versão On-line ISSN 2317-1782
CoDAS vol.27 no.4 São Paulo jul./ago. 2015
http://dx.doi.org/10.1590/2317-1782/20152015008
De acordo com o censo demográfico do ano de 2010, realizado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, 45.606.048 brasileiros possuíam algum tipo de deficiência. Dessa parcela, 9.722.163 apresentaram deficiência auditiva, sendo que 7.574.797 indivíduos relataram ter alguma dificuldade, 1.799.885 grande dificuldade e 347.481 informaram não escutar de modo algum(1).
A Organização Mundial da Saúde (OMS) define deficiência como anormalidade nos órgãos, sistemas e estruturas do corpo. Além disso, a incapacidade é caracterizada como as consequências da deficiência do ponto de vista funcional e a desvantagem (handicap) reflete a adaptação do indivíduo ao meio ambiente como consequência da deficiência e incapacidade(2). Dessa forma, o handicap auditivo é considerado a percepção do próprio indivíduo a respeito de sua limitação auditiva, o que afeta seu estilo de vida, relação familiar, sua situação social e emocional(3).
A OMS conceitua como perda auditiva incapacitante a elevação permanente do limiar auditivo na melhor orelha para níveis de 30 dBNA em crianças e para níveis de 40 dBNA em adultos, usando tons puros nas frequências de 0,5, 1, 2 e 4 KHz(2).
Nos ciclos de vida do adulto e do idoso, a perda auditiva pode causar impactos emocionais e psicológicos de formas distintas em cada indivíduo. Esses impactos estão relacionados à experiência de vida, às perspectivas relacionadas à saúde, às habilidades de adaptação às limitações e ao grau de socialização. Dessa forma, sujeitos com perdas auditivas semelhantes podem apresentar distintos impactos na comunicação, nos meios sociais e emocionais e na qualidade de vida(2).
Os protocolos de avaliação da restrição à participação auditiva auxiliam na complementação dos dados obtidos na avaliação auditiva, sendo importantes na identificação das necessidades específicas de cada indivíduo e na avaliação dos resultados obtidos com as intervenções.
Investigar quais instrumentos são utilizados para avaliar a restrição à participação auditiva, em indivíduos adultos e idosos, por meio de uma revisão sistemática de estudos.
A primeira etapa do presente estudo consistiu na elaboração da pergunta de investigação: "Quais questionários são utilizados para avaliar a restrição à participação auditiva em adultos e idosos"?
Os estudos, dos últimos cinco anos, foram selecionados por meio de levantamento bibliográfico, em periódicos nacionais e internacionais, nas seguintes bases de dados eletrônicas: ISI Web of Science e na Biblioteca Virtual em Saúde - BIREME, que engloba as bases de dados LILACS e MEDLINE.
A seleção dos descritores foi elaborada por meio da consulta aos Descritores em Ciências da Saúde (DeCS) e os mesmos foram combinados entre si com a utilização dos operadores booleanos AND e OR. Foram utilizados os seguintes descritores em Português, Inglês e Espanhol: "Perda Auditiva" ("Hearing Loss" e "Pérdida Auditiva" ), "Audição" ("Hearing" e "Audición") e "Questionários" ("Questionnaires" e "Cuestionarios").
Foram utilizados descritores (DeCS e MESH) para a recuperação dos assuntos na literatura: MH: "Hearing" OR "Audición" OR "Audição" OR "Hearing Loss" OR "Pérdida Auditiva" OR "Perda Auditiva" AND "Questionnaires" OR "Cuestionarios" OR "Questionários" OR "Questionário". Também foram utilizados os seguintes filtros: adulto, meia-idade, idoso e ano de 2009 a 2014.
Foram adotados os seguintes critérios de inclusão: estudos disponíveis na íntegra; publicados em Português, Inglês ou Espanhol; cujos participantes eram adultos ou idosos e os que utilizaram questionário para avaliação da restrição à participação auditiva. Os seguintes critérios de exclusão foram adotados: artigos com menor nível de evidência científica segundo critério proposto pela literatura(4), ou seja, artigos de opinião de especialistas, relatos de casos ou séries de casos.
