versão impressa ISSN 1679-4508versão On-line ISSN 2317-6385
Einstein (São Paulo) vol.14 no.2 São Paulo abr./jun. 2016
http://dx.doi.org/10.1590/S1679-45082016AO3616
Em saúde pública, as orientações odontológicas para as mães têm sido cada vez mais voltadas para a criança de baixa idade, havendo também orientações para vida intraútero, visando a dentições futuras sadias. A primeira infância tem sido apontada como o período ideal para introduzir bons hábitos e adotar padrões de comportamento que possam permanecer profundamente fixados. Um comportamento de risco, com relação à dieta e/ou higiene bucal, estabelecido no primeiro ano da vida tende a se manter durante toda a infância.(1)
As gestantes devem ser consideradas um grupo populacional prioritário para a atenção odontológica, considerando diversos fatores próprios desta etapa: (1) podem apresentar algumas alterações bucais próprias do período gestacional; (2) têm necessidades acumuladas que podem comprometer a saúde materna e da criança; (3) devem ser alvo de programas de educação em saúde porque elas são multiplicadoras de atitudes na rede familiar, com influência nos hábitos alimentares e de higiene da família; (4) constituem um grupo de fácil acesso, por frequentarem sistematicamente os serviços de saúde nesse período, o que é um facilitador importante e, além disso, elas podem ser enquadradas em programas de periodicidade programada, e não abordá-las seria uma oportunidade perdida.(2)
Segundo Bijella,(3) a educação em saúde bucal significa aquisição de conhecimentos (informação) e desenvolvimento de habilidades (instrução), favorecendo a mudança de comportamento e atitudes do indivíduo, criando novos valores que beneficiam a própria saúde do paciente e/ou a de seus pais (motivação). Observa-se a necessidade do estabelecimento de estudos sobre os conhecimentos prévios dos responsáveis/mães, com relação aos cuidados com sua própria saúde bucal e a de seus filhos, a fim de se formularem propostas viáveis e adequarem os programas preventivos/educativos para a criação de novos valores.(4)
Tanto a cárie dentária quanto as doenças periodontais possuem um caráter dinâmico e se desenvolvem por um desequilíbrio no processo de saúde, e não por uma fatalidade na vida do indivíduo. Dessa forma, tais enfermidades devem ser diagnosticadas e prevenidas o mais cedo possível, isto é, durante a gravidez e nos primeiros anos de vida da criança.(5)
Com os avanços das pesquisas na área de cariologia e a melhor compreensão da dinâmica do processo saúde/doença, ficou evidente a necessidade de se implementar a atenção odontológica para o binômio mãe/criança, pois a ciência já comprovou que a transmissão da microbiota cariogênica se processa também de forma vertical e que os estreptococos cariogênicos estabilizam-se na cavidade bucal durante a fase de irrompimento dos primeiros dentes decíduos. Em decorrência dos fatos abordados, inúmeros programas de assistência materno-infantil foram implementados, tornando a importância do atendimento odontológico precoce um fato consolidado e indiscutível.(6)
O atendimento à criança e, consequentemente, a educação, e a motivação dos pais em relação à saúde bucal são as formas mais práticas, simples, eficazes e de baixo custo para se realizarem programas de saúde pública. No entanto, no Brasil, por muito tempo, o atendimento infantil esteve restrito à faixa etária escolar, recomendando-se também que mães e pais levassem seus filhos ao dentista após os 3 anos de idade, pois acreditava-se que a criança só poderia cooperar a partir dessa idade. Hoje, a literatura nos mostra de forma incontestável que cárie não espera a idade “cooperativa da criança”, e que ela afeta, indistintamente, crianças de qualquer classe socioeconômica e grau de escolaridade, e com maior ou menor dificuldade de acesso à educação para a saúde e para o atendimento.(1)
Na área da odontopediatria, atualmente, a assistência bucal está voltada em grande parte para a saúde da criança e da gestante. No entanto, para promover saúde bucal infantil, é essencial a inserção precoce dos responsáveis aos programas de orientação para hábitos saudáveis de higiene e alimentação voltados para a prevenção de doenças bucais.(7) Diversos estudos têm como objetivo conhecer o perfil de saúde da população, permitindo, assim, contribuir para um melhor desenvolvimento de políticas públicas de saúde dirigidas às crianças.(8)
Analisar a percepção das mães em relação à saúde bucal de seus filhos, bem como verificar a influência das variáveis demográficas, de percepção e prática preventiva em saúde bucal das mães, na orientação odontológica recebida durante a gestação.
