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Impacto de um programa de promoção da saúde na qualidade de vida do idoso

Impacto de um programa de promoção da saúde na qualidade de vida do idoso

Autores:

Silvia Affini Borsoi Tamai,
Sergio Márcio Pacheco Paschoal,
Julio Litvoc,
Adriana Nunes Machado,
Pedro Kallas Curiati,
Luis Felipe Prada,
Wilson Jacob-Filho

ARTIGO ORIGINAL

Einstein (São Paulo)

versão impressa ISSN 1679-4508versão On-line ISSN 2317-6385

Einstein (São Paulo) vol.9 no.1 São Paulo jan./mar. 2011

http://dx.doi.org/10.1590/s1679-45082011ao1759

INTRODUÇÃO

Viver mais, sim, mas com qualidade: é o que almeja a maioria das pessoas que compreendem o envelhecimento como um processo e vislumbram a velhice como um fato, decorrente de estudos demográficos que apontam para o aumento de quase 25 anos na expectativa de vida do brasileiro nos últimos 50 anos(1).

Com a transição epidemiológica que acompanha a transição demográfica, houve diminuição das doenças infectocontagiosas e aumento da prevalência das doenças crônicas não transmissíveis, culminando com maior proporção de pessoas idosas portadoras dessas doenças. Diante desse quadro, a longevidade propicia a vivência de uma situação ambígua, vivenciada por muitas pessoas (em menor escala pelas pessoas não idosas), que é o desejo de viver cada vez mais e, ao mesmo tempo, o temor de viver em meio à incapacidade e à dependência(2).

Cientes dessa mudança e da importância de planejar políticas públicas para essa população, os profissionais envolvidos na questão do envelhecimento passaram a planejar e desenvolver ações globais que promovessem a saúde do idoso no âmbito da promoção da saúde. Segundo a Carta de Ottawa(3) “promoção da saúde é o processo político e social global que abrange não somente ações dirigidas para o fortalecimento de habilidades e capacidades dos indivíduos, mas também, aquelas dirigidas para a modificação das condições sociais, ambientais e econômicas, com finalidade de atenuar seu impacto na saúde pública e individual”.

Dez anos após a publicação da Carta de Ottawa, realizou-se, em Jacarta, a Quarta Conferência Internacional de Promoção da Saúde. A Declaração de Jacarta(4) reafirma o conceito de promoção da saúde e incentiva a participação da comunidade. Nesse sentido propõe o treinamento da população para a liderança e acesso aos recursos de saúde disponíveis.

Dois anos antes da Carta de Ottawa, iniciavam-se as atividades do Grupo de Assistência Multidisciplinar ao Idoso Ambulatorial (GAMIA) do Serviço de Geriatria do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FMUSP), formado por uma equipe multidisciplinar. Na época, o idealizador do programa, Professor Doutor Wilson Jacob Filho, cunhou o termo senecultura(5) como sendo “o conjunto de ações interdisciplinares cujo resultado contribui para a Promoção da Saúde do Idoso”, conceito que passou a caracterizar o trabalho desse grupo de profissionais.

Dessa forma, o GAMIA estruturou um trabalho pioneiro à época, elaborando uma proposta de atendimento grupal, na qual o idoso, previamente selecionado, passaria a frequentar o Ambulatório de Geriatria semanalmente, desenvolvendo atividades que visavam à promoção de sua saúde, por meio de consultas médicas, orientações especializadas e atividades físicas, sociais e de lazer.

O GAMIA apresenta-se como um grupo em busca de conhecimento acerca de sua própria saúde. As atividades propostas seguem a ideia de que o idoso precisa conhecer sua condição de saúde, as alternativas de atuação de cada profissional e ter poder de decisão sobre sua saúde(6). Instrumentalizar o idoso quanto aos seus direitos e deveres implica construir cidadania e promover acesso à integralidade da saúde.

Atualmente, a equipe conta com um corpo de profissionais formado pelas áreas de enfermagem, farmácia, fisioterapia, medicina, psicologia, serviço social e terapia ocupacional. O GAMIA seleciona 30 idosos para participar de seu programa anual a partir de um processo de triagem daqueles interessados inscritos, tendo como critérios de inclusão idosos de ambos os sexos, idade igual ou superior a 60 anos, capacidade de locomoção independente de outrem, capacidade de comunicação que permita a atuação em grupo, e interesse e compromisso em participar do programa(7).

