Compartilhar

Índice de Gravidade de Emergência: acurácia na classificação de risco

Índice de Gravidade de Emergência: acurácia na classificação de risco

Autores:

Joselito Adriano da Silva,
Angélica Santos Emi,
Eliseth Ribeiro Leão,
Maria Carolina Barbosa Teixeira Lopes,
Meiry Fernanda Pinto Okuno,
Ruth Ester Assayag Batista

ARTIGO ORIGINAL

Einstein (São Paulo)

versão impressa ISSN 1679-4508versão On-line ISSN 2317-6385

Einstein (São Paulo) vol.15 no.4 São Paulo out./dez. 2017

http://dx.doi.org/10.1590/s1679-45082017ao3964

INTRODUÇÃO

A superlotação dos serviços de emergência é um problema mundial de saúde pública, que tem piorado nesta última década. Ela é multifatorial e, como causas, são citadas a desestruturação da rede de Atenção Primária, o aumento da demanda por serviços de saúde, o reduzido número de leitos e o número insuficiente de médicos e enfermeiros.(1) Esta realidade tem levado a insatisfação dos clientes, devido ao longo tempo de espera, além de comprometer a rapidez no atendimento dos casos de maior complexidade nestes serviços, podendo contribuir para o aumento de mortalidade destes indivíduos.(2)

No Brasil, em 2004, o Programa Nacional de Humanização implantou o Acolhimento com Avaliação e Classificação de Risco (AACR) nos serviços de emergência, com o objetivo de prestar um atendimento com qualidade, compromisso, dignidade e respeito a todas as pessoas que procuram estas unidades. Deve também organizar o atendimento por gravidade, e não mais por ordem de chegada à unidade, pois, ao identificar pacientes em condições de urgência, aumenta-se a satisfação do usuário, diminui-se o congestionamento, organiza-se o fluxo de atendimento e direcionam-se os recursos a serem utilizados pelo paciente.(3)

O AACR tem por meta melhorar o acesso aos serviços de saúde promovendo mudanças. Estas transformações visam aprimorar as relações entre profissionais e usuário, quanto à forma de atendê-los, por meio de uma escuta qualificada e uma classificação de acordo com o grau de risco dos mesmos, e também por meio de uma maior integração entre os membros da equipe, além de disponibilizar um atendimento com maior responsabilidade e segurança.(4)

Com a implantação do AACR nas emergências, tornam-se possíveis a diminuição do risco de mortes evitáveis, a extinção da triagem por funcionário não qualificado, a priorização de acordo com critérios clínicos, a redução do tempo de espera, a detecção de casos que podem se agravar se o atendimento for postergado, a assistência adequada reduzindo os riscos e aumentando a segurança prestada, e o direcionamento dos recursos a serem utilizados pelo paciente.(5)

O processo de AACR deve ser realizado por profissional de saúde, de nível superior, mediante treinamento específico e utilização de protocolos preestabelecidos.(3)

De acordo com a cartilha da Política Nacional de Humanização, o AACR deve ser realizado pelo enfermeiro, que deve ser preparado para exercer esta função.(3) A lei do exercício profissional também o respalda para realizar tal atividade, pois a consulta e a prescrição de enfermagem são atividades privativas do enfermeiro, e a classificação de risco está inserida na consulta de enfermagem.(5)

De forma geral, tem sido recomendada a utilização de protocolos que estratifiquem o risco em cinco níveis, por apresentarem maior fidedignidade, validade e confiabilidade na avaliação do estado clínico do paciente. Atualmente, os protocolos mais utilizados para a realização da classificação de risco, nos serviços de urgência/emergência, em nível mundial, são: o Australasian Triage Scale (ATS), Canadian Triage & Acuity Scale (CTAS), Índice de Gravidade de Emergência (ESI - Emergency Severity Index) e o Manchester Triage System (MTS). Todas estas escalas organizam o atendimento em cinco níveis de prioridade.(6)

Não existe uma escala padrão quando se trata de medir saúde. Cada instituição possui autonomia para utilizar aquela que mais se adequa às suas necessidades. A mensuração requer indicadores que representem um conceito. Não há um instrumento de mensuração infalível; fatores situacionais e ambientais, tendenciosidade nas respostas, fatores pessoais e alterações no método de coleta de dados podem contribuir para erros de mensuração.(7)