Estudo com abordagem quantitativa, com delineamento do tipo transversal. A amostragem realizada foi não probabilística, com todas as mães que frequentaram o posto central da Secretaria Municipal da Saúde no município de Ijuí, localizado na região noroeste do Estado do Rio Grande do Sul. Elas aceitaram participar da pesquisa durante os meses de janeiro a julho de 2014, compondo uma amostra de 79 mães.
O estudo foi realizado na cidade de Ijuí (RS). Sua população correspondia a 82.833 habitantes, e a cidade possuía amplos recursos hospitalares.(9) O município dispunha de cinco Unidades Básicas de Saúde (UBS) estruturadas para atender a população. Os dados foram coletados somente no posto central da Secretaria Municipal da Saúde pelo fato de este posto estar em uma localização acessível e ser o maior estruturalmente. A unidade contava com clínica médica geral e pediátrica, e um centro de especialidades odontológicas. Além dos odontólogos, contava com profissionais das áreas de ginecologia, obstetrícia, especialidades de média complexidade, como cardiologia, oftalmologia, psicologia e fonoaudiologia.
A coleta dos dados foi realizada a partir de informações relatadas pelas mães, no preenchimento de um questionário autoaplicativo realizado nos meses da coleta. Foram excluídas do estudo todas as mães que possuíam filhos com idade maior de que 1 ano. O projeto foi submetido ao Comitê de Ética em Pesquisa da Faculdade Meridional e aprovado sob o número CAAE: 31581214.8.0000.5319, parecer 689.475. As mães participantes da pesquisa consentiram participar da pesquisa, assinando o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, e o Secretário de Saúde Bucal do município assinou o Termo de Autorização de Local para a realização da pesquisa.
Foi realizada uma análise estatística descritiva e inferencial dos dados, a partir das informações obtidas no instrumento de coleta de dados. Para isso, foi utilizado o teste χ2 ao nível de significância de 5%, e o programa Statistical Package for Social Science, versão 18.0.
Para a análise descritiva, todas as variáveis foram descritas com valores relativos e absolutos, para relatar a distribuição das frequências encontradas nas respostas das mães. Para a análise inferencial, foi definida a variável orientação odontológica na gestação como dependente. Esta variável é explicada segundo as orientações dadas às gestantes pelos profissionais da saúde (médicos e/ou dentistas) na forma de conversas/comunicação oral sobre o tipo de alimentação cariogênica dada aos lactentes, e a forma mais adequada de higiene bucal nos primeiros anos de vida.
As demais variáveis (faixa etária, ocupação, escolaridade, primeira visita da criança ao dentista, pré-natal, aleitamento materno, mamadeira prejudicial os dentes, uso de chupeta, higienização da boca da criança, início da escovação, cárie transmissível) foram independentes. As associações foram analisadas, verificando quais eram estatisticamente significativas em relação ao nível de probabilidade determinado.
As mães que compuseram a amostra tinham idade entre 15 e 37 anos, com média de 26 anos. A maioria delas tinha Ensino Médio completo (39,2%) e trabalhava fora de casa (60,8%). Quase a totalidade da amostra (93,7%) realizou o pré-natal durante a gestação, porém a maioria não recebeu orientação odontológica durante esse período (63,3%). Grande parte das mães entrevistadas levou seu filho ao dentista para a primeira consulta dentária no primeiro ano de idade da criança (64,6%). Quando questionada sobre o tempo de aleitamento, a maioria afirmou ter amamentado o filho exclusivamente no peito até os 6 meses de idade (81%) e todas acreditavam que o uso da mamadeira era prejudicial aos dentes (100%). Quanto ao uso da chupeta, 65,8% acreditavam ser prejudicial aos dentes da criança. A maioria das mães realizava a higiene bucal dos dentes de seus filhos (79,8%), sendo que 72,2% deram início à escovação bucal de seus filhos quando o primeiro dente irrompeu. A maioria das mães tinha conhecimento de que a cárie dentária era uma doença transmissível (64,6%).