Os 30 idosos selecionados são divididos em dois grupos de 15 pessoas e passam a frequentar o Ambulatório de Geriatria todas as quartas-feiras, das 8h às 15h. Todas as atividades são realizadas em grupo, com exceção das consultas médicas. Os dois grupos são atendidos concomitantemente às quartas-feiras. As áreas de fisioterapia e de terapia ocupacional atendem aos dois grupos semanalmente e as demais áreas alternam-se atendendo a cada grupo quinzenalmente. O cronograma de atividades do GAMIA está exemplificado no quadro 1.

Quadro 1 Cronograma de atividades do Grupo de Assistência Multidisciplinar ao Idoso Ambulatorial – Grupos Amarelo e Verde 

HORÁRIO SEQUÊNCIA A HORÁRIO SEQUÊNCIA B
08:00 – 09:00 NUTRIÇÃO 08:00 –09:00 FARMÁCIA
09:00 – 10:00 SERVIÇO SOCIAL 09:00 – 10:00 FISIOTERAPIA
10:00 – 11:00 FISIOTERAPIA 10:00 – 11:00 PSICOLOGIA
11:00 – 12:30 ALMOÇO 11:00 – 12:00 ALMOÇO
12:30 – 13:30 ENFERMAGEM 12:00 – 13:00 TERAPIA OCUPACIONAL
13:30 – 15:00 TERAPIA OCUPACIONAL 13:00 – 14:00 ATENDIMENTO MÉDICO
MARÇO ABRIL MAIO JUNHO JULHO
Data AMARELO VERDE Data AMARELO VERDE Data AMARELO VERDE Data AMARELO VERDE Data AMARELO VERDE
03 Apresentação 07 A B 05 B A 02 A B 07 B A
10 A B 14 B A 12 A B 09 B A 14 A B
17 B A 21 Feriado 19 Passeio 16 A B 17 Festa de Aniversário do GAMIA
24 A B 28 A B 26 B A 23 B A 21 e 28 - Férias
31 B A 26 Festa Junina
30 A B
AGOSTO SETEMBRO OUTUBRO NOVEMBRO DEZEMBRO
Data AMARELO VERDE Data AMARELO VERDE Data AMARELO VERDE Data AMARELO VERDE Data AMARELO VERDE
04 B A 01 B A 01 Dia do idoso 03 B A 01 AGG
11 A B 8 A B 06 A B 10 A B 11 Festa de Natal
18 B A 15 B A 13 B A 17 B A
25 A B 22 A B 20 Passeio 24 A B
29 B A 27 A B

Os idosos participam das atividades sociais e de lazer juntamente dos idosos do grupo Pós-GAMIA (formado por idosos que já participaram do GAMIA), como passeios, festas e bazares.

Desde 2002, os idosos fundaram o Jornal do GAMIA, cuja comissão é formada por idosos do GAMIA, Pós-GAMIA e da assistente social do GAMIA. O objetivo dessa atividade é estimular e propiciar o exercício de participação dos idosos, sendo o papel do profissional apenas o de facilitador e colaborador. O Jornal do GAMIA é um espaço aberto para entrevistas, artigos de prevenção e saúde, temas relacionados ao envelhecimento, dicas, receitas, piadas, divulgação de informes referentes aos grupos, enfim, um espaço de participação.

Pensar no envelhecimento como uma experiência positiva expõe uma visão que a Organização Mundial da Saúde (OMS) chama de envelhecimento ativo(8): “…processo de otimização das oportunidades de saúde, participação e segurança, com o objetivo de melhorar a qualidade de vida à medida que as pessoas ficam mais velhas”.

Entende-se por qualidade de vida(9) “a percepção do indivíduo de sua posição na vida no contexto da cultura e sistema de valores nos quais ele vive e em relação aos seus objetivos, expectativas, padrões e preocupações”.

OBJETIVO

Este estudo teve como objetivo verificar alteração na qualidade de vida dos idosos participantes do programa do GAMIA.

MÉTODOS

O estudo foi realizado no Ambulatório de Geriatria do Hospital das Clínicas da FMUSP, com idosos participantes do programa do GAMIA nos anos 2000, 2001 e 2002. Foram observadas 83 pessoas em 1 ano de acompanhamento, sendo aferidas medidas de qualidade de vida utilizando-se o instrumento World Health Organization Quality Of Life (WHOQOL-bref) em dois momentos: no início e no final do programa. Terminaram o estudo com todas as avaliações preenchidas 83 das 90 pessoas avaliadas na primeira fase.

O instrumento selecionado foi o WHOQOL-bref, uma versão abreviada do instrumento WHOQOL-100, ambos validados para população brasileira(1012). O WHOQOL-Bref é composto por 26 questões dentre as que obtiveram os melhores desempenhos psicométricos, cobrindo 4 domínios específicos (físico, psicológico, relações sociais e meio ambiente) e 1 domínio geral.

