versão impressa ISSN 1413-8123versão On-line ISSN 1678-4561
Ciênc. saúde coletiva vol.24 no.11 Rio de Janeiro nov. 2019 Epub 28-Out-2019
http://dx.doi.org/10.1590/1413-812320182411.32402017
The scope of this article is to evaluate the impact of emissions from sugarcane burning on hospital admission numbers for respiratory diseases in a sugarcane region. Hospital admission records for respiratory diseases were acquired from the database of the Hospital Information System of the Unified Health System (SIH-SUS) in the period from March 28, 2011 to December 28, 2012. Levels of PM10, NO2, O3, Temperature and Relative Humidity were recorded. Logistic regression models were created to analyze the association between the total number of hospitalizations, atmospheric pollutants and meteorological variables. A total of 1,179 hospitalization admissions were recorded, with a significant increase in cases of pneumonia in the burning period (p = 0.005). Likewise, it was observed that the cluster of PM10 and NO2 was influenced 67.9% (95% CI: 11.111-2.537) followed by cluster PM10, NO2, O3 and Temperature that influenced 91.1% (95% CI: 1.116; 3.271) in the total number of hospitalization admissions. During the sugarcane burning period there were more hospitalization admissions due to respiratory tract diseases, mainly pneumonia, where the influence of air pollutants and temperature in the process of illness in the population was detected.
Key words Air pollutants; Sugarcane; Respiratory tract diseases; Pneumonia; Meteorological variables
O impacto da poluição atmosférica sobre a saúde humana vem sendo tema de vários estudos1-4, evidenciando um grave problema de saúde pública. Em regiões canavieiras, por exemplo, a queima noturna da palha da cana-de-açúcar pode ser considerada como o maior fator contribuinte de agravos em cidades interioranas5,6. Além de afetarem as comunidades próximas, os poluentes atmosféricos podem viajar quilômetros e atingir locais distantes da fonte de emissão e, mesmo que abaixo dos níveis determinados pela legislação, são capazes de provocar efeitos à saúde da população7-11.
A nível mundial, 25% das terras correspondentes a plantações de cana-de-açúcar estão localizadas no Brasil, o Estado de São Paulo é o maior produtor desta safra, crescendo em 121% a cada década. A queima da cana está diminuindo gradualmente a cada ano desde 2002, quando a lei de suspensão da queima entrou em vigor, tendo uma prospectiva gradual de mecanização de toda área do Estado de São Paulo, entretanto, sabe-se que essa queima da palha de cana-de-açúcar e sua consequente emissão de poluentes ainda vão impactar a saúde das regiões canavieiras não só do Estado de São Paulo, mas a nível País onde a queima da cana de açúcar ainda é um problema para a saúde humana12,13.
A queima da palha da cana-de-açúcar pode gerar uma grande quantidade de aerossóis, material particulado (MP), gases como monóxido de carbono (CO) e dióxido de carbono (CO2), aldeídos, metano (CH4), óxidos de nitrogênio (NOx) e outros hidrocarbonetos policíclicos aromáticos (PAHs). Uma vez na atmosfera, alguns desses gases como metano, dióxido de nitrogênio (NO2) e hidrocarbonetos podem produzir poluentes secundários como o ozônio (O3), por meio de uma reação fotoquímica14,15.
Os efeitos da exposição humana à estes poluentes são de caráter agudo ou crônico, e vão desde tosse seca e cansaço, irritação no nariz e garganta, chegando até a causar aumento de liberação de células inflamatórias e alterações no clearance mucociliar nasal16,17. Um estudo realizou uma projeção de mortalidade e internações hospitalares na rede pública de saúde no Estado de São Paulo, onde estimaram que entre 2011 e 2030, o total de mortes chegaria a mais de 246 mil óbitos e 918 mil internações apenas por causas cardiovasculares, respiratórias e neoplasias em grupos mais susceptíveis18.
Segundo o mesmo autor, a mortalidade geral atribuída ao MP apresentou um aumento de 96% no período de análise, com 9.384 mortes em 2011 e uma projeção de 18.407 mortes para 203018. Bayram19 realizou um estudo mostrando associação entre NO2 e O3, o qual constatou que havia ocorrido o aumento da permeabilidade do tecido brônquico e células inflamatórias em pacientes com doenças respiratórias crônicas, como asma e doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC). Diante da temática e das lacunas ainda a serem preenchidas na literatura científica, o presente estudo teve como objetivo avaliar o impacto das emissões da queima noturna da palha da cana-de-açúcar sobre o número de internações hospitalares por doenças respiratórias em uma região canavieira do estado de São Paulo.