O presente estudo teve como foco estudos para revisão sistemática sem meta-análise; assim, foram selecionados estudos que não testaram a mesma hipótese, mas que utilizaram o mesmo instrumento de avaliação.
Inicialmente, os estudos foram selecionados com base na leitura dos títulos e resumos. Em segundo momento, os artigos foram lidos na íntegra e as informações foram analisadas segundo o checklist do Strengthening the Reporting of Observational Studies in Epidemiology (STROBE)(5). A iniciativa STROBE tem por objetivo oferecer recomendação e auxiliar no relato de estudos observacionais por meio do seu checklist, além de poder ser utilizada como bibliografia de apoio para os pesquisadores( 5 ).
O protocolo de análise dos estudos constou de objetivo da pesquisa, delineamento, métodos e as variáveis analisadas em cada instrumento e artigo.
No resultado da busca, foram encontrados 370 estudos nas bases de dados pesquisadas. Desses estudos, 14 foram excluídos, pois foram encontrados em mais de uma base de dados, sendo considerada apenas a primeira ocorrência. Com base nos critérios de inclusão, foram selecionados 356 artigos. Após a aplicação dos critérios de exclusão, foram selecionados 40 estudos para leitura na íntegra. Destes, sete foram excluídos por não responderem a pergunta norteadora do estudo e outros sete foram excluídos por não apresentarem os resultados da aplicação de instrumentos para avaliar a restrição à participação auditiva. Ao final, 26 artigos foram selecionados para a revisão (Figura 1).
Na verificação dos estudos selecionados (Tabela 1), observou-se que sete estudos utilizaram protocolos de restrição à participação auditiva apenas na população adulta( 8 , 9 , 11 , 16 , 18 , 23 ). Em 12 estudos, a amostra foi composta exclusivamente por idosos( 6 , 10 , 13 - 15 , 17 , 22 , 25 - 29 ); quanto aos demais trabalhos, sete( 3 , 7 , 12 , 19 - 21 , 24 ) avaliaram a restrição à participação auditiva tanto em adultos quanto em idosos.
Tabela 1. Descrição dos resultados dos estudos selecionados
Autor (ano) | País | Delineamento | Casuística | Instrumento | Principais achados do estudo |
---|---|---|---|---|---|
Campos et al. (2014)3 | Brasil | Transversal | Usuários de AASI experientes: 37 Novos usuários de AASI: 37 | HHIA e HHIE | Não houve diferença da habilidade de manipulação do AASI entre novos usuários e usuários experientes de AASI. As habilidades de manipulação estão relacionadas ao benefício geral obtido com o uso do dispositivo. |
Chiossi et al. (2014)6 | Brasil | Transversal | 72 | HHIE-S | A autopercepção do impacto auditivo na vida diária correlacionou-se com o índice de desvantagem vocal. A qualidade de vida foi influenciada negativamente pelo aumento da autopercepção de dificuldades auditivas e vocais no cotidiano. |
Silva et al. (2013)7 | Brasil | Transversal | 34 | HHIA e HHIE | Foi verificada redução com significância estatística nas dificuldades causadas pela privação auditiva após a adaptação do AASI. |
Guarinello et al. (2013)8 | Brasil | Longitudinal | 29 | HHIA | Verificou-se diferença significativa entre a média da avaliação da restrição à participação antes e após a adaptação do AASI. Houve diminuição da percepção da restrição à participação auditiva após uso da prótese auditiva no grupo estudado. |
Fuente et al. (2013)9 | Chile | Longitudinal | Grupo de estudo: 48 Grupo controle: 48 |
AIADH | A exposição a solventes está associada com as dificuldades da vida diária relacionadas com as funções do sistema auditivo periférico e central. |