No ESI, os pacientes são classificados e priorizados conforme o grau de gravidade da doença, por meio da estimativa do número de recursos necessários para o atendimento. Os pacientes menos graves têm a previsibilidade de utilizar menos recursos do sistema, sendo classificados como ESI 5, enquanto que os mais graves estão propensos a utilizar quatro ou mais recursos do sistema, sendo classificados como prioridade 1. Os pacientes com classificação de risco 1 necessitam de atendimento médico imediato; aqueles classificados como 2 e 3 necessitam de atendimento em até 15 minutos; e os com classificação de risco 4 e 5 devem ser atendidos em até 30 minutos.(8)

O ESI visa descentralizar o atendimento médico. Em uma primeira análise, o foco principal seria proporcionar atendimento médico adequado aos pacientes com afecções de menor complexidade, os quais correspondem aos níveis 3, 4 e 5. Estes pacientes geralmente utilizam poucos recursos da instituição e, mais raramente, necessitam de internação hospitalar. A prioridade é definida com base em um fluxograma, com avaliação dos recursos necessários para a adequada assistência, garantindo que o paciente tenha acesso aos recursos certos no tempo certo.(8)

O aperfeiçoamento da classificação de risco é o objetivo dos serviços de emergência, pois isto melhora os resultados clínicos dos pacientes, especialmente em ambientes de recursos limitados. Estudo internacional demostra que o ESI é um dos melhores métodos na definição de prioridades dos doentes, assim como após o processo de tratamento, para melhor acesso aos cuidados médicos e recursos disponíveis em muitos países.(9)

OBJETIVO

Verificar a concordância entre a estimativa de recursos previstos por meio do Índice de Gravidade de Emergência adaptada e aqueles utilizados pelos pacientes na prática; e analisar as variáveis tempo de formado, experiência profissional e tempo de trabalho nos serviços de emergência com a assertividade da previsão de recursos.

MÉTODOS

Estudo retrospectivo, analítico, com abordagem quantitativa realizado na Unidade de Pronto Atendimento Ibirapuera do Hospital Israelita Albert Einstein. Esta unidade funciona 24 horas por dia e faz, em média, 7.150 atendimentos mensais de especialidades como clínica médica, cirurgia geral e pediatria; apresenta ainda consultas de ortopedia.(8)

Para classificação de risco dos pacientes, o algoritmo de triagem ESI é utilizado pelos enfermeiros. O algoritmo consiste em pontos de decisão, nos quais o enfermeiro, devidamente treinado, faz quatro perguntas específicas para identificação dos pacientes, que são: será que este paciente necessita de uma intervenção rápida? Trata-se de um paciente que não deve esperar? De quantos recursos este paciente precisa? Quais são seus sinais vitais? Os pacientes são classificados em emergência se estiverem com risco de morte (níveis 1 e 2); os níveis remanescentes (de 3 a 5) são definidos pelas necessidades de recursos, como por exemplo, exames diagnósticos complementares, procedimentos terapêuticos a serem utilizados e sinais vitais, sendo esses níveis: urgência (atendimento rápido, categoria 3), (pouco urgente, categoria 4) e não urgente (categoria 5). Sendo esses últimos dois níveis denominados como supertrack que consiste em um sistema de salas ou áreas rápidas, que têm por objetivo a rápida resolução protocolizada de pacientes não graves.(6)

Excluído o risco de morte dos níveis 1 e 2, o enfermeiro realiza questões relativas à estimativa de recursos necessários para o atendimento, como, por exemplo, dos exames de apoio ao diagnóstico. Se o paciente usa dois ou mais recursos, o enfermeiro avalia os sinais vitais e, dependendo do resultado, pode reclassificá-lo para a categoria 2 de prioridade.(6)

A escala foi traduzida para a língua portuguesa do Brasil pelos enfermeiros e médicos da equipe desta instituição envolvidos na assistência, entretanto, não foi validada antes da implantação. Durante o processo de tradução, foram realizadas adequações para a implantação no serviço (ESI adaptada). As alterações realizadas foram: não foi considerada como recursos a medicação administrada por via intramuscular, endovenosa e subcutânea; foram considerados recursos os curativos e a inalação, após a segunda aplicação. Alguns procedimentos que não são realizados no serviço foram descartados, como procedimentos complexos, sedação leve e heparinização ou salinização de cateteres (Quadro 1).