Esse instrumento foi desenvolvido pela OMS em estudo multicêntrico, baseando-se nos pressupostos de que qualidade de vida é uma construção subjetiva (percepção do indivíduo em questão), multidimensional e composta por elementos positivos (por exemplo, mobilidade) e negativos (dor)(13).

Os dados sociodemográficos foram extraídos de um questionário elaborado pela autora e por informações contidas em prontuários.

Para medir os índices que avaliam as atividades de vida diária foi utilizada a escala de Atividades Básicas de Vida Diária (ABVDs) de Katz e a escala de Atividades Instrumentais de Vida Diária (AIVDs) de Lawton.

O Índice de Katz(14,15) avalia as ABVDs. As atividades estão divididas nos itens banho, alimentação, higiene pessoal, vestir-se, transferência e continência. O escore total é determinado pela soma respostas afirmativas e o máximo de 6 pontos significa plena independência para as ABVDs.

A escala de Lawton(16) avalia as AIVDs. As atividades estão divididas em habilidade de usar o telefone, ir a locais distantes, fazer compras, preparar as próprias refeições, arrumar a casa, fazer trabalhos manuais domésticos, lavar e passar a roupa, tomar seus remédios, cuidar das finanças. Para cada questão, a primeira resposta significa independência; a segunda, capacidade com ajuda; a terceira, dependência. A pontuação máxima é de 27 pontos e os escores têm um significado apenas para o paciente individual, servindo como base de comparação evolutiva.

Para responder os objetivos do estudo, foram utilizadas as diferenças na qualidade de vida nos domínios do WHOQOL com uso de testes Wilcoxon pareados(17) e foram calculadas as diferenças sofridas em cada domínio (final – inicial). Foi testada a normalidade de distribuição das diferenças nos domínios com uso de testes Kolmogorov-Smirnov(17), aceita a suposição de normalidade de distribuição dos dados (p > 0,05). Os testes foram realizados com nível de significância inferior a 5%.

O estudo foi aprovado pelo Comissão de Ética para Análise de Projetos de Pesquisa (CAPPesq) da Diretoria Clínica do Hospital das Clínicas da FMUSP e o termo de Consentimento Livre e Esclarecido foi obtido de todos os participantes.

RESULTADOS

Dos 83 sujeitos, 79,5% eram do sexo feminino e 20,5% do sexo masculino, e a média de idade foi de 69,30 anos.

A Escala de Katz mostrou que todos os idosos obtiveram a pontuação máxima, enquanto que, segundo a Escala de Lawton, 92,8% obtiveram a pontuação máxima (Tabela 1).

Tabela 1 Descrição dos escores de atividades de vida diária 

Escala N Escore %
KATZ 83 6 100
LAWTON 1 24 1,2
2 25 2,4
3 26 3,6
77 27 92,8

A Tabela 2 mostra que as pessoas participantes do programa GAMIA tiveram uma redução estatisticamente significativa no domínio físico (p = 0,014) e melhoram nos domínios psicológico e meio ambiente (p = 0,029 e p = 0,007, respectivamente). Os domínios relações sociais e geral mostraram tendência de melhora.

Tabela 2 Descrição dos escores de qualidade de vida no início e fim do programa e resultado da comparação entre os momentos 

Domínio Momento Média DP Mediana Mínimo Máximo N Valor p
Físico Inicial 71,08 16,31 75,0 28,6 100,0 83 0,014
1 ano 68,46 15,76 67,9 32,1 100,0 83
Psicológico Inicial 66,41 15,65 66,7 29,2 100,0 82 0,029
1 ano 70,08 13,00 70,8 41,7 100,0 83
Relações sociais Inicial 65,75 16,36 66,7 25,0 100,0 82 0,062
1 ano 69,07 14,52 75,0 25,0 100,0 83
Meio ambiente Inicial 58,04 15,87 56,3 25,0 93,8 82 0,007
1 ano 62,16 12,62 62,5 34,4 96,9 83
Geral Inicial 63,86 16,68 62,5 25,0 100,0 83 0,052
1 ano 67,62 15,38 75,0 25,0 100,0 83

DP: desvio padrão.

DISCUSSÃO

Em função dos critérios de seleção, os participantes do programa do GAMIA caracterizam-se por serem idosos independentes em relação às atividades de vida diária e cognitivamente preservados, possuindo, assim, plena autonomia.

