versão impressa ISSN 1806-3713versão On-line ISSN 1806-3756
J. bras. pneumol. vol.43 no.6 São Paulo nov./dez. 2017
http://dx.doi.org/10.1590/s1806-37562017000000088
A imersão em água altera fisiologicamente diversos sistemas do organismo, incluindo os sistemas musculoesquelético, renal, respiratório e cardiovascular.1 A pressão hidrostática comprime a cavidade torácica, reduzindo sua circunferência, o que favorece o deslocamento cranial do centro diafragmático.2 No sistema cardiovascular, ocorre aumento do retorno venoso, do volume sanguíneo e da pressão venosa central, resultando no aumento do débito cardíaco, do diâmetro do átrio esquerdo e do volume cardíaco em indivíduos saudáveis.3-5
As alterações cardiorrespiratórias induzidas pela imersão em água causam a redução do volume expiratório final e o prejuízo da relação comprimento/tensão dos músculos respiratórios, diminuindo sua capacidade de gerar e manter uma força adequada e, consequentemente, reduzindo PImáx e PEmáx.2 Além disso, acarretam o aumento da pressão nos capilares pulmonares, provocando piora da função pulmonar, com redução da CV, do VEF1 e da capacidade residual funcional, levando ao desenvolvimento de um padrão pulmonar restritivo.2,3,6 De fato, na prática clínica, inúmeras doenças cardiopulmonares induzem um padrão restritivo como consequência da congestão pulmonar, a partir de mecanismos similares aos promovidos pela imersão.
Dentre o arsenal terapêutico utilizado pelos fisioterapeutas no tratamento da congestão pulmonar e de suas complicações respiratórias destacam-se os exercícios respiratórios, a inspirometria de incentivo e a ventilação não invasiva com pressão positiva (VNIPP).7,8 Vepo et al.,9 em um modelo de indução de características pulmonares restritivas por meio da imersão em água, verificaram que tanto exercícios respiratórios como a inspirometria de incentivo não foram eficazes em normalizar a função pulmonar durante a imersão.
Nesse sentido, a VNIPP aplicada em modo de continuous positive airway pressure (CPAP, pressão positiva contínua nas vias aéreas) melhorou a condição hemodinâmica de pacientes com congestão pulmonar decorrente de insuficiência cardíaca, reduzindo a pré e pós-carga, e, assim, incrementando a complacência e os volumes pulmonares, e reduzindo o trabalho respiratório.10 Outros estudos evidenciam que a VNIPP reduz o retorno venoso, a pressão capilar pulmonar, a pressão venosa central, e, consequentemente, normaliza a função pulmonar em pacientes cardiopatas.11,12
Tendo em conta que alguns recursos terapêuticos não revertem o quadro restritivo pulmonar durante a manutenção de alterações hemodinâmicas nesse modelo de simulação de congestão pulmonar por meio da imersão em água, associado às evidências de que a VNIPP, através do modo CPAP, constitui uma importante ferramenta terapêutica utilizada no tratamento dessa condição, torna-se imprescindível investigar seus efeitos sobre as alterações hemodinâmicas que induzem o quadro pulmonar restritivo característico da congestão pulmonar. Assim, o estudo objetivou verificar se a aplicação de VNIPP no modo CPAP em diferentes pressões melhora os volumes e as capacidades pulmonares de sujeitos saudáveis imersos em água.
Ensaio clínico aleatório, desenvolvido entre abril e junho de 2016, em uma universidade federal localizada no estado do Rio Grande do Sul. Os voluntários selecionados assinaram um termo de consentimento livre e esclarecido, conforme as normas éticas previstas na Resolução 466/12 do Conselho Nacional de Saúde, após a prévia aprovação do estudo pelo comitê de ética em pesquisa da instituição (CAEE 56861216.7.0000.5323).