Quadro 1 Classificação de recursos preconizados pelo Indice de Gravidade de Emergência e adaptação realizada 

Recursos ESI ESI adaptado
Exames laboratoriais Sim Sim
Testes rápidos Não Não
Eletrocardiograma, ultrassonografia e exames radiológicos Sim Sim
Hidratação endovenosa Sim Sim
Medicamentos endovenosos ou intramusculares Sim Não
Consulta com especialista Sim Sim
Procedimentos simples (suturas e cateterização vesical de demora) Sim Sim
Procedimentos complexos (sedação leve) Sim N/A
Medicação endovenosa (com tempo de infusão) Sim Sim
Medicação subcutânea e endovenosa sem tempo de infusão Sim Não
Curativo Não Sim
Inalação (somente após a segunda dose) N/A Sim
Anamnese e exame físico Não Não
Heparinização e salinização de cateteres Não N/A
Medicação oral, imunização contra o tétano e troca de receitas Não Não
Ligação para o médico titular Não Não
Muletas, talas e imobilização simples Não Não

N/A: não se aplica.

Neste estudo, os pacientes classificados como fast track (atendimento rápido) eram encaminhados para área específica no pronto-socorro e contavam com equipe exclusiva para realização deste atendimento. Para isto, foi realizada a reestruturação da planta física da unidade para atender este fluxo da triagem.

Foram incluídos dados de registros eletrônicos correspondentes à classificação de risco de pacientes de ambos os sexos, com idade igual ou superior a 18 anos, classificados na categoria 1 a 5 do ESI adaptada, atendidos pela especialidade clínica médica.

O cálculo amostral foi realizado considerando a precisão de 5% na estimativa de uma proporção de assertividade da ordem de 70%, com nível de significância 5%. A amostra foi de 538 prontuários de pacientes atendidos por 11 enfermeiros da classificação de risco.

A coleta de dados foi realizada com informações de pacientes atendidos no período de dezembro de 2012 a junho de 2013, por meio de formulário com as variáveis de interesse (queixa inicial, recursos propostos pelo ESI adaptada, recursos utilizados e identificação do autor da triagem) deste estudo, a partir do prontuário eletrônico do Sistema de Gestão Hospitalar, após aplicação do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) aos enfermeiros do local do estudo.

As variáveis categóricas foram descritas por frequências absolutas e relativas (percentagens) e as variáveis quantitativas, por medidas resumo, como média e desvio padrão (DP) ou mediana, primeiro e terceiro quartis (1ºQ; 3ºQ), além de valores mínimos e máximos.

As classificações de número previsto de recursos e do número utilizado de recursos foram descritas em tabela de dupla entrada, com frequências absolutas e percentagens relativas ao total da amostra. Para a avaliação de concordância, foi utilizado o coeficiente Kappa.

A avaliação dos fatores associados à adequação do número de recursos de acordo com o ESI foi feita por modelos de equações de estimação generalizadas, considerando a correlação entre as observações de um mesmo enfermeiro em diferentes atendimentos de pacientes. Os modelos foram ajustados com distribuição multinomial, em abordagens simples.

As análises foram realizadas com o auxílio programa Statistical Package of the Social Sciences (SPSS), versão 17, considerando o nível de significância 5%.

O projeto foi submetido ao Comitê de Ética em Pesquisa institucional e foi aprovado com o número 650.584, CAAE: 27423314.0.0000.0071.

RESULTADOS

Os atendimentos de triagem foram realizados por 11 enfermeiros, em sua maioria, do sexo feminino (81,8%). A idade variou de 29 a 36 anos, e o número de atendimentos realizado por cada um deles variou de 27 a 53 pacientes. O tempo médio de formação da maioria dos enfermeiros foi inferior a 7 anos (54,5%) (Tabela 1).