Tomioka et al. (2013)10 | Japan | Longitudinal | Homens: 781 Mulheres: 950 | HHIE-S | O HHIE-S teve alta confiabilidade e foi específico na detecção da restrição à participação auditiva. O instrumento foi sensível para avaliar o impacto da restrição à participação auditiva na qualidade de vida. |
Håkan et al. (2013)11 | Suécia | Transversal | Audição normal: 20 Perda auditiva: 20 |
HHIA | Os trabalhadores com deficiência auditiva relataram boa qualidade de vida em relação à população com audição normal, porém com menor funcionamento físico e maior esforço percebido no ruído que seus pares com audição normal. |
Yamamoto e Ferrari (2012)12 | Brasil | Retrospectivo | 200 | HHIA e HHIE | O tempo entre o início da queixa auditiva e o momento para procura do tratamento foi de, em média, 7,6 anos. Houve correlações fracas ou inexistentes entre os dados audiométricos, demográficos, percepção da restrição à participação e tempo para procura de tratamento. |
Magalhães e Iório (2012)13 | Brasil | Coorte | 50 | HHIE | A análise do HHIE revelou que houve redução da restrição de participação nas escalas Emocional e Social no período pós-intervenção. |
Fuente et al. (2012)14 | Chile | Transversal | Audição normal: 20 Perda auditiva: 20 |
AIADH | A versão em idioma espanhol do AIADH apresentou boa validade de critério. Diferenças com significância estatística para todas as respostas aos itens do questionário foram observadas entre indivíduos com audição normal e com deficiência auditiva. |
Deepthi e Kasthuri (2012)15 | Índia | Transversal | 175 | HHIE-S | A sensibilidade, especificidade, valor preditivo positivo e valor preditivo negativo das ferramentas de triagem foram comparados com médias tonais superiores a 25, 40 e 55 dB de nível de audição. O HHIE-S produziu uma sensibilidade de 26,2% e especificidade de 95,9%. |
Holanda et al. (2011)16 | Brasil | Transversal | 43 | HDHS | O instrumento foi considerado de fácil compreensão e aplicação e obteve confiabilidade e validade aceitáveis. O HDHS precisa ser testado em amostras representativas da população de trabalhadores brasileiros com perda auditiva induzida por ruído. |
Magalhães e Iório (2011)17 | Brasil | Retrospectivo | 50 | HHIE | O HHIE revelou que a Escala Emocional e a Social no período pós-adaptação do AASI foram significantes, no gênero e faixa etária. |
Aiello et al. (2011)18 | Brasil | Prospectivo | Audição normal: 30 Perda auditiva: 113 |
HHIA | As perguntas do questionário foram consideradas de fácil leitura. Alta consistência interna geral e dos itens. Não foi observada diferença entre as pontuações no teste e reteste. |
Menegotto et al. (2011)19 | Brasil | Retrospectivo | 51 | HHIA-S e HHIE-S | Os instrumentos revelaram baixa sensibilidade e alta especificidade. Não houve significância estatística entre o grau da perda auditiva e o grau de restrição de participação. |
Luz et al. (2011)20 | Brasil | Longitudinal | Grupo Adultos: 17 Grupo Idosos: 27 | HHIA e HHIE | Houve redução das limitações de atividades e da restrição de participação em atividades de vida diária em adultos e idosos com o uso de AASI. |
Silverman et al. (2011)21 | EUA | Longitudinal | Idosos | HHIA e HHIE | Não houve significância estatística no acompanhamento cego na aplicação dos protocolos. |
Solheim et al. (2011)22 | Noruega | Transversal | 84 | HDHS | Houve significância estatística na associação entre limitações de atividades e aumento do grau da perda auditiva e na restrição de participação relacionada com a menor satisfação com as condições de vida geral. |