Os resultados descritivos das variáveis encontram-se na tabela 1.
Tabela 1 Análise descritiva das variáveis
Variáveis | n (%) |
---|---|
Faixa etária (anos) | |
1 (15-23) | 25 (31,6) |
2 (24-26) | 27 (34,2) |
3 (27-37) | 27 (34,2) |
Escolaridade | |
Nunca estudou | 10 (12,7) |
Ensino Fundamental incompleto | 12 (15,2) |
Ensino Fundamental completo | 26 (32,9) |
Ensino Médio completo | 31 (39,2) |
Ocupação | |
Do lar | 31 (39,2) |
Trabalha fora de casa | 48 (60,8) |
Pré-natal | |
Não | 5 (6,3) |
Sim | 74 (93,7) |
Orientação odontológica na gestação | |
Não | 50 (63,3) |
Sim | 29 (36,7) |
Primeira visita da criança ao dentista | |
Primeiro ano | 51 (64,6) |
1-2 anos | 21 (26,6) |
Depois de 2 anos | 3 (3,8) |
Não sabe | 4 (5,1) |
Apenas leite materno, meses | |
4 | 9 (11,4) |
5 | 6 (7,6) |
6 | 64 (81,0) |
Mamadeira pode prejudicar os dentes | |
Não | 0 (0) |
Sim | 79 (100) |
Uso de chupeta | |
Não | 27 (34,2) |
Sim | 52 (65,8) |
Higienização da boca da criança | |
Não | 16 (20,3) |
Sim | 63 (79,8) |
Início escovação | |
Primeiro dente | 57 (72,2) |
Dentição completa | 16 (20,3) |
Não sabe | 6 (7,6) |
Cárie transmissível | |
Não | 15 (19,0) |
Sim | 51 (64,6) |
Não sabe | 13 (16,5) |
A análise inferencial mostrou as associações entre as variáveis independentes e a variável desfecho orientação durante a gestação, conforme tabela 2.
Tabela 2 Análise inferencial entre a variável dependente orientação odontológica na gestação e as variáveis independentes
Variáveis | Receberam orientação odontológica na gestação | |||
---|---|---|---|---|
Sim | Não | Total | Valor de p | |
n (%) | n (%) | n (%) | ||
Faixa etária, anos | 0,131 | |||
15-23 | 18 (36) | 7 (24,1) | 25 (31,6) | |
24-26 | 13 (26) | 14 (48,3) | 27 (34,2) | |
27-37 | 19 (38) | 8 (27,6) | 27 (34,2) | |
Total | 50 (100) | 29 (100) | 79 (100) | |
Escolaridade | <0,001* | |||
Nunca estudou | 10 (20) | 0 (0) | 10 (12,7) | |
Ensino Fundamental incompleto | 12 (24) | 0 (0) | 12 (15,2) | |
Ensino Fundamental completo | 26 (52) | 0 (0) | 26 (32,9) | |
Ensino Médio completo | 2 (4) | 29 (100) | 31 (39,2) | |
Total | 50 (100) | 29 (100) | 79 (100) | |
Ocupação | <0,001* | |||
Do lar | 30 (60) | 1 (3,4) | 31 (39,2) | |
Trabalha fora de casa | 20 (40) | 28 (96,6) | 48 (60,8) | |
Total | 50 (100) | 29 (100) | 79 (100) | |
Pré-natal | 0,094 | |||
Não | 5 (10) | 0 (0) | 5 (6,3) | |
Sim | 45 (90) | 29 (100) | 74 (93,7) | |
Total | 50 (100) | 29 (100) | 79 (100) | |
Primeira visita da criança ao dentista | <0,001* | |||
Primeiro ano | 22 (44) | 29 (100) | 51 (64,6) | |