Tabela 1 Descrição da amostra de enfermeiros 

Variável n (%)
Idade do enfermeiro (anos)
Média (DP) 32,4(3,8)
Mínimo-máximo 26-38
Sexo do enfermeiro, n (%)
Feminino 9(81,8)
Masculino 2 (18,2)
Tempo de formação
Até 7 anos 6 (54,5)
Mais de 7 anos 5(45,5)
Mediana (1°Q; 3°Q) 7 (4;9)
Mínimo-máximo 4-11
Tempo de experiência nos serviços de emergência
Até 6 anos 6 (54,5)
Mais de 6 anos 5 (45,5)
Mediana (1°Q; 3°Q) 6(4;8)
Mínimo-máximo 4-10
Tempo de trabalho na unidade de estudo
Até 2 anos 6 (54,5)
Mais de 2 anos 5 (45,5)
Mediana (1°Q; 3°Q) 2(2;4)
Mínimo-máximo 1-6
Número de atendimentos
Mediana (1°Q; 3°Q) 50(27;53)
Mínimo-máximo 22-88

DP: desvio padrão; Q: quartil.

A amostra analisada foi composta por 538 prontuários de pacientes atendidos. A idade dos pacientes variou entre 18 e 65 anos, com média de 39,4 anos (DP=10,7 anos) e 59,3% eram do sexo feminino.

A classificação do risco variou entre 2 e 5, com maior representatividade de pacientes na categoria 3 de classificação (61%); 47,4% dos pacientes relatavam dois ou mais sintomas no momento do atendimento.

As principais queixas apresentadas pelos participantes do estudo foram náusea e vômitos (22,30%), seguidos por dor de garganta (15,24%), dor abdominal (14,30%) e tosse (13,01%). Em relação ao sexo, os homens foram o que mais procuraram o serviço, e a maioria da população apresentava somente uma queixa (Tabela 2).

Tabela 2 Variáveis demográficas e clínicas, e Indice de Gravidade de Emergência, segundo os prontuários de pacientes atendidos 

Características n (%)
Média de idade dos pacientes (DP) 39,4 (10,7)
Paciente do sexo feminino 319 (59,3)
Número de sintomas
1 283 (52,6)
2 166 (30,9)
3 77 (14,3)
4 11 (2,0)
5 1 (0,2)
Nível de classificação na triagem
2 60 (11,2)
3 328 (61,0)
4 145 (27,0)
5 5 (0,9)
Correspondência entre diagnóstico de triagem e de alta 514 (95,5)
Recursos utilizados
0 116 (21,6)
1 126 (23,4)
2 ou mais 296 (55,0)
Recursos previstos pelo ESI
0 5 (0,9)
1 145 (27,0)
2 ou mais 388 (72,1)
Adequação do número de recursos de acordo com ESI
Abaixo do recomendado 181 (33,6)
Adequado 348 (64,7)
Acima do recomendado 9(1,7)

DP: desvio padrão; ESI: Emergency Severity Index.

Na categoria 3, a correção da previsão de recursos foi de 36% e, na 4, na qual os casos não exigiriam recursos ou procedimentos específicos, resultou em 37% de utilização.

A acurácia entre o número de recursos previstos e os utilizados foi de 64,7% (Tabela 3). O coeficiente de concordância Kappa calculado foi de 0,34, ou seja, a concordância entre o número previsto e o número utilizado foi baixa, sendo que as discordâncias mais frequentes foram casos de utilização menos recursos que o previsto pelo ESI.

Tabela 3 Recursos previstos pelo Índice de Gravidade de Emergência e utilizados 

Recursos previstos e utilizados n (%)
Previsão adequada
Nenhum previsto/nenhum utilizado 5 (0,9)
Um previsto/um utilizado 56 (10,4)
Dois ou mais previstos/dois ou mais utilizados 287 (53,3)
Número de recursos abaixo do previsto
Um previsto/nenhum utilizado 80 (14,9)
Dois ou mais previstos/nenhum utilizado 31 (5,8)
Dois ou mais previstos/um utilizado 70 (13,0)
Número de recursos superior ao previsto
Nenhum previsto/apenas um utilizado 0 (0,0)
Nenhum previsto/dois ou mais utilizados 0 (0,0)
Um previsto/dois ou mais utilizados 9(1,7)
Total 538 (100)

Não foram observadas evidências de associação significativa da adequação do número de recursos utilizados de acordo com a classificação ESI com as variáveis explicativas (Tabela 4).