O estudo foi realizado na cidade de Presidente Prudente, São Paulo, Brasil, situada a 587 quilômetros da capital, com uma população de 223.749, de acordo com dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE)20. Foram registrados número de internações hospitalares e emergenciais por doenças respiratórias (DR) a partir da base de dados referentes ao sistema de informações hospitalares do sistema único de saúde (SIH-SUS), disponibilizado pelo Hospital Regional de Presidente Prudente, de acordo com a Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde - Décima Revisão (CID-10). Dentre as doenças, foram observadas internação por DPOC (CID-10: J44), asma (CID-10: J45), pneumonia (CID-10: J12-J18), broncopneumonia (CID-10: J18.0) e infecções de vias aéreas superiores (IVAS, CID-10: J00-J06), no período de 28 de março de 2011 a 28 de dezembro de 2012.
Foram incluídos somente os registros de indivíduos residentes na cidade de Presidente Prudente e quando o diagnóstico médico se encontrava bem definido para as DR. O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Faculdade de Ciências e Tecnologia (FCT/UNESP), Campus de Presidente Prudente-SP.
O material MP10, NO2, O3, temperatura (T) e umidade relativa do ar (UR) foram obtidas por amostragem ativa através de uma rede automática de monitoramento do estado de São Paulo, localizada em Presidente Prudente/SP21. Esta rede registra as concentrações dos poluentes através do sistema de telemetria e são disponibilizados diariamente, apresentando um resumo das condições da poluição atmosférica e meteorológica das últimas 24 horas.
Para a análise estatística, foi utilizado o SPSS, versão 15.0. O teste de Mann-Whitney foi utilizado para verificar as diferenças entre as médias de variáveis contínuas, uma vez que estas não mostraram distribuição normal no teste de normalidade de Kolmogorov-Smirnov. Para a análise de regressão logística, informamos que a definição de cada categoria de doença foi estabelecida como nenhuma internação ou uma ou mais internações por dia.
Posteriormente, modelos de regressão logística foram construídos separadamente para analisar a associação entre a frequência do número total de internações por DR, poluentes atmosféricos e variáveis meteorológicas. Nos modelos, foram incluídos as variáveis de ajuste como MP10, NO2, O3, T e UR, durante o período de queima da palha da cana-de-açúcar.
Para esta regressão foram elaborados clusters dos poluentes a partir do somatório de quantidade de MP10, NO2 e O3. Para isso, todos os poluentes foram transformados em Score Z (formula: (amostra - média) / DP) e os clusters foram feitos a partir da somatória entre as possíveis combinações. Os dados de T e UR foram combinados aos clusters que apresentaram significância afim de identificar a influência meteorológica junto aos poluentes sobre as internações por DR. O aumento do risco relativo foi calculado usando a formula (Exp (B) - 1) * 100. O nível de significância adotado considerado para todos os testes foi de 5% (p < 0,05).
Na Tabela 1 estão representadas as principais características do estudo. Foram registradas 1.179 internações por DR, com no mínimo zero de internações e máximo de oito internações por dia. As médias das concentrações de MP10, NO2 e O3 apresentaram-se dentro dos limites classificados como “Boa” de acordo com a OMS22 (0-50 µg/m3, 0-200 µg/m3, 0-100 µg/m3, respectivamente).
Tabela 1 Características das principais variáveis do estudo, Oeste do Estado de São Paulo, Brasil, 2011 a 2012.
