apresenta como fator desencadeador das hospitalizações, mas também a menor idade materna tem sido descrita como potencial característica que leva ao internamento de crianças na primeira infância7. No entanto, apesar de na presente investigação não ter sido observada associação entre a hospitalização e a idade materna, é importante destacar que um estudo realizado em Londrina (PR) evidenciou que 23,7% dos RN foram incluídos no programa de vigilância ao RN de risco do município em decorrência de a mãe ter idade menor ou igual a 17 anos por ocasião do parto11. Em Sobral (CE), quase 30,0% dos RN de baixo peso eram filhos de mães adolescentes7. O mesmo estudo evidenciou, ainda que aproximadamente 33,0% das crianças que necessitaram de quatro ou mais consultas no decorrer do primeiro ano de vida, eram filhos de mães com menos de vinte anos7.

A maternidade precoce, portanto, configura-se como um grave problema de saúde pública, pois representa riscos tanto para a adolescente como para o concepto, necessitando de esforços conjuntos da gestão dos serviços de saúde, da equipe multiprofissional da ESF e da comunidade para juntos elaborarem estratégias de intervenção eficazes, que visem trazer luz sobre a problemática.

Os cuidados principais dispensados à criança, quando realizados pela mãe, salvo os casos de mães adolescentes e que possuem baixa escolaridade, configuram-se como fatores protetores para a hospitalização4. No entanto, diferentemente do encontrado em um estudo realizado em São Paulo (SP), o qual revelou que o cuidado não materno, efetivado na maioria das vezes pelas avós, apresentou-se como fator de risco para a internação de crianças menores de cinco anos4, neste estudo não pode-se evidenciar sua ocorrência.

Já um estudo realizado em Pelotas (RS) observou que o fato de a mãe possuir vínculo empregatício fora do domicílio constituiu fator de proteção para a internação hospitalar em crianças menores de um ano5, demonstrando haver a necessidade de outros estudos que melhor avaliem a correlação entre o cuidado materno e a hospitalização de crianças na primeira infância.

Outro fator frequentemente mencionado como de risco, tanto para morbidade quanto para internação hospitalar na primeira infância, é a utilização de instituições de ensino5. Na presente investigação, apesar de a maioria das crianças que foram hospitalizadas permanecerem, no mínimo, meio período em instituições educativas, não houve associação da variável com o desfecho de interesse. Esses dados corroboram os resultados de um estudo realizado na região metropolitana de São Paulo, com 893 crianças menores de cinco anos, em que a hospitalização também não apresentou associação estatisticamente significante com a utilização da creche4.

No que tange à alimentação das crianças, é indiscutível os benefícios do aleitamento materno para a saúde do binômio mãe-filho, representando um fator determinante na humanização do nascimento e proporcionando inúmeras vantagens para os RN de risco, das quais destacam-se: propriedades nutritivos e imunológicas do leite humano, seu papel na maturação gastrintestinal e na formação do vínculo mãe-filho, aumento do desempenho neurocomportamental, menor incidência de infecção, melhor desenvolvimento cognitivo e psicomotor e menor incidência de re-hospitalização15-17.

Estudo de caso-controle realizado em Pelotas (RS) com 625 casos de internação por doença respiratória aguda constatou que o desmame precoce constituiu fator de risco para a internação hospitalar. Ou seja, as crianças que foram desmamadas precocemente apresentaram chance 2,3 vezes maior de serem hospitalizadas em relação às que receberam o AME até os seis meses de vida, com tendência linear significativa de aumento das hospitalizações por doença respiratória aguda à medida que o tempo de amamentação diminuía5.

Na prática, observa-se que, no caso de RN de risco, diversos fatores podem estar envolvidos no desmame precoce, como, por exemplo, longo período de internação em UTI Neonatal, presença de anomalias congênitas, dificuldade de pega e sucção, baixo nível educacional materno, além de condições da mãe que contraindicam a amamentação, entre as quais se destaca-se o fato de ser portadora do Human Immunodeficiency Virus (HIV). Todos estes fatores, ainda que isolados, contribuem para que os RN de recebam AME por menor período e, ao mesmo tempo, constituem determinantes que desencadeiam maior propensão para a hospitalização.

De um modo geral, exceto nos casos em que o aleitamento materno seja estritamente contraindicados, a equipe de saúde, em especial o enfermeiro, deve acompanhar de perto as mães de RN de risco, a fim de diagnosticar precocemente dificuldades no processo de amamentação, implementar, sempre que necessário, estratégias de intervenção que as diminuam e, por fim, estimulá-las continuamente, de modo que o aleitamento materno possa ser percebido pela mãe como indispensável e também prazeroso.

Em relação à hospitalização prévia, contatou-se que, das 50 crianças hospitalizadas, 25 (50,0%) já o haviam sido durante o primeiro ano de vida. Um estudo de corte transversal realizado em São Paulo (SP), com 893 crianças menores de cinco anos que não foram consideradas de risco por ocasião do parto, revelou que apenas 7,3% necessitaram de duas ou mais hospitalizações em período inferior a doze meses4. E em um estudo realizado na Holanda com 1.412 crianças e adolescentes (0 a 17 anos) evidenciou que apenas 80 (7,0%) delas apresentaram dois ou mais episódios de hospitalização por causas respiratórias, no decorrer de um ano18.