Araújo et al. (2010)23 | Brasil | Transversal | 52 | HHIA | Foram pontuadas as subescalas dos aspectos emocionais e sociais/situacionais, sendo encontrados 73,1% de presença do handicap. A aplicação do questionário mostrou-se um procedimento eficiente. |
Preminger e Meeks (2010)24 | EUA | Ensaio clínico randomizado | Perda auditiva: 36 Cônjuge: 36 | HHIA, HHIE, HHIE-SP | O individuo com perda auditiva que participou de programa de reabilitação auditiva apresentou melhora na qualidade de vida, o que também ocorreu com o cônjuge. O principal impacto do programa foi a melhor compreensão do cônjuge nas experiências vividas pelos seus pares. |
Noble et al. (2009)25 | Austrália | Ensaio clínico randomizado | 68 | HHIE e HHQ | Os grupos mostraram benefício após a implantação. Não foram observadas diferenças em pacientes com implante unilateral e bilateral. A coorte mais jovem mostrou aumentos no desempenho e autoavaliação e habilidades. |
Calviti e Pereira (2009)26 | Brasil | Clínico prospectivo | 71 | HHIE e HHIE-S | Tanto a pontuação do HHIE-S quanto do HHIE apresentou correlação com os limiares auditivos. Os dois instrumentos apresentaram boa sensibilidade e média especificidade. |
Rosis et al. (2009)27 | Brasil | Transversal | Audiologia: 55 Geriatria/ Gerontologia: 23 |
HHIE-S | Houve relação com significância estatística entre a restrição à participaçãoe o grau de perda auditiva nos dois grupos estudados. Ocorreu associação positiva entre o grau de perda auditiva e a restrição à participaçãoreferida em ambos os grupos. |
Collins et al. (2009)28 | EUA | Ensaio clínico randomizado | Individual: 329 Grupo: 330 | HHIE | A maior parte da amostra foi composta por sujeitos do gênero masculino. Não ocorreu diferença entre os grupos e resultados com significância estatística na relação entre perda auditiva e autopercepção auditiva. |
Metselaar et al. (2009)29 | Holanda | Exploratório | 247 | HHDI | Ocorreu melhora na percepção da restrição à participação em indivíduos adaptados com AASI. Esta percepção durou meses enquanto a percepção sobre a deficiência auditiva durou mais de um ano com o acompanhamento da adaptação. |
Legenda: AASI = aparelho de amplificação sonora individual; HHIA = Hearing Handicap Inventory for Adults; HHIE = Hearing Handicap Inventory for the Elderly; HHIE-S = Hearing Handicap Inventory for the Elderly - Screening; AIADH = Auditory Disability and Handicap; HDHS = Hearing Disability and Handicap Scale; HHIA-S = Hearing Handicap Inventory for Adults - Screening; HHIE-SP = Hearing Handicap Inventory for the Elderly - Spouse; HHQ = Hearing Handicap Questionnaire; HHDI = Hearing Handicap and Disability Inventory
A literatura mostra que o crescimento da população idosa é um fenômeno mundial. A perda auditiva no idoso é um dos mais incapacitantes distúrbios de comunicação e pode causar sérias consequências sociais e na qualidade de vida do indivíduo(7 , 9 , 24 ). Na presente revisão de literatura, importante parcela dos estudos avaliou a restrição à participação auditiva em idosos. É imprescindível averiguar os impactos da perda auditiva nessa população, para que ações de prevenção e intervenção possam ser planejadas e auxiliem na melhora da qualidade de vida desses indivíduos.
A deficiência auditiva, por muito tempo, foi considerada uma doença incapacitante. Ao longo dos anos, ações são realizadas para amenizar esse estigma e proporcionar melhora da qualidade de vida dos indivíduos deficientes auditivos; entre as possibilidades, está a adaptação de aparelhos de amplificação sonora individual (AASI)(3).