Variáveis | Média | DP | Mínimo | Máximo | Percentils | ||
---|---|---|---|---|---|---|---|
25th | 50th | 75th | |||||
Total de internações (n = 1.179) | 2,3 | 1,3 | 1 | 8 | 1,0 | 2,0 | 3,0 |
DPOC (n = 114) | 0,2 | 0,5 | 0 | 3 | 0,0 | 0,0 | 0,0 |
Asma (n = 35) | 0,1 | 0,3 | 0 | 2 | 0,0 | 0,0 | 0,0 |
Pneumonia (n = 497) | 1,0 | 1,0 | 0 | 7 | 0,0 | 1,0 | 1,0 |
Broncopneumonia (n = 338) | 0,7 | 0,9 | 0 | 4 | 0,0 | 0,0 | 1,0 |
Infecções VAS (n = 195) | 0,4 | 0,7 | 0 | 4 | 0,0 | 0,0 | 1,0 |
Poluentes Atmosféricos | |||||||
MP10 (µg/m3) | 24,1 | 13,1 | 4,3 | 82,9 | 13,9 | 22,2 | 31,6 |
NO2 (µg/m3) | 16,2 | 7,3 | 3,7 | 43,1 | 11,2 | 14,6 | 21,0 |
O3 (µg/m3) | 48,3 | 16,3 | 10,0 | 95,0 | 37,2 | 47,1 | 58,3 |
Variáveis Meteorológicas | |||||||
T (ºC) | 23,7 | 3,8 | 9,6 | 32,8 | 21,6 | 24,2 | 26,4 |
UR (%) | 61,8 | 14,4 | 24,3 | 98,5 | 52,0 | 61,8 | 71,5 |
DP: desvio padrão; DPOC: doença pulmonar obstrutiva crônica; VAS: vias aéreas superiores; MP10: material particulado de 10 micrômetros; NO2: dióxido de nitrogênio; O3: ozônio; T: temperatura; ºC: graus Celsius; UR: umidade relativa do ar; %: porcentagem.
Ao longo do estudo, quando estratificado pelo período de não queima (162 dias) e queima (350 dias) da cana-de-açúcar, houve diferença significativa do número de internações por DR no período da queima, em comparação ao período de não queima (p = 0,011). No entanto, dentre as doenças, apenas a pneumonia apresentou aumento significativo no número de internações no período de queima (p = 0,005) (Tabela 2).
Tabela 2 Analise comparativa entre o número de internações por doenças respiratórias nos períodos de queima e não queima da cana-de-açúcar.
Média | DP | Mínimo | Máximo | Percentis | |||
---|---|---|---|---|---|---|---|
25th | 50th | 75th | |||||
Não queima (162 dias) | |||||||
Total de internações (n = 404) | 2,5 | 1,3 | 1,0 | 7,0 | 1,0 | 2,0 | 3,0 |
DPOC (n = 36) | 0,2 | 0,5 | 0,0 | 3,0 | 0,0 | 0,0 | 0,0 |
Asma (n = 14) | 0,1 | 0,3 | 0,0 | 1,0 | 0,0 | 0,0 | 0,0 |
Pneumonia (n = 125) | 0,8 | 0,8 | 0,0 | 4,0 | 0,0 | 1,0 | 1,0 |
Broncopneumonia (n = 107) | 0,7 | 0,9 | 0,0 | 4,0 | 0,0 | 0,0 | 1,0 |
Infecções VAS (n = 54) | 0,3 | 0,6 | 0,0 | 3,0 | 0,0 | 0,0 | 1,0 |
Queima (350 dias) | |||||||
Total de internações (n = 775) | 2,2* | 1,3 | 1,0 | 8,0 | 1,0 | 2,0 | 3,0 |
DPOC (n = 78) | 0,2 | 0,5 | 0,0 | 3,0 | 0,0 | 0,0 | 0,0 |
Asma (n = 21) | 0,1 | 0,3 | 0,0 | 2,0 | 0,0 | 0,0 | 0,0 |
Pneumonia (n = 372) | 1,1** | 1,0 | 0,0 | 7,0 | 0,0 | 1,0 | 2,0 |
Broncopneumonia (n = 231) | 0,7 | 0,9 | 0,0 | 4,0 | 0,0 | 0,0 | 1,0 |
Infecções VAS (n = 141) | 0,4 | 0,7 | 0,0 | 4,0 | 0,0 | 0,0 | 1,0 |
DP: desvio padrão; DPOC: doença pulmonar obstrutiva crônica; VAS: vias aéreas superiores. *Diferente do período de não queima (*p < 0,011, **p = 0,005; Teste Mann-Whitney).
As concentrações de MP10, NO2 e O3 aumentaram significantemente durante o período de queima (p < 0,0001), em contrapartida os dados de T e UR diminuíram significantemente neste mesmo período (p < 0,0001; Tabela 3). Houve correlação positiva entre O3 e T (r = 0,644; p < 0,0001).
Tabela 3 Análise comparativa entre as concentrações de poluentes atmosféricos e variáveis meteorológicas nos períodos de queima e não queima da cana-de-açúcar.