No presente estudo, portanto, o fato de 25,0% das crianças terem sido hospitalizadas no primeiro e no segundo ano de vida explica-se por elas terem sido classificadas como RN de risco e, por conseguinte, apresentarem características que as tornem potencialmente mais sensíveis à morbidade na primeira infância e consequentemente, à hospitalização.

Outra característica que se mostrou estatisticamente diferente entre o grupo de crianças hospitalizadas e não hospitalizadas foi a renda familiar, sendo sua mediana inferior no primeiro grupo. Estudo de caso-controle realizado em Pelotas (RS), com 625 casos de internação por doença respiratória aguda, demonstrou que a renda familiar per capta dos casos era quase duas vezes menor que a dos controles5. Outro estudo, por sua vez, evidenciou ainda que a renda de um a dois salários mínimos esteve associada ao aumento da incidência de morbidade por doenças respiratórias em crianças de muito baixo peso ao nascer, durante o segundo ano de vida9.

Além disso, um estudo realizado em Rio Grande (RS) com 771 crianças menores de cinco evidenciou maior prevalência de sintomas respiratórios entre aquelas que conviviam com famílias de nível socioeconômico mais baixo, sendo que nesta situação a chance da criança apresentar asma e bronquite aumentava até 2,2 vezes14. Este fato levou os autores do estudo a concluírem que a renda familiar influencia na qualidade de vida, pois famílias com renda per capita mais elevada tem a possibilidade de cuidar ativamente da saúde dos filhos, o que pode resultar em menor ocorrência de doenças e hospitalizações14.

A densidade domiciliar reduzida, reflexo de melhores condições financeiras, possivelmente influencia na dispensação de maiores cuidados às crianças. Conforme observado em outras pesquisas que evidenciaram associação entre a elevada densidade domiciliar e o desfecho clínico de interesse4, também foi verificado o presente estudo que o número de pessoas morando no mesmo domicílio foi significativamente maior entre o grupo das crianças hospitalizadas.

Fatores socioambientais desfavoráveis, como a elevada densidade domiciliar, habitações insalubres que apresentam maior poluição ambiental e menor acesso à assistência médica) podem contribuir individualmente ou talvez interagir para aumentar a susceptibilidade da ocorrência e recorrência de morbidade em crianças na primeira infância14.

Apesar de não terem sido evidenciadas associações entre as características representativas de mal prognóstico da criança por ocasião do parto, como, por exemplo, pontuação de Apgar menor ou igual a sete no quinto minuto de vida, baixo peso ao nascer e prematuridade junto à hospitalização, sabe-se que tais crianças estão em risco aumentado de internação em UTI Neonatal logo após o parto; morbidade neonatal que exige readmissão hospitalar; e mortalidade decorrente das complicações apresentadas, quando comparadas com crianças nascidas a termo9.

Embora não se tenha bases teóricas que fundamentem a magnitude destas complicações em longo prazo, acredita-se que as interferências ocorridas nesta etapa da vida tenham reflexos na idade adulta. Além disso, o fato de os RN pré-termos nascerem antes de seus sistemas nervosos estarem totalmente desenvolvidos, suscita a necessidade de grandes estudos populacionais que objetivem avaliar, a longo prazo, os resultados do desenvolvimento neurológico e comportamental destas crianças12, apresentando-se então um amplo campo de pesquisa para a área da enfermagem.

CONCLUSÃO

Neste estudo, a prematuridade, o baixo peso ao nascer, a maternidade na adolescência, a asfixia grave e a presença de anomalia congênita foram os fatores que condicionaram a população como de risco por ocasião do nascimento. Os resultados evidenciaram, ainda, que diversos fatores estiveram associados à hospitalização das crianças de risco durante o segundo ano de vida, tais como: baixa escolaridade materna, ausência do AME até o sexto mês de vida, relato materno de morbidade no último ano, presença de hospitalização no primeiro ano de vida, baixa renda familiar e elevada densidade domiciliar.

O considerável percentual de crianças hospitalizadas durante o segundo ano de vida (20,1%) encontrado estudo é atribuível ao fato de a população analisada apresentar maior vulnerabilidade decorrente de diversas ordens, o que reforça a necessidade de acompanhamento e de intervenções específicas e efetivas na prevenção do adoecimento e na melhoria da qualidade de vida das crianças e suas famílias. Por isso, elas devem constituir o foco de atenção dos serviços de saúde, principalmente na Atenção Primária à saúde.

Acreditamos que a não associação de algumas variáveis, que são descritas na literatura como significativamente associadas ao desfecho de interesse, se deva, em primeiro lugar, ao fato de serem as crianças estudadas consideradas de risco ao nascimento e, em seguida, ao expressivo número de crianças/família não localizadas. Isso, contudo, não diminui o valor científico dos resultados encontrados, os quais podem ser úteis para que a equipe de saúde, principalmente o profissional enfermeiro, que tem sido identificado como o elo mais forte entre os serviços de saúde e a família, possa atuar diretamente sobre os fatores que influenciam na hospitalização de RN de risco durante a primeira infância, elaborando estratégias de intervenção que minimizem a ocorrência deste evento dispendioso aos cofres públicos e traumático para as crianças e seus familiares.

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