Tabela 4 Associação entre adequação do número de recursos utilizados, de acordo com o Indice de Gravidade de Emergência, e as variáveis de interesse 

Características dos enfermeiros Adequação do número de recursos de acordo com a classificação ESI Valor de p
Abaixo do recomendado Adequado Acima do recomendado
Tempo de formação, n (%)
Até 7 anos (n=345) 122(35,4) 220 (63,8) 3 (0,9) 0,100
Mais de 7 anos (n=193) 59 (30,6) 128 (66,3) 6(3,1)
Até 6 anos (n=352) 120 (34,1) 229 (65,1) 3 (0,9) 0,698
Mais de 6 anos (n=186) 61 (32,8) 119 (64,0) 6 (3,2)
Tempo de trabalho na unidade de estudo, n (%)
Até 2 anos (n=250) 80 (32,0) 168 (67,2) 2 (0,8) 0,471
Mais de 2 anos (n=288) 101 (35,1) 180 (62,5) 7 (2,4)

ESI: Emergency Severity Index.

DISCUSSÃO

A Política Nacional de Humanização recomenda a implantação do acolhimento com classificação de risco nos serviços de emergência.(3) A concordância entre a avaliação dos profissionais e o protocolo institucional é essencial para garantir a segurança da população atendida.(7) Estudo desenvolvido no Irã, que comparou dois sistemas de triagem, verificou que o ESI tem importante função na priorização do atendimento, pois coloca o paciente no lugar e no tempo certos, com os recursos corretos.(10)

Em relação ao perfil dos enfermeiros que realizam a classificação de risco, estudo realizado em hospital público de São Paulo apresentou resultado semelhante, com maioria do sexo feminino (90,0%) e média de idade de 27,3 anos. Porém, em relação ao tempo de formado, que neste estudo foi superior a 5 anos, a pesquisa teve tempos inferiores.(11) O tempo de experiência em serviços de urgência e emergência contribui para acurácia da classificação de risco.(12)

As características identificadas na demanda da população ao serviço de emergência foram pacientes com baixa complexidade clínica, que poderiam ser atendidos pela rede de Atenção Básica à Saúde, achados semelhantes aos da literatura.(13) Este resultado demostra o uso inadequado destes serviços pela população, causando superlotação destas unidades por pacientes que poderiam ser atendidos em serviços de baixa complexidade. As principais causas citadas na literatura para o uso incorreto é a presteza do atendimento, a medicalização e a realização rápida de exames mais sofisticados.(14)

As queixas apresentadas com mais frequência pelos pacientes foram náusea e vômitos, seguidos por dor de garganta, dor abdominal e tosse. Já estudo realizado em Minas Gerais com a escala Manchester mostrou que os fluxogramas mais utilizados foram o de “mal-estar em adultos”, que é utilizado quando o paciente não tem uma queixa específica, e o de “palpitações, dor torácica e cefaleia”.(7)

A assertividade dos enfermeiros na previsão dos recursos foi de 64,7%, resultado semelhante ao encontrado em estudo de implantação e validação do ESI, realizado em hospitais universitários e comunitários americanos no qual os enfermeiros foram capazes de prever quantos recursos seriam utilizados em 70% dos casos.(15) A concordância entre o número previsto e o utilizado foi baixa, e as discordâncias mais frequentes são os casos que utilizaram um número menor de recursos que o previsto. Isto implica em menor risco de morte ao paciente, pois são indivíduos com baixa complexidade clínica, mas que requerem um olhar atento, com implantações de intervenções educacionais para correção desta situação.