A amostra, determinada por cálculo amostral para análise de variáveis quantitativas de uma proporção de população infinita, considerando um nível de confiança de 95%, um erro máximo de estimação de 5% e uma prevalência estimada de 50%, foi composta por indivíduos voluntários, incluídos de acordo com os seguintes critérios: indivíduos saudáveis, do gênero feminino, com idade entre 18 e 40 anos, em uso de anticoncepcional oral no período de realização da pesquisa (para garantir a homogeneidade da amostra, tendo em vista que o uso de anticoncepcionais orais proporciona níveis estáveis de hormônios sexuais femininos, evitando assim possíveis alterações na função pulmonar devido às flutuações hormonais que ocorrem nas diferentes fases do ciclo menstrual) e que assinaram o termo de consentimento livre e esclarecido. Foram excluídos os sujeitos que, por qualquer motivo, não compareceram às etapas do estudo; não conseguiram executar as técnicas de avaliação ou de VNIPP; apresentaram alguma alteração durante a realização da espirometria; apresentavam doenças cardiovasculares, respiratórias, neurológicas e/ou musculoesqueléticas; estavam em tratamento medicamentoso (exceto anticoncepcional oral); ou eram tabagistas ou ex-tabagistas.
Os voluntários foram submetidos a anamnese (estado geral de saúde, doenças associadas e uso de medicamentos) e exame físico (peso, altura e índice de massa corpórea), realizados por um único avaliador, segundo a padronização da International Society for the Advancement of Kinanthropometry.13 Na avaliação cardiorrespiratória, FC, SpO2, e pressão arterial sistólica e diastólica foram obtidas conforme recomendações das VI Diretrizes Brasileiras de Hipertensão.14 A função pulmonar foi analisada por espirometria (Koko Legend®; nSpire Health Inc., Hertford, Reino Unido), de acordo com os critérios da American Thoracic Society e European Respiratory Society15 e da Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia,16 utilizando valores preditos por Pereira et al.17 para CVF, VEF1 e relação VEF1/CVF, assim como peak expiratory flow rate (PEFR, taxa de pico de fluxo expiratório) e FEF25-75%.
Foram também mensurados capacidade vital lenta, por meio de um ventilômetro (Wright Mark 8; Ferraris Respiratory, Louisville, CO, EUA), assim como PImáx e PEmáx, utilizando-se um manovacuômetro (MV 120; Comercial Médica, São Paulo, Brasil), de acordo com Neder et al.18 Essas avaliações foram executadas em postura sentada, de acordo com as diretrizes da Sociedade Brasileira de Pneumologia e Tisiologia.16
A VNIPP, no modo CPAP (BiPAP®; Respironics, Murrysville, PA, EUA), foi aplicada por máscara facial individual para cada voluntário em imersão em água no nível do processo xifoide. Nesse modelo de imersão, a redução da função pulmonar ocorre principalmente por alterações cardiovasculares e simula, em indivíduos saudáveis, um padrão pulmonar restritivo, o qual geralmente é observado em algumas complicações cardiorrespiratórias, como a congestão pulmonar.9 Vepo et al.9 descrevem para esse modelo, após 10 min de imersão em água, a redução de CVF e VEF1 induzida por alterações hemodinâmicas de aumento de volume sanguíneo e pressão venosa central.
Todos os sujeitos participaram dos três protocolos de VNIPP sob imersão, com um intervalo de aplicação de pelo menos 24 h, e uma sequência definida através de randomização em blocos, como mostra a Figura 1. Os protocolos tiveram duração de 20 min e foram assim designados: controle - em respiração espontânea, em repouso e sem suporte ventilatório; CPAP5 - uso de CPAP de 5 cmH2O, de acordo com Reis et al.19; e CPAP10 - uso de CPAP de 10 cmH2O, conforme Bellone et al.20 Durante sua aplicação, foram avaliadas as variáveis FC, SpO2, CVF, VEF1, relação VEF1/CVF, PEFR e FEF25-75% nos seguintes momentos: antes da imersão em água (pré-imersão); 10 min após a imersão em água; e 10 min após os 20 min de duração dos protocolos (ou seja, 40 min após o início dos protocolos; Figura 1).