1-2 | 21 (42) | 0 (0) | 21 (26,6) | |
Depois de 2 anos | 3 (6) | 0 (0) | 3 (3,8) | |
Não sabe | 4 (8) | 0 (0) | 4 (5,1) | |
Total | 50 (100) | 29 (100) | 79 (100) | |
Apenas leite materno, meses | 0,005* | |||
4 | 9 (18) | 0 (0) | 9 (11,4) | |
5 | 6 (12) | 0 (0) | 6 (7,6) | |
6 | 35 (70) | 29 (100) | 64 (81) | |
Total | 50 (100) | 29 (100) | 79 (100) | |
Uso de chupeta | 0,577 | |||
Não | 17 (34) | 10 (34,5) | 27 (34,2) | |
Sim | 33 (66) | 19 (65,5) | 52 (65,8) | |
Total | 50 (100) | 29 (100) | 79 (100) | |
Higienização da boca da criança | <0,001* | |||
Não | 16 (32) | 0 (0) | 16 (20,3) | |
Sim | 34 (68) | 29 (100) | 63 (79,7) | |
Total | 50 (100) | 29 (100) | 79 (100) | |
Inicio da escovação | <0,001* | |||
Primeiro dente | 28 (56) | 29 (100) | 57 (72,2) | |
Dentição completa | 16 (32) | 0 (0) | 16 (20,3) | |
Não sabe | 6 (12) | 0 (0) | 6 (7,6) | |
Total | 50 (100) | 29 (100) | 79 (100) | |
Cárie transmissível | *<0,001 | |||
Não | 13 (26) | 2 (6,9) | 15 (19) | |
Sim | 24 (48) | 27 (93,1) | 51 (64,6) | |
Não sabe | 13 (26) | 0 (0) | 13 (16,5) | |
Total | 50 (100) | 29 (100) | 79 (100) |
*p<0,005. Diferença estatisticamente significativa.
Houve relação estatisticamente significativa entre a variável desfecho e a escolaridade das mães (p<0,001), verificando que, dentre as mães que tiveram mais tempo de escolaridade (Ensino Médio completo), 100% receberam orientação odontológica na gestação. Houve relação significativa também em relação à variável desfecho e à variável ocupação (p<0,001), sendo que 96,6% das mães que trabalhavam fora de casa, receberam orientação odontológica na gestação. Outra associação significativa esteve relacionada à primeira visita da criança ao dentista: 100% das mães que receberam orientação na gestação levaram suas crianças no primeiro ano de vida para consulta odontológica (p<0,001). Em relação à amamentação natural, houve influência dessa variável com a orientação odontológica na gestação, na qual 100% das mães amamentaram seus filhos até os 6 meses de idade (p=0,05). Em relação às variáveis higienização e início da escovação da criança, ambas tiveram associação significativa com orientação odontológica na gestação, verificando que 100% das mães faziam a higienização da boca de seus filhos e a iniciaram no aparecimento do primeiro dente (p<0,001). As variáveis relacionadas ao conhecimento sobre a cárie dentária também foram estatisticamente significativas (p<0,001), verificando que 93,1% das mães que sabiam que a doença cárie era transmissível, foram as que receberam orientação odontológica na gestação.