Nos estudos selecionados( 3 , 7 , 8 , 17 , 20 , 29 ), os questionários de restrição à participação auditiva foram utilizados para avaliar o plano de intervenção e se a reabilitação auditiva foi efetiva para a diminuição das incapacidades e desvantagens. Como resultado, obteve-se que o uso dos AASI auxiliou na diminuição da percepção da desvantagem e das dificuldades auditivas.
Quanto ao delineamento dos estudos, verificou-se que a maioria apresentou delineamento transversal( 3 , 6 , 14 - 16 , 22 , 23 , 27 ). O maior nível de evidência científica(4) encontrado nos estudos selecionados foi o ensaio clínico controlado randomizado, presente em apenas três artigos( 24 , 25 , 28 ), todos internacionais. Os estudos transversais são importantes, porém não inferem sobre a causalidade ou auxiliam na compreensão das mudanças na percepção da restrição à participação auditiva ao longo do tempo.
Dentre as temáticas abordadas nos ensaios clínicos randomizados, vale destacar um estudo que avaliou a eficácia da reabilitação auditiva individual ou em grupo, na qualidade de vida de indivíduos com perda auditiva e seus respectivos cônjuges. Observou-se que a reabilitação auditiva teve impacto positivo na qualidade de vida dos participantes de ambos os grupos e seus pares, porém os frequentadores da reabilitação em grupo apresentaram melhor avaliação(24).
Outro estudo avaliou a restrição à participação auditiva em adultos jovens e em adultos mais velhos que receberam implantação coclear bi ou unilateral. O estudo mostrou que os grupos avaliados apresentaram diminuição da percepção da restrição à participação auditiva; não foi observada diferença com significância estatística entre sujeitos com implante coclear unilateral e bilateral. Os adultos jovens apresentaram melhora no desempenho e na autoavaliação das habilidades auditivas(25).
Ensaio clínico randomizado com idosos distribuídos em dois grupos: o primeiro realizou terapia individual e o segundo, reabilitação auditiva grupal, evidenciou que os participantes atendidos em grupo apresentaram menores pontuações referentes à percepção das desvantagens da perda auditiva(28).
Entre os estudos selecionados para a presente revisão sistemática, a maioria possuía como cenário a clínica ou ambulatório da própria instituição de ensino superior dos pesquisadores ou clínicas conveniadas( 3 , 7 , 9 - 18 , 20 - 22 , 24 - 26 , 28 , 29 ) e prestava atendimento na área fonoaudiológica. Outros trabalhos também foram realizados em hospitais(16 , 23 ), centro de referência destinado aos idosos(6) e em ambulatório de gerontologia(27). Assim, verifica-se que, em diversas esferas de atenção e acolhimento ao paciente, estão sendo desenvolvidas pesquisas referentes à temática em estudo.
A Perda Auditiva Induzida por Níveis de Pressão Sonora Elevados (PAINPSE) oferece riscos à qualidade de vida do indivíduo, visto que, mesmo em estágio inicial, ela pode ser percebida e interferir na comunicação oral do indivíduo e causar comprometimento social e emocional(16). Estudo nacional( 16 ) realizou adaptação transcultural de instrumento de avaliação da restrição à participação auditiva em portadores de PAINPSE. O instrumento foi considerado de fácil compreensão e aplicação e obteve confiabilidade e validade aceitáveis, porém os autores sugeriram que novos estudos fossem realizados e que o questionário fosse aplicado em amostras mais representativas. A disponibilização de um instrumento específico para portadores de PAINPSE é importante para incentivar a pesquisa nesse campo, que é pouco estudado no Brasil.
Na área da saúde, ao longo dos anos, aumentou a necessidade de medir, demonstrar e documentar sistematicamente os avanços e resultados de intervenções(16). Dos estudos selecionados para a revisão sistemática, dois apresentaram resultados da validação de instrumentos para avaliação da restrição à participação auditiva(15 , 18 ) e um apresentou a adaptação transcultural( 16 ). Esses estudos apresentaram boa confiabilidade e validade em relação às versões originais. Os três instrumentos tinham como população-alvo adultos(18), idosos(15) ou ambos( 16 ).