Os resultados foram expressos como médias e desvios-padrão. A normalidade dos dados foi verificada por meio do teste de Shapiro-Wilk, sendo que todas as variáveis analisadas apresentaram distribuição normal. Os dados foram analisados utilizando ANOVA de uma via para medidas repetidas e, quando apropriado, o teste post hoc de Fisher. Foram considerados significantes os valores com p < 0,05. O programa GraphPad Prism, versão 6.01 (GraphPad Inc., San Diego, CA, EUA) foi utilizado para as análises estatísticas e a confecção das figuras.
Das 15 voluntárias avaliadas, 2 foram excluídas por apresentarem alterações espirométricas na avaliação inicial (n = 1) e por não comparecerem a todas as etapas da coleta de dados (n = 1). Ao final, participaram do estudo 13 voluntárias, com média de idade de 23,6 ± 5,5 anos. As características antropométricas, assim como os parâmetros cardiovasculares e respiratórios avaliados antes da aplicação dos protocolos estavam dentro do limite da normalidade para idade e gênero (Tabela 1).
Tabela 1 Avaliação física, respiratória e cardiovascular inicial dos sujeitos avaliados (n = 13).a
Parâmetros | Resultados |
---|---|
Idade, anos | 23,6 ± 5,5 |
Estatura, m | 1,60 ± 0,02 |
Peso, kg | 63,7 ± 11,6 |
IMC, kg/m2 | 23,6 ± 3,5 |
FC, bpm | 76,2 ± 6,4 |
PAS, mmHg | 120,5 ± 8,6 |
PAD, mmHg | 71,9 ± 7,7 |
SpO2, % | 98,4 ± 0,8 |
PImáx, cmH2O | 98,5 ± 26,3 |
PEmáx, cmH2O | 103,1 ± 26,5 |
CVL, l | 3,3 ± 0,3 |
CVL, % do previsto | 82,2 ± 3,0 |
CVF, l | 3,9 ± 0,6 |
CVF, % do previsto | 98,9 ± 11,4 |
VEF1, l | 3,5 ± 0,5 |
VEF1, % do previsto | 99,9 ± 10,7 |
VEF1/CVF | 0,9 ± 0,1 |
VEF1/CVF, % | 98,0 ± 7,0 |
PEFR, l/min | 8,4 ± 1,7 |
PEFR, % do previsto | 106,2 ± 16,3 |
FEF25-75%, l/min | 4,4 ± 1,1 |
FEF25-75%, % do previsto | 95,2 ± 19,9 |
IMC: índice de massa corpórea; PAS: pressão arterial sistólica; PAD: pressão arterial diastólica; CVL: capacidade vital lenta; PEFR: peak expiratory flow rate (taxa de pico de fluxo expiratório). aValores expressos em média ± dp.
Após 10 min de imersão em água, todos os indivíduos apresentaram uma redução de CVF e VEF1, sugerindo uma alteração restritiva do padrão pulmonar pela imersão, conforme previamente observado por Vepo et al.9 Essa redução seguiu-se após 10 min da aplicação do protocolo controle e também após a aplicação do protocolo CPAP5. No entanto, essas alterações foram normalizadas com a aplicação do protocolo CPAP10 (Figura 2).
Figura 2 Valores de CVF e VEF1, respectivamente, nos protocolos controle (em A e D), CPAP de 5 cmH2O (CPAP5; em B e E) e CPAP de 10 cmH2O (CPAP10; em C e F) nos distintos momentos avaliados (dados expressos em média ± dp). CPAP: continuous positive airway pressure (pressão positiva contínua nas vias aéreas); PI: pré-imersão; I10’: 10 min após o início do protocolo; I40’: 10 min após a aplicação dos protocolos. *p < 0,05 vs. PI (ANOVA de uma via para medidas repetidas, seguido de teste post hoc de Fisher).