Não queima (162 dias) | Queima (350 dias) | p-valor | |
---|---|---|---|
Poluentes Atmosféricos | |||
MP10 | 14,3 (9,6-19,6) | 26,4 (17,1-36,5) | < 0,0001* |
NO2 | 11,7 (7,4-15,2) | 16,4 (12,0-22,2) | < 0,0001* |
O3 | 45,0 (35,6-53,0) | 47,6 (37,8-61,1) | 0,009* |
Variáveis Meteorológicas | |||
T (ºC) | 25,9 (24,5-27,3) | 23,2 (20,7-25,2) | < 0,0001* |
UR (%) | 65,5 (59,7-75,5) | 59,8 (49,9-68,9) | < 0,0001* |
MP10: material particulado de 10 micrômetros; NO2: dióxido de nitrogênio; O3: ozônio; T: temperatura; ºC: graus Celsius; UR: umidade relativa do ar; %: porcentagem. Diferença entre os períodos de não queima e queima (*p < 0,05, Teste Mann-Whitney). Dados expressos em mediana (intervalo interquartílico 25-75%).
Na análise de regressão logística, pode-se observar que o número total de internações no período de queima da cana-de-açúcar sofreu influência de 67,9% do MP10 e NO2 (Exp(B) 1,679; IC95%: 11,111-2,537). No entanto, a combinação de MP10, NO2, O3 e T influenciou 91,1% no número total de internações por DR no período de queima (Exp(B) 1,911; IC95%: 1,116; 3,271) (Tabela 4).
Tabela 4 Regressão logística de associação entre internações por doenças respiratórias e poluentes atmosféricos e variáveis meteorológicas durante o período de queima da cana-de-açúcar.
Modelos | Número total de internações por doenças respiratórias durante período de queima | ||
---|---|---|---|
Exp(B): | IC 95% | p-valor | |
Ajustadoa | 1,161 | 0,664-2,031 | 0,601 |
Ajustadob | 1,679 | 1,111-2,537 | 0,014* |
Ajustadoc | 0,425 | 0,205-0,882 | 0,022* |
Ajustadod | 1,911 | 1,116-3,271 | 0,018* |
Ajustadoe | 0,707 | 0,481-1,041 | 0,079 |
DPOC: doença pulmonar obstrutiva crônica; VAS: vias aéreas superiores.
aAjustado para MP10
bAjustado para o cluster de MP10 e NO2
cAjustado para o cluster de MP10, NO2, O3
dAjustado para o cluster de MP10, NO2, O3 e Temperatura;
eAjustado para o cluster de MP10, NO2, O3, Temperatura e Umidade relativa do ar; Exp(B): Razão de Chance, IC: intervalo de confiança; Diferença entre os períodos de não queima e queima (*p < 0,05).
O presente estudo teve como objetivo avaliar o impacto das emissões de poluentes por meio da queima da cana-de-açúcar sobre as internações hospitalares por DR em uma região canavieira. Dentre os principais achados, observou-se um aumento no número de internações por DR, principalmente por pneumonia, no período de queima de cana-de-açúcar. Além disso, o aumento dos poluentes associado com a diminuição da temperatura mostrou relação direta sobre o número total de internações por doenças respiratórias neste período.
A queima da cana-de-açúcar é responsável pela produção e emissão de MP e gases tóxicos, que possuem efeitos deletérios à saúde humana à curto e longo prazos23-25. Dentre esses poluentes, o MP apresenta maior toxidade26 e, quando inalados, pode desencadear processos inflamatórios a partir da formação de agentes oxidantes intracelulares, produzindo mecanismos como o aumento da reatividade brônquica, redução do transporte mucociliar, estresse oxidativo, sibilância, infecções de vias aéreas e exacerbações de crises asmáticas e da DPOC27-29.
Em um estudo realizado com MP, por Atkinson et al.23, relataram que este tipo de poluente pode provocar danos físicos ao sistema respiratório. Alguns outros estudos também têm sugerido que o MP está associado a toxidade respiratória em estudos in vivo, in vitro e epidemiológicos24-26. Além disso, outros estudos apontam que a exposição especificamente ao MP10 tem relação com o aumento no número de internações hospitalares por pneumonia27-29.
Outro poluente emitido na queima da cana-de-açúcar é o NO2, este é produzido a partir da oxidação em altas temperaturas do nitrogênio do ar e responsável também por desencadear efeitos potenciais sobre a saúde respiratória como produção de sibilos, infecções respiratórias, exacerbação de asma e diminuição da capacidade pulmonar30-33.