Na análise dos estudos selecionados, observou-se que, ao longo dos últimos cinco anos, ocorreu uma distribuição heterogênea das produções científicas que utilizaram questionários para avaliação da restrição à participação auditiva. Os anos de 2011, 2013 e 2009 foram os que apresentaram a maior quantidade de estudos, respectivamente.
Na presente revisão, foram encontrados nove instrumentos para a avaliação da restrição à participação auditiva: Auditory Disability and Handicap (AIADH), Hearing Handicap Inventory for Adults (HHIA), Hearing Handicap Inventory for Adults - Screening (HHIA-S), Hearing Handicap Inventory for the Elderly (HHIE), Hearing Handicap Inventory for the Elderly - Screening (HHIE-S), Hearing Handicap Inventory for the Elderly - Spouse (HHIE-SP), Hearing Handicap and Disability Inventory (HHDI), Hearing Handicap Questionnaire (HHQ) e Hearing Disability and Handicap Scale (HDHS).
A Tabela 2 apresenta a relação dos questionários para avaliação da restrição à participação auditiva encontrados na presente revisão, os domínios avaliados, os eixos temáticos utilizados pelos autores dos estudos para a utilização dos questionários e a quantidade de estudos que utilizou cada um.
Tabela 2. Relação de questionários encontrados na revisão
Instrumento | Domínios | Principais eixos temáticos do estudo | Número de estudos de inclusão |
---|---|---|---|
HHIE | Emocional e social | Restrição à participaçãona população idosa(3,10,12,17-20,24,27,28) | 10 |
HHIE-S | Emocional e social | Restrição à participação na população idosa(8,13,15,24,25) | 5 |
HHIE-SP | Emocional e social | Avalia como o cônjugue acredita que o parceiro reage à perda auditiva(28) | 1 |
HHIA | Emocional e social | Restrição à participação na população adulta(6,7,9,10,17,18,20,21,23,28) | 10 |
HHIA-S | Emocional e social | Restrição à participação na população adulta(19) | 1 |
HDHS | Percepção de fala e percepção de sons não verbais, relação interpessoal, angústia e ameaça à autoimagem | Restrição à participação em portadores de PAIR(16) e avaliação da restrição à participação auditiva em idosos(22) | 2 |
AIADH | Inteligibilidade no barulho, inteligibilidade no silêncio, distinção do som, detecção do som e localização sonora | Restrição à participação(6,11) | 2 |
HHDI | Emocional, social e percepção do outro | Restrição à participaçãoem usuários de AASI(29) | 1 |
HHQ | Emocional, social e restrição na participação | Restrição à participação(25) | 1 |
Legenda: HHIE = Hearing Handicap Inventory for the Elderly; HHIE-S = Hearing Handicap Inventory for the Elderly - Screening; HHIE-SP = Hearing Handicap Inventory for the Elderly - Spouse; HHIA = Hearing Handicap Inventory for Adults; HHIA-S = Hearing Handicap Inventory for Adults - Screening; HDHS = Hearing Disability and Handicap Scale; AIADH = Auditory Disability and Handicap; HHDI = Hearing Handicap and Disability Inventory; HHQ = Hearing Handicap Questionnaire
Observa-se que os protocolos mais utilizados nos estudos selecionados foram o HHIA( 10 , 17 , 18 , 20 , 21 , 23 , 28 ), HHIE( 3 , 10 , 12 , 17 - 20 , 24 , 27 , 28 ) e o HHIE-S( 8 , 13 , 15 , 24 , 25 ).
Os questionários HHIA e HHIE são compostos por 25 itens cada, dos quais 13 envolvem aspectos emocionais e 12, aspectos sociais e situacionais. O HHIA é aplicado em indivíduos na faixa etária de 18 a 60 anos e o HHIE, na população acima de 60 anos.