Kalache et al.(18) observaram que a manutenção da autonomia está intimamente ligada à qualidade de vida e que uma forma de se procurar quantificar esta variável pode ser pelo grau de autonomia com que o indivíduo desempenha as funções cotidianas que o torna independente dentro do seu contexto socioeconômico cultural. Na prática, uma forma adequada de medir tais características é por meio do desempenho das atividades de vida diária.

O domínio físico avalia os aspectos relacionados a dor e desconforto, energia e fadiga, sono e repouso, atividades da vida cotidiana, dependência de medicação ou de tratamentos, além da capacidade de trabalho.

O declínio observado nos índices do domínio físico podem estar relacionados à percepção que o idoso tem de seu estado atual de saúde, devido à descoberta e à consciência de novos diagnósticos e, consequentemente, à necessidade de novos tratamentos. Isso, porém, não é indicativo de que seu estado de saúde tenha piorado no período.

Estudo de Xavier et al.(19) mostrou que idosos insatisfeitos com sua qualidade de vida tinham mais problemas de saúde segundo a Cumulative Illness Rating Scale (CIRS) e mais sintomas depressivos quando avaliados pela Geriatric Depression Scale (GDS); a causa desse descontentamento era a falta de saúde física. Concluiu-se que o conceito de uma qualidade de vida negativa seria equivalente à perda de saúde, enquanto que o conceito de uma qualidade de vida positiva seria equivalente a uma pluralidade maior de categorias, como atividade, renda, vida social e relação com a família, categorias diferentes de sujeito para sujeito.

A revisão realizada por Fortin et al.(20) mostrou a existência de uma relação inversa entre multimorbidades e qualidade de vida, apontada também no estudo de Miranda et al.(21). Em ambos os estudos, as pessoas tinham doenças crônicas estabilizadas, não apresentavam limitações funcionais, dores ou complicações. Os dados sugeriram que pacientes com esse perfil, quando conscientizados de sua real condição de saúde, mudam sua percepção em relação à sua saúde física e, consequentemente, à avaliação de sua qualidade de vida.

Em função da assistência multidisciplinar, o idoso aprende que existem outras abordagens, como nutrição saudável, atividade física, cuidados com a saúde, psicoterapia, terapia ocupacional, que atuam como poderosos adjuvantes do tratamento médico.

As abordagens não medicamentosas exigem da pessoa a incorporação de novos hábitos e mudanças comportamentais, alterando, muitas vezes, suas rotinas. Essa alteração pode se tornar uma tarefa difícil, pois depende da aderência do idoso e, nesse aspecto, a atuação da equipe interdisciplinar torna-se fundamental.

O domínio psicológico avalia os aspectos relacionados a sentimentos positivos ou negativos, pensar, aprender, memória e concentração, autoestima, imagem corporal e aparência, espiritualidade/religiosidade/crenças pessoais. A melhora observada nesse domínio deve estar relacionada a uma série de fatores.

Ao entrar no GAMIA, o idoso sente-se acolhido devido ao suporte que o atendimento em grupo oferece e pelo fato de sentir a disponibilidade de profissionais interessados em auxiliá-lo nos diferentes aspectos relacionados ao seu envelhecimento. Existe a oportunidade de desenvolvimento de novas amizades, contribuindo ao aumento da autoestima e dos sentimentos positivos relacionados à velhice.

A dinâmica decorrente do atendimento multidisciplinar permitiu maior relacionamento entre a equipe de profissionais do GAMIA e colaborou para que o idoso modificasse seus conceitos e comportamentos na relação ao seu processo de envelhecimento e à sua condição de ser velho.

Da mesma forma, o atendimento grupal também influencia o domínio meio ambiente, que avalia os aspectos relacionados à segurança física e proteção, ambiente no lar, recursos financeiros, cuidados de saúde e sociais (disponibilidade e qualidade), oportunidades de adquirir novas informações e habilidades, participação/oportunidades de recreação/lazer, ambiente físico (poluição/ruído/trânsito/clima) e transporte.

O compromisso estabelecido em participar assiduamente do programa de atividades do GAMIA colaborou para que o idoso desenvolvesse a percepção da importância de ter um tempo só para si.

O conhecimento e a percepção de tais alterações propiciaram o desenvolvimento de respostas adaptativas e fortalecedoras, capazes de potencializar um melhor desempenho dos idosos no meio social ao qual pertenciam, propiciando sua permanência ativa e atuante no mesmo pelo maior tempo possível(22).

O idoso compartilha, além de suas próprias percepções, da percepção do outro, podendo, dessa forma, ampliar para seu relacionamento familiar, afetivo e social(22).