As mães desempenham um papel fundamental como transmissoras do bom comportamento para a saúde bucal de seus filhos. Assim, quanto maior o conhecimento delas sobre atitudes positivas em relação a hábitos bucais, melhor a condição bucal das crianças.(10) A implantação da divulgação do pré-natal odontológico por meio de cartazes e panfletos trouxe grande avanço em âmbito nacional, com reflexos diretos no comportamento das mães. Porém, mesmo com esse avanço, no presente estudo, observou-se que, das mães entrevistadas, uma minoria delas obteve orientação odontológica durante a gestação, corroborando estudo semelhante, no qual as mães, quando questionadas se tinham recebido alguma orientação relacionada aos cuidados de higiene bucal nas crianças durante a realização das consultas de pré-natal, 48% afirmaram que nunca receberam qualquer tipo de orientação em relação à odontologia.(1) Em outro estudo, realizado na cidade de Caruaru (PE) com gestantes, a maioria das entrevistadas de ambos os grupos (privado e público) também nunca recebera informações sobre os cuidados dentários de seu filho; aquelas que receberam, foi somente do cirurgião-dentista. Porém, a maioria das gestantes relata a necessidade de receber orientações sobre saúde bucal de toda a equipe de saúde.(11) Tal fato contraria achados de outro estudo, realizado em Campina Grande (PB), no qual uma pequena parcela das mães entrevistadas recebeu informações sobre a higiene bucal da criança, sendo o médico pediatra o principal agente transmissor. Sugere-se, dessa forma, a realização de uma atuação conjunta entre o setor de odontologia e a unidade de pediatria, proporcionando um melhor atendimento aos pacientes pediátricos.(12)
O posto central da Secretaria Municipal da Saúde do município de Ijuí (RS), garante fácil acesso e qualidade no acompanhamento pré-natal, oferecendo atendimento adequado, com assistência médica frequente as todas as mães que buscam atendimento gratuito. Ainda assim, existe uma pequena porcentagem de mães que, durante a gravidez, não foram acompanhadas por profissionais de saúde.
A análise dos resultados da presente pesquisa revelou associação estatisticamente significativa entre a escolaridade das mães e a orientação odontológica recebida durante a gestação. Tal resultado está de acordo com achados de uma pesquisa com 78 mães realizada na cidade de Bauru (SP), cujos resultados mostraram correlação significante entre o grau de conhecimento das mães sobre saúde bucal e o nível de escolaridade. Houve maior conhecimento em relação aos cuidados com seus filhos das mães que tiveram maior tempo de estudo.(5) Em estudo que avaliou o conhecimento das mães sobre a saúde bucal de seus filhos de 1 a 4 anos de idade, os autores observaram que a manutenção da saúde bucal das crianças é influenciada por conhecimentos e crenças de seus pais. As mães com maior qualificação educacional e mais acesso às informações obtidas por cirurgiões-dentistas tiveram melhores resultados do conhecimento sobre a saúde bucal de seus filhos.(13) Isso demonstra a importância das informações repassadas às mães ou aos responsáveis pelas crianças, para que ocorra uma efetiva educação em saúde bucal, o que é essencial para a manutenção da saúde e a prevenção de doenças bucais.
Semelhante ao grau de escolaridade, as mães que trabalham fora de casa têm maior acesso às informações e aos conhecimentos. No presente estudo, também houve relação estatisticamente significativa com a variável ocupação das mães, revelando, assim, que as mães que trabalham fora de casa receberam orientação odontológica na gestação e estiveram mais informadas do que as mães que trabalham em casa (do lar). Outros estudos investigaram associação do conhecimento e da prática das mães para com seus filhos e variáveis socioeconômicas, semelhante à variável ocupação, investigada neste estudo. Pesquisa realizada em um município de Santa Catarina (SC), mostrou que, à medida que o nível socioeconômico diminui, o percentual de mães que não receberam informações é maior, e o nível de conhecimentos é mais baixo.(14) Em estudo realizado em Manaus (AM), a percepção da saúde bucal pelas gestantes foi considerada baixa. Além disso, constatou-se que é crescente, nessa região, o número de adolescentes grávidas com baixo nível de escolaridade e renda familiar inferior a um salário mínimo.(15) Dessa forma, pode-se afirmar que as condições socioeconômicas interferem diretamente em fatores como saúde e educação.
Houve associação significativa nos resultados deste estudo em relação à primeira visita da criança ao dentista e a orientação odontológica recebida na gestação. As mães que tiveram orientação levaram seus filhos para consultar até o primeiro ano de vida. Verifica-se que este é o período mais recomendado pelos profissionais para que a criança seja avaliada, pois, assim, a mãe ou responsável ficará informada sobre a condição bucal atual da criança, além de receber informações sobre como prevenir e evitar problemas bucais na dentição decídua e permanente fornecidas por um profissional capacitado para tal.