Esses questionários podem ser autoaplicáveis ou aplicados por meio de entrevista; para cada pergunta do HHIA e do HHIE, o entrevistado deverá responder "sim", "às vezes" ou "não". Os valores de pontuação podem variar em índices percentuais de zero a 100, havendo uma correlação entre o escore obtido e a percepção do handicap (desvantagem), sendo que escore elevado sugere uma significativa percepção da deficiência auditiva pelo sujeito avaliado. Assim, escore de zero a 16 indica ausência de percepção do handicap; de 18 a 30, handicap leve; de 32 a 42, handicap moderado e acima de 42 indica handicap significativo.
O questionário HHIE-S é uma versão reduzida do HHIE, também aplicado na população com idade superior a 60 anos. O instrumento é composto por dez itens, sendo que cinco envolvem aspectos emocionais e os outros cinco, aspectos sociais e situacionais. O questionário pode ser respondido por meio de entrevista ou autoaplicável. Ao responder, o indivíduo deve optar por apenas uma resposta para cada item: sim, às vezes ou não. O escore total varia de 0 a 40, sendo que a pontuação 0 a 8 indica ausência de percepção do handicap; 10 a 23 pontos, percepção leve a moderada; e de 24 a 40, percepção significativa do handicap.
A comparação entre os instrumentos revelou que os eixos emocional e social são os mais utilizados( 3 , 7 - 10 , 12 - 15 , 17 - 21 , 23 - 29 ). Tal fato está relacionado ao impacto que a perda auditiva tem nesses aspectos, visto que, ao enfrentar limitações auditivas, o paciente se depara com alterações em sua rotina social e funcional, tais como isolamento social e dificuldades no âmbito profissional. Essas barreiras podem gerar emoções negativas (ansiedade, raiva, tristeza etc.). Em contrapartida, o processo de reabilitação pode gerar experiências positivas e, portanto, minimizar a percepção da desvantagem auditiva.
A avaliação do aspecto social dos instrumentos mostra que o aspecto social é um eixo importante, pois a audição tem papel preponderante na vivência social do indivíduo, seja no acesso à comunicação oral com seus pares, seja nas atividades rotineiras do ambiente de trabalho (reuniões, atendimento ao público, recebimento de orientações verbais) ou ambiente familiar e atividades culturais (cinema, teatro etc.)(22 , 25 ).
Nesse sentido, vale destacar outro aspecto fundamental, que é a análise do impacto da perda auditiva segundo a mensuração da restrição na participação em atividades, que está contemplado no instrumento HDHS(16 , 22 ). A PAINPSE tem repercussão psicossocial que pode ser refletida a curto prazo no desempenho profissional e, em situações mais severas, pode levar à incapacidade para o trabalho. Entre os aspectos relacionados à restrição à participação auditiva abordados pelo HDHS, pode-se citar a percepção de fala, percepção de sons não verbais e a ameaça à autoimagem; esses domínios são de grande importância não só no ambiente profissional como também no pessoal.
A complexidade do processo de determinação da percepção do impacto da perda auditiva na vida é notada na diversidade de instrumentos propostos pela literatura e dos eixos temáticos abordados. Contudo, cabe considerar que tal percepção é subjetiva e, portanto, tem relação com a história de vida de cada um e com aspectos sociais, culturais e demográficos.
Os estudos revelaram que os questionários mais utilizados para avaliar a restrição à participação auditiva foram o HHIA, HHIE e HHIE-S. Por meio da análise dos estudos selecionados, observou-se que a aplicação de questionários de restrição à participação auditiva pode auxiliar na validação de decisões na prática da clínica audiológica, além de ser útil na prática de adaptação dos AASI e resultados da reabilitação auditiva. Esses questionários também são importantes na avaliação dos serviços de promoção da saúde auditiva, pois, por meio de sua aplicação, é possível monitorar como as incapacidades e desvantagens afetam a qualidade de vida dos indivíduos.