A relação VEF1/CVF também demonstrou alterações após 10 min de imersão em todos os indivíduos nos três protocolos. Corroborando os dados de CVF e VEF1, essa alteração se manteve 10 min após a aplicação do protocolo controle e CPAP5; porém, foi restaurada após a aplicação do protocolo CPAP10 (Figura 3). Os valores de PEFR e FEF25-75% também diminuíram após 10 min de imersão em água. Os protocolos CPAP5 e CPAP10 foram capazes de normalizar os valores de PEFR 10 min após a aplicação dos mesmos; no entanto, os valores de FEF25-75% permaneceram inalterados após a aplicação de ambos os protocolos (Tabela 2).
Figura 3 Valores da relação VEF1/CVF nos protocolos controle (em A), CPAP de 5 cmH2O (CPAP5; em B) e CPAP de 10 cmH2O (CPAP10; em C) nos distintos momentos avaliados (dados expressos em média ± dp). CPAP: continuous positive airway pressure (pressão positiva contínua nas vias aéreas); PI: pré-imersão; I10’: 10 min após o início do protocolo; I40’: 10 min após a aplicação dos protocolos. *p < 0,05 vs. PI; ANOVA de uma via para medidas repetidas, seguido de teste post hoc de Fisher.
Com relação aos parâmetros cardiorrespiratórios, foi observada uma redução da FC após 10 min de imersão em água, a qual persistiu durante todos os períodos de avaliação em todos os protocolos realizados. Por sua vez, a SpO2 não sofreu alterações em nenhum período avaliado, mantendo valores basais mesmo após a imersão (Tabela 2).
Tabela 2 Parâmetros cardiovasculares e respiratórios avaliados nos distintos protocolos aplicados.a
Parâmetros | Controle | CPAP5 | CPAP10 | ||||||
---|---|---|---|---|---|---|---|---|---|
PI | I10' | I40' | PI | I10' | I40' | PI | I10' | I40' | |
FC, bpm | 93,5 ± 15,1 | 78,8 ± 11,2* | 79,8 ± 10,5* | 101,3 ± 13,9 | 84,2 ± 10,4* | 80,4 ± 13,5* | 98,5 ± 14,4 | 82,2 ± 8,7* | 78,4 ± 12,1* |
SpO2, % | 98,8 ± 1,0 | 98,5 ± 1,1 | 98,8 ± 0,9 | 98,3 ± 0,6 | 98,6 ± 0,9 | 98,8 ± 0,7 | 98,5 ± 1,7 | 98,5 ± 1,2 | 98,3 ± 1,9 |
PEFR, l/min | 7,06 ± 1,3 | 7,0 ± 1,3* | 6,9 ± 1,2 | 7,5 ± 1,1 | 7,2 ± 1,2* | 7,3 ± 1,1 | 7,1 ± 1,0 | 6,6 ± 1,3* | 6,9 ± 1,2 |
FEF25-75%, l/min | 4,1 ± 0,7 | 3,9 ± 0,8* | 3,8 ± 0,7* | 4,3 ± 0,7 | 3,9 ± 0,6* | 3,8 ± 0,6* | 3,9 ± 0,8 | 3,9 ± 0,8 | 3,8 ± 0,7 |
CPAP5: CPAP de 5 cmH2O; CPAP10: CPAP de 10 cmH2O; PI: pré-imersão; I10’: 10 min após a imersão; I40’: 10 min após 20 min da aplicação dos diferentes protocolos; e PEFR: peak expiratory flow rate (taxa de pico de fluxo expiratório). aValores expressos em média ± dp. *p < 0,05 vs. PI (ANOVA de uma via, seguido de teste post hoc de Fisher.