Em relação à amamentação natural, houve influência desta variável na orientação odontológica recebida na gestação, verificando que, a maioria das mães que amamentou seus filhos até os seis meses de idade recebeu orientação durante a gestação. Em estudo realizado durante o pré-natal, 80% das gestantes, quando questionadas sobre o tempo do aleitamento natural da criança, relataram que o período ideal é igual ou maior do que 6 meses.(16)
As variáveis higienização da boca da criança e início de sua escovação dentária tiveram associação significativa com a orientação odontológica na gestação, verificando que todas as mães realizam a higienização da boca de seus filhos desde o aparecimento do primeiro dente decíduo. Esses resultados corroboram de estudo em Campina Grande (PB), onde 73,8% das mães realizam rotineiramente a higiene bucal de seu filho; a maioria dessas mães realiza a higiene bucal com a escovação, constituindo-se no método mais utilizado; e a época de início da higiene bucal ocorreu antes da erupção do primeiro dente decíduo, porém poucas mães a realizam três vezes ao dia.(12) Tais resultados são ainda semelhantes aos de estudo que avaliou o conhecimento e as práticas de saúde bucal dos responsáveis pelas crianças atendidas em uma clínica escola, os quais observaram que a maioria das crianças iniciou sua higienização bucal entre os 6 e 12 meses e, entre 1 e 3 anos de idade, elas já realizavam sua higienização sozinha.(17) Estudo sobre o perfil da gestante e sua percepção quanto à atenção odontológica precoce revelou que a higiene bucal das crianças é praticada pela maioria das mães, porém metade da amostra nunca recebeu qualquer tipo de orientação quanto à higiene bucal de seu filho e nem conhece algum tipo de mecanismo de limpeza.(1) Em outro estudo, realizado em um hospital universitário durante o pré-natal, a maioria das gestantes entrevistadas afirmou achar necessária a realização da higiene bucal do recém-nascido, porém essas mulheres apresentaram inúmeras dúvidas com relação ao modo de como fazer a higienização.(16) Observa-se que, quando os profissionais da saúde repassam às mães as orientações de forma adequada, a educação e os conhecimentos são absorvidos efetivamente. Em estudo clínico, no qual houve intervenção dos cirurgiões-dentistas, a frequência de escovação aumentou após o grupo das mães de crianças de 6 a 18 meses receberem as ações educativas de forma contínua por um período de 8 meses.(10) Assim, na presente pesquisa, pôde-se verificar que as mães entrevistadas estavam conscientes da necessidade da implementação de medidas de higiene bucal para seus filhos o mais precocemente possível, a fim de evitar possíveis agravantes bucais. As mães mostraram ter conhecimento adequado quanto aos cuidados e hábitos relacionados à saúde bucal.
A variável relacionada ao conhecimento sobre cárie dentária também foi estatisticamente significativa, pois as mães que conhecem que a cárie é uma doença transmissível foram as que receberam orientação odontológica na gestação. Isso significa que as mães têm o conhecimento de uma possível transmissão de bactérias cariogênicas da mãe para o filho. A percepção das gestantes sobre a severidade das doenças bucais está relacionada à adoção de cuidados caseiros e com a busca por atendimento odontológico; este último, porém, somente para resolução do problema instalado. Estudo realizado em Porto Alegre (RS) com responsáveis pelas crianças atendidas em uma clínica de uma faculdade de odontologia verificou que mais da metade dos entrevistados revelou algum conhecimento sobre cárie dentária, porém menos da metade nunca recebeu informações sobre a doença e não a considera como uma doença transmissível.(17) Em outro estudo, a maioria dos pais apresentou um pequeno conhecimento sobre a erupção do primeiro dente da criança, mas com baixo conhecimento sobre a higienização bucal e o desenvolvimento da cárie dentária.(16)
A cárie dentária é considerada um problema de saúde pública, uma vez que a doença acomete crianças em fase inicial do irrompimento dos dentes e pode ser influenciada pelo hábito de amamentação noturna, pelo alto consumo de carboidratos e açucares, e pela falta de higiene bucal adequada. Dessa forma, muitos estudos associam o alto índice de cárie dentária nas crianças, a falta de conhecimento das mães sobre a saúde bucal de seus filhos, o nível socioeconômica baixo, e o reduzido nível de escolaridade materna.(6) A cárie dentária ainda é a doença bucal mais prevalente na população, independente da idade, sendo de etiologia multifatorial. Além do leite materno, um estudo com mães de crianças de zero a 18 meses identificou que as mães utilizam alimentos com alto poder cariogênico em seus bebês, observando que a adoção de hábitos dietéticos saudáveis, com padrão nutricional adequado e consumo restrito de alimentos açucarados, é uma meta difícil de ser alcançada. Sugere-se assim que deve-se dar uma atenção maior sobre a necessidade da higiene bucal precoce.(18) Podem-se observar resultados positivos quando as mães são orientadas também após o nascimento de seus filhos. Em estudo longitudinal, foram selecionadas, de maneira randomizada, 480 mães de filhos entre 6 e 18 meses de idade de um Centro de Saúde, verificando-se aumento do uso de mamadeira noturna somente no grupo que não recebeu orientação em saúde bucal (grupo controle).(10)
Uma das limitações deste estudo foi ele não ter verificado as características clínicas dentárias das crianças, para analisar a influência do conhecimento das mães adquirido na gestação nas características clínicas bucais das crianças. Dessa forma, sugerem-se estudos futuros, que investiguem o conhecimento e percepção das mães, além do exame clínico bucal de seus filhos.