Neste estudo, o melhor grau de assertividade foi observado para a categoria 2. Os enfermeiros avaliados tiveram uma assertividade de 64,7% na adequação dos recursos. Resultados semelhantes foram observados em estudo que comparou a concordância na classificação entre enfermeiros e médicos com o uso do ESI, com elevados percentuais de assertividade para os níveis 1 e 2 (100 e 95%, respectivamente).(16) Pesquisa realizada na Suíça com profissionais de quatro serviços de emergência, na qual eles analisaram e classificaram os cenário de acordo com a escala ESI, observou que, na categoria ESI 2, aproximadamente metade (50,2%) atribui a categoria incorreta.(17) Entendemos que a percentagem de acerto baixa para pacientes que estão em situação crítica, ou seja, qualquer retardo no atendimento pode aumentar o risco de morte. Em outro estudo, realizado na Bélgica, a assertividade dos enfermeiros segundo o ESI em situações simuladas foi de 77,5%, observando-se variações quando os níveis de gravidade eram avaliados separadamente. Com relação à adequação dos recursos, a classificação abaixo do recomendado foi mais comum, e a categoria 2 do ESI apresentou maior percentual de erros sendo que 99,20% das situações simuladas foram classificadas abaixo do recomendado.(18)

De acordo com o ESI, pacientes com escores de dor maior que 7 podem ser classificados na categoria 2. Entretanto, é recomendado que o enfermeiro correlacione com outros parâmetros como alteração de sinais vitais e postura adotada no momento da triagem. Entretanto, a avaliação da dor ainda é desafiadora, devendo ser considerados o quadro clínico ou o estágio da doença, e a capacidade do paciente em se comunicar. Desta forma, ao se optar por mensurar a dor por meio de escalas, o enfermeiro deve levar em consideração outros parâmetros vitais.(19)

Na categoria 3, a assertividade foi de 36%, os enfermeiros não conseguiram prever o número de recursos utilizados pela maioria dos pacientes. Na categoria 4, também verifica-se que vários casos que não exigiriam recursos ou procedimentos específicos, no entanto, resultou na utilização dos mesmos (37%). Nestes dois níveis, os achados do estudo suíço apresentou resultado divergente, com taxa de acerto de 70%.(17)

Quanto às características dos enfermeiros, não houve associação significativa com a adequação do número de recursos utilizados, o que pode ser atribuído à existência de um protocolo preestabelecido para guiar e uniformizar as ações durante o processo de classificação de risco.

Ressalta-se a importância de estudos relacionados a essa temática no que concerne a qualidade do atendimento e segurança do paciente. Entretanto, este estudo apresentou como limitação o fato da coleta de dados ter sido realizada em centro único e de forma retrospectiva, o que pode restringir os achados à realidade local. Além disso, ainda existem poucos estudos direcionados à avaliação da validade e confiabilidade de protocolos direcionadores para determinar o grau de risco de pacientes em serviços de urgência. Cabe ressaltar que a ESI é uma escala de origem americana e não há estudos que tratem sua tradução e validação em nosso país, o que pode resultar em fragilidade no que se refere a confiabilidade deste instrumento, já que seu desempenho analítico não foi verificado na população brasileira anteriormente. Recomenda-se que mais estudos sejam realizados para verificar a acurácia na predição dos recursos utilizados nos serviços de triagem nacionais.

Os enfermeiros desta pesquisa apresentaram uma assertividade de 64,4% na utilização da escala adaptada do ESI, o que pode indicar a necessidade de capacitações periódicas para o uso da escala e de reavaliações deste processo, com o objetivo de aumentar a segurança do paciente e trazer benefícios para a instituição.

CONCLUSÃO

Os índices de assertividade dos enfermeiros na previsão de recursos, no atendimento de pacientes na unidade de pronto atendimento, utilizando o Índice de Gravidade de Emergência adaptado, foram inferiores aos descritos na literatura com a escala original. Houve baixa concordância entre a estimativa de recursos previstos pelos enfermeiros e os utilizados.

Não foi observada associação na previsão correta do número de recursos com o tempo de formação, tempo de experiência nos serviços de emergência e tempo de trabalho na unidade de estudo. É uma tendência nos serviços de saúde a busca pela excelência na assistência, para uma maior segurança do paciente. Assim é importante ressaltar a importâncias da análise deste processo de trabalho e da necessidade de implantação de intervenções educacionais para os profissionais envolvidos.