O domínio relações sociais avalia os aspectos envolvidos nas relações pessoais, suporte social e atividade sexual. Acredita-se que a tendência de melhora observada nesse domínio decorra da maior percepção do idoso quanto às suas possibilidades de articulação e de relacionamentos afetivos adquirida nas atividades em grupo, base fundamental do programa do GAMIA.

A literatura(2325) aponta para uma questão importante ligada à problemática da relações pessoais nas grandes metrópoles. Fatores como a alta densidade demográfica, heterogeneidade da população, falta de segurança e de adaptação dos espaços públicos acabam por não estimular o crescimento pessoal e social de seus membros, pois dificultam a convivência e as oportunidades de lazer.

Torna-se difícil organizar espaços nos quais os idosos possam desenvolver a cidadania e a convivência, incentivando, assim, sua participação social. Dessa forma, as atividades em grupo acabam contribuindo para o exercício de novos papéis e retomada de outros abandonados no decorrer de sua vida.

Segundo Lima e Pasetchny(23), as dificuldades nas relações interpessoais e sociais nas grandes metrópoles, aliadas à falta de espaços públicos e ao aumento do número de idosos, fazem da instituição de grupos de terceira idade uma necessidade, pois elas auxiliam na promoção da inclusão social do idoso.

Da mesma forma, no domínio geral, que se reporta à autopercepção da qualidade de vida e de seu grau de satisfação com a própria saúde, acredita-se que a tendência de melhora seja devida ao melhor conhecimento sobre suas capacidades e aptidões, porém, em consonância com a consciência recém-adquirida de doenças e limitações até então desconhecidas, fruto de um processo de acurada avaliação geriátrica global.

O estudo longitudinal realizado por Rudinger e Thomae (apud Neri)(26) ofereceu informações valiosas sobre o ajustamento e a satisfação na velhice, enfatizando que a saúde percebida e as maneiras como as pessoas lidam com os problemas de saúde são mais preditivas do que as condições objetivas de saúde, avaliadas segundo parâmetros médicos.

O fato de o encaminhamento dos idosos para triagem do GAMIA ser realizado por meio da indicação dos idosos do Pós-GAMIA, não sendo necessária a divulgação por parte do Serviço de Geriatria, mostra a influência positiva do programa no cotidiano do idoso, que passa a exercer o papel de agente multiplicador. O idoso do Pós-GAMIA almeja que seu familiar, seu vizinho, seu amigo se beneficiem da mesma forma que ele se sentiu beneficiado.

Segundo Melo et al.(27), em qualquer sistema de saúde, não se pode conceber o planejamento de ação sem antes considerar as premissas do planejamento educativo.

A OMS pontua que os objetivos da educação em saúde são o de desenvolver nas pessoas o senso de responsabilidade pela sua própria saúde e pela saúde da comunidade a qual pertençam, e a capacidade de participar da vida comunitária de maneira construtiva. Essas assertivas fazem da educação em saúde um dos mais importantes elos entre os desejos e as expectativas da população por uma vida melhor, além de projeções e estimativas dos governantes ao oferecer programas de saúde mais eficientes(28).

O trabalho com grupos de idosos funciona como instrumento a serviço da autonomia e do desenvolvimento contínuo do nível de saúde e das condições de vida, promovendo a saúde do idoso(27).

O modelo de atendimento proposto pela equipe de profissionais do GAMIA tem a possibilidade de ser reproduzido na rede pública, pois sua estrutura é simples e de baixo custo, visto que funciona há 26 anos no Ambulatório de Geriatria do Hospital das Clínicas da FMUSP.

As ações voltadas para a promoção do envelhecimento saudável, portanto, quebram os paradigmas da atenção ao idoso, que visa fundamentalmente ao tratamento sintomático das doenças. Acredita-se na importância de modelos de atuação que permitam a quem envelhece uma habilitação para participar ativamente da construção de seu futuro, conceitos estes muito bem sintetizados por Litvoc e Brito(29), pontuando que as ações de prevenção e promoção de saúde, que incluem medidas referentes às doenças e aos aspectos do bem-estar social e cultural, são fundamentais tanto para os idosos com capacidade funcional preservada como para aqueles já com incapacidade. No caso dos idosos com função preservada, essas ações são necessárias para manter o estado funcional íntegro.

CONCLUSÃO

Embora a literatura relacione a importância da saúde física ao desenvolvimento de uma boa qualidade de vida na velhice, este estudo mostrou que, apesar do declínio nos índices do domínio físico, o idoso teve melhora da qualidade de vida em decorrência do desenvolvimento de suporte psicológico, social e ambiental.

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