É necessária uma conscientização ampla, de âmbito nacional, sobre os problemas de saúde bucal, a fim de evitar complicações causadas por negligência e falta de autocuidado, com suporte de estilos de vida saudáveis, por meio da adoção de comportamentos adequados de higiene bucal e hábitos alimentares, consultas odontológicas periódicas, a partir de um processo de capacitação permanente junto às gestantes e às mães das crianças no período inicial da dentição. As mães com acesso regular a cuidados odontológicos estão mais inclinadas a levarem seus filhos ao dentista e a desenvolverem comportamentos e hábitos que promovem saúde bucal.(19) Dessa forma, há a necessidade dos profissionais de saúde se empenharem na busca de estratégias para a melhoria da qualidade das orientações oferecidas a população, tornando viável a adoção dos hábitos de saúde bucal nos domicílios e desmistificando o tratamento odontológico, para que este passe a ser visto como parte fundamental na busca pela saúde integral da criança.
Em estudo com gestantes que realizavam o pré-natal na UBS foi observado um baixo porcentual destas mulheres gestantes que receberam orientações sobre saúde bucal durante este período, o que demonstra a necessidade de uma maior integração da equipe da Estratégia Saúde da Família, considerando ser este um grupo prioritário e em razão do papel que essas mulheres exercem na promoção de saúde bucal no núcleo familiar.(20) A primeira forma de educação para a saúde das crianças deve ser aprendida pela mãe, que deve ser educada durante a gestação. Esse deve ser um processo contínuo, independente do nível de educação.(21)
Corroborando diversos estudos,(7,8,15,20-23) os dados analisados contribuem para a ciência e para a sociedade, confirmando a necessidade de implantação de programas de saúde bucal em parceria com o programa pré-natal voltados para todas as gestantes, com o intuito de conscientizá-las e orientá-las para que possam cuidar da saúde bucal de seus filhos. A elaboração desses programas deve ser desenvolvida pelos atuais governos nas três estâncias, afim de que tenham um caráter permanente e eficiente para a população. Isso porque os programas atuais relacionados à saúde bucal priorizam crianças na faixa etária de 5 anos e adolescentes de 12 anos, deixando de lado a fase de irrompimento dos primeiros dentes decíduos, que seria voltada para os lactantes.
As mães que receberam orientação odontológica durante a gestação tiveram maior percepção sobre a saúde bucal de seus filhos. Ainda, aquelas com maior nível de escolaridade e que trabalhavam fora de casa tinham mais conhecimento sobre atenção odontológica, pois receberam orientação odontológica na gestação.
A orientação odontológica recebida na gestação influencia as mães nos procedimentos adotados com seus filhos, em relação ao início da higienização bucal, à primeira consulta ao dentista, ao tempo de amamentação, e ao conhecimento sobre os fatores que levam ao aparecimento da cárie dentária, melhorando a percepção sobre a saúde bucal de seus filhos.