REFERÊNCIAS

1. Di Somma S, Paladino L, Vaughan L, Lalle I, Magrini L, Magnanti M. Overcrowding in emergency department: an international issue. Intern Emerg Med. 2015; 10(2):171-5.
2. Todd KH, Ducharme J, Choiniere M, Crandall CS, Fosnocht DE, Homel P Tanabe P; PEMI Study Group. Pain in the emergency department: results of the Pain and Emergency Medicine Initiative (PEMI) multicenter study. J Pain. 2007;8(6):460-6.
3. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria-Executiva. Núcleo Técnico da Política Nacional de Humanização. Humaniza SUS. Acolhimento com avaliação e classificação de risco: um paradigma ético-estético no fazer em saúde. Brasília (DF): Ministério da Saúde; 2004. p. 48. [Série B. Textos Básicos de Saúde].
4. Oliveira EB, Lisboa MT, Lúcido VA, Sisnando SD. [Contributions from a study about the participation of nursing students in an emergency unit: the labour psycho-dynamics]. Rev Enferm UERJ. 2004;12:179-85. Portuguese.
5. Conselho Regional de Enfermagem de São Paulo. Parecer Coren-SP CAT n° 014/2009. Triagem clínica por técnico/auxiliar de enfermagem [Internet]. São Paulo: Coren; 2009 [citado 2017 Abr 16]. Disponível em:
6. Emergency Severity Index (ESI). A triage tool for emergency. Department care. Version 4, Implementation Handbook [Internet]. Rockville: AHRQ Publication; 2012 [cited 2017 Apr 16]. Available from:
7. Souza CC, Toledo AD, Tadeu LF, Chianca TC. Classificação de risco em pronto-socorro: concordância entre um protocolo institucional brasileiro e Manchester. Rev Lat Am Enfermagem. 2011;19(1):1-8.
8. Viola DC, Cordioli E, Pedrotti CH, Iervolino M, Bastos Neto AS, Almeida LR, et al. Advanced units: quality measures in urgency and emergency care. einstein (São Paulo). 2014;12(4):492-8.
9. Singer RF Infante AA, Oppenheimer CC, West CA, Siegel B. The use of and satisfaction with the Emergency Severity Index. J Emerg Nurs. 2012;38(2): 120-6.
10. Maleki M, Fallah R, Riahi L, Delavari S, Rezaei S. Effectiveness of five-level Emergency Severity Index triage system compared with three-level spot check: an Iranian experience. Arch Trauma Res. 2015;4(4):e29214.
11. Mendes AC, Araújo Júnior JL, Furtado BM, Duarte PO, Silva AL, Miranda GM. [Conditions and motivations for the work of nurses and physicians in high complexity emergency services]. Rev Bras Enferm. 2013;66(2):161-6. Portuguese.
12. Chen SS, Chen JC, Ng CJ, Chen PL, Lee PH, Chang WY Factors that influence the accuracy of triage nurses’ judgement in emergency departments. Emerg Med J. 2010;27(6):451-5.
13. Becker JB, Lopes MC, Pinto MF, Campanharo CR, Barbosa DA, Batista RE. [Triage at the Emergency Department: association between triage levels and patient outcome]. Rev Esc Enferm USP 2015;49(5):783-9. Portuguese.
14. Carret ML, Fassa AC, Domingues MR. Inappropriate use of emergency services: a systematic review of prevalence and associated factors. Cad Saude Publica. 2009;25(1):7-28. Review.
15. Esmailian M, Zamani M, Azadi F, Ghasemi F. Inter-rater agreement of emergency nurses and physicians in Emergency Severity Index (ESI) Triage. Emerg (Tehran). 2014;2(4):158-61.
16. Elshove-Bolk J, Mencl F van Rijswijck BT, Simons MP van Vugt AB. Validation of the Emergency Severity Index (ESI) in self-referred patients in a European emergency department. Emerg Med J. 2007;24(3):170-4.
17. Jordi K, Grossmann F Gaddis GM, Cignacco E, Denhaerynck K, Schwendimann R, et al. Nurses’ accuracy and self-perceived ability using the Emergency Severity Index triage tool: a cross-sectional study in four Swiss hospitals. Scand J Trauma Resusc Emerg Med. 2015;23:62.
18. Bergs J, Verelst S, Gillet JB, Vandijck D. Evaluating implementation of the emergency severity index in a Belgian hospital. J Emerg Nurs. 2014;40(6): 592-7.
19. Lord B. Paramedic assessment of pain in the cognitively impaired adult patient. BMC Emerg Med. 2009;9:20. Review.