Mills et al.34 realizaram uma revisão sistemática sobre os efeitos agudos do NO2 sobre a mortalidade e hospitalizações, sendo identificada uma associação positiva entre a exposição e admissão hospitalar de forma aguda. Já Ghozikali et al.35 realizaram um estudo sobre os efeitos da exposição em mais poluentes como o O3, NO2 e dióxido de enxofre (SO2) em pacientes com DPOC. Seus resultados mostraram um impacto significativo na internação hospitalar no inverno em comparação ao verão. Nossos achados corroboram com esses estudos, visto que o período de queima de cana-de-açúcar ocorre em sua grande parte no inverno e a média da temperatura manteve-se menor em comparação ao período de não queima.
Além da queima da cana-de-açúcar, a emissão de poluentes pelo tráfego veicular também é considerado um fator contribuinte para o aumento nas concentrações de MP10 e NO2. De acordo com dados fornecidos pelo site do departamento de trânsito do Município, a frota veicular também apresentou aumento no período de queima (1.810.486 carros) comparado ao período de não queima (1.265.333 carros) na cidade36.
Dentre as DR investigadas no presente estudo, a pneumonia apresentou aumento significativo no período de queima. Estes resultados estão em concordância com o estudo de Arbex et al.2, que avaliaram 1.505 internações por pneumonia, observaram aumento de 6% (CI 95% 2,4 a 9,9) no número de internações durante dois dias, após o aumento na concentração de partículas totais em suspensão em uma região canavieira do estado de São Paulo. No estudo de Negrisoli e Nascimento37, realizado com 1.825 internações por pneumonia em crianças, observaram que a cada 10µg/m3 de aumento nas concentrações de NO2 no mesmo dia, aumenta 16% o risco de internações hospitalares. Semelhante comportamento ocorre com o MP10, que aumenta 9% do risco de internação após quatro dias de exposição.
Outro ponto importante deste estudo foi a influência dos dados meteorológicos. Sabe-se que um dos fatores que contribuem para a dispersão dos poluentes atmosféricos é a temperatura, que em condições baixas pode provocar maior concentração de poluentes, dificultando assim a renovação do ar. O estudo de Elliot et al.38 reportaram que em dias mais frios aumentam-se o número de internações hospitalares por bronquite aguda e gripe por influenza quando comparados à dias mais quentes. Zhou et al.39 analisaram 93.538 adultos com idade acima de 20 anos e 87.748 idosos acima de 60 anos e observaram um aumento de 1.05% (CI 95% 0.08-2.04) na taxa de mortalidade por doenças respiratórias nos adultos e 1,62% (CI 95% 0,22-3,46) nos idosos durante o inverno, isso associado ao aumento mensal de 10 µg/m3 de MP10.
Deste modo, existe uma conexão entre a baixa temperatura e doenças respiratórias. A congestão nasal causada pela rinite, por exemplo, pode levar à inalação bucal e, portanto, resultando em uma resposta inflamatória40-42.
Em contrapartida, neste estudo, observou-se relação negativa do O3 sobre o número total de internações por doenças respiratórias. Entretanto, as baixas temperaturas presentes no período de queima se associou positivamente com o O3. Sabe-se que a formação do O3 se dá pelas espécies de NOx (NO2 + NO), no entanto sofre influência do período do dia e temperatura, onde durante a noite e com a diminuição da temperatura há presença principalmente de NO, que é um importante eliminador de O343, fato que pode explicar por partes a relação negativa.
Como limitações do estudo, foram incluídas somente internações realizadas em unidades vinculadas ao Sistema Único de Saúde (SUS), excluindo as por planos de saúde privados. Também não foi identificado casos de reinternações e indivíduos residentes de outras cidades.
Diante da importância atribuída no âmbito dos agravos à saúde relacionados com os poluentes atmosféricos a partir da queima noturna da palha da cana-de-açúcar, o presente estudo observou maior prevalência de internações hospitalares por DR, principalmente por pneumonia durante o período de queima.
De acordo com nossas análises, estabelecemos que poluentes como o MP10 e NO2, juntamente com a temperatura, tornaram-se fatores envolvidos no processo de adoecimento por doenças respiratórias.
A partir dessas conclusões, espera-se que os resultados obtidos neste estudo sejam úteis a nível nacional, principalmente para a região centro-sul do Brasil, que atualmente é responsável por oitenta e oito por cento (88%) da produção da cana-de-açúcar, e que ainda não possui nenhuma implantação de políticas públicas visando a diminuição desses riscos que afetam diretamente a saúde humana44,45.