No presente estudo, demonstramos que a aplicação de CPAP com pressão de 10 cmH2O foi capaz de restaurar o padrão restritivo pulmonar induzido pela imersão em água em indivíduos saudáveis, mantendo os volumes e capacidades pulmonares em níveis de normalidade por um período mais prolongado quando comparado a níveis menores de pressão. Esses dados sugerem, pela primeira vez, que, em situações nas quais persista a alteração hemodinâmica causadora do distúrbio pulmonar, a aplicação de pressões positivas mais elevadas é efetiva para manter as melhorias no quadro pulmonar por um maior tempo.
As alterações hemodinâmicas durante a imersão ocorrem, em parte, pela hemodiluição, devido à transferência de líquido do compartimento intersticial dos membros inferiores para o espaço intravascular.5,21 Essas alterações promovem, no sistema respiratório, uma redução de volumes e de capacidades pulmonares, característica de um padrão restritivo.22
Na prática clínica, observamos que as complicações pulmonares decorrentes de alterações cardíacas acarretam um padrão pulmonar restritivo devido, principalmente, ao aumento do volume sanguíneo torácico. Caracterizada por um aumento nas pressões pulmonar e venosa sistêmica, a congestão pulmonar geralmente está relacionada à redução no débito cardíaco e à disfunção ventricular em pacientes cardiopatas.23,24 Essa condição, quando não tratada, pode evoluir para um quadro de edema pulmonar e constitui uma emergência médica.23-25
O modelo de indução de um padrão pulmonar restritivo utilizado no presente estudo, previamente descrito por Vepo et al.,9 utiliza a imersão em água para promover aumento de volume sanguíneo central em sujeitos saudáveis e, consequentemente, alterações hemodinâmicas similares às desenvolvidas em cardiopatas com congestão pulmonar. Assim, esse modelo possibilita a análise e o esclarecimento dos efeitos da aplicação de CPAP exclusivamente sobre as alterações de volumes e de capacidades pulmonares promovidas por fatores hemodinâmicos isolados, afastando o risco de doenças associadas influenciarem os achados.
Após a aplicação de CPAP em sujeitos em imersão em água, verificamos que apenas a aplicação de pressão de 10 cmH2O proporcionou melhoras sustentadas de volumes e capacidades pulmonares. Isso sugere que, quando as alterações hemodinâmicas que contribuem para o quadro de congestão pulmonar não são controladas, pressões positivas mais altas são necessárias para manter melhoras da função pulmonar. Da mesma forma, Vepo et al.,9 ao aplicar exercícios respiratórios e inspirometria de incentivo em sujeitos em imersão em água, não observaram melhoras nos volumes e capacidades pulmonares, sugerindo que essas técnicas não apresentam os benefícios esperados quando a alteração hemodinâmica primária não é controlada ou eliminada.
Embora a farmacoterapia, através de diuréticos e vasodilatadores, seja uma ferramenta essencial no combate à retenção de fluídos e no alívio dos sintomas respiratórios da congestão pulmonar,24,26,27 cada vez mais a combinação dessa com o uso de pressão positiva é empregada a fim de normalizar a condição hemodinâmica dos pacientes e impedir a recidiva da congestão. Nesse sentido, a CPAP é um modo de ventilação aplicada a um amplo espectro de situações clínicas28 e frequentemente é indicada a pacientes em condições críticas, como no edema agudo de pulmão (EAP) cardiogênico. Nesse caso, as Diretrizes Brasileiras de Ventilação Mecânica28 recomendam seu uso com pressões de 5 a 10 cmH2O, o que justifica a faixa escolhida para o presente estudo.
Os benefícios pulmonares advindos da CPAP são decorrentes, em grande parte, da elevação da pressão intratorácica e consequente redução da pós-carga do ventrículo esquerdo promovida pela pressurização das vias aéreas. Em consequência, essa pressurização eleva o débito cardíaco, promovendo melhoras nos volumes e capacidades pulmonares, e reduz o desconforto respiratório.11,12 Apesar de os efeitos hemodinâmicos proporcionados pela aplicação da CPAP estarem completamente elucidados para a população que apresenta hipertensão pulmonar devido à disfunção ventricular esquerda, nosso estudo demonstrou que, diante da permanência do agente causador das alterações hemodinâmicas, a melhora na função pulmonar se mantém somente quando aplicadas pressões de CPAP mais elevadas nas vias aéreas, independentemente de melhoras pulmonares observadas imediatamente após a aplicação da técnica.
Apesar de numerosos, os estudos envolvendo a aplicação de CPAP para o tratamento da condição pulmonar cardiogênica, utilizando a mesma faixa de pressão positiva relatada no corrente estudo, variam quanto aos seus efeitos em termos de mortalidade, permanência em UTI e tempo de internação, bem como suas vantagens em relação à terapia convencional.20,29,30 É sabido que a CPAP aumenta a sobrevida e evita a intubação traqueal em pacientes com EAP cardiogênico.29-31 Entretanto, um estudo controlado randomizado envolvendo pacientes com EAP cardiogênico não mostrou diferenças na taxa de mortalidade a curto e longo prazos entre pacientes submetidos à terapia convencional com oxigenoterapia e aqueles submetidos a CPAP.32 As divergências entre os estudos provavelmente ocorrem devido à variabilidade de fatores clínicos associados nesses pacientes, bem como de cointervenções farmacológicas administradas. Ambas as situações impedem a análise isolada dos efeitos da CPAP sobre as alterações respiratórias originadas dos distúrbios hemodinâmicos.
Com relação à redução encontrada nos demais parâmetros espirométricos, como FEF25-75% e PEFR, após imersão em água, tal comportamento foi previamente observado por Vepo et al.9 Os autores referem que FEF25-75% é diretamente dependente dos valores de CVF, sendo esperada sua redução durante a imersão. Além disso, sabe-se que esse parâmetro está relacionado à permeabilidade das vias aéreas distais,33 e sua redução está de acordo com o aumento do volume sanguíneo intratorácico e da pressão capilar pulmonar observado nesse modelo.
No que concerne aos parâmetros cardiorrespiratórios investigados, nosso estudo demonstrou uma redução da FC em todos os protocolos aplicados, o que corrobora o estudo de Kaneko et al.,34 utilizando uma combinação de CPAP e terapia medicamentosa em pacientes com EAP cardiogênico. Porém, em nosso estudo, não podemos relacionar essa alteração à aplicação de pressões positivas nas vias aéreas, já que também se observou o mesmo comportamento da FC no protocolo controle. Sugere-se que a alteração observada seja oriunda exclusivamente da imersão em água, o que já foi relatado em estudos prévios.35,36 A aplicação de CPAP com pressão de 10 cmH2O melhorou a hipoxemia quando comparada ao tratamento convencional em pacientes com EAP cardiogênico.37 Contudo, nosso estudo não encontrou diferenças significantes da SpO2 em nenhum protocolo de CPAP e período avaliados, o que pode estar relacionado ao fato de esses indivíduos serem saudáveis e apresentarem valores normais de SpO2. Ressalta-se que os sujeitos relataram cansaço após a aplicação de CPAP com pressão de 10 cmH2O, o que pode ter ocorrido devido a uma menor tolerância a pressões positivas mais elevadas sobre as vias aéreas, já que são sujeitos com condições respiratórias normais. Esse fator pode ter limitado o melhor desempenho dos participantes do estudo durante a avaliação espirométrica imediatamente posterior à aplicação da CPAP.
Sumarizando, os resultados encontrados no presente estudo sugerem que o uso de pressões mais elevadas de CPAP seja mais efetivo para manter as melhorias nos volumes e capacidades pulmonares em situações nas quais persista a alteração hemodinâmica causadora do padrão pulmonar restritivo. Nossos achados reforçam a importância de um adequado controle da causa hemodinâmica primária da congestão pulmonar para que a associação de recursos fisioterapêuticos à conduta clínica apresente benefícios máximos e prolongados sobre as alterações respiratórias presentes